Cinearte, tradicional cinema de São Paulo, fecha as portas após 56 anos

O Cinearte, um dos cinemas mais tradicionais da cidade de São Paulo, localizado no Conjunto Nacional, no coração da Avenida Paulista, fechou as portas na noite de quarta-feira (19/2) devido à política […]

O Cinearte, um dos cinemas mais tradicionais da cidade de São Paulo, localizado no Conjunto Nacional, no coração da Avenida Paulista, fechou as portas na noite de quarta-feira (19/2) devido à política cultural do governo Bolsonaro.

O cinema foi inaugurado em 1963 com o nome de Cine Rio. Também já foi chamado de Cine Bombril, Cine Livraria Cultura e, até março de 2019, Cinearte Petrobras.

Segundo orientação de Bolsonaro, a Petrobras não renovou o contrato de patrocínio com o cinema no começo de 2019. O corte foi geral e também atingiu festivais, como o Anima Mundi e o Festival de Rio, além de outros eventos culturais. A atriz Angela Leal revelou que chegou a enfartar quando seu teatro, o Rival, perdeu o apoio da Petrobrás no ano passado.

O cinema não conseguiu novo patrocinador para ficar aberto, ao contrário do Cine Belas Artes, que enfrentou o mesmo problema em relação à Caixa Econômica Federal. Mas enquanto o Belas Artes, a poucos metros de distância, tornou sua situação – e causa – pública, o desfecho do Cinearte foi melancólico, sem aviso prévio ou alarde. A maioria do público chegou desavisado ao cinema na noite de quarta, sem saber que se tratava da última sessão.

“Foram 22 anos de várias parcerias que tornaram possível a apresentação de inúmeros filmes independentes, debates, mostras, pré-estreias. Agradecemos a todos que, ao longo desta jornada, estiveram conosco nesta empreitada. Fechamos duas salas, mas não apagamos a crença na diversidade possível no cinema e que nosso lema Democracia na Tela esteja também no nosso cotidiano sempre”, disse Adhemar Oliveira, diretor do Circuito Cinearte, em comunicado.

O último filme exibido foi “Parasita”, vencedor do Oscar 2020.

Além de proibir que estatais possam ajudar a manter cinemas abertos, Bolsonaro vetou integralmente em dezembro a prorrogação do Recine (Regime Especial de Tributação para Desenvolvimento da Atividade de Exibição Cinematográfica) e dos incentivos fiscais da Lei do Audiovisual, que, entre outros objetivos, visavam fomentar a abertura de novos cinemas no Brasil.

Não por acaso, durante o primeiro ano do governo Bolsonaro, o parque exibidor nacional registrou sua maior retração desde os anos 1990, perdendo 155 cinemas em relação ao relatório da administração anterior sobre a quantidade de salas de exibição existentes no país. A principal ironia desses dados é que a Ancine comemorou o resultado “robusto”.

Quem quiser comparar e reparar na briga com a realidade, pode verificar um exemplo prático do orweliano Ministério da Verdade no próprio site oficial da Ancine, onde o relatório oficial de 2018 (aqui) exalta o recorde de 3.356 cinemas, enquanto o texto mais recente (aqui) afirma que o número era 3.194 e houve um crescimento “robusto” para 3.201 salas em 2019, “ressaltando o fortalecimento do número de cinemas no país”. O mesmo texto traz um link para powerpoints que não cobrem o ano passado, mas citam 3.352 salas em 2018. Noves fora, continuam aproximadamente 150 cinemas a menos.