Senado aprova Lei Aldir Blanc de auxílio à Cultura brasileira
O Senado Federal aprovou nesta quinta-feira (4/6), por unanimidade, o projeto de lei que vai destinar R$ 3 bilhões para socorrer o setor cultural durante a pandemia do novo coronavírus. Conhecida como Lei Aldir Blanc, em homenagem ao compositor que morreu vítima de covid-19, a lei prevê um auxílio de R$ 600, em três parcelas, para trabalhadores da arte e da cultura, que Bolsonaro excluiu, via veto, do “coronavoucher” destinado aos trabalhadores informais, de baixa renda e microempreendedores individuais. Como o senado aprovou o projeto sem alterar o texto encaminhado pela Câmara, o texto vai seguir diretamente para a sanção presidencial. O relator do projeto, senador Jaques Wagner, fez um apelo para que o presidente da República sancione o projeto sem vetos. “Eu espero que Sua Excelência, o presidente da República, acolhendo o apelo de seus líderes, e me somo a esse apelo como Relator desta matéria no Senado, que Sua Excelência possa aprovar o texto sem vetos para que esse recurso possa rapidamente, como o texto prevê, em 15 dias chegar à ponta para que o remédio não encontre o paciente já em situação terminal”. De autoria da deputada Benedita da Silva (PT-RJ) e de outros 23 parlamentares, o projeto de Lei 1075/2020 prevê também que os espaços culturais terão direito a uma quantia que varia entre R$ 3 mil e R$ 10 mil até o fim da quarentena. Além disso, 20% do total deverá ser aplicado na manutenção de espaços artísticos e no apoio a micro e pequenas empresas culturais, cooperativas e instituições dedicadas à arte que tiveram as suas atividades interrompidas por força das medidas de isolamento social. O recurso também poderá ser usado para editais, chamadas públicas, prêmios, aquisição de bens e serviços vinculados ao setor cultural. De acordo com o texto, os R$ 3 bilhões serão divididos ao meio: 50% vão para os estados e o Distrito Federal e 50%, para os municípios. 80% do valor destinado aos municípios (R$ 1,5 bilhão) serão distribuídos de acordo com o tamanho da população deles. Os outros 20% serão distribuídos de acordo com os critérios do Fundo de Participação de Município (FPM), uma transferência constitucional que leva em consideração fatores como tamanho e renda per capita. A partir do momento em que o dinheiro entra em caixa, o município terá 60 dias para distribuir o apoio emergencial. Para ter direito ao auxílio emergencial, o trabalhador vai precisar comprovar sua atuação social ou profissional nas áreas artística e cultural dos últimos dois anos. Pela proposta, serão analisados os cadastros culturais dos estados, onde os artistas devem estar registrados. O profissional também não poderá ter outro emprego formal ativo e não pode ser titular de benefício previdenciário ou assistencial ou beneficiário do seguro-desemprego ou de programa de transferência de renda federal, ressalvado o Bolsa Família. E aqueles que já recebem o auxílio emergencial do governo pago a trabalhadores informais também não terão acesso a nova ajuda. O benefício de pessoa jurídica será para espaços culturais e artísticos, micro e pequenas empresas culturais, organizações culturais comunitárias, cooperativas e instituições culturais com atividades atualmente suspensas como prevenção contra a pandemia. Elas precisam comprovar que constam em ao menos um dos cadastros públicos existentes (estadual, municipal, distrital de Cultura, ou de pontos de cultura) para receber o montante. Estas empresas também não podem ter vínculo com a administração pública, Sistema S ou fundações e institutos mantidos por grupos empresariais. Esta lei se tornou emergencial porque Bolsonaro, além de barrar o auxílio de R$ 600 para artistas, não liberou nenhum valor dos fundos de fomento cultural, que superam esse montante. O dinheiro arrecadado desde 2018 para financiar a Cultura encontra-se parado em aplicações financeiras, enquanto o setor atravessa sua mais grave crise econômica. Como reação à essa “política cultural”, deputados, artistas e secretários estaduais e municipais de Cultura decidiram se organizar e negociar uma solução para o setor, via Congresso. Isso se provou necessário porque o desgoverno não tem nem sequer quem responda pela pasta da Cultura, assim como não tem ministro da Saúde em plena pandemia.
Bolsonaro cria caos na Cinemateca para acomodar Regina Duarte
A situação de abandono e caos administrativo criada pelo governo Bolsonaro na Cinemateca Brasileira, o maior arquivo de filmes da América do Sul e uma das mais importantes instituições do gênero no mundo, voltou a chamar atenção da mídia e virou caso de justiça ao se tornar um prêmio de consolação para Regina Duarte. Ao anunciar a saída da ex-atriz do cargo de secretária de Cultura, na semana passada, Jair Bolsonaro disse que ela iria comandar a Cinemateca, com sede em São Paulo. Essa nomeação, porém, criou mais uma crise de desgoverno. Para começar, o cargo que Bolsonaro quer dar para Regina não existe, uma vez que a Cinemateca deixou de ser administrada diretamente pelo governo federal há quatro anos, quando teve sua gestão transferida para uma organização social, a Acerp (Associação de Comunicação Educativa Roquette Pinto). Desde então, o governo faz um repasse anual à Roquette Pinto para gerir o espaço. Mas como a proposta de Bolsonaro para a Cultura é o sucateamento, as verbas foram diminuindo até sumirem. No ano passado, a previsão era de entrada de R$ 13 milhões, mas só R$ 7 milhões foram transferidos até dezembro. Neste ano, nada. Como se não bastasse, o polêmico ministro da Educação, Abraham Weintraub, decidiu romper contrato com a Acerp, que era responsável pelos programas da TV Escola. Como a administração da Cinemateca era um adendo desse contrato, este ato deixou o mais importante espaço de preservação da história do cinema brasileiro sem acordo de gestão. Sem contrato e sem dinheiro, a Acerp tem feito mais que o Estado para preservar a Cinemateca. De janeiro a abril deste ano, o local foi mantido apenas com verbas próprias da Acerp, que teria desembolsado R$ 4 milhões para o pagamento de funcionários, prestadores de serviço e dos custos da instituição. Os poucos funcionários na ativa trabalham sem receber e a instituição tem negociado débitos da conta de luz — que varia entre R$ 100 e R$ 200 mil ao mês – para impedir o corte de energia que seria fatal para o acervo, dadas as condições de refrigeração necessárias para sua preservação. Além disso, contratos de prestação de serviços, como o dos bombeiros, fundamentais para preservação do acervo de 250 mil rolos de filmes, o maior da América do Sul, também estão para prescrever, o que é mais um risco sobre o acervo. Enquanto isso, os arquivos da Cinemateca já sofreram com incêndio e inundação nos últimos meses. Muito material precioso já foi perdido. Ao tomar ciência do caos, o Ministério Público Federal de São Paulo (MPF-SP) encaminhou um ofício à Secretaria Especial da Cultura cobrando “informações a respeito da possível ausência de repasse orçamentário que vem prejudicando o funcionamento da Cinemateca Brasileira e causando danos a acervo audiovisual mantido pela citada entidade.” De acordo com o documento, que o jornal O Globo divulgou na sexta (30/5), a secretaria tem até 60 dias para confirmar se houve ou não repasse à Cinemateca Brasileira. Se confirmada a falta de envio dos recursos — eram previstos R$ 12 milhões para 2020 —, o Ministério Público poderá entrar com uma ação civil pública contra a pasta. A decisão de Bolsonaro de colocar Regina Duarte à frente desse problema rendeu uma reunião na sexta-feira entre a Acerp e integrantes do governo. A expectativa da Acerp era fechar um termo de emergência com a Secretaria Especial de Cultura, mas o resultado do encontro foi uma nota, divulgada pelo ministério do Turismo, que afirma que a Cinemateca Brasileira será reincorporada à União. Para tanto, o governo decidiu pela oficialização do encerramento do contrato de gestão com a Acerp. “A Cinemateca Brasileira não será fechada e agora entra na fase natural de reincorporação pela União, uma vez que não existe respaldo contratual para a Organização Social permanecer”, diz a nota, enviada ao jornal O Estado de S. Paulo. “Todos os acertos jurídicos serão feitos com a Roquette Pinto”, garante o ministério. Com a rescisão do contrato, a instituição teria que interromper projetos já em andamento e a Acerp demitiria cerca de 150 funcionários. O governo, que deve milhões à instituição, também não arcaria com os custos das rescisões trabalhistas. Apesar do anúncio do ministério do Turismo, a Acerp teria recusado a proposta e acionado o conselho administrativo para tomar medidas judiciais. Afinal, a nota deixa claro que toda essa movimentação tem o objetivo exclusivo de dar função para Regina Duarte, que não tem a menor experiência com preservação e restauração de filmes. “A Cinemateca Brasileira, que detém uma parcela significativa da memória audiovisual e documental brasileira, prosseguirá sob a Direção da Secretária Regina Duarte”, assume o comunicado oficial do desgoverno. Como o ministério determinou por conta própria que a Acerp não é mais responsável pela Cinemateca e, por outro lado, nem sequer oficializou o desligamento de Regina Duarte do cargo que ela perdeu na semana passada, a responsabilidade pelo equipamento foi pro limbo. Quanto mais tempo o impasse demorar, maiores são as chances de deterioração e perdas de um arquivo inestimável. A situação de negligência por incompetência burocrática pode configurar crime e, conforme observado, já está sendo acompanhada pelo MPF-SP.
MIS comemora 50 anos com programação especial online
O Museu da Imagem e do Som (MIS) de São Paulo celebra 50 anos de existência nesta sexta (29/5). Mas embora a data não possa ser devidamente comemorada no próprio espaço do MIS, devido à crise sanitária criada pela pandemia de covid-19, ela não foi esquecida. Estão previstas diversas atividades online. Com sede no Jardim Europa, um dos bairros mais ricos de São Paulo, a instituição foi fundada em 1970 com o objetivo de conservar a memória audiovisual, preservando material de interesse artístico, histórico, sociológico e cultural. No acervo há fotografias, filmes, artes gráficas, discos, vídeos e equipamentos, refletindo a diversidade de manifestações e a própria evolução das formas de captação, produção e suporte da imagem ao longo de meio século. Além da conservação desse material, o MIS tem promovido oficinas e exposições. Entre julho de 2014 e janeiro de 2015, a mostra sobre o “Castelo Rá-Tim-Bum” – que trazia os cenários, figurinos e outras lembranças do programa televisivo infantil – recebeu 410 mil pessoas e foi a exposição mais visitada da história do museu, superando outros sucessos, como exposições dedicadas aos diretores de cinema Tim Burton e Alfred Hitchocock, ao apresentador Sílvio Santos e aos cantores David Bowie e Renato Russo. Como parte da programação comemorativa dos 50 anos, celebrações virtuais terão início com um bate-papo às 20h sobre o “Castelo-Rá-Tim-Bum”, que contará com a participação de parte do elenco da série, como Pascoal da Conceição, o Dr. Abobrinha, e Angela Dip, a Penélope. A mediação será de André Sturm, curador da exposição e ex-diretor do MIS, com transmissão pelo canal do MIS no Youtube. No sábado, o canal disponibilizará o curta-metragem “Nasce o MIS”, dirigido por Eduardo Leone, em 1970. O filme foi feito para a inauguração da instituição e reflete sobre a criação do museu em paralelo com as transformações da cidade de São Paulo e os avanços tecnológicos para suporte de imagem e som – há 50 anos. Em parceria com a plataforma Google Arts & Culture, também foi disponibilizada a mostra Moventes, em que a pesquisadora Valquíria Prates apresenta os resultados de uma investigação poética no acervo do MIS. Podem ser vistos vídeos e fotografias de artistas consagrados, como Sebastião Salgado e Helena Tassara.
Regina Duarte ainda é secretária da Cultura, uma semana após anunciar saída do cargo
Uma semana depois de anunciar sua saída da secretária especial da Cultura, Regina Duarte segue no cargo. Ela não foi exonerada (desligada oficialmente) porque o ato que a desvincula da secretaria ainda não foi publicado no Diário Oficial da União até esta quinta-feira (28/5). O afastamento da ex-atriz e futura ex-secretária foi comunicado em vídeo pelo presidente, ao lado de Regina, na quarta-feira passada (20/5), quando anunciaram que ela seria transferida para o comando da Cinemateca, em São Paulo. Mas o cargo informado não existe, uma vez que a Cinemateca é gerida por uma ONG. Comprovando sua permanência, a agenda pública da secretária revela que, nesta semana, ela teve ao menos quatro atividades de despachos da pasta – duas internas, duas por videoconferência. Questionado pelo UOL, o Ministério do Turismo informou que Regina está em transição. “A secretária especial de Cultura, Regina Duarte, encontra-se em fase de transição dos trabalhos realizados por ela durante este período para valorizar a cultura no país”, comunicou a pasta. Desde o anúncio da saída de Regina, um dos nomes cotados para substituí-la é do ator Mário Frias, que almoçou com Bolsonaro na semana passada, antes mesmo da ida da ex-atriz para o limbo, e que o próprio presidente tachou de “excelente nome” para assumir a Cultura do país. Mas assim que sua participação no governo
Câmara dos Deputados aprova auxílio emergencial de R$ 3 bilhões para a Cultura
A Câmara dos Deputados aprovou nesta terça-feira (26/5) o projeto de lei que concederá R$ 3 bilhões em ações emergenciais para a área da Cultura. Todos os partidos apoiaram a proposta, que agora precisa ser apreciada pelo Senado e seguir para promulgação da Presidência para virar lei. O Projeto de Lei 1075/2020, de autoria da deputada Benedita da Silva (PT-RJ) e de outros 23 parlamentares, conta com a relatoria da deputada Jandira Feghalli (PCdoB-RJ) e prevê aos trabalhadores informais no setor cultural uma complementação mensal de renda no valor de R$ 600, em três parcelas. Artistas tinham sido excluídos do “coronavoucher”, o benefício emergencial original de R$ 600, em veto do presidente Jair Bolsonaro, que desde o começo de seu governo só realizou ações que objetivam quebrar a indústria cultural brasileira, bem como seus trabalhadores e seus empreendedores. Ainda pela proposta, os espaços culturais terão direito a uma quantia que varia entre R$ 3 mil e R$ 10 mil até o fim da quarentena. Além disso, 20% do total deverá ser aplicado na manutenção de espaços artísticos e no apoio a micro e pequenas empresas culturais, cooperativas e instituições dedicadas à arte que tiveram as suas atividades interrompidas por força das medidas de isolamento social. O recurso também poderá ser usado para editais, chamadas públicas, prêmios, aquisição de bens e serviços vinculados ao setor cultural. A lei pode ser batizada de Aldir Blanc, em homenagem ao artista que morreu vítima do novo coronavírus, e foi resultado de uma parceria entre deputados, artistas e secretários estaduais e municipais de Cultura, como reação à “política cultural” do governo – muito anterior à pandemia, a paralisação do setor foi iniciada no dia em que Bolsonaro assumiu o poder e decidiu travar uma guerra contra o que batizou de “marxismo cultural”, que seriam quase todos os filmes, séries, peças teatrais e exposições artísticas. “Entendemos que esse é um momento histórico do parlamento brasileiro. Cultura é o que nos simboliza. Como já dizia o nosso saudoso Aldir Blanc: o Brazil não conhece o Brasil. Mas esta casa de representação nacional certamente conhece”, disse a relatora Jandira Feghali, ao comemorar a aprovação. Líder do governo na Câmara, o deputado Major Vitor Hugo (PSL-GO) afirmou ter se reunido com o presidente Jair Bolsonaro e com o ministro da Secretaria de Governo, Luiz Eduardo Ramos, e que o governo consentiu o apoio ao projeto. O líder afirmou ter construído um acordo para que a deputada da oposição tirasse pontos conflitantes do seu texto sob a garantia de o Planalto sancionar a proposta. Há um esforço coletivo de lideranças partidárias junto ao gabinete da presidência, a fim de que a proposta seja sancionada integralmente, sem vetos. De acordo com o texto, os R$ 3 bilhões serão divididos ao meio: 50% vão para os estados e o Distrito Federal e 50%, para os municípios. 80% do valor destinado aos municípios (R$ 1,5 bilhão) serão distribuídos de acordo com o tamanho da população deles. Os outros 20% serão distribuídos de acordo com os critérios do Fundo de Participação de Município (FPM), uma transferência constitucional que leva em consideração fatores como tamanho e renda per capita. A partir do momento em que o dinheiro entra em caixa, o município terá 60 dias para distribuir o apoio emergencial. Para ter direito ao auxílio emergencial, o trabalhador vai precisar comprovar sua atuação social ou profissional nas áreas artística e cultural dos últimos dois anos. Pela proposta, serão analisados os cadastros culturais dos estados, onde os artistas devem estar registrados. O profissional também não poderá ter outro emprego formal ativo e não pode ser titular de benefício previdenciário ou assistencial ou beneficiário do seguro-desemprego ou de programa de transferência de renda federal, ressalvado o Bolsa Família. E aqueles que já recebem o auxílio emergencial do governo pago a trabalhadores informais também não terão acesso a nova ajuda. O benefício de pessoa jurídica será para espaços culturais e artísticos, micro e pequenas empresas culturais, organizações culturais comunitárias, cooperativas e instituições culturais com atividades atualmente suspensas como prevenção contra a pandemia. Elas precisam comprovar que constam em ao menos um dos cadastros públicos existentes (estadual, municipal, distrital de Cultura, ou de pontos de cultura) para receber o montante. Estas empresas também não podem ter vínculo com a administração pública, Sistema S ou fundações e institutos mantidos por grupos empresariais. Esta lei se tornou emergencial porque Bolsonaro, além de barrar o auxílio de R$ 600 para artistas, não liberou nenhum valor dos fundos de fomento cultural, que superam esse montante. O dinheiro arrecadado desde 2018 para financiar a Cultura encontra-se parado em aplicações financeiras, enquanto o setor atravessa sua mais grave crise econômica. Atualmente, o desgoverno não tem nem sequer quem responda pela pasta da Cultura, assim como não tem ministro da Saúde. E daí?
Regina Duarte defende sua gestão na Cultura com ataques à esquerda
Regina Duarte já tenta fazer controle de danos de sua breve passagem pela Secretaria Especial da Cultura do desgoverno atual. Em artigo publicado nesta sexta-feira (22/5) no jornal O Estado de S. Paulo, ela se defendeu das críticas “à esquerda e à direita” que recebeu enquanto foi a secretária cultural de Bolsonaro, mas principalmente “à esquerda”. Dizendo-se consciente de que sua passagem pela Secretaria seria alvo de críticas, ela afirma que assumiu a missão com a convicção de que teria de “enfrentar interesses entrincheirados em ideologias cujo anacronismo não parece suficiente para sepultá-las”, mas mesmo assim lamenta “a ação coordenada de apedrejar uma pessoa que, há mais de meio século, vem se dedicando às artes e à dramaturgia brasileira”. No artigo, Regina diz ter sido “formuladora de diretrizes” na política cultural de Bolsonaro, sem detalhar suas realizações nos 77 dias em que esteve à frente da pasta. E sem trabalho para mostrar, o texto se revela apenas um roteiro para papel de vítima. Não da direita, que promoveu hashtag #ForaRegina, mas de colegas “de esquerda”. Os colegas que ficaram horrorizados com sua falta de sensibilidade às vítimas reais, da covid-19, e sua defesa da ditadura, com direito à marchinha patriótica, durante a entrevista fatídica para a CNN Brasil, em que tentou agradar terraplanistas para permanecer no cargo. “Amo meu país, sim, e tenho deixado isso sempre bem claro, a ponto de, numa recente entrevista à TV, ter cantado a conhecida marchinha dos anos 70, que fala de ‘todos ligados na mesma emoção’. Nada a ver com defesa da ditadura, como quiseram alguns, mas com o sonho de brasilidade e união que venho defendendo ao longo de toda a minha vida”, justificou a atriz. “E me desculpo se, na mesma ocasião, passei a impressão de que teria endossado a tortura, algo inominável e que jamais teria minha anuência, como sabem os que conhecem minha história. Dito isso, não será o veneno destilado nas redes sociais que me fará silenciar nem renegar amor à minha pátria”. Ela chega a lembrar da novela “Roque Santero”, de Dias Gomes, e seu famoso papel como a Viúva Porcina para dizer que enfrentou a censura nos primórdios da redemocratização – o que é meia-verdade. “Nos anos 80, na pele da Viúva Porcina e integrante do elenco da novela ‘Roque Santeiro’, enfrentei a censura nos primórdios da redemocratização. Fui aplaudida”, falou. “Duas décadas mais tarde, não me abstive de alertar a sociedade sobre a ameaça que representaria para o País um governo de matiz notoriamente socialista. Fui vaiada”. Na verdade-inteira, “Roque Santero” foi completamente censurada pela ditadura e proibida de ser produzida, mas em sua primeira versão, em 1975. Na ocasião, Betty Faria interpretaria a viúva “que foi sem nunca ter sido”. Regina até participou de movimento de repúdio à produção da obra, mas quando a novela foi liberada uma década depois, permitindo que ela vivesse Porcina, o Brasil já tinha um civil na presidência, José Sarney, e a infame Dona Solange, a burocrata que encarnou a censura no Brasil, já estava com a tesoura confiscada, de forma que Regina não enfrentou censura nenhuma para viver esse papel. Ao mesmo tempo, ela chama de “ameaça” “de matiz notoriamente socialista” um governo que, ao ser eleito, jamais ameaçou a democracia ou promoveu atos contra os poderes legislativo e judiciário, em defesa de um novo AI-5, como a administração da qual ela fez parte. Regina não enxerga essas diferenças. Pior: ela diz que chamar atenção para essas diferenças é ruim e sintomático de uma “infodemia” de esquerda. A citação a uma pandemia não vem com a lembrança, tão cobrada pelos artistas, às vítimas da covid-19, mas a uma “pandemia de informações tendenciosas em que conta o viés de quem as veicula e não o factual isento, não a verdade”. Trata-se, por óbvio, de uma visão ideológica do que é “verdade” – para bolsonaristas, ideológica é a “esquerda” e a verdade é “de direita”. Por fim, Regina Duarte acrescenta que o país precisa “de uma política cultural que transcenda ideologias”. Ou seja, que transcenda a esquerda. E finaliza: “Num país que tivesse nas comunicações uma elite pensante que não optasse pelo ‘quanto pior, melhor’, esse era o trabalho que deveria estar sob os holofotes da opinião pública – nunca a minha pessoa”. Vale lembrar, já que Regina esqueceu, que a elite que está nas comunicações lhe pagou salário por cinco décadas, e foi lembrada por ela, em seu próprio texto, via citação de novela, como produtora de arte que merecia ser defendida de um governo autoritário, na época em que estavam “todos ligados na mesma emoção”.
Bolsonaro nomeou Regina Duarte para cargo que não existe
Pegadinha do Mallandro? O cargo para o qual Jair Bolsonaro nomeou a ex-atriz e ex-secretária da Cultura Regina Duarte não existe. O presidente da República disse que ela iria presidir a Cinemateca Brasileira, responsável pela preservação e difusão do patrimônio audiovisual brasileiro. Mas a Cinemateca deixou de ser administrada diretamente pelo governo federal há quatro anos, quando teve sua gestão transferida para uma organização social, a Acerp (Associação de Comunicação Educativa Roquette Pinto). Desde então, o governo faz um repasse anual à Roquette Pinto para gerir o espaço. No ano passado, a previsão era de entrada de R$ 13 milhões, mas só R$ 7 milhões foram transferidos até dezembro. Neste ano, nada. A falta de recursos é um espelho do desgoverno na área da Cultura, administrada de forma deliberadamente incompetente, com demissões em série e cancelamentos de contratos, que visam manter a Secretaria Especial da Cultura desestruturada e paralisada. No Congresso, parlamentares já relataram dificuldades para transferir recursos de emendas para a Cinemateca por impedimento por parte do governo federal em empenhá-las. Enquanto isso, os arquivos da Cinemateca já sofreram com incêndio e inundação nos últimos meses. Muito material precioso já foi perdido. Para piorar, Bolsonaro odeia “ongistas”, a quem já culpou por incendiar a Amazônia e jogar petróleo no litoral brasileiro, sem provas ou razão. Administrada por uma ONG autônoma, a Cinemateca não está ao alcance da caneta nomeadora do presidente. No máximo, Regina poderia participar da coordenação-geral, um cargo de confiança, como representante da Secretaria do Audiovisual para supervisionar as ações do equipamento. Mas até a Secretaria do Audiovisual está desestruturada. Como se não bastasse, a Acerp está em briga declarada com o governo, após o ministro da Educação romper contrato com a associação, que era responsável pelos programas da TV Escola. Uma solução seria o governo “estatizar” a administração da Cinemateca, para desagradar seu desestatizante ministro da Economia. Só após promover o retorno da Cinemateca à administração federal é que o governo poderia alocar sua diretoria. O mais provável, porém, é Bolsonaro fazer o que tem feito com relação a todas as decisões urgentes que precisa tomar na pasta da Cultura: nada. Simplesmente deixar o tempo passar. Responsável por costurar a saída de Regina Duarte da Secretaria Especial da Cultura, a deputada Carla Zambelli, principal bolsonarista da Câmara, confessou na quarta (20/1) para a imprensa que a formalização da ida da atriz para a Cinemateca de São Paulo “ainda está pendente”. E, como se pode apostar, assim ficará por muito tempo. Segundo a própria deputada, a nomeação depende de questões burocráticas que não têm prazo para serem resolvidas. Um detalhe que veio à tona em meio a essa indefinição foi uma indefinição ainda maior na pasta da Cultura. Aparentemente, Regina Duarte foi saída sem realmente sair, deixando um vácuo em seu lugar, que não será preenchido enquanto o governo protelar a questão da Cinemateca. “A secretária [Regina] não saiu ainda [do cargo]. Ela vai fazer a transição”, disse Zambelli no Palácio do Planalto, apontando que ela continua como secretária da Cultura, sem ser mais a secretária de Cultura. Os detalhes do que seriam essa transição não foram esclarecidos nem pela parlamentar, nem pelo Planalto e nem pela atriz. Se não existisse de verdade, o governo Bolsonaro seria um pesadelo digno de Kafka – que não é comida árabe, ao contrário do que acredita o ministro da Educação.
Mario Frias já teria acertado substituir Regina Duarte na Secretaria de Cultura
O ator Mario Frias já teria sido convidado para assumir a Secretaria de Cultura, afirmaram aliados do presidente Jair Bolsonaro à vários veículos de imprensa. Ele vai substituir a atriz Regina Duarte, que foi exonerada nesta quarta (20/5), após cerca de dois meses no comando da pasta. Ainda não está definida a data em que o ex-ator será empossado. Sai a Viúva Porcina, de “Roque Santero”, e entra o Drácula, de “Os Mutantes”. Frias é uma ator de novelas de apenas 38 anos, cuja maior credencial para o cargo é ser bolsonarista. Revelado em “Malhação”, em 1998, ele também apareceu em “Senhora do Destino” e “Bela, a Feia”, e atualmente apresentava um game show na Redetv. Frias acompanhou a posse de Regina, mas foi rápido para sugerir seu próprio nome como sucessor da ex-atriz, durante o ápice da campanha #ForaRegina, promovida por terraplanistas das redes sociais. Ele se ofereceu para ocupar o cargo numa entrevista à CNN Brasil, há duas semanas. Na reta final da fritura da ex-atriz e agora ex-secretária, o ex-“Malhação” almoçou por dois dias consecutivos com Bolsonaro no Palácio do Planalto. Na tarde desta quarta (20/5), segundo atualização da agenda oficial do presidente, voltaram a se encontrar, quando o presidente teria batido o martelo. Sem grande currículo, Mario Frias pode se dar ao luxo de se queimar com a classe artística, ao abraçar a política anti-cultural de Bolsonaro. Quinto secretário de Cultura em menos de um ano e meio desse desgoverno, se ele ficar mais tempo na pasta que os dois meses de Regina, se tornará um dos mais resistentes no cargo. O recorde de longevidade pertence a Henrique Pires, que se demitiu após oito meses, recusando-se a praticar censura para agradar ao presidente. Este ato dramático, entretanto, acabou eclipsado pelo sincericídio de Roberto Alvim, que nem Bolsonaro conseguiu segurar após estrelar um vídeo da pasta com discurso inegavelmente nazista.
Regina Duarte não é mais secretária de Cultura
Regina Duarte não é mais secretária especial da Cultura. Um dia depois de almoçar com um dos nomes cotados para assumir o cargo, o ex-“Malhação” Mário Frias, o presidente confirmou nesta quarta (20/5) o remanejamento da ex-atriz de 73 anos para a Cinemateca Brasileira, com sede em São Paulo. Bolsonaro afirmou nesta manhã que Regina estava com saudade da família e que a mudança seria para o “bem” dela, em respeito ao “passado” da atriz e “por tudo o que representa para todos nós”. Vale lembrar que ela encerrou um contrato de mais de 50 anos com a TV Globo, com salário muito maior e todas as garantias possíveis para seu futuro, para atender ao convite do presidente e virar secretária de Cultura. Mas não pode reclamar de falta de exemplos de traição, inclusive de amigos íntimos, cometidas por Bolsonaro no poder. Há poucos dias, Regina reclamou foi de “matérias tendenciosas, maldosas, fakes, venenosas” que apontavam sua fritura, em meio à campanha #ForaRegina nas redes sociais, incentivada pelo próprio Bolsonaro. Segundo fontes ouvidas pelo jornal Folha de S. Paulo, os dois estavam insatisfeitos um com o outro e se dedicaram a encontrar uma saída honrosa para a artista, que vinha sofrendo intervenção no cargo, sem poder nomear ninguém. A tal saída honrosa, o comando da Cinemateca, foi estabelecida em um café da manhã desta quarta, no Palácio da Alvorada. A solução encontrada reflete uma reclamação de Bolsonaro, que já havia dito publicamente que Regina não dava expediente em Brasília, ficando a maior parte do tempo em São Paulo, trabalhando pela internet, o que prejudicava a gestão da pasta. A ausência da atriz abriria espaço, de acordo com o presidente, a conflitos ideológicos dentro da secretaria. Conflitos ideológicos, na visão de Bolsonaro, não são os absurdos terraplanistas defendidos por seu mentor Olavo de Carvalho, mas a defesa de direitos humanos. “Tem muita gente de esquerda [na secretaria de Cultura] pregando ideologia de gênero, essas coisas todas que a sociedade, a massa da população não admite. E ela tem dificuldade nesse sentido”, afirmou ele em 28 de abril. A ex-atriz esperava ter carta branca — algo que lembrou, em sua posse, ter-lhe sido prometido pelo presidente — para poder nomear os subordinados. Mas nunca teve. Bolsonaro mandou exonerar quem ela contratou em duas ocasiões e ainda impediu um terceiro de assumir um cargo, ao mesmo tempo em que manteve quem ela queria destituir e ensaiou trazer de volta quem tinha sido demitido por ela. Em seu discurso por ocasião da demissão-transferência da ex-atriz e ex-secretária de Cultura, Bolsonaro foi condescendente, sugerindo ter dado uma migalha para ela não ficar tristinha. “Pode ter certeza de uma coisa, acho que você quer ajudar o Brasil e o que eu mais quero é o seu bem pelo pelo seu passado e por tudo o que representa para todos nós. Ir para Cinemateca do lado do apartamento, saber que você vai ser feliz e produzir muito mais. Fico feliz por isso. Mas chateado porque sai um pouco do convívio com a gente”, disse o presidente. Bolsonaro postou um vídeo no Twitter ao lado da ex-atriz para justificar a decisão. E ela seguiu firme no papel que escolheu para si mesma pelo resto de sua vida, definindo a mudança como um “presente”. “Acabo de ganhar um presente, que é o sonho de qualquer profissional de comunicação, de audiovisual, de cinema e de teatro, um convite para fazer a Cinemateca que é um braço da cultura em São Paulo. Ficar secretariando o governo na cultura dentro da Cinemateca. Pode ter presente maior do que isso?” A atuação de Regina Duarte como secretária foi digna do Framboesa de Ouro, a premiação dos piores do ano em Hollywood, tendo como auge da canastrice a entrevista desastrosa que deu à CNN Brasil, quando teve chilique, defendeu a ditadura e minimizou as mortes de artistas por coronavírus para não perder o cargo. Tanto que a classe artística chegou a criar um manifesto dizendo que “ela não nos representa”. Decididos a ignorá-la, artistas buscaram alianças com secretários municipais e estaduais da Cultura para se dirigir diretamente ao Congresso em busca de aprovação de leis e alternativas de sobrevivência para o setor, durante a crise do novo coronavírus, que Regina não foi capaz de formular. A queda da ex-atriz, pouco mais de dois meses após sua posse, também faz parte do método implantado por Bolsonaro para neutralizar a pasta da Cultura e congelar todo e qualquer fomento para o setor. Trata-se de uma repetição escancarada de situações, que revela a tática de mudar tudo, o tempo todo, para que nada aconteça e ninguém faça coisa alguma. O método das demissões em série, desorganização estrutural e sabotagem assumida implode organogramas e trava definições de comitês importantes, como o responsável pela gestão do FSA (Fundo Setorial do Audiovisual). Essa desgovernança, que se aproveita da morosidade burocrática para transformar inoperância em modelo administrativo, explica porque nenhum dinheiro da Cultura foi liberado por Bolsonaro desde que assumiu a presidência. Além de não liberar, seu desgoverno se caracteriza por cortar incentivos e vetar leis que possam ajudar a classe artística, com o objetivo claro de sangrar o setor até matá-lo. Regina Duarte foi peão e cúmplice do maior ataque estatal já sofrido pela Cultura brasileira em todos os tempos. Seu sucessor deve apenas esquentar banco para o próximo, e assim sucessivamente, para que o pior presidente da História do Brasil avance em sua guerra cultural declarada, com o objetivo de sucatear o setor.
Artistas desistem de Regina Duarte e buscam apoio do Congresso para salvar a Cultura nacional
A falta de propostas e projetos da secretaria especial da Cultura fez artistas desistirem de tentar contato com Regina Duarte. Em vez disso, estão agora conversando diretamente com congressistas para aprovar projetos, que possam ajudar a classe durante a crise sanitária do novo coronavírus. Com a participação de artistas e secretários estaduais e municipais de Cultura de todo o país, a Frente da Cultura na Câmara juntou quatro projetos que estavam no Congresso para formar a base de uma espécie de Lei Emergencial da Cultura. Entre as propostas estão auxílios para artistas, repasses para centros culturais e modificações nos prazos de prestação de contas, pagamento de tributos, além da concessão de crédito a juro zero e com prazo de até três anos para pagamento. Há ainda um plano para a descentralização dos recursos, ou seja, de repasse direto para as secretarias de Cultura de estados e municípios, de fundos que estão concentrados e perdidos na esfera federal, onde a incompetência planejada do governo Bolsonaro vem causando graves estragos – além de vetar incentivos, o presidente protela indicações e mantém congeladas verbas arrecadadas e separadas há mais de 500 dias para o setor. Segundo a relatora do projeto, a deputada federal Jandira Feghali (do PC do B carioca), a ideia é garantir que as regiões, que têm maior conhecimento sobre a realidade local, possam fazer melhor gestão desse dinheiro. Ela afirmou ao jornal Folha de S. Paulo que a medida se fez necessária diante da ausência absoluta de propostas do poder Executivo. “Se a gente esperar do governo federal não virá nada, o Congresso precisava tomar a iniciativa de socorrer o setor cultural”, disse a deputada. Artistas como os cantores Ivan Lins e Zélia Duncan, além da produtora Paula Lavigne e do ator Fábio Assunção, estão entre os que tratam do projeto com representantes do Congresso. A classe desistiu de Regina Duarte, após ela dizer que artistas tinha sido beneficiados pelo auxílio emergencial de R$ 600 do governo. Mas, na verdade, Bolsonaro vetou trecho da MP (medida provisória) em que os artistas haviam sido acrescentados como beneficiários. Para Jandira, há uma dificuldade do governo em particular e da classe política em geral em ver a arte como trabalho e seu impacto na economia. “A arte, desde que a gente nasce, faz parte da nossas vidas, faz parte de todas as dimensões da nossa vida, cognitivo, das relações humanas, do nosso desenvolvimento. Mas muitas vezes não olham a arte como ofício, como trabalho, como forma de viver”, lembrou Feghali. “Esse setor faz viver uma cadeia imensa e em torno dela uma série de cadeias como hotéis, bares e restaurantes”, completou. Segundo apurou Jandira Feghali, o Fundo Nacional de Cultura tinha um montante de cerca de R$ 2,9 bilhões aguardando direcionamento em 31 de dezembro de 2019. Vale lembrar que o Fundo Setorial do Audiovisual também contava com mais de R$ 700 milhões, de taxas cobradas do mercado em 2018 para distribuir para novos projetos – cujos editais ainda não foram lançados – , e esse valor deve ter mais que duplicado desde então. Cansados de esperar 500 dias por alguma satisfação do governo, um grupo de artistas fez um vídeo cobrando explicações da secretária especial da Cultura pela demora na liberação das verbas do ano passado, agravada pela ausência de medidas para conter a crise no setor cultural gerada pela pandemia do novo coronavírus. “Cadê Regina”, queriam saber. O Estúdio Sotaque do Mundo, do Rio de Janeiro, até musicou a cobrança. “Cadê o fundo?”, diz os primeiros versos da canção. “Procurei, tô querendo saber, procurei pelo seu parecer, mas você some”, segue a letra, que depois entoa “cadê Regina”. Como Regina Duarte apareceu para defender a ditadura, torturas e minimizar a pandemia de coronavírus, numa entrevista para a rede CNN Brasil que acabou com sua credibilidade diante do setor, ficou claro que os artistas precisavam esquecer da secretaria da Cultura e buscar aliados no poder legislativo. Os encontros com congressistas e secretários regionais de Cultura rendeu tudo o que o governo federal não deu ao setor, transformando os apelos em projeto de lei, de número 1.075, cuja tramitação teve regime de urgência aprovado na semana passada, podendo ser votado ainda nesta semana. Também falando à Folha, Úrsula Vidal, secretária de Cultura do Pará e presidente do Fórum Nacional dos Secretários e Dirigentes Estaduais de Cultura, lembrou que cerca de 900 projetos culturais se encontram parados devido à burocracia federal – propositalmente inoperante no governo Bolsonaro. Por conta disso, o Fórum fechou entendimento de que é absolutamente necessária a descentralização do dinheiro. “Conhecemos as realidades locais, podemos ver melhor os programas, existe legislações específicas também”, afirmou à Folha de S. Paulo.
Governo cria crise na Cultura e Regina Duarte culpa a imprensa
A secretária especial da Cultura Regina Duarte atacou a imprensa com uma postagem nas redes sociais na manhã deste sábado (16/5), em que se disse vítima de uma “infodemia” de “matérias tendenciosas, maldosas, fakes, venenosas”. Mas errou o alvo. Desde que foi nomeada para chefiar a secretaria da Cultura, Regina tem sido atacada, na verdade, pela ala ideológica do governo Bolsonaro. Após uma entrevista desastrosa à CNN Brasil, em que relativizou tortura, ditadura, mortes por coronavírus e ainda cantarolou música ufanista da época da pior repressão, também passou a receber críticas e repúdio da classe artística. Mas enquanto acusa a imprensa de ser responsável pelos males que a afligem, o verdadeiro ataque se manifesta por meio de atos do governo que a ex-atriz insiste em defender. Uma decisão publicada no Diário Oficial de sexta (15/5) e assinada pelo ministro Walter Braga Netto, da Casa Civil, exonerou o secretário adjunto da pasta, Pedro Horta, número dois de sua secretaria. Horta tinha sido nomeado pro Regina no final de abril e ficou poucas semanas no cargo. Antes do governo Bolsonaro, ele era o responsável pelo departamento comercial da Ceagesp, a Companhia de Entrepostos e Armazéns Gerais de São Paulo, e já foi secretário parlamentar e advogado de Celso Russomanno, político e professor de direito constitucional. A decisão foi comemorada pela militância bolsonarista nas redes sociais. Grupos ligados ao ideólogo Olavo de Carvalho estão promovendo uma campanha de fritura de Regina Duarte e pedindo sua demissão, pois acreditam que ela estaria levando “infiltrados da esquerda” para dentro do governo do “Brasil uber alles” de seu líder, Jair Bolsonaro. A extremista Geralda Gonçalves (conhecida como Geigê) publicou uma mensagem em tom provocativo sobre a nova queda: “Bom dia! Menos um traíra #ReginaPedePraSair”, escreveu. Anteriormente, Regina também não tinha conseguido nomear seu favorito ao posto de número dois da secretaria, o gestor público e produtor Humberto Braga, que foi igualmente alvo de uma campanha nas redes sociais com acusações de ser um “esquerdista” tentando se infiltrar no governo. Para completar, há três semanas, Bolsonaro mandou demitir o pesquisador Aquiles Brayner, indicado por Regina para a diretoria do Departamento de Livro, Literatura e Bibliotecas. Ele caiu apenas três dias após sua nomeação, novamente sob pressão de perfis radicais nas redes sociais. Enquanto isso, a paralisação da Cultura segue firme, completando 500 dias de desmontagem do setor, sem que as principais verbas de fomento tenham sido liberadas. Mas, para Regina Duarte, a culpa dos problemas que a Cultura enfrenta é da imprensa. Veja abaixo. Ver essa foto no Instagram Para VOCÊS , meus queridos. BOM DIA!💐💓💞💞💞❤️🥰 Uma publicação compartilhada por Regina (@reginaduarte) em 16 de Mai, 2020 às 6:39 PDT
Débora Falabella diz que Bolsonaro não é normal e deve ser tratado como lunático
A atriz Débora Falabella, que estrela a série “Aruanas”, atualmente exibida pela rede Globo, aproveitou o tema politizado da produção, que acompanha ativistas ambientais, para criticar o governo Bolsonaro. Durante uma entrevista ao portal UOL, Falabella foi direta ao falar a respeito do presidente. “A gente precisa ter a percepção de que estamos lidando com algo que não é normal. Durante muito tempo, no início desse governo, acho que as pessoas estavam lidando com ele de uma forma muito normal, como se fosse só uma pessoa que fala coisas absurdas. Agora está muito explícito. Não sei como que a gente não trata essa pessoa [Bolsonaro] como um louco, um lunático, há muito tempo”, disparou a a atriz. Na série, Falabella interpreta Natalie, uma jornalista que busca a verdade, doa a quem doer, e que usa seu trabalho para auxiliar a ONG Aruana em luta pela defesa da Amazônia. Sua personagem chegou a declarar num episódio que o papel do jornalismo é colocar o dedo na ferida, e a atriz viu paralelos na relação dos vilões da produção com o comportamento de Bolsonaro, que chegou a mandar jornalista “calar a boca” para não responder a uma pergunta. Ela acrescenta que a resposta do atual governo à pandemia do novo coronavírus só reforçou sua percepção. “Vejo com muita tristeza o que está acontecendo com o nosso país agora. Acho que já é um momento muito difícil para o mundo. O que a gente escuta [no Brasil] é muito vergonhoso, absurdo. Chegou em um momento em que não dá mais para fingir que isso é normal. A gente está precisando defender a vida e estamos lidando com um governo que está fechando os olhos para isso e ao mesmo tempo tenta atacar quem está defendendo. Hoje no nosso país a gente está lidando com duas virulências [o governo e o coronavírus]”, frisa ela. Falabella diz considerar as omissões do governo na saúde tão ou mais perigosas que a devastação que incentiva na Amazônia. “A série foi escrita há muito tempo, acho que a Amazônia já vem sofrendo há muito tempo, com governos anteriores também. Mas agora a gente chegou nas vias do absurdo. Se trata da nossa sobrevivência defender a natureza, a floresta, nossos recursos naturais. Quem é contra isso é contra a vida. É muito claro que não estamos levantando uma questão política controversa, estamos falando de algo de um bem geral, que precisa ser defendido”. Em sua pesquisa para compor sua personagem, ela visitou a Amazônia e conheceu de perto a atuação de ONGs, em especial do Greenpeace, que chegou a ser atacado com fake news pelo presidente. “O Greenpeace foi transformador para mim: eu ouvia falar, via as matérias, achava incrível, mas quando você conhece, conversa com aquelas pessoas, você tem uma sensação mesmo que eles são heróis”, afirma. Ela reforça que é preciso defender a atuação de ativistas. “O Brasil tem um número horrível: é o país onde mais se mata ativistas. Isso é muito triste. O interessante da série é mostrar que ativistas são pessoas reais, que estão lutando por algo de um bem maior. Elas poderiam estar dentro de suas casas, não se preocupando com isso”. Vale lembrar que Bolsonaro culpou até Leonardo DiCaprio de incendiar a Amazônia. Ele também acusou, sem provas, ONGs de fazerem picaretagem, ao mesmo tempo em que desmontou mecanismos de fiscalização e proteção de reservas indígenas, incentivando demissões de funcionários eficientes e premiando invasores de terras com a regularização de seus crimes. O resultado é um desmatamento sem qualquer precedente na região, com recordes que não param de crescer.









