Diretor de filme LGBTQ+ atacado por Bolsonaro diz sofrer ameaças de morte

O cineasta Bruno Victor Santos revelou que vem recebendo ataques nas redes sociais após seu filme “Afronte” ser mencionado pelo presidente Jair Bolsonaro (PSL) numa live. O projeto da adaptação do curta […]

O cineasta Bruno Victor Santos revelou que vem recebendo ataques nas redes sociais após seu filme “Afronte” ser mencionado pelo presidente Jair Bolsonaro (PSL) numa live. O projeto da adaptação do curta numa série foi citado entre por Bolsonaro numa live em agosto, em que o presidente se manifestou contra produções de temática LGBTQ+, afirmando que não iria liberar verba para esse tipo de “filmes”.

“Um discurso de ataque tão direto do presidente valida que outras pessoas façam o mesmo”, escreveu o diretor num desabafo publicado pelo site The Intercept Brasil. “E eu recebi ataques extremamente dolorosos, desde apoios à fala [de Bolsonaro] e à censura, até gente falando da cor da minha pele, da minha orientação sexual.”

Bruno conta que ele foi chamado de “cosplay de Marielle Franco” em um dos ataques. Ele considera motivo de orgulho ser comparado à figura da vereadora assassinada em 2018, mas o motivo da associação é o pior possível. “O que eles estão falando que eu mereço ter uma morte parecida com a dela. E eu fiquei com medo, me retirei das redes sociais. E sei que essas pessoas são covardes e gostam de violência, e que elas querem que a população preta, principalmente LGBT, continue sendo massacrada”, declarou.

Codirigdo por Bruno Victor e Marcus Azevedo, o curta “Afronte” mostra a realidade vivida por negros homossexuais no Distrito Federal. Exibido no Festival Mix Brasil de Cultura da Diversidade e no Festival de Brasília em 2017, a obra venceu o Prêmio Saruê, concedido pelo jornal Correio Braziliense no evento da capital – o nome é homenagem ao longa-metragem “O País de São Saruê”, de Vladimir Carvalho, retirado do Festival de Brasília em 1971 por conta da censura.

“Confesso que não entendi nada. Olha, a vida particular de quem quer que seja, ninguém tem nada a ver com isso, mas fazer um filme mostrando a realidade vivida por negros homossexuais no DF, não dá para entender. Mais um filme que foi para o saco”, disse o Bolsonaro, deixando claro a ordem de impedir a produção do projeto.

Seis dias depois, uma portaria do Ministério da Cidadania suspendeu o edital para a produção das séries atacadas pelo presidente – que, na ocasião da live, achava que eram filmes.

Para não fazer as séries, o ministro da Cidadania, Osmar Terra, encontrou uma brecha. Ele mandou suspender tudo alegando falta de nomeação dos membros do Comitê Gestor do FSA, responsável por direcionar as verbas arrecadadas com o Condecine (Contribuição para o Desenvolvimento da Indústria Cinematográfica Nacional, taxa cobrada da indústria de cinema, TV e telefonia) para seus respectivos programas de fomento. O detalhe é que a formação do comitê depende das indicações do governo. E, passados nove meses de sua posse, Bolsonaro ainda não indicou nenhum representante.

O decreto prevê a suspensão do edital por 180 dias, podendo prorrogar o prazo caso o comitê gestor continue sem as indicações dos membros do governo. Trata-se, portanto, de uma inação intencional, como estratégia para censurar obras, cujo efeito colateral, pela justificativa apresentada, travou o financiamento de todo o setor.

Como (apenas) a Pipoca Moderna vem alertando, isto não afetou apenas as séries que tiveram seu edital suspenso. Todos os projetos audiovisuais estão impedidos de receber financiamento, com base na justificativa apresentada. E isso já traz consequências claras para o setor.

Após a fala de Bolsonaro e a ação de Osmar Terra, entidades LGBTQ+ denunciam o presidente na Procuradoria Geral da República por homofobia e o MPF (Ministério Público Federal) no Rio de Janeiro já instaurou um inquérito civil para apurar a suspensão do edital. A suspeita de homofobia também é uma das questões apuradas.

Além disso, a suspensão do edital está enfrentando processos da entidades representantes da indústria audiovisual brasileira.

Bolsonaro já foi condenado por declarações homofóbicas em 2011, tendo que pagar R$ 150 mil, por danos morais, ao Fundo de Defesa dos Direitos Difusos (FDDD) do Ministério da Justiça. Isto porque na época o crime não era equiparado ao racismo, que contempla penas de reclusão. Isto mudou neste ano, em entendimento do STF (Supremo Tribunal Federal) que igualou as punições a todos os atos de intolerância.