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    Museu parte de um assalto verídico para questionar o valor da cultura

    23 de novembro de 2018 /

    O filme “Museu”, que conta uma história real, que beira o absurdo, mostra um grande roubo ocorrido na cidade do México, no período de Natal de 1985. Uma ação realizada por apenas dois estudantes de Veterinária, que foram capazes de roubar cerca de cem peças valiosíssimas do extraordinário Museu Nacional de Antropologia, extraídas, principalmente, da sala de cultura Maia. Surpreendente. Mas e depois? Quem vai comprar tais elementos fundamentais e preciosos da própria cultura mexicana, sentidos pela sociedade como uma perda inestimável? A história é até pouca e previsível, mas o filme, não. Ele envereda pela questão do valor da arte e da cultura, explorando significados artísticos e turísticos do México, dando densidade e dimensão à questão cultural que está na base da trama. E mostrando o equívoco que pode resultar da falta de informação e reflexão sobre os signos culturais de um país e de uma região. Cultura não se mede por dinheiro, não é consumo, é história e vida. “Museu” tem ótimos atores, como Leonardo Ortizgris na condição de protagonista e também o muito conhecido Gael García Bernal, em excelente desempenho. O filme merece ser conhecido. É um ótimo trabalho do diretor Alonzo Ruizpalacios em seu segundo longa (depois de “Güeros”), e levou o Urso de Prata de Roteiro no Festival de Berlim deste ano.

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    Novo Halloween é homenagem relevante ao clássico de John Carpenter

    9 de novembro de 2018 /

    Passou da hora de muita gente admitir que terror é um gênero relevante. É verdade que, quando um filme de horror faz sucesso, a fórmula é desgastada até não dar mais com continuações infinitas e repetitivas. Mas quando inaugura tendências ou, pelo menos, comprova sua conexão com discussões importantes para a sociedade de sua época, o filme costuma marcar seu nome na história do cinema. Em 1978, por exemplo, o lendário cineasta John Carpenter lançou um filme que influenciaria para sempre a cultura pop, além de dezenas de imitações. O slasher movie de Carpenter gerou um subgênero inteiro de terror ao mostrar um psicopata mascarado solitário tocando o terror numa cidadezinha pacata, na década do assassino do zodíaco. Tamanho foi impacto que sem ele não haveria “Sexta-Feira 13”, “A Hora do Pesadelo” ou “Pânico”. E tem outra: Michael Myers adorava matar mulheres, crime que ainda pauta o cinema de hoje por, infelizmente, nunca ter deixado de refletir a nossa realidade. Atento a suas origens, o “Halloween” de 2018 segue relevante. Admirador da obra de John Carpenter, o diretor eclético David Gordon Green, que assinou “Segurando as Pontas”, não assumiu riscos e prestou uma homenagem, com referências que deixarão os fãs com sorrisos enormes. É um caminho seguro e válido, que opta por reverenciar o único filme da franquia que fez História, fingindo que nenhuma continuação existiu e dando sequência aos eventos do clássico. Além disso, toma a estrutura do roteiro original como base e retoma com saudosismo a trilha composta pelo próprio John Carpenter. Mas faz Michael Myers esfolar o dobro, talvez o triplo de pessoas que ele esfaqueou no primeiro, conduzindo ao inevitável confronto com Laurie Strode (novamente vivida por Jamie Lee Curtis), a babá que sobreviveu ao clássico e esperou quatro décadas para reviver o pesadelo. Mas o “Halloween” de 2018 é mais que uma simples continuação da história original. Mais que as mudanças trazidas pela técnica, a produção também atualiza os temas da obra. Trata-se de um legítimo slasher, com todos os prós e contras do gênero, mas também um exemplar da era #MeToo. Em cena, mulheres decididas, corajosas e influentes se destacam em oposição a homens babacas ou burros, com exceção do assassino mascarado, claro, que, apesar de demente, consegue ser o macho mais inteligente do filme, embora represente um agressor violento de mulheres por motivos óbvios. Tirando bebês (uma grata surpresa), Michael mata sem explicações tudo que encontra pela frente, embora mantenha sua preferência por mulheres, especialmente as tradicionais babás. Só que o filme não é do monstro, mas da atriz que deve sua carreira ao primeiro “Halloween”. Jamie Lee Curtis, filha dos astros Tony Curtis (“Quanto Mais Quente Melhor”) e Janet Leigh (“Psicose”), protagoniza aqui o filme de maior sucesso liderado por uma atriz de 60 anos muito bem vividos, e que merecia mais reconhecimento da Academia por “Um Peixe Chamado Wanda” (1988) e “True Lies” (1994). Sua presença em cena é tão hipnotizante que ameaça o apelo pop da imagem de Michael Myers. A estrutura do roteiro reflete tanto o “Halloween” de 1978 que deixou o esperado embate entre os dois personagens principais somente para os tensos minutos finais, exatamente como no original. A diferença é que, agora, o público anseia pelo confronto, enquanto há 40 anos ninguém tinha certeza se Laurie chegaria viva até o final. Como, desta vez, Laurie se diz pronta para a volta de Michael, o roteiro de Danny McBride (ele mesmo, o comediante de “Segurando as Pontas”) peca ao rechear o miolo do filme com personagens descartáveis que entram em cena somente para servir de guisado para o psicopata. Para provar que há um excesso de gente sem propósito, onde diabos foi parar o crush da neta de Laurie após a festa de Halloween? Não adianta dizer que a última cena entre os dois serviu apenas para isolar a menina pelas ruas como presa fácil para o monstro, porque foi criada uma expectativa e o personagem simplesmente desapareceu sem nem ao menos dar de cara com Michael Myers. Aliás, há um certo desperdício da neta (Andi Matichak) e a filha (Judy Greer) de Laurie durante toda a trama, embora elas se mostrem importantes na conclusão da história. Ao menos, as portas ficam abertas para mais uma sequência, que virá, graças ao sucesso do filme, e tem a obrigação de ser superior. Mas ficam duas certezas: não dá para fazer “Halloween” sem Jamie Lee Curtis e a volta Michael Myers embute a consequência de um revival da tendência que ele despertou há 40 anos. Hollywood já prepara a volta de Jason, de “Sexta-Feira 13”, e outros monstros da era slasher devem ressuscitar para o século 21, com a promessa de extirpar à facadas qualquer resquício de originalidade que sobreviver.

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  • Filme

    O Primeiro Homem transforma conquista da lua em drama intimista

    9 de novembro de 2018 /

    “Nós decidimos ir à Lua nesta década e fazer as outras coisas, não porque são fáceis, mas porque são difíceis”, disse o presidente americano John F. Kennedy em 1962, num discurso célebre que deu um novo gás para a corrida espacial e culminou com a pegada do astronauta Neil Armstrong no solo lunar. “O Primeiro Homem”, nova parceria do cineasta Damien Chazelle com o ator Ryan Gosling (ambos de “La La Land: Cantando Estações”), conta a história de Armstrong mostrando que as dificuldades mencionadas por Kennedy vão muito além dos problemas tecnológicos. Escrito por Josh Singer (“The Post – A Guerra Secreta”) com base no livro de James R. Hansen, o roteiro acompanha quase uma década na vida de Neil Armstrong (Gosling), um piloto de testes que, ao pilotar um X-15, teve o seu primeiro vislumbre do espaço. A tranquilidade espacial é substituída pela conturbada realidade terrestre. Após perder a filha, vítima de câncer, Neil decide voltar ao trabalho. Mas quando lhe empurram um serviço burocrático – que lhe daria tempo para pensar na sua perda –, ele enxerga a oportunidade de sair dali e ingressar no programa espacial. Assim, fica estabelecida desde o início a relação trabalho-família, algo que vai ser reforçado ao longo de toda a narrativa. Chazelle explicita isso ao demonstrar como o relacionamento de Armstrong com a sua família melhora quando seu trabalho está indo bem – e como piora quando as coisas vão mal. Além disso, o diretor investe em uma montagem paralela que mostra Neil no espaço e sua esposa, Janet (Claire Foy, de “The Crown”), na Terra, dando igual importância a estes dois eventos. A relação trabalho-família também é um fator determinante para levá-lo a aceitar a missão. Quando questionado sobre os motivos de querer ir até à Lua, Neil fala da possibilidade de poder enxergar as coisas sob outra perspectiva. Sua perspectiva, porém, tem mais a ver com a sua trajetória pessoal para lidar com o luto do que com as mudanças que tal viagem causaria no mundo. Por mais que o personagem de Buzz Aldrin (Corey Stoll, de “Homem Formiga”) ofereça uma opinião dissonante – falando sobre a corrida espacial contra a União Soviética –, fica claro que o filme se posiciona de maneira contrária à opinião pragmática de Aldrin e favorável à motivação emocional de Armstrong. Marcado por um histórico de tragédias, o protagonista parece se afastar de todos como forma de se proteger. Afinal, é na solidão que encontra a segurança para lidar com os seus problemas. Numa determinada cena, Neil vê um balanço na árvore e menciona para o colega Ed White (Jason Clarke, de “Planeta dos Macacos: O Confronto”) que a sua filha tinha um igual. Porém, antes de levar a conversa adiante e expor demais a sua intimidade ao amigo, ele se afasta, retornando à sua escuridão solitária. E Gosling, que não é um ator expressivo, representa bem essa personalidade introvertida justamente pela frieza da sua atuação. Damien Chazelle também opta por uma abordagem intimista. Apostando em planos fechados, o realizador transforma a sua câmera num personagem que acompanha os astronautas, vendo as coisas sob o mesmo ponto de vista deles – os voos são filmados todo no interior dos foguetes, e não por fora, como costumam ser filmes sobre o espaço. Mais do que isso, porém, a câmera parece sentir o que eles sentem, partilhando a tensão deles durante os voos – em muitos casos, a câmera treme tanto que não dá pra identificar o que está sendo mostrado, numa representação subjetiva da visão daquelas pessoas. E é bastante significativo que, quando finalmente chegam à Lua, a câmera seja a primeira a sair. Contando uma história que já é, ao menos em partes, conhecida pelo público, o longa é mais focado nos desafios da viagem, e não no seu destino. E foram muitos desafios. O design de som destaca o ranger dos metais das aeronaves antes da decolagem, apontando para o perigo iminente que aquela tecnologia representa. Trata-se de um perigo real, que custou a vida de alguns astronautas ao longo dessa jornada. Tal insegurança é reproduzida pelo próprio Armstrong quando conversa com a família pouco tempo antes de embarcar e fala da possibilidade de não voltar. Porém, apesar de temer a viagem, ele a aceita, uma vez que, de certa maneira, ele precisa dela. “Este é um pequeno passo para o homem, mas um gigantesco salto para a humanidade” disse Neil Armstrong ao pisar na superfície lunar pela primeira vez. O filme de Damien Chazelle, porém, faz o caminho inverso, diminuindo o salto representado pela humanidade naquele momento e aumentando a importância do passo para aquele primeiro homem.

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  • Filme,  Música

    Legalize Já acerta praticamente tudo ao contar a gênese do Planet Hemp

    27 de outubro de 2018 /

    É raro uma cinebiografia acertar a mão. Muitas tentam dar conta da vida completa do artista ou da pessoa em questão e acabam por tornar tanto a narrativa quanto o personagem rasos. Não é o caso de “Legalize Já – Amizade Nunca Morre”, dirigido por Johnny Araújo e Gustavo Bonafé, que faz um recorte destacando a amizade entre Marcelo D2 e Skunk, responsáveis pela criação de uma das bandas mais importantes do cenário brasileiro dos anos 1990, o Planet Hemp. Bastava estar vivo naquela década para lembrar o que o rolava nas rádios e nas televisões: era o boom do pagode e do axé. O surgimento das novas bandas da turma de 1994 foi crucial para dar uma oxigenada no rock daquele período, ainda que as bandas da década anterior ainda estivessem ativas e interessantes. Mas era preciso sangue novo e essa nova turma em geral soube lidar com a transgressão de maneira muito mais efetiva que a turma anterior. Colocar a legalização da maconha como principal bandeira por si só já foi um trunfo. Mas o Planet Hemp tinha também muito a oferecer no que se refere à qualidade de sua música. Uma coisa que muita gente não sabia era a importância de Skunk para a criação do conceito da banda. Marcelo não acreditava em si mesmo, embora as letras tenham partido dele desde o começo. Skunk, soropositivo, tentou lidar com a doença até onde deu. Na época, os coquetéis para combater o avanço do HIV eram muito desconfortáveis e tinham efeitos colaterais desagradáveis. “Legalize Já” ganhou o subtítulo “Amizade Nunca Morre” justamente por focar mais na amizade da dupla do que na criação musical. As linhas paralelas das vidas de Marcelo, camelô que vendia camisetas de banda de rock na rua, e Skunk, que morava com um amigo argentino dono de bar e de uma espécie de mini-estúdio caseiro, cruzam-se em um momento em que o rapa aparece para desmontar as bancas de alguns vendedores de rua. Chega a ser tocante ver a aproximação e a ótima química entre os dois, com Skunk sempre sendo o cara que motiva Marcelo a acreditar em si, em pensar grande com a ideia de montar uma das melhores bandas de rock do país. Apesar de haver aspectos dramáticos muito fortes, devido às situações nada fáceis da vida de ambos, o filme tem uma pegada leve, com cenas bem divertidas. E há também momentos musicais, que são de arrepiar. O que dizer da primeira vez em que ouvimos “Phunky Bhuda”? O que é aquele riff de guitarra, aquela energia? Vale destacar aqui as excelentes performances dos atores. Tanto Renato Góes (“Pequeno Dicionário Amoroso 2”) como Marcelo D2 quanto Ícaro Silva (“Sob Pressão”) como Skunk estão ótimos. Principalmente o segundo, que exala um carisma impressionante. E também a evolução do diretor Johnny Araújo, que filma rock desde sua estreia, “O Magnata” (2007), com roteiro de Chorão e participação do Marcelo Nova, e seguiu firme no tema com “Depois de Tudo” (2015), uma espécie de ode à canção “Soldados”, da Legião Urbana. “Legalize Já” é poesia urbana que, em vez de rimas, usa imagens.

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  • Filme,  Música

    Nasce uma Estrela é um show de talento na frente e atrás das câmeras

    17 de outubro de 2018 /

    Uma frase dita no final de “Nasce uma Estrela” pelo ator e (agora) diretor Bradley Cooper define a abordagem do filme. “Música é, essencialmente, 12 notas entre qualquer oitava. 12 notas e a oitava repete. É a mesma história sendo contada de novo e de novo. Tudo o que um artista pode oferecer ao mundo é como ele enxerga essas 12 notas.” Além de ter seu contexto na trama, é a forma como o astro justifica a repetição dos roteiros contados diversas vezes por Hollywood, incluindo seu próprio remake. A diferença estaria na interpretação de cada artista – ou cineasta. Diferentes gerações tiveram seu “Nasce uma Estrela” – este é o quarto – e, por isso, é quase um milagre que o diretor de primeira viagem não tenha oferecido o previsível mais do mesmo. Pelo contrário, conta sua versão com tanta paixão que a torna relevante para os tempos atuais, extremamente carentes de boas histórias que exalem valores básicos da humanidade, como amizade, amor, bondade, coisas que perdemos pelo caminho. E o filme de Bradley Cooper não tem medo de ser feliz ao abraçar seu romantismo exacerbado e por vezes brega. Ora, existe sentimento mais brega que o amor? Cooper não tem a mínima vergonha disso e se aproveita do momento cínico que o mundo vive para emprestar um pouco de frescor a uma fórmula tão desgastada. Entrega, assim, um filme emocionante e que vicia, porque gruda como chiclete da mesma forma que um belo refrão. Mas nada disso seria possível sem uma musa inspiradora. Neste caso, Lady Gaga, que é sim boa atriz e, mais que isso, entrega talvez a melhor performance de uma cantora famosa no cinema desde Cher em “Feitiço da Lua”, de 1987. E o melhor elogio que se pode fazer nem é esse. É que ela consegue fazer o público esquecer que está diante de Lady Gaga. Até mesmo quando sua personagem começa a ficar famosa e cantar cada vez mais. Todo mundo conhece a trama de “Nasce uma Estrela”. Músico decadente e alcoólatra (Jackson Maine) ganha uma segunda chance não na carreira, mas na vida ao abrir as portas do showbusiness para uma cantora amadora, porém promissora (Ally). Bradley Cooper optou por falar e cantar (muito bem) pra dentro, o que tem tudo a ver com Jackson Maine, personagem reprimido e autodestrutivo. Não por acaso recebeu conselhos de Eddie Vedder para cantar, embora mantenha um estilo mais Chris Cornell no quesito comportamento. Por sua vez, ele próprio se disse influenciado por Neil Young – a banda mais recente do roqueiro canadense o acompanha nas músicas. Mas é interessante como o ator engrossa a voz para revelar a surpreendente opção pela técnica: seu personagem é irmão de Sam Elliott, com seu melhor papel em anos e dono de um dos vozeirões mais imponentes e inconfundíveis de Hollywood. É visível a evolução de Cooper como ator e dá pra cravar que ele nunca esteve tão bem quanto em “Nasce uma Estrela”. Mas o que nasce de verdade aqui é um novo diretor americano talentoso, que ainda pode dar muitas alegrias para o cinema, pois mostrou dominar algo que Hollywood valoriza muito: o equilíbrio entre integridade artística e viés comercial (um recado nas entrelinhas do próprio roteiro que bate sutilmente na indústria fonográfica). Sobretudo, Cooper sabe contar uma história, mesmo que dê uma acelerada aqui e ali no processo, como um noivado que vira casamento da noite para o dia e a estreia nos palcos da personagem de Lady Gaga num piscar de olhos, que é a melhor cena do filme ao som da melhor canção feita para o cinema nos últimos anos, “Shallow”, embora tenhamos também as ótimas “Maybe It’s Time”, “I’ll Never Love Again” e “Black Eyes” – a trilha sonora está vendendo tanto quanto os ingressos de cinema. Outro momento acelerado é quando o empresário de Ally fala algumas verdades e toma uma decisão polêmica sem pensar muito ou discutir com a moça a respeito das consequências. Mas ao invés de criticar Bradley Cooper, é válida a tentativa de se colocar no lugar do artista, que costuma ser intenso e trazer tudo à flor da pele. Por exemplo, os olhares que brilham quando Jackson e Ally se encontram no início do filme. E se você prefere a primeira metade de “Nasce uma Estrela”, é porque o amor é lindo e você foi fisgado. Se a segunda metade parece mais pesada é porque a vida não é fácil e a realidade, mais cedo ou mais tarde, bate à nossa porta. Imagine, então, que essa história é sobre artistas que transparecem mil vezes mais sensibilidade em relação a um mero mortal. Até “La La Land” também se inspirou nas versões anteriores de “Nasce uma Estrela”. No filme de Bradley Cooper, essa linha tênue entre estar nas nuvens ou no inferno é refletida quando as lentes do diretor de fotografia Matthew Libatique estão seguindo Ally e Jackson, principalmente nos palcos, e se perdem entre flashes e sombras. A opção por deixar os rostos dos atores bem próximos à câmera sugere um mergulho interno, como se ela quisesse olhar dentro deles para tentar entender o que estão pensando seus personagens. Compare como o filme abre com Jackson de costas, cabisbaixo, rasgando sua guitarra, envolto pela penumbra, enquanto o final é dominado por cores fortes e Ally cantando como nunca cantou antes, até o último frame que traz Lady Gaga olhando para frente – na verdade para vocês, espectadores, que assistiram ao show. São imagens claras de transição, do ocaso de um artista ao momento em que nasce uma estrela.

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    Os Invisíveis resgata história dos judeus que sobreviveram ao nazismo em Berlim

    13 de outubro de 2018 /

    Em junho de 1943, o ministro Joseph Goebbels declarou Berlim “livre de judeus”. Mas, na verdade, cerca de 7 mil judeus permaneceram na capital alemã, na clandestinidade, a maior parte jovens. 1,7 mil deles conseguiram sobreviver até o final da guerra. Para que isso fosse possível, era preciso que muitos alemães – dezenas de milhares – ajudassem a escondê-los ou, pelo menos, deixassem de denunciá-los. O que indica que, apesar do maciço apoio ao regime nazista, havia uma oposição humanitária e corajosa, agindo silenciosamente nos subterrâneos. Esse fato histórico é explorado em “Os Invisíveis”, uma ficção não só inspirada na realidade comprovada, como mesclada ao documentário, por meio de entrevistas com os sobreviventes retratados na narrativa do filme de Claus Räfle. São eles Cioma Schönhaus (1922-2015), interpretado por Max Mauff (“Sense8”), Ruth Arndt (1922-2013), papel de Ruby O. Fee (“Os Irmãos Negros”), Hanni Lévy, nascida em 1924 e vivendo em Paris, interpretada por Alice Dwyer (“A Garota das Nove Perucas”, e Eugen Friede, nascido em 1926 e vivendo na Suíça, papel de Aaron Altaras (“Nem Todos Eram Assassinos”). Pequena parte das entrevistas feitas com esses quatro sobreviventes, que são os protagonistas da trama, aparece no filme entremeada com a evolução da narrativa ficcional. A sobrevivência de Cioma, Hanni, Ruth e Eugen é mostrada alternadamente em histórias paralelas, sem encontro entre eles. Cada um deles, todos muito jovens, se torna “invisível” de forma diferente, numa clandestinidade que aparece à luz do sol. Cioma, estudante de artes gráficas, acabou trabalhando como falsificador de passaportes e se utilizou desse mesmo recurso para se salvar, chegando à fronteira com a Suíça, onde passou a viver. Hanni, de 17 anos, após a morte dos pais encontrou refúgio ao ser acolhida por uma vendedora de ingressos de cinema em sua casa, após pintar o cabelo de loiro, o que a tornava algo invisível. Passava a maior parte do tempo na rua. Ruth vive uma odisseia de esconderijo em esconderijo, se disfarça de viúva de guerra e trabalha como empregada doméstica na casa de um oficial das forças armadas do Terceiro Reich. Eugen, de 16 anos, único na família que precisava usar a estrela amarela porque tinha mãe judia e padrasto cristão, viveu escondido e se juntou a um grupo de resistência que, por meio de panfletos, denunciava crimes nazistas. O que eles vivem, mostrado realisticamente, mas em tom poético, com suspense e até humor, traz um retrato humanista, muito colado á realidade, e esperançoso, quase otimista, apesar de toda a barbárie. A forte sustentação documental do filme se explica por anos de pesquisa, instituições alemãs que preservam a memória do período e pela longa experiência anterior do cineasta como documentarista.

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    Uma Noite de 12 Anos relembra a repressão das ditaduras militares na América Latina

    6 de outubro de 2018 /

    Nos anos 1960 e 1970, pipocaram ditaduras militares por toda a América Latina. Contavam com apoio civil relevante, internamente, e apoio decisivo internacional, em especial dos governos dos Estados Unidos, que atuavam como financiadores e capacitadores das ações de repressão. O que se viu no Brasil por longos 21 anos aconteceu no mesmo período, ainda que por menos tempo, na Argentina, no Chile e no Uruguai. Os níveis de violência, tortura e morte dos opositores variam bastante, mas os métodos se assemelham. Vivia-se o mesmo período de trevas e supressão da democracia, em todos os lugares. Assim como havia o terrorismo de Estado, também se desenvolveu a luta armada de resistência. O padrão de resposta à opressão também variou muito, mas com elementos comuns. No caso uruguaio, foram de 12 para 13 anos de ditadura, de 1972 a 1985, e a resistência armada foi protagonizada por um forte e ousado grupo de guerrilheiros urbanos, do movimento de libertação nacional conhecido como Os Tupamaros. O filme “Uma Noite de 12 Anos” trata da prisão e sequestro de três membros dos Tupamaros, que estiveram nas mãos dos militares nesse período. A saber: José Mujica, o Pepe (Antonio de la Torre, de “Os Amantes Passageiros”), que acabaria sendo eleito presidente do Uruguai em 2010, Eleuterio Fernandez Huidoro (Alfonso Tort, de “O Silêncio do Céu”), que depois foi senador e ministro, e o jornalista e escritor Maurício Rosencof (Chino Darín, também de “O Silêncio do Céu”). A prisão que eles amargaram por esses 12 anos é algo absolutamente inominável, como mostra o filme do diretor uruguaio, que vive na Espanha, Álvaro Brechner (“Sr. Kaplan”). A opressão é absoluta, desmedida. As condições de encarceramento em isolamento, desumanas e degradantes, sem nenhum respeito aos direitos humanos. Numa situação tal que é um milagre conseguir sobreviver sem enlouquecer. O filme mostra claramente esse dia a dia abominável, em que a tortura psicológica atua e complementa a tortura física, nas condições mais humilhantes que o ser humano pode conceber. Também mostra os poucos respiros que surgem na convivência humana, mesmo nessas condições. Inclui imagens de memória, sonho ou imaginação, que aliviam a carga dramática. Mas faz um retrato da desumanidade que é assustador. Como foi possível que todo aquele sofrimento pudesse gerar uma figura tão cativante quanto o presidente Pepe Mujica? É absolutamente incrível! Assistir a “Uma Noite de 12 Anos” é politicamente recomendável para entendermos a que ponto pode chegar o autoritarismo de um regime de força. Ainda que o filme seja sofrido e pesado – e não tenha uma intenção de exploração histórica do período, com referências ao que estava acontecendo tão perto, como o regime de terror de Pinochet no Chile, por exemplo. A entrega dos atores às filmagens das condições do cárcere ilegal compõe um retrato realista, que acaba tornando tudo muito claro e didático. Por se tratar de uma situação extrema, a que nenhum ser humano pode ser submetido – mas que continua acontecendo pelo mundo, em meio às guerras e perseguições de toda ordem – , resta-nos lutar pela preservação da democracia, para que, ao menos, possamos usufruir de um convívio civilizado que respeite a vida, a integridade e a dignidade das pessoas.

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    A Fábrica de Nada reflete o crescimento do desemprego na fase atual do capitalismo

    30 de setembro de 2018 /

    Condição necessária para a existência da produção e, consequentemente, do lucro no sistema capitalista, é a mão de obra geral e especializada, que vem dos trabalhadores. Mas em tempos de tecnologia avançada, robótica e que tais, o próprio trabalhador começa a ser dispensável. Máquinas podem ser eliminadas ou substituídas por equipamentos mais recentes, que chegam a tornar obsoletos a própria estrutura física das fábricas e seu maquinário tradicional. Ou esse maquinário pode ser deslocado para onde a tecnologia não se sofisticou e que mantém custos de mão de obra tão baixos que se aproximam da escravidão. Esse é o pano de fundo da história do filme português “A Fábrica de Nada”, dirigido por Pedro Pinho (“Um Fim do Mundo”) a partir de ideia original do cineasta Jorge Silva Melo (“Agosto”), com base na peça “The Nothing Factory”, da escritora holandesa Judith Herzberg. A referência teatral não impede que o realizador trabalhe o material fílmico de forma documental, inclusive dedicando a obra aos trabalhadores da Fateleva, que, entre 1975 e 2016, levaram a cabo uma experiência de autogestão na fábrica de elevadores Otis portuguesa. Experiência que, certamente, inspirou “A Fábrica de Nada”, tanto quanto a peça original holandesa. Trata-se, de qualquer modo, de uma ficção. Quando equipamentos da fábrica vão desaparecendo, ou são roubados, à noite, esvaziando as condições de trabalho e produção, seus operários decidem fazer vigílias para impedir que isso continue a acontecer. A fábrica, porém, para de produzir. Eles não têm o que fazer e agora são os seus empregos que estão em jogo. Há um plano evidente de desativar a fábrica e dispensar os trabalhadores. Eles partem para a greve, recurso histórico e legítimo dos operários. Mas greve numa fábrica que já parou? A ideia do roteiro é ótima, muito bem desenvolvida e com um elenco convincente, que nos põe no mundo dessa fábrica estranha que, no entanto, é tão representativa dos dias econômicos atuais. E, de quebra, reflexões teóricas sobre a presente etapa do capitalismo, que se caracteriza pelo desemprego, vão sendo lançadas ao longo do filme, ilustrando as encenações, ou melhor, dando a elas um caráter mais geral, extrapolando o caso concreto que está sendo mostrado. Apesar das quase três horas de projeção, o filme flui bem, cria uma situação de expectativa e de suspense que mantém o espectador interessado no que vai ocorrer em seguida.

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    Sierra Burgess É uma Loser recicla Cyrano de Bergerac para a geração Netflix

    23 de setembro de 2018 /

    Há uma razão para afirmar que “Sierra Burgess É uma Loser”, comédia teen da Netflix, nasceu velha. Não por se entregar aos clichês da comédia romântica adolescente e de escolinha, mas principalmente por confiar em conceitos que falavam com a sociedade de quase 40 anos atrás, mas que hoje soam retrógrados e, mesmo que originados de boas intenção, resultam como equivocados e até mesmo preconceituosos. O filme do estreante em longas Ian Samuels (do curta premiado em Sundance “Myrna the Monster”) colhe sua inspiração de “Cyrano de Bergerac”, peça clássica de 1897. Já vimos diversos filmes adaptados da obra de Edmond Rostand e não é a primeira vez que os figurinos de época são deixados no armário e substituídos por roupas do período em que a produção foi rodada, como “Roxanne”, de 1987, com Steve Martin e Daryl Hannah. Apesar do título, o filme de Fred Schepisi não é contado do ponto de vista da personagem título interpretada por Daryl Hannah, mas pelo Cyrano narigudo de Steve Martin que tem outro nome que ninguém lembra, embora faça referência ao protagonista da obra clássica. Só que as pessoas lembrarão do nome de Sierra Burgess (vivida por Shannon Purser, a Barb de “Stranger Things”), que não é nariguda, mas gorda. E também lembrarão dos filmes dos John Hughes. E nostalgia é uma sensação indescritível de tão boa. Só que Hughes é a cara dos anos 1980 e o mundo mudou muito nas últimas décadas, não? É preciso atualizar alguns conceitos, afinal certas soluções não podem mais funcionar em 2018. Veja “Gatinhas e Gatões” agora e tente não ficar indignado. Por sinal, a produção da Netflix traz alguns ídolos juvenis dos anos 1980, como Lea Thompson, que esteve em “De Volta para o Futuro”, e Alan Ruck, de “Curtindo a Vida Adoidado” (de John Hughes!). Na trama, Sierra é uma adolescente intelectual, que sofre bullying das meninas populares da escola, como a líder de torcida Veronica (Kristine Froseth), que apronta essa aqui: ao invés de dar o número de seu celular para o ingênuo Jamey (Noah Centineo, da série “The Fosters”), ela passa o de Sierra para humilhar ainda mais a coitada, que acaba se apaixonando pelo rapaz via mensagens de texto (!). Mas olha o dilema. Sierra se acha feia, e como Veronica deve uma a ela por causa da cachorrada, pede ajuda a inimiga, que deverá se passar por ela quando tiver de encontrar o cara ao vivo. Em troca, Sierra promete dar aulas particulares a Veronica, que pode ser popular, mas tira zero nas provas. É como Cyrano, mas invertendo os papéis do casal central para avacalhar com o sexo oposto. O roteiro de Lindsey Beer (do vindouro “Mundo em Caos”), no fundo, é uma visão artística mais team Veronica que team Sierra. Não por acaso, a amiga da protagonista possui um arco dramático muito mais completo e redentor. Além de bonita (e exemplo de beleza vendido para a sociedade), ela termina o filme bem mais inteligente e um doce de pessoa, ao contrário da monstra apresentada no início. Para piorar, “Sierra Burgess É uma Loser” realmente conclui que a protagonista é feia, embora pondere de maneira hipócrita que, mesmo assim, devemos olhar para sua inteligência acima da média e beleza interior. A personagem serve, ao menos, para pavimentar a ascensão da talentosa Shannon Purser, ainda que o filme acabe sendo dessa descoberta impressionante que rouba todas as cenas, Kristine Froseth.

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    As Herdeiras é surpresa paraguaia premiada em Berlim e Gramado

    23 de setembro de 2018 /

    Chela (Ana Brun) e Chiquita (Margarita Irún) são “As Herdeiras”. Juntas há 30 anos e já em idade avançada, dependem da venda de seus bens, herdados das famílias abastadas de ambas, para sobreviverem com dignidade. Ainda que não consigam manter o padrão sofisticado da classe alta de Assunção, elas têm uma relação homoafetiva aparentemente tranquila e as coisas caminham razoavelmente bem, apesar dos contratempos atuais. Dívidas não quitadas, porém, produzirão uma separação que dará origem a novas possibilidades e, quem sabe, desejos que se renovem. No meio disso, um modelo de transporte particular, ao estilo Uber, tem um grande peso na trama. “As Herdeiras” é audacioso na abordagem, apesar da aparência convencional e do ambiente discreto que cria. Tem uma narrativa bem construída, atrizes competentes, que dão o tom preciso às personagens e às situações. Tudo se passa em tom baixo, sem grandes sobressaltos. Mas a vida muda. E não é fácil reconhecer e aceitar isso. É um desafio que pode aparecer em qualquer momento da existência. Mesmo após um longo tempo de convívio, cuidadosamente protegido. O modesto cinema paraguaio, de poucas produções anuais e dependente do apoio de coproduções, como é o caso dessa, com Alemanha, Brasil e Uruguai, mostra aqui uma realização cinematográfica de peso, premiada em Berlim e Gramado. E que também pode ser vista como uma metáfora da elite de seu país, segundo o diretor Marcelo Martinessi.

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    A Vida em Família mostra tipos desencontrados com leveza

    23 de setembro de 2018 /

    Uma pequena comunidade no sul da Itália, em que todos se conhecem e têm laços, experiências em comum, é algo que pode ser equiparado a uma grande família. Ainda assim, chamar a comédia “La Vita in Comune” de “A Vida em Família” não corresponde ao que se vê na tela. Disperata, a comunidade, reúne muitos tipos desencontrados consigo mesmos, que não se sentem parte integrante de um contexto social harmonioso. Ao contrário, todos parecem estar fora do lugar, à procura de algo que lhes falta ou com o que se identifiquem. A estreiteza do pequeno mundo onde vivem não lhes permite grandes voos, exceto os imaginários. Um prefeito poeta, incompetente no cargo, busca se realizar por meio de discussões literárias com um pequeno grupo de presos. Mirabolante tentativa de assalto, que acaba em violência contra um cão, produz complicações inúteis e uma culpa insuperável. E assim, a comédia do diretor Edoardo Winspeare (“Sangue Vivo”) rola solta. Um roteiro muito competente, atores talentosos e com ótimo timing para o humor, uma direção que trabalha o clima provinciano da localidade com graça e sutileza, fazem de “A Vida em Família” um programa cinematográfico muito bem feito, leve e divertido.

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    Cheio de clichês, A Freira é um terror que não assusta

    15 de setembro de 2018 /

    O terror “A Freira” é o mais recente derivado da franquia “Invocação do Mal” (os outros são os filmes da “Annabelle”), mas o idealizador da franquia, James Wan, aparece aqui apenas como produtor, sem exercer muita influência na realização do longa. Wan tem um talento ímpar para o terror, investindo muito mais na tensão do que no susto (embora este sempre surja como uma forma alívio para a tensão). Mas mais do que isso, o diretor trabalha com protagonistas tridimensionais, estabelecendo uma ligação entre eles e o espectador (algo essencial para o gênero). Infelizmente, essas são qualidades que nenhum destes derivados conseguiu atingir. E “A Freira” não é diferente. Escrito por Gary Dauberman (“Annabelle 2: A Criação do Mal”), o roteiro busca explorar a origem da figura demoníaca vista pela primeira vez em Invocação do Mal 2 – há, inclusive, algumas menções a Ed e Lorraine Warren. A trama se passa em 1952 e acompanha Burke (Demián Bichir, de “Os Oito Odiados”), um padre que trabalha investigando casos sobrenaturais à mando do Vaticano, e Irene (Taissa Farmiga, de “American Horror Story”), uma jovem noviça que costuma ter visões sobrenaturais. Os dois são enviados para uma abadia localizada numa região remota da Romênia para investigar o suicídio de uma freira. Chegando lá, eles contam com a ajuda de um guia, Frenchie (Jonas Bloquet, de “Elle”), que lhes fala sobre o medo dos moradores em relação àquele lugar e sobre como parece que a abadia serve para aprisionar algum tipo de mal em seu interior. Dauberman é um roteirista bastante limitado. Quando trabalha com outras pessoas é capaz de criar personagens tridimensionais e metáforas eficientes (como aconteceu em “It: A Coisa”). Mas quando escreve sozinho apela para situações inverossímeis e escolhas duvidosas. Isso fica claro quando descobrimos que a trama aqui envolve um portal para o inferno e o sangue de Cristo (literalmente). O roteirista também sacrifica a estrutura do texto em busca de entendimento rápido e raso: é o que acontece, por exemplo, quando vemos o flashback de um exorcismo realizado pelo padre, que culminou na morte de um garoto, somente para que este mesmo garoto apareça assombrando-o na cena seguinte. Já o fato de Irene ter visões sobrenaturais pouco importa para a história, a não ser quando tais visões servem para esmiuçar alguma informação importante – numa decisão narrativa um tanto preguiçosa. Aliás, Irene é a única personagem a ganhar algum tipo de desenvolvimento. Enquanto o padre Burke é mostrado como uma espécie de Indiana Jones a serviço da igreja, e Frenchie tenta a todo custo ser um alívio cômico, a jovem noviça ao menos esboça um conflito interior a respeito da obediência cega aos dogmas da Igreja. Não que isso seja bem explorado pelo filme, mas ao menos possibilita que se crie algumas tomadas visualmente interessantes: em determinado momento, vemos um círculo de freiras rezando, todas vestidas de preto, e a noviça está localizada no centro, com suas vestes brancas simbolizando, entre outras coisas, as visões distintas daquelas mulheres em relação à fé. Porém, a inexpressividade de Taissa Farmiga a impede de expressar todos os conflitos da sua personagem, cabendo ao roteiro explicitá-los por meio de diálogos expositivos. Baseando-se em um texto tão limitado, o diretor Corin Hardy (“A Maldição da Floresta”) faz o possível para dar ao seu filme uma identidade própria. A ambientação de época é um ponto que funciona a seu favor, com a arquitetura gótica do cenário remetendo às produções do estúdio Hammer, uma grande influência. Hardy também acerta ao tornar a Freira uma presença que habita a escuridão daquele lugar; ela é mais sentida do que vista. O problema é que ele não sabe trabalhar os protagonistas, que são separados em cômodos diferentes sem qualquer motivo aparente e passam a maior parte do tempo andando em círculos, procurando por assombrações em cantos escuros apenas para descobrirem que estas não estão mais lá. A repetição das mesmas estratégias para gerar tensão acaba gerando o efeito contrário. A ideia de mostrar a ameaça se aproximando das costas do personagem sem que este a perceba é repetida à exaustão, até o ponto em que o público consiga antecipá-las. Falta a Corin Hardy a originalidade para conceber situações inovadoras ou a criatividade para manipular os clichês a seu favor. Estas são algumas das qualidades que fazem os trabalhos de James Wan se descarem dentro do gênero. A ausência destes atributos iguala “A Freira” aos demais spin-offs deste universo. Ou seja, é um terror mediano, que se encontra a anos-luz do material que o originou.

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