Willem Dafoe impressiona como Van Gogh em No Portal da Eternidade
A obra pictórica de Vincent Van Gogh (1853-1890) é impressionante, revolucionou a pintura, tornou-se uma quase unanimidade ao longo do tempo. Foi praticamente ignorada, porém, enquanto ele estava vivo. Recebeu algum reconhecimento crítico, mas nenhum êxito econômico. Consta que, apesar dos esforços do dedicado irmão Theo, nem um único quadro foi vendido até sua morte. Isso já é suficiente para despertar o interesse pelo personagem, mas sua vida solitária, desencontrada, com lances de loucura, como o corte da orelha, dificuldades no convívio, rejeição da comunidade, sombras sobre a sua morte, tornam tudo mais misterioso e sedutor. Não por acaso, o cinema dedicou vários filmes importantes a Van Gogh, começando por um curta de Alain Resnais, de 1948, passando por “Sede de Viver”, de Vincent Minnelli, de 1956, com Kirk Douglas vivendo o pintor. Mais dois filmes praticamente simultâneos, “Vincent & Theo”, de Robert Altman, protagonizado por Tim Roth, em 1990, e o ótimo “Van Gogh”, de Maurice Pialat, com Jacques Dutronc no papel principal, em 1991. Até “Com Amor, Van Gogh”, uma animação adulta de 2017, sobre as obras e o final da vida do pintor, dirigida por Dorota Kobiela e Hugh Weichman. Agora, é o diretor americano – e também pintor – Julian Schnabel quem volta ao personagem, em outro belo filme sobre o período final da vida de Van Gogh, “No Portal da Eternidade”. O mistério dessa vida aqui vai ser explorado não só na beleza de suas obras, mas na natureza, tão essencial à sua pintura, mostrada com exuberância e sofisticação visual. Buscará também uma reflexão sobre a relação da obra com o criador, o significado da arte, a determinação quase impositiva do talento criativo. Algo que tem de se expressar de forma borbulhante, explosiva, que não tem como ser contido. Que seria isso, afinal? Dom, destino, missão, loucura? Willem Dafoe faz o personagem com grande força interpretativa e alcançando uma similaridade com a figura conhecida do pintor, que impressiona. Tanto que concorre, pela primeira vez, ao Oscar de Melhor Ator – após três indicações como Coadjuvante, a mais recente por “Projeto Flórida”, no ano passado. O elenco é todo cheio de talentos conhecidos – Oscar Isaac, Mads Mikkelsen, Mathieu Amalric, Emmanuelle Seigner, etc. São intérpretes experientes, que dão suporte consistente à narrativa de Schnabel, que já dirigiu “O Escafandro e a Borboleta”, um êxito de 2007, e outro filme sobre um pintor, “Basquiat – Traços de uma Vida”, de 1996.
Roman Polanski reúne grandes astros franceses para seu próximo filme
Expulso da Academia de Artes e Ciências Cinematográficas dos Estados Unidos, em meio ao surgimento de novas denúncias de abusos de adolescentes nos anos 1970, Roman Polanski prepara seu primeiro filme após a insurgência do movimento #MeToo. E ao contrário de Woody Allen, não encontra nenhuma dificuldade para escalar um elenco estelar. Polanski reuniu uma impressionante constelação de astros franceses para seu novo projeto, que levará para as telas o célebre caso Dreyfus, o mais famoso erro de Justiça na história francesa, que condenou um herói militar inocente à prisão, inspirando uma campanha na imprensa por sua libertação, acompanhada por denúncias de preconceito, perseguição e antissemitismo. O tema obviamente ecoa os últimos anos tumultuados da vida do diretor. Intitulado “J’accuse”, como a célebre carta-aberta-editorial escrita por Emile Zola, o filme vai trazer o vencedor do Oscar Jean Dujardin (“O Artista”) no papel do agente de contra-espionagem que provou que o capitão judeu Alfred Dreyfus havia sido erroneamente acusado de espionar para os alemães. O caso dividiu a França por mais de uma década a partir de 1894, e a amargura e as divisões que criou duraram até a 2ª Guerra Mundial. O papel de Dreyfus será interpretado por ninguém menos que Louis Garrel (“O Formidável”) e o elenco ainda inclui Mathieu Amalric e a esposa de Polanski, Emmanuelle Seigner, que atuaram juntos no premiadíssimo “O Escafandro e a Borboleta” (2007) e num dos filmes mais recentes de Polanski, “A Pele de Vênus” (2013). O roteiro foi escrito pelo romancista britânico Robert Harris, que também já trabalhou com Polanski: no aclamado “O Escritor Fantasma” (2010), premiado com o troféu de Melhor Direção no Festival de Berlim. “Eu venho querendo há muito tempo fazer um filme sobre Dreyfus, não como um drama de época, mas como um thriller de espionagem”, disse Polanski em 2012. A história, argumentou, era “absolutamente pertinente para o mundo de hoje — uma caça às bruxas contra uma minoria, paranoia sobre segurança, tribunais militares secretos e serviços de Inteligência fora de controle, governos mentirosos e uma imprensa enfurecida”. O novo filme será falado em francês e as filmagens começarão em breve em Paris.
Willem DaFoe vira Van Gogh em trailer delirante de cinebiografia
A CBS Films divulgou o pôster e o primeiro trailer de “At Eternity’s Gate”, cinebiografia de Vincent Van Gogh estrelada por Willem Dafoe (“Meu Amigo Hindu”). A prévia tem clima delirante, ao tentar captar o estado de espírito do pintor holandês. Dirigido por Julian Schnabel (“O Escafandro e a Borboleta”), o longa narra os últimos dias de Van Gogh, que ele passa entre os que o consideram louco e os que o chamam de gênio. Preocupado com a forma como será lembrado, ele chega a considerar que talvez tenha feito arte para quem ainda não nasceu. De forma apropriada, o filme foi batizado com o título de uma pintura do artista. Feita em 1890 com tinta a óleo, a obra mostra um homem já em idade avançada sentado em uma cadeira e chorando com as mãos no rosto. O elenco ainda conta com Oscar Isaac (“Star Wars: Os Últimos Jedi”) no papel do pintor Paul Gauguin, além de Rupert Friend (“Homeland”), Emmanuelle Seigner (“Baseado em Fatos Reais”), Mads Mikkelsen (“Rogue One: Uma História Star Wars”) e Mathieu Amalric (“O Grande Hotel Budapeste”). Exibido sob aplausos no Festival de Veneza 2018, o filme conta com 80% no aprovação no site Rotten Tomatoes e rendeu muitos elogios à interpretação de Dafoe. A estreia está marcada para 16 de novembro nos cinemas americanos e ainda não há previsão de lançamento no Brasil.
O Filho de Joseph busca a figura paterna num ambiente formal e erudito
A questão que move a narrativa de “O Filho de Joseph” é a da paternidade. Ausência e rejeição pesam muito e o mínimo de equilíbrio e o bom humor parecem estar condicionados ao encontro de figura paterna substituta. O personagem central é Vincent, um adolescente de 15 anos, vivendo bem com a mãe, mas insatisfeito por desconhecer o pai. Até que o descobre e a decepção só cresce. Desejos de vingança tomam corpo. No entanto, uma afetividade inesperada pode pôr as coisas no lugar. Dito assim, dá para imaginar um filme de fortes emoções. Mas não é o que acontece. Os diálogos soam cerebrais, artificiais. Os tempos de reação são demorados, estranhos. Evita-se o naturalismo e a expressão de grandes emoções. Elas estão lá, mas represadas ou enquadradas por um certo formalismo. Além de um tanto formal, o filme é todo erudito, se refere às diversas manifestações artísticas, como a pintura, a música, o cinema e a literatura. Histórias bíblicas inspiram a trama. Quem quiser buscar citações vai encontrá-las em todo lugar, o tempo todo. O diretor Eugène Green vai na mesma linha que adotou em “La Sapienza”, seu filme de 2014. O roteiro parte de uma temática bastante usual e conhecida, mas tem um refinamento artístico que lhe dá um ar sofisticado. Seu maior mérito, porém, está na evolução das situações e na solução que surpreende, pelo menos da forma como foi conduzida. Os desempenhos do elenco, que incluem os atores Fabrizio Rongione (“Dois Dias, uma Noite”), Mathieu Amalric (“O Grande Hotel Budapeste”) e Maria de Medeiros (“Frango com Ameixas”), soam estranhos, pelos já citados racionalismo e formalismo que o filme adota. Superado esse inconveniente, dá para curtir bem a proposta.
Marion Cotillard e Charlotte Gainsbourg vão à praia na primeira foto de filme de fantasmas
A distribuidora francesa Le Pacte divulgou a primeira foto de “Les Fantômes d’Ismaël” (título internacional: “Ismaël’s Ghosts”), que reúne Marion Cotillard (“Assassin’s Creed”) e Charlotte Gainsbourg (“Ninfomaníaca”). A imagem mostra as duas tomando sol numa praia. O detalhe é que uma delas interpreta supostamente um fantasma. A trama gira em torno de Ismaël Vuillard, um cineasta que desenvolve um projeto inspirado na vida de seu irmão, quando é surpreendido pela volta de sua ex-mulher do mundo dos mortos. Cotillard vive a falecida, enquanto Gainsbourg é a atual companheira do protagonista, vivido por Mathieu Amalric (“O Grande Hotel Budapeste”). O elenco grandioso ainda inclui Alba Rohrwacher (“As Maravilhas”), Hippolyte Girardot (“Amar, Beber e Cantar”), Samir Guesmi (“Carga Explosiva: O Legado”) e Louis Garrel (“Saint Laurent”). O filme tem roteiro e direção de Arnaud Desplechin (“Três Lembranças da Minha Juventude”) e está cotado para ter sua première no Festival de Cannes. Por isso, ainda não tem previsão de estreia comercial.
Estreias: Animação infantil Cegonhas é o maior lançamento da semana
A semana traz dez lançamentos, além de uma exibição limitadíssima de “Pequeno Segredo” no interior do RS. Parece muito, mas dessa lista só três frequentarão os shoppings, dois deles com estreia simultânea com os EUA. A animação “Cegonhas – A História que Não Te Contaram” tem a distribuição mais ampla, ocupando 807 salas (594 em 3D). Bem infantil, sequer aborda a premissa que a inspirou: de onde vem os bebês. A trama mostra que as cegonhas abandonaram o negócio de entrega de bebês para se concentrar no lucrativo serviço de entregas de celular de última geração. Mas quando um bebê aparece no depósito das mercadorias, uma jovem órfã ruiva, que nenhuma cegonha entregou, convence o herdeiro do negócio a retomar o hábito perdido e encontrar uma família para o pequeno pacote babão. Fofo até enjoar, o filme dividiu a crítica americana (56% de aprovação no site Rotten Tomatoes) e chega ao Brasil com as vozes de Klebber Toledo (novela “Lado a Lado”), Tess Amorim (“Hoje Eu Quero Voltar Sozinho”) e Marco Luque (programa “Altas Horas”). A outra estreia simultânea com os EUA é o western “Sete Homens e um Destino”, remake anacrônico do filme de 1960, que chega em 340 salas (12 em Imax). Fruto do revisionismo afetado do cinema americano atual, apresenta um Velho Oeste sem conflitos raciais, em que pistoleiros de diferentes etnias (a ONU do Velho Oeste) se unem para expulsar um bando com perfil de terroristas radicais (o Estado Islâmico do Velho Oeste), que atormenta uma cidadezinha de pacatos cidadãos brancos. Até os westerns spaghetti, rodados na Espanha com atores italianos, eram mais realistas. Mas se não dá para levar muito a sério este trabalho do diretor Antoine Fuqua (“O Protetor”), é possível se divertir bastante com ele, graças ao elenco imponente, com Denzel Washington (“O Protetor”), Chris Pratt (“Guardiões da Galáxia”), Ethan Hawke (“Boyhood”) e Vincent D’Onofrio (série “Demolidor”) trocando tiros e bancando machões. 65% no Rotten Tomatoes. Apenas um dos quatro lançamentos nacionais da semana chega em todo o país, e é mesmo mais um besteirol. Sem criatividade alguma, “Tô Ryca” leva a 420 telas outra história de pobre que enriquece de uma hora para outra, como “Até que a Sorte nos Separe” (2012), “Vai que Cola: O Filme” (2015) e “Um Suburbano Sortudo” (2016). A diferença, além do sexo da protagonista, é que, para ganhar uma grande herança, a personagem central precisa perder milhões de propósito – e não por acidente. Diferença? A premissa genérica é a mesma do livro “Brewster’s Millions”, de George Barr McCutcheon, já filmado 11 vezes desde 1914, inclusive com duas versões indianas. A filmagem mais conhecida, “Chuva de Milhões” (1985), passou repetidas vezes na TV brasileira e inclui na história uma trama da eleição que também está no roteiro brasileiro! Estrelado por Samantha Schmutz (“Vai que Cola: O Filme”) em seu primeiro papel de protagonista, o filme registra o último trabalho da atriz Marília Pêra (“Pixote: A Lei do Mais Fraco”), falecida em dezembro. Assim como na semana passada, a melhor estreia da programação também é um filme brasileiro restrito a poucas salas. Exibido em apenas 17 telas, “O Silêncio do Céu” representa o amadurecimento do diretor Marco Dutra, que troca o terror de “Trabalhar Cansa” (2011) e “Quando Eu Era Vivo” (2014) pelo suspense sufocante. Tenso do começo ao fim, o filme acompanha o desdobramento de um ato de violência, o estupro de uma mulher, testemunhado em segredo e sem querer por seu marido. Envergonhados, nenhum dos dois fala sobre o assunto, como se não tivesse acontecido, embora o marido se torne obcecado em se vingar do responsável. Rodado em Montevidéu e falado em espanhol, a produção destaca a brasileira Carolina Dieckmann (“Entre Nós”) e o argentino Leonardo Sbaraglia (“Relatos Selvagens”) nos papéis principais. Os outros dois títulos nacionais são anti-comerciais, cada um a seu modo. Distribuído em nove salas de seis cidades, “Charlote SP” se orgulha de ser o primeiro longa nacional rodado com câmeras de celular. Praticamente um filme de estudante de cinema, traz como protagonista, lógico, um jovem que quer ser cineasta e que namora, obviamente, uma modelo. “Nervos de Aço” também é protagonizado por um diretor, mas de teatro, e vai na linha oposta, com câmeras profissionais, bom acabamento e um cineasta de ficha corrida: Maurice Capovilla, marginal cinematográfico desde os anos 1960. O longa teve première há dois anos no Festival Cine Ceará e a demora para encontrar circuito reflete seu formato “experimental”. A produção parte de um musical inspirado no repertório clássico de Lupicínio Rodrigues para fazer metalinguagem, contando uma historinha interpretada pelos próprios músicos, entre canções apresentadas num teatro e com o elenco dialogando com o público. Arrigo Barnabé estrela como o diretor teatral que também é cantor e, ainda por cima, namora a cantora da banda. A exibição começa em apenas uma sala no Rio e pretende aumentar seu alcance na próxima semana. As últimas novidades são quatro lançamentos europeus. Gérard Depardieu chegou a vir ao Rio para lançar “O Vale do Amor”, drama que ele estrela com Isabelle Huppert, sem circuito divulgado. Além do enorme talento, a dupla demonstra uma química inegável, construída ao longo das décadas – este é seu terceiro encontro nas telas, após 35 anos da última parceria. Por coincidência, na trama eles vivem um casal separado há muitos anos, que se reencontra no Vale da Morte, na Califórnia, para cumprir o último desejo do filho, morto seis meses antes. Ambos foram indicados ao César (o Oscar francês) por seus papéis. As demais estreias não empolgam. O drama “Lembranças de um Amor Eterno” leva a 46 salas o pior filme do diretor italiano Giuseppe Tornatore, em que Jeremy Irons (“Batman vs. Superman”) é um astrônomo num relacionamento à distância com Olga Kurylenko (“Oblivion”). O mesmo ator também vive um acadêmico na produção inglesa “O Homem que Viu o Infinito”, cinebiografia apelativa e reducionista do gênio autodidata indiano S. Ramanujan, interpretado por Dev Patel (“O Exótico Hotel Marigold”), em 25 salas. Por fim, merecendo apenas seis salas, “Belas Famílias” perpetua os clichês das comédias francesas sobre infidelidade, desperdiçando o bom ator Mathieu Amalric (“O Escafandro e a Borboleta”).





