O Ministério Público Federal questionou, num ofício datado de 13 de outubro, porque a Agência Nacional do Cinema (Ancine) aprovou apenas um projeto para obter recursos do Fundo Setorial do Audiovisual (FSA) num período de dez meses. O procurador Sergio Suiama deu 15 dias de prazo para a agência responder esta e outras demandas, e este prazo acaba na próxima quarta (28/10).
No ofício, obtido pela reportagem do jornal O Globo, o MP pede explicações à agência e a seu diretor-presidente, Alex Braga, sobre a razão de não terem sido deliberados projetos destinados ao FSA entre agosto de 2019 e maio de 2020. “No período de onze meses entre julho de 2019 e maio de 2020, consta que nenhum projeto passou pela fase de elaboração de alíquotas de retorno financeiro, o que levou a um significativo déficit. Desse modo, requisito a V.S.a. que esclareça a paralisação da elaboração de alíquotas no mencionado intervalo, bem como quantos projetos aguardam a elaboração de relatório de adimplência pela ANCINE dentre os enviados ao BRDE (Banco Regional de Desenvolvimento do Extremo Sul, responsável pelo pagamento dos contratos) para contratação”.
O documento também compara o número atual com o de projetos contratados nos governos anteriores: “Considerando que, no ano de 2018, a média de projetos contratados destinados aos recursos do FSA era de 25 (vinte e cinco) ao mês, valor que se iguala ao montante total dos últimos 14 (catorze) meses, requisito a V.S.a. que especifique as razões para a drástica queda na média em 2019 e 2020”.
O ofício também solicita que a agência “apresente as metas e estimativas de conclusão de projetos (contratação pelo BRDE e publicação em Diário Oficial), contemplando tanto os projetos já acumulados ao longo do período analisado, quanto os novos que forem submetidos à apreciação desta autarquia”.
Vale observar: o FSA não está paralisado há dez meses, mas há um ano e dez meses, desde que Bolsonaro se tornou presidente. A Pipoca Moderna alerta para este fato desde agosto do ano passado, quando o então ministro da Cidadania Osmar Terra suspendeu um edital de filmes LGBTQ+ denunciado pelo presidente usando como justificativa a necessidade de recomposição dos membros do Comitê Gestor do FSA.
Para as verbas serem liberadas, é preciso formar um Comitê Gestor, e o governo Bolsonaro só tomou essa iniciativa em dezembro do ano passado. Na ocasião, o comitê comunicou a existência de um montante de R$ 703,7 milhões, relativo à taxas de Condecine e Fistel cobradas do setor audiovisual em 2018, que estaria disponível para produções de filmes, séries e games nacionais em 2019. Este valor, porém, nunca foi utilizado.
Desde então, as poucas reuniões realizadas pelo comitê discutiram empréstimos bancários e outras pautas, menos a liberação do FSA – a razão de existência do chamado Comitê Gestor do FSA.
O fato mais preocupante é que, em junho passado, a Ancine sugeriu num comunicado contábil bastante vago – e sem dar maiores explicações – que o dinheiro do FSA teria sumido.
Até a eleição de Bolsonaro, o governo federal costumava liberar o FSA no começo de cada ano. Assim sendo, já são dois anos completos de verbas do FSA que o desgoverno atual não libera – algo em torno de R$ 1,5 bilhão. Este dinheiro já foi arrecadado, via taxas. Apenas não foi disponibilizado onde deveria, para cumprir o objetivo legal de sua arrecadação.
O MP está puxando um fio que pode conduzir a uma bomba.