Isabelle Huppert presidirá júri do Festival de Cinema de Veneza
A consagrada atriz francesa liderará a equipe que decidirá os vencedores do Leão de Ouro na 81ª edição do evento
Morre Jacques Rozier, último cineasta da Nouvelle Vague
O cineasta Jacques Rozier, o último membro sobrevivente do movimento Nouvelle Vague, a “nova onda” do cinema francês dos anos 1960, faleceu na última sexta-feira (2/6) na França, sua cidade Natal, aos 96 anos. O cineasta já estava hospitalizado há um curto período e a notícia de sua morte foi confirmada por um conhecido próximo. Ele ganhou notoriedade pelos longas franceses “Maine Ocean” (1986), “Fifi Martingale” (2001) e “Adeus Philippine” (1962). Embora nunca tenha alcançado o mesmo sucesso de contemporâneos como Jean-Luc Godard (“Masculino-Feminino”), François Truffaut (“Contatos Imediatos do Terceiro Grau”), Agnès Varda (“Os Renegados”), Jacques Demy (“Pele de Asno”), Claude Chabrol (“Mulheres Diabólicas”) ou Eric Rohmer (“Conto de Verão”), seu trabalho teve um lugar importante no movimento francês, abrindo caminho para os cineastas contemporâneos. Após estudar na escola de cinema francesa IDHEC (Instituto de Altos Estudos Cinematográficos), Rozier iniciou sua carreira como assistente de TV, ao mesmo tempo em que produziu seus próprios curtas-metragens, incluindo “Rentrée des Classes” (1956) e “Blue Jeans” (1958). Com este último trabalho, ele participou do Festival de Curtas-Metragens da cidade de Tours, onde foi destacado pela crítica, ao lado de curtas de Varda e Demy. Filmes que marcaram época Seu primeiro longa-metragem, “Adeus Philippine” (1962), estreou na primeira edição da Semana Internacional da Crítica, no Festival de Cannes. Ambientado no verão de 1960, o filme gira em torno de um jovem assistente de TV prestes a partir para o serviço militar obrigatório na Argélia. Determinado a aproveitar seus últimos dias de liberdade, ele abandona o emprego e parte para a Córsega com duas amigas que conheceu recentemente em Paris. Com um elenco jovem e amador, capturado nas ruas de Paris e caracterizado por uma estética neorrealista italiana, o filme retratou de forma autêntica o espírito da juventude francesa da época. Esse aspecto conceitual foi algo que se estendeu no segundo filme de Rozier, intitulado “Du Côté d’Orouët” (1971), lançado quase dez anos depois. A trama acompanha três jovens em férias na Bretanha. Ao longo de sua carreira, Rozier dirigiu apenas cinco longas-metragens, mas também se manteve ocupado com curtas, videoclipes e séries de TV. Um de seus curtas notáveis é “Paparazzi” (1964), explorando a relação da atriz e ativista francesa Brigitte Bardot com os fotógrafos que tentavam captar imagens da mesma durante sua estadia na ilha italiana de Capri, nas filmagens do clássico “O Desprezo”. Inclusive, este foi um dos primeiros trabalhos a abordar o surgimento da cultura das celebridades e a perda de privacidade que acompanha o estrelato internacional. Entre seus outros trabalhos estão “The Castaways of Turtle Island” (1976), ambientado no trem que percorre o trajeto entre Paris e a cidade portuária de Saint-Nazaire. Anos mais tarde, o longa ganhou o Prêmio Jean Vigo de 1986. Seu último filme, “Fifi Martingale” (2001), foi estrelado por Jean Lefebvre (“Diabolique”) no papel de um diretor de teatro e escritor de sucesso que reescreve sua nova obra para escapar das garras de uma conspiração com consequências inesperadas. O fim da Nouvelle Vague A morte de Rozier marca o fim de uma era para o cinema francês, como previsto por seu amigo e defensor de longa data, Godard, que faleceu em setembro do ano passado. Citado pela mídia francesa, Godard escreveu em 2019: “Quando Agnès Varda faleceu, pensei: a verdadeira Nouvelle Vague, só restam dois de nós, eu… e Jacques Rozier, que começou um pouco antes de mim”. A Nouvelle Vague foi um momento importante para a estética do cinema francês, que teve início no final da década de 1950 na França. Mostrando uma nova maneira de pensar o audiovisual, o movimento questionava muitos elementos do cinema tradicional, tentando inovar no formato – filmando em ângulos não convencionais e com a câmera na mão – e no conteúdo das produções. Com o passar dos anos, essa atitude influenciou artistas do mundo todo.
Jean-Luc Godard, ícone da nouvelle vague, morre aos 91 anos
O cineasta Jean-Luc Godard, maior nome da nouvelle vague e lenda do cinema francês, morreu nessa terça (13/9) aos 91 anos por suicídio assistido. Dono de uma carreira longeva e repleta de experimentações, Godard dirigiu mais de 130 obras, incluindo longas-metragens, curtas, séries de TV e documentários. Seus títulos mais conhecidos são também aqueles que ajudaram a revolucionar o cinema francês, como “Acossado” (1960), “Viver a Vida” (1962) e “O Demônio das Onze Horas” (1965). Nascido em Paris em 1930, Godard era filho de pais protestantes que viviam entre a França e a Suíça. Após terminar o ensino médio, ele se matriculou na universidade Sorbonne, em Paris, mas logo abandonou as aulas para frequentar os cinemas e cineclubes – onde encontrou outros colegas cinéfilos, como François Truffaut e Jacques Rivette. Os três, junto com Claude Chabrol e Maurice Scherer (mais conhecido como Eric Rohmer) começaram a escrever críticas e, em 1952, Godard publicou os seus primeiros artigos na revista Cahiers du Cinéma, fundada no ano anterior. Godard acabou expulso da revista depois de roubar o dinheiro do caixa e fugir para a Suíça, onde com a verba dirigiu o curta-documentário “Operação Beton” (1955). O roubo, de todo modo, não foi um caso isolado. Godard era conhecido por ser cleptomaníaco. Ele voltou para Paris em 1956, depois de trabalhar na TV suíça e passar um tempo em um hospital psiquiátrico. Ele começou a trabalhar como publicitário, escrevendo materiais promocionais para o estúdio 20th Century Fox, e conseguiu até voltar a escrever para a Cahiers du Cinéma. Neste período, dirigiu três curtas: “Charlotte e Seu Namorado” (1958), “Todos os rapazes se chamam Patrick” (1959) e “Uma História d’Água” (1961), co-dirigido com Truffaut. Com esta experiência, ele decidiu dirigir seu primeiro longa-metragem, que se tornou responsável por catapultar a sua carreira e por chamar atenção para um novo estilo de filmar, que foi batizado como “nouvelle vague” – ou, a nova onda do cinema francês. “Acossado” (1960) contava a história de um ladrão de carros (Jean-Paul Belmondo, que havia trabalhado com Godard no curta “Charlotte e Seu Namorado”) que usa seu charme para seduzir Jean Seberg embora fosse procurado por ter matado um policial. O filme é uma homenagem ao cinema clássico hollywoodiano, ao mesmo tempo que traz personagens sexualmente liberados e propõe a desconstrução da narrativa convencional, colocando câmeras onde escolas de cinema diziam para nunca colocar e fazendo uma edição de cenas que os mestres considerariam errada. Só que essa era a ideia da nova onda. Godard também empregou um estilo de montagem muito mais ágil, fazendo diferentes experimentos com imagens e sons dessincronizados, e chamando a atenção para a artificialidade do cinema – o oposto do que o naturalismo da montagem clássica pretendia. A novidade jogou os manuais de cinema no lixo. Mas foi um sucesso. “Acossado” venceu o Urso de Prata no Festival de Berlim e deu origem aos filmes totalmente autorais. Depois disso, Godard começou a fazer um filme atrás do outro, sempre empregando doses de experimentalismo visual. Seus melhores trabalhos na década de 1960 foram: “Uma Mulher É Uma Mulher” (1961), “Viver a Vida” (1962), “Alphaville” (1965) e “O Demônio das Onze Horas” (1965), clássicos existencialistas. Mas paralelamente também desenvolveu uma fase maoísta, mais evidente em “A Chinesa” (1967), que se acirrou após os protestos estudantis de maio de 1968 e o viu perder adeptos. Ironicamente, também foi a fase em que filmou o documentário “Sympathy for the Devil” (One + One, 1968) com os Rolling Stones. Muitos destes primeiros filmes foram estrelados pela atriz e modelo dinamarquesa Anna Karina, que se casou com o diretor em 1961. Os dois tiveram um relacionamento tumultuado, que acabou em 1965. Godard chegou a adaptar esse relacionamento para o cinema no filme “O Desprezo” (1963), em que escalou ninguém menos que Brigitte Bardot como a versão ficcional de Karina. Em 1967, Godard se casou com a atriz Anne Wiazemsky, que também começou a atuar nos seus filmes. Este casamento durou até 1979. Na década de 1970, ele se juntou a um grupo de ativistas e cineastas de esquerda para formar o “Grupo Dziga Vertov”, nomeado em homenagem ao famoso cineasta russo. O grupo comandou diversos filmes, como “Tudo Vai Bem” (1972) e “Letter to Jane: An Investigation About a Still” (1972), ambos estrelado por Jane Fonda. Em 1977, Godard voltou para a Suíça e passou a morar com a cineasta Anne-Marie Miéville. Foi o relacionamento mais duradouro da vida do diretor, que persistiu até o final da sua vida. Abrindo uma nova fase, ele dirigiu em 1980 “Salve-se Quem Puder (A Vida)”, uma obra que se propôs a examinar os relacionamentos sexuais acompanhando três protagonistas que interagem entre si. O filme foi exibido no Festival de Cannes e saudado como o grande retorno do cineasta. Foi também um enorme sucesso de bilheteria no país. “Salve-se Quem Puder (A Vida)” deu um novo fôlego para a carreira de Godard, que passou a realizar vários filmes consagrados, como “Paixão” (1982), “Detetive” (1985) e principalmente “Eu Vos Saúdo Maria” (1985), que teve grande repercussão pelo tema: uma estudante universitária, que fica grávida sem ter relações sexuais. Considerado uma blasfêmia, foi proibido em vários países, inclusive no Brasil. A polêmica voltou a sacudir a carreira do infant terrible, que a partir daí radicalizou de vez. Seu filme “Rei Lear” (1987), estrelado por nomes como Woody Allen, Leos Carax, Julie Delpy e Burgess Meredith, dividiu a crítica. O Washington Post afirmou que se tratava de um “total desrespeito de Godard a uma apresentação sustentada e coerente das suas ideias”, enquanto o Los Angeles Times afirmou que se tratava de “obra de um gênio certificado.” Na década de 1990, Godard comandou filmes como “Nouvelle Vague” (1990), estrelado por Alain Delon, “Infelizmente Para Mim” (1993), com Gerard Depardieu, e “Para Sempre Mozart” (1996). Porém, o grande destaque desse período foi a série documental “Histoire(s) du cinéma”, iniciada em 1989 e finalizada em 1999. Com um total de 266 minutos e exibida pela emissora francesa Canal Plus, a série consistiu de entrevistas, cenas de filmes clássicos e imagens de arquivo para narrar um século da História do Cinema. Numa entrevista ao jornal francês Libération, publicada anos após o lançamento, Godard descreveu o projeto como “um pouco como meu álbum de fotos de família – mas também o de muitos outros, de todas as gerações que acreditaram no amanhecer. Só o cinema poderia reunir o ‘eu’ e o ‘nós’”. Com a chegada do novo século, Godard voltou a inovar em obras como “Filme Socialismo” (2010), “3x3D” (2013) e “Adeus à Linguagem” (2014), filmes que, como o último título sugere, rompiam de vez com a linguagem tradicional cinematográfica – algo que Godard já vinha fazendo, pouco a pouco, desde o início da sua carreira. Radicais, mantiveram a divisão crítica entre os que consideraram as obras geniais e os que não viram mais cinema nas realizações do cineasta, apenas instalações de arte. Seus últimos créditos como diretor foram o documentário “Imagem e Palavra”, basicamente uma colagem de imagens de arquivo e gravações aleatórias, e o curta “Spot of the 22nd Ji.hlava IDFF”, ambos de 2018. Nos seus últimos anos, Godard se tornou completamente recluso. Ele se recusava a dar entrevistas, não aceitava prêmios e não viajava para os festivais. Quando lhe foi oferecida a Ordem Nacional do Mérito da França, ele recusou, dizendo: “Não gosto de receber ordens e não tenho méritos”. E quando foi premiado com um Oscar honorário em 2010, ele se recusou a viajar para Los Angeles para aceitá-lo pessoalmente. Anne-Marie Miéville disse na época que Godard “não irá para a América, ele está ficando velho demais para esse tipo de coisa. Você faria todo esse caminho apenas por um pedaço de metal?” Ao longo da carreira, Godard colecionou mais de 50 “pedaços de metal”, incluindo prêmios nos principais festivais de cinema do mundo, como o Urso de Ouro no Festival de Berlim (que ele venceu por “Eu Vos Saúdo Maria”), no Festival de Cannes (por “Imagem e Palavra” e “Adeus à Linguagem”), entre muitos outros. Ao saber da morte do cineasta, o ex-ministro da Cultura da França, Jack Lang, disse à rádio France Info que Godard era “único, absolutamente único… Ele não era apenas cinema, era filosofia, poesia”. O presidente francês Emmanuel Macron também prestou a sua homenagem, chamando-o de “iconoclasta”. “Inventou uma arte decididamente moderna, intensamente livre. Nós perdemos um tesouro nacional, um olhar de gênio”, definiu o governante. Ce fut comme une apparition dans le cinéma français. Puis il en devint un maître. Jean-Luc Godard, le plus iconoclaste des cinéastes de la Nouvelle Vague, avait inventé un art résolument moderne, intensément libre. Nous perdons un trésor national, un regard de génie. pic.twitter.com/bQneeqp8on — Emmanuel Macron (@EmmanuelMacron) September 13, 2022
Jean-Louis Trintignant (1930–2022)
O ator Jean-Louis Trintignant, um dos maiores intérpretes do cinema francês, morreu nesta sexta-feira (17/6) aos 91 anos. Ele tinha câncer e sua mulher, Mariane Hoepfner Trintignant, informou que ele morreu “pacificamente, de velhice, esta manhã em casa no Gard, cercado por seus entes queridos”, de acordo com o jornal Le Monde. Ao longo de quase 70 anos de carreira e mais de 130 filmes – sem contar dezenas de peças de teatro – , ele foi dirigido pelos principais mestres do cinema europeu, demonstrando enorme versatilidade ao encarar de dramas artísticos da nouvelle vague a comédias comerciais, épicos históricos e até western spaghetti. Originalmente, Trintignant queria ser diretor. Mas para pagar o curso na escola de cinema IDHEC em Paris começou a assumir pequenos papéis na tela. Até que chamou atenção em 1956 como um dos três homens envolvidos com Brigitte Bardot no famoso filme “E Deus Criou a Mulher” (1956), de Roger Vadim. O cineasta ficou com ele mente, mesmo que Trintignant ainda não levasse a carreira de ator à sério, especialmente pelas condições da época – após filmar o clássico de Vadim, ele foi convocado pelo serviço militar e levado a lutar na Guerra da Argélia. Após três anos, Vadim o reencontrou para integrar o elenco de sua adaptação de 1959 de “Ligações Perigosas”, de Choderlos de Laclos – lançada no Brasil como “Ligações Amorosas” – , onde contracenou com Jeanne Moreau e Boris Vian. E a partir daí Trintignant não parou mais. No mesmo ano, fez seu primeiro papel de protagonista naquele que também foi seu primeiro trabalho estrangeiro: o drama de guerra “Verão Violento”, filmado na Itália por Valerio Zurlini. E em seguida foi integrar o elenco internacional de seu primeiro épico, um filme de Napoleão com o especialista Abel Gance, “Com Sangue se Escreve a História” (Austerliz, 1960), ao lado de estrelas de Hollywood (Jack Palance, Orson Welles, Leslie Caron), da Cinecittà (Claudia Cardinale, Vittorio de Sica) e compatriotas (Jean Marais, Pierre Mondy, Martine Carol). O sucesso dos dois longas o tornou requisitado tanto na França quanto na Itália, fazendo sua filmografia inflar. Nos cinco anos seguintes, fez nada menos que 20 filmes, incluindo “Paixões e Duelo” (1962), de Alain Cavallier, como um terrorista casado com Romy Schneider, e duas comédias muito populares com Vittorio Gassman: “Aquele Que Sabe Viver” (1962), de Dino Risi, e “Minha Esposa é um Sucesso” (1963), de Mauro Morassi. Também estrelou coproduções entre França e Itália, como “Castelos na Suécia” (1963), dirigido por Roger Vadim e coestrelado por Monica Vitti, e a aventura romântica “Maravilhosa Angélica” (1964), de Bernard Borderie. Trintignant ainda estrelou o primeiro de seus filmes com Costa Gavras, “Crime no Carro Dormitório” (1965), antes de embarcar no papel que o projetou como nenhum outro, “Um Homem, uma Mulher” (1966), de Claude Lelouch. Considerado um dos filmes românticos mais famosos de todos os tempos, a história de amor vivida pelo ator e Anouk Aimée venceu a Palma de Ouro do Festival de Cannes e dois Oscars – Melhor Filme em Língua Estrangeira e Melhor Roteiro. O filme foi tão marcante que resultou num reencontro entre o casal e o diretor na continuação “Um Homem, uma Mulher: 20 Anos Depois”, lançada em 1986. Seu alcance mundial também transformou Trintignant num dos maiores astros do cinema francês. Por isso, mesmo aumentando a pilha de projetos, ele passou a aparecer em filmes cada vez mais importantes. A lista é enorme, destacando o drama de guerra “Paris Está em Chamas?” (1966), de René Clement, que disputou dois Oscars, o célebre filme lésbico “As Corças” (1968), de Claude Chabrol, premiado no Festival de Berlim, o politizado “Z” (1969), de Costa Gavras, vencedor do Oscar de Melhor Filme em Língua Estrangeira, o romântico “Minha Noite com Ela” (1969), de Éric Rohmer, indicado ao Oscar de Melhor Roteiro, o icônico “O Conformista” (1970), de Bernardo Bertolucci, também indicado ao Oscar e responsável por um dos melhores desempenhos de Trintignant, entre muitos, muitos outros. Com tantos trabalhos marcantes, o próprio ator começou a receber prêmios, a partir de “O Homem que Mente” (1968), de Alain Robbe-Grillet, que lhe rendeu o Urso de Prata no Festival de Berlim. No ano seguinte, foi a vez do Festival de Cannes saudá-lo por “Z”. Mas o César, considerado o Oscar francês, só passou a considerá-lo numa fase mais madura de sua carreira. Na década de 1970, embarcou em novos projetos artísticos do diretor Robbe-Grillet (os cultuados “Deslizamentos Progressivos do Prazer” e “O Jogo com o Fogo”), retomou sua química com Romy Schneider em outros romances (“O Último Trem”, “Escalada ao Poder”), fez mais uma colaboração sensacional com o diretor Valerio Zurlini (“O Deserto dos Tártaros”) e até estreou em Hollywood, contracenando com Burt Reynolds e a conterrânea Catherine Deneuve em “Crime e Paixão” (1975), de Robert Aldrich. Depois de consagrado e rico, o grande astro ficou ainda mais exigente, o que compactuou com sua longevidade artística. Escolhendo a dedo seus projetos, ele só não viveu um renascimento nas décadas seguintes porque sua carreira nunca decaiu. Vieram três parcerias consecutivas com Ettore Scola: “O Terraço” (1980), premiado no Festival de Cannes, “Paixão de Amor” (1981) e “Casanova e a Revolução” (1982), vencedores de vários prêmios David di Donatello (o Oscar italiano). Veio seu melhor filme americano: “Sob Fogo Cerrado” (1983), de Roger Spottiswoode, indicado ao Oscar e vencedor da categoria de Melhor Filme Estrangeiro no David di Donatello. Veio a protelada colaboração com o mestre François Truffaut: “De Repente num Domingo” (1983), indicado ao César e ao BAFTA (o Oscar britânico). E, principalmente, veio a primeira indicação ao César de Trintignant, como Ator Coadjuvante em “A Mulher de Minha Vida” (1986), de Régis Wargnier. Mas ele ainda estava só começando. Com mais de 60 anos, passou a acumular indicações ao César como Melhor Ator: por “A Fraternidade é Vermelha” (1994), de Krzysztof Kieslowski, “Fiesta” (1995), de Pierre Boutron, e “Os que Me Amam Tomarão o Trem” (1998), de Patrice Chéreau. Mostrando-se disposto a se revigorar, passou a trabalhar com uma nova geração de cineastas de visões originais, com destaque para Enki Bilal, um artista de quadrinhos transformado em diretor de ficção científica, com quem filmou três filmes: “Bunker Palace Hotel” (1989), “Tykho Moon” (1996) e “Immortal” (2004). Também fez dobradinha com Jacques Audiard (“O Declínio dos Homens” e “Um Herói Muito Discreto”) e participou de uma das melhores fantasias de Marc Caro e Jean-Pierre Jeunet, dublando um cérebro falante em “Ladrão de Sonhos” (1995). Essa dedicação ao cinema foi recompensada com outro papel importante no fôlego final de sua carreira. Trintignant viveu o marido octogenário e solitário, que opta pela morte misericordiosa de sua esposa (Emmanuelle Riva), após ela sofrer derrame em “Amor” (2012). O filme do austríaco Michael Haneke venceu a Palma de Ouro e o Oscar de Melhor Filme em Língua Estrangeira. E rendeu ao astro veterano o César de Melhor Ator, que tantas vezes escapou de seu alcance. Sobre o filme, o ator disse ao Le Journal du Dimanche: “O personagem me emocionou enormemente. Como ele, estou no fim da minha vida. E como ele, penso muito em suicídio. Qualquer que seja o papel que Haneke queira me escalar a seguir, eu vou aceitar.” De fato, ele voltou a atuar para Haneke em “Happy End” (2014), antes de se despedir das telas com um último drama. O ator foi casado com a atriz Stéphane Audran, que o trocou pelo diretor Claude Chabrol – e depois os três filmaram juntos “A Corsas”. Sua segunda esposa, Nadine Marquand, também foi atriz, roteirista e diretora – e dirigiu o marido em alguns filmes. Eles tiveram três filhos: o diretor Vincent Trintignant, Pauline (que morreu no berço em 1969) e Marie Trintignant, que se tornou uma atriz de sucesso, antes de ser assassinada pelo namorado em 2003, aos 41 anos. Em 2018, Trintignant anunciou que tinha sido diagnosticado com câncer de próstata e não procuraria tratamento. Seu velho amigo, Claude Lelouch, o procurou na ocasião para fazer um filme-homenagem, “Os Melhores Anos de Uma Vida”, título perfeito para o reencontro final de um homem, uma mulher e um diretor. Em sua despedida das telas, Trintignant voltou a contracenar com Ainouk Aimée como um idoso tentando lembrar o grande amor de sua vida, com direito a flashbacks de cenas em que todos eram jovens encantados. “Envelhecer é apenas uma série de problemas”, disse ele em entrevista recente. “Mas, no final, foi bom eu ter permanecido vivo por tanto tempo. Eu pude conhecer muitas pessoas interessantes.”
Michel Bouquet (1925–2022)
O renomado ator Michel Bouquet, estrela de primeira grandeza do cinema e do teatro francês, com mais de 100 filmes no currículo, faleceu na quarta-feira (13/4) em um hospital de Paris, aos 96 anos. A causa da morte não foi revelada. Com status de gigante das artes, sua morte foi lamentada pelo presidente da França Emmanuel Macron. “Durante sete décadas, Michel Bouquet levou o teatro e o cinema ao mais alto grau de incandescência e verdade, mostrando o homem em todas as suas contradições, com uma intensidade que queimou os palcos e arrebentou a tela”, disse o líder francês em comunicado. A longa carreira começou em 1947, empregado como figurante em seus primeiros filmes. Mas em apenas dois anos ele se tornou coadjuvante importante, aparecendo em clássicos como “Anjo Perverso”, do mestre Henri-Georges Clouzot, e “Mulher Cobiçada”, de Jean Grémillon, ambos de 1949. Com uma filmografia repleta de títulos icônicos do cinema francês, Bouquet passou a ter presença constante na tela durante a era da nouvelle vague, trabalhando com François Truffaut em “A Noiva Estava de Preto” (1968) e “A Sereia do Mississipi” (1969), e iniciando uma longa parceria com Claude Chabrol, que começou em “O Tigre se Perfuma com Dinamite” (1965) e se estendeu por décadas, com “O Espião de Corinto” (1967), “A Mulher Infiel” (1969), “Trágica Separação” (1970), “Ao Anoitecer” (1971) e “Um Tira Amargo” (1985). Também trabalhou com Jean Delannoy em “As Amizades Particulares” (1964), com Jacques Deray no sucesso “Borsalino” (1970), que juntou pela primeira vez os astros Jean-Paul Belmondo e Alain Delon, e em dose dupla com André Cayatte, nos thrillers políticos “Não Há Fumaça sem Fogo” (1973) e “A Razão de Estado” (1978). Uma de suas interpretações mais famosas foi o papel do inspetor Javert na melhor versão de “Os Miseráveis”, dirigida por Robert Hossein em 1982. Outra produção marcante de sua trajetória, “Todas as Manhãs do Mundo” (1991), de Alain Corneau, venceu o César (o Oscar francês) de Melhor Filme. Ele próprio venceu o César de Melhor Ator em duas oportunidades: por “Como Matei Meu Pai” (2001), de Anne Fontaine; e “O Último Mitterrand” (2005), de Robert Guédiguian. Além disso, ainda concorreu ao prêmio em 2014 pela atuação como o pintor impressionista do título de “Renoir” (2013), de Gilles Bourdos. Bouquet também recebeu o troféu de Melhor Ator Europeu, concedido pela Academia Europeia de Cinema por “Um Homem com Duas Vidas” (1991), do belga Jaco Van Dormael – produção que ainda levou o César de Melhor Filme Estrangeiro. O reconhecimento de seu talento se estendeu aos palcos, com a conquista de dois prêmios Molière, maior honra do teatro francês, pelo trabalho em “Les Côtelettes”, de Bertrand Blier, em 1998, e por “Exit the King”, de Eugène Ionesco, em 2005. Ele ainda recebeu um troféu pelo conjunto de sua obra em 2014. Ele foi casado com a atriz Ariane Borg (“A Valsa da Neve”), entre 1954 e 1981, e desde o ano seguinte com a também atriz Juliette Carré (“Rebecca”), com quem viveu até a morte.
Colo Tavernier O’Hagan (1945 – 2020)
A roteirista inglesa Colo Tavernier O’Hagan, que assinou vários clássicos do cinema francês, morreu de câncer na sexta (13/6), aos 75 anos, segundo comunicado do Instituto Lumière, presidido por seu ex-marido. Ao longo de sua carreira prolífica, abrangendo cinema e TV, Tavernier O’Hagan foi a grande parceira do ex-marido, o cineasta Bertrand Tavernier, em muitos de seus filmes de maior sucesso. Nascida Claudine O’Hagan na Inglaterra, com pai irlandês e mãe franco-espanhola, ela se mudou para Paris ainda jovem e rapidamente se apaixonou e casou com Tavernier. O relacionamento durou de 1965 a 1980. E a separação, ironicamente, marcou o começo da parceria profissional do casal. O primeiro roteiro de Colo dirigido por Bertrand Tavernier foi o filme “Um Olhar para a Vida” (1980), sétimo longa da carreira do diretor, que competiu no Festival de Cannes. Mas foi o filme seguinte, “Um Sonho de Domingo” (1984), que estabeleceu sua reputação, rendendo-lhe o prêmio César de Melhor Roteiro Adaptado. Baseado no romance homônimo de Pierre Bost, o filme girava em torno de um pintor idoso, sempre visitado aos fins de semana pelo filho, que se surpreende com a visita inesperada da filha solteira (Sabine Azéma, vencedora do César pelo papel), raramente interessada na família. A obra virou um marco do novo cinema francês após a nouvelle vague e também rendeu o prêmio de Melhor Direção a Bertrand Tavernier no Festival de Cannes. Ela também colaborou com o roteiro do jazzístico “Por Volta da Meia-Noite” (1986), estrelado pelo saxofonista Dexter Gordon, e assinou o épico medieval “Béatrice” (1987) e o drama “O Regresso” (1990), que estão entre os grandes sucesso do ex-marido, além de “A Isca” (1995), que rendeu a Bertrand Tavernier o Urso de Ouro no Festival de Berlim. Sua carreira ainda inclui uma grande parceria com Claude Chabrol: “Um Assunto de Mulheres” (1988), estrelado por Isabelle Huppert, que foi premiado pela crítica no Festival de Veneza e indicado ao Globo de Ouro. Entre seus roteiros mais recentes destacam-se “Geliebte Clara” (2008), da alemã Helma Sanders-Brahms, sobre o romance dos compositores Clara e Robert Schumann no século 19, e o drama “Paris a Branca” (2017), da argelina Lidia Terki. “A vida nos separou, mas sinto um vácuo e uma sensação de vazio”, disse Bertrand Tavernier em comunicado sobre a morte da ex-esposa. “Colo me formou, me sacudiu e me fez crescer”. “Colo sabia como desenterrar os sentimentos mais agudos e as emoções mais profundas, como pequenas coisas (‘aquelas coisas’ como aquela famosa canção de jazz) que faz a vida valer uma pena”, acrescentou. O casal teve dois filhos, que cresceram para se tornar, curiosamente, uma roteirista (Tiffany Tavernier) e um diretor de cinema (Nils Tavernier).
Monique Mercure (1930 – 2020)
A atriz canadense Monique Mercure morreu no domingo (17/5), aos 89 anos, após batalha contra o câncer. Com uma carreira de seis décadas, ela trabalhou com diretores consagrados, como o francês Claude Chabrol (“Domínio Cruel”, de 1994), o canadense David Cronenberg (“Mistérios e Paixões”, de 1991) e até o americano Robert Altman (“Quinteto”, de 1979). Nascida em 14 de novembro de 1930 como Marie Lise Monique Emond, em Montreal, ela estudou música e casou-se com o compositor Pierre Mercure com apenas 19 anos, em 1949. O casal teve três filhos antes de se separar em 1958. A carreira como atriz só começou depois da separação. Ela estudou no Actor’s Studio, em Nova York, e passou a atuar no cinema canadense a partir de “Quem Ama, Perdoa” (1963), de Claude Jutra, com quem firmou uma duradoura parceria – incluindo papéis em “Meu Tio Antoine” (1971) e “Pour le Meilleur et pour le Pire” (1975). A consagração veio em “J.A. Martin Fotógrafo” (1977), de Jean Beaudin, que lhe rendeu o prêmio de Melhor Atriz no Festival de Cannes, e o Genie da categoria na premiação da Academia Canadense de Cinema. No filme, ela interpreta Rose-Aimée, esposa do famoso fotógrafo J.A. Martin, que decide acompanhá-lo em sua turnê pelo duro interior canadense na virada do século passado, esperando reviver o casamento deles. A projeção lhe rendeu seu primeiro papel hollywoodiano, na sci-fi pós-apocalíptica “Quinteto” (1979), de Altman, em que contracenou com um elenco internacional formado pelos lendários Paul Newman, Vittorio Gassman, Fernando Rey e Bibi Andersson. Ela também participou de “Domínio Cruel”, que Chabrol rodou no Canadá em 1984, ao lado de Jodie Foster e Sam Neill, e se destacou em “Mistérios e Paixões” (1991), do compatriota David Cronenberg, que lhe rendeu seu segundo Genie (O Oscar canadense), desta vez como Atriz Coadjuvante. Mercure ainda venceu um terceiro Genie como coadjuvante por “Conquest” (1998), de Piers Haggard, sobre uma comunidade rural repleta de idosos. Mas, depois disso, foram poucos destaques, incluindo “O Violino Vermelho”, de François Girard, lançado no mesmo ano, e seu último filme, “C’est le Coeur qui Meurt en Dernier” (2017), de Alexis Durand-Brault, indicado a seis prêmios da Academia Canadense. Foram mais de 30 filmes em francês e inglês, o que lhe rendeu uma homenagem final do primeiro-ministro Justin Trudeau no Twitter. “Perdemos uma grande atriz canadense. Monique Mercure teve um impacto profundo em muitas gerações. Ela ajudou a promover o cinema do Quebec além das nossas fronteiras, e seu legado segue vivo através do seu trabalho”, escreveu o líder político do Canadá.
Marie Laforêt (1939 – 2019)
A cantora e atriz francesa Marie Laforêt morreu neste domingo (3/11) em Genolier, na Suíça, aos 80 anos de idade. O assessor da cineasta Lisa Azuelos (“Rindo à Toa”), filha de Laforêt, confirmou a morte à imprensa sem revelar as causas. Sua carreira começou acidentalmente em 1959, quando ela substituiu a irmã no último minuto em um concurso de talentos numa rádio francesa e venceu. Com isso, chegou a ser convidada pelo diretor Louis Malle a participar de um filme, mas o projeto não foi adiante. Assim, acabou fazendo sua estreia no clássico de René Clément “O Sol por Testemunha”, adaptação do famoso livro de suspense “O Talentoso Ripley”, de Patricia Highsmith, com Alan Delon no papel principal. Em seu segundo filme, a comédia “Saint Tropez Blues” (1961), Laforêt cantou a música-título e decidiu seguir cantando fora das telas. Lançou seu primeiro single em 1963, “Les Yendanges de L’amour”, que foi um estouro comercial e lhe rendeu ainda mais popularidade. Ela assinou com a gravadora CBS e se tornou uma estrela da música francesa. Mas não abandonou o cinema. Continuou a fazer filmes impactantes, como “Leviathan” (1962), ao lado de Louis Jordan, e “Mulheres no Front” (1965), com Anna Karina, até pender para aventuras e comédias ligeiras, como “A Espiã de Olhos de Ouro Contra Dr. K” (1965), de Claude Chabrol, vindo a formar uma parceria popular com o astro Jean-Paul Belmondo – em “A Caça ao Homem” (1964), “Tira ou Ladrão” (1979), “Les Morfalous” (1984) e “Feliz Páscoa” (1984). Sua filmografia ainda inclui o clássico infantil “O Reino Encantado de Polegarzinho” (1972), o papel principal no célebre drama musical “Tangos – O Exílio de Gardel” (1985), que foi premiado no Festival de Veneza, e participação na sci-fi “Tykho Moon – Segredos da Eternidade” (1996), do artista de quadrinhos Enki Bilal. Mas os filmes foram diminuindo e Laforêt também passou progressivamente a perder o interesse na indústria fonográfica, graças às pressões da gravadora para se repetir. Acabou mudando-se para Genebra, na Suíça, em 1978, onde abriu uma galeria de arte e se focou na carreira de atriz, com ênfase em apresentações teatrais, elogiadas pela crítica. Em setembro de 2005, ela decidiu voltar a cantar e fez sua última turnê pela França, com todos os shows esgotados. Confira abaixo cinco clipes da carreira musical de Marie Laforêt.
Charles Aznavour (1924–2018)
Morreu Charles Aznavour, o último dos grandes nomes da canção francesa do século 20. O cantor e compositor faleceu na madrugada desta segunda-feira (1/10), aos 94 anos em sua casa em Apilles, no sul da França. Filho de imigrantes armênios, seu verdadeiro nome era Shahnour Varinag Aznavourian. Mas também era chamado de o Frank Sinatra da França. A carreira deslanchou após a 2ª Guerra Mundial, quando Edith Piaf foi conferir seus shows de cabaré. Encantada, ela o consagrou ao convidá-lo para abrir o seu show no famoso Moulin Rouge e o levou em uma turnê pelos Estados Unidos e Canadá. Assim, Aznavour passou a compor alguns dos sucessos mais populares da cantora, tornando-se também conhecido por conta de seu talento. A carreira durou oito décadas, vendeu mais de 100 milhões de discos e rendeu canções mundialmente conhecidas como “La Bohème”, “La Mamma” e “Emmenez-moi”. Além de sucessos próprios, ele também compôs para artistas como Maurice Chevalier e Charles Trenet. Aznavour também teve uma carreira paralela muito bem-sucedida como ator, que a maioria dos talentos de Hollywood não consegue igualar. Foram cerca de 80 filmes, a princípio em pequenas participações vivendo a si mesmo, como em “Até Logo, Querida!” (1946). Mas a atuação se tornou uma atividade séria a partir de “Os Libertinos” (1959), de Jean-Pierre Mocky. O cantor logo virou protagonista de clássicos franceses, como “A Passagem do Reno (1960), do mestre André Cayatte, e o famoso nouvelle-noir “Atirem no Pianista” (1960), dirigido simplesmente por François Truffaut. Estes filmes o lançaram de vez como astro de cinema, levando-o a multiplicar sua presença nas telas, a ponto de fazer três filmes por ano na década de 1960. A safra incluiu “As Virgens” (1963), de Mocky, “Breve Encontro em Paris” (1966), de Pierre Granier-Deferre, e seu primeiro filme falado em inglês, o psicodélico “Candy” (1968), de Christian Marquand. A estreia em Hollywood propriamente dita veio logo em seguida, como par romântico de Candice Bergen em “O Mundo dos Aventureiros” (1970), de Lewis Gilbert. Ele também se aventurou pelo cinema inglês, com “Os Jogos” (1970), de Michael Winner, pelo cinema policial italiano, estrelando “Tempo de Lobos” (1970) e “O Belo Monstro” (1971), ambos dirigidos por Sergio Gobbi, e até pelo suspense alemão em “O Último dos Dez” (1974), uma adaptação de “E Não Sobrou Nenhum” (mais conhecido como “O Caso dos Dez Negrinhos”), de Agatha Chistie. Tornou-se um astro de cinema internacional. E embora fizesse filmes dispensáveis em Hollywood, como o thriller “Fortaleza Proibida” (1976), acabou aparecendo em clássicos que marcaram época, como “O Tambor” (1979), do alemão Volker Schlöndorff, “Os Fantasmas do Chapeleiro” (1982), do conterrâneo Claude Chabrol, e “Viva la Vie (1984), do também francês Claude Lelouch. A partir dos anos 1990, passou a fazer mais séries e telefilmes, diminuindo sua presença no cinema. Mesmo assim, estrelou algumas produções recentes, como “Ararat” (2002), do egípcio Atom Egoyan, sobre um tema que lhe interessava em particular, o genocídio armênio. Também contracenou com Henry Cavill (o Superman) em “Laguna” (2001). E estava finalizando um último longa, “Une Revanche à Prendre”, do francês Kader Ayd, com quem tinha trabalhado em 2005 em “Ennemis Publics”. Mesmo quando não era visto, Aznavour também era lembrado pelo cinema em suas trilhas sonoras. Ele é o compositor, por exemplo, de “She”, a canção tema do filme “Um Lugar Chamado Notting Hill”, estrelado por Julia Roberts. Lançada em 1974, a música liderou as paradas britânicas por 14 semanas e ficou entre as mais tocadas em diversos países. E voltou a demonstrar sua atualidade como parte da trilha do filme de 1999, na voz de Elvis Costello. Nos últimos 40 anos, ele ainda teve suas composições gravadas por cantores tão diferentes quanto Elton John, Sting, Bob Dylan, Placido Domingo, Céline Dion, Julio Iglesias, Liza Minnelli e Ray Charles.
Stéphane Audran (1932 – 2018)
Morreu a atriz francesa Stéphane Audran, uma das musas da nouvelle vague. Ela faleceu nesta terça-feira (27/3) aos 85 anos. “Minha mãe estava doente há algum tempo. Ela foi hospitalizada há dez dias e voltou para casa. Ela partiu pacificamente esta noite por volta das duas da manhã”, anunciou seu filho Thomas Chabrol à AFP. Nascida Colette Suzanne Dacheville, em 8 de novembro de 1932 na cidade de Versalhes, ela foi casada com o ator Jean-Louis Trintignant entre 1954 e 1956, antes dele se tornar famoso. Mas só virou atriz depois da separação. Em 1959, o cineasta Claude Chabrol a escalou na comédia “Os Primos” e foi amor à primeira vista. Os dois se casaram na vida e no cinema, criando 20 filmes juntos. Entre eles, estão alguns clássicos da nouvelle vogue, como “Entre Amigas” (1960), “A Mulher Infiel” (1969), “Amantes Inseparáveis” (1973) e especialmente “As Corças” (1968), sobre um relacionamento à três, em que ela encarnou uma bela bissexual. Pelo papel, a atriz venceu o Urso de Prata no Festival de Berlim. Stéphane também venceu o César por “Violette” (1978), e o BAFTA por “Ao Anoitecer” (1971), ambos dirigidos por Chabrol. Ela também estrelou inúmeros clássicos de outros cineastas, como “O Signo do Leão” (1962), de Éric Rohmer, “A Garota no Automóvel com Óculos e um Rifle” (1970), de Anatole Litvak, o vencedor do Oscar “O Discreto Charme da Burguesia” (1972), de Luis Buñuel, “Agonia e Glória” (1980), de Samuel Fuller, e o popular “A Festa de Babette” (1987), de Gabriel Axel, que também venceu o Oscar de Melhor Filme em Língua Estrangeira. O casamento com Chabrol acabou em 1980, mas não a parceria, que perdurou até os anos 1990. Após encerrar a carreira em 2008, num pequeno papel em “A Garota de Mônaco”, de Anne Fontaine, ela retornou recentemente para completar filmagens de um longa inacabado de Orson Welles, “The Other Side of the Wind”, que permanece inédito. “Stéphane era uma atriz muito boa. Era ótima para interpretar mulheres livres e independentes, como era na vida”, reagiu o diretor Jean-Pierre Mocky, que havia dirigido a atriz em “Les Saisons du Plaisir” em 1988.
Danielle Darrieux (1917 – 2017)
A atriz francesa Danielle Darrieux morreu na terça-feira (17/10) aos 100 anos, depois de participar de mais de uma centena de filmes, com frequência interpretando personagens muito elegantes. Seu estado de saúde “havia deteriorado um pouco recentemente após uma queda”, afirmou à agência France Presse (AFP) seu companheiro, Jacques Jenvrin, e ela faleceu em casa, no noroeste da França. Uma das atrizes mais belas de sua geração, Danielle Darrieux teve um início de carreira precoce, estreando no cinema aos 14 anos. Ela trabalhou em Hollywood e na Broadway nos anos 1930 e entre seus primeiros filmes estão os clássicos “Semente do Mal” (1934), do diretor Billy Wilder, “Mayerling” (1936), de Anatole Litvak, pelo qual venceu prêmios da crítica americana, e “A Sensação de Paris” (1938), de Henry Koster, que lhe rendeu aclamação. Sua beleza deu vida a amantes históricas, como “Katia, A Tzarina Sem Coroa” (1938), mas também mulheres modernas de sexualidade exuberante. Os títulos de seus filmes eram reveladores de como o cinema francês a considerava sedutora, trazendo adjetivos como “sensação”, “proibida”, “bonita”, “pecadora”, etc. Não demorou a ter cineastas a seus pés, formando uma parceria duradoura na frente e atrás das câmeras com o diretor Henri Decoin. Os dois se casaram e compartilharam duas décadas de cinema, entre “Mulher Mascarada” (1935) e “As Pecadoras de Paris” (1955). Mas sua filmografia se tornou ainda mais impressionante quando encontrou outro parceiro artístico, estrelando três clássicos de Max Ophuls, “Conflitos de Amor” (1950), “O Prazer” (1952) e “Desejos Proibidos” (1953), ao mesmo tempo em que brilhava em Hollywood com a comédia “Rica, Bonita e Solteira” (1951), de Norman Taurog, o noir “5 Dedos” (1952), de Joseph L. Mankiewicz, e o épico “Alexandre Magno” (1956), de Robert Rossen. Sua carreira permaneceu vital durante as décadas seguintes, sendo abraçada por uma nova geração de cineastas, como Claude Chabrol (“A Verdadeira História do Barba Azul”, 1963) e Jacques Demis (“Duas Garotas Românticas”, 1967). E embora tenha enveredado pela TV a partir dos anos 1970, continuou a aparecer em filmes importantes, em especial “Um Quarto na Cidade” (1982), de Demis, e “A Cena do Crime” (1986), de André Téchiné, que lhe renderam indicações ao César (o Oscar francês). Apesar de sua popularidade, Danielle nunca venceu um César, mas recebeu um prêmio da Academia Francesa por sua carreira, em 1985. Ela foi indicada mais duas vezes depois disso. Mais recentemente, ela estrelou “8 Mulheres” (2002), de François Ozon, sua última indicação ao César, e dublou a animação “Persepolis” (2007), de Marjane Satrapi, que disputou o Oscar, como a voz da vovó da protagonista.
Jean Rochefort (1930 – 2017)
Jean Rochefort, um dos atores mais populares do cinema francês, morreu na madrugada desta segunda-feira (9/10) aos 87 anos. Ele estava hospitalizado em agosto e faleceu em um estabelecimento médico em Paris. Com uma filmografia de quase 150 filmes, Rochefort construiu sua carreira em todos os gêneros, mas principalmente comédias ligeiras, sem nunca perder o charme e a elegância… ou seu icônico bigode. O ator nasceu em Paris em 1930 e começou a trabalhar no cinema na década de 1950, primeiro como figurante, depois como coadjuvante de aventuras de capa e espada, como “Le Capitaine Fracasse” (1961), “Cartouche” (1962), “Maravilhosa Angélica” (1965) e “Angélica e o Rei” (1966). Até que a comédia o descobriu. De coadjuvante em “Fabulosas Aventuras de um Playboy” (1965), estrelado por seu colega de “Cartouche”, Jean-Paul Belmondo, passou a protagonista no filme seguinte, o cultuado “Quem é Polly Maggoo?” (1966), um dos filmes mais famosos da história da moda no cinema. Ainda contracenou com Brigitte Bardot no romance “Eu Sou o Amor” (1967) e fez alguns thrillers importantes no começo dos anos 1970: “A Estranha Herança de Bart Cordell” (1973), nova parceria com Belmondo, “O Relojoeiro” (1974), de Bertrand Tavernier, e dois longas de Claude Chabrol, “Assassinato por Amor” (1975) e “Profecia de um Delito” (1976). O período também destaca duas obras dramáticas que lhe consagraram com Césares (o Oscar francês) consecutivos: a produção de época “Que a Festa Comece” (1976), novamente dirigido por Tavernier, e a trama de guerra “Le Crabe-Tambour” (1978), de Pierre Schoendoerffer. Mas apesar da variedade de projetos, logo sua veia de comediante se tornou mais evidente. Um quarteto de filmes foi responsável por estabelecer o novo rumo de sua carreira: “Loiro Alto do Sapato Preto” (1972), em que foi dirigido pela primeira vez por Yves Robert, “O Fantasma da Liberdade” (1974), do gênio espanhol Luis Buñuel, “Pecado à Italiana” (1974), de Luigi Comencini, e principalmente “O Doce Perfume do Adultério” (1976), seu segundo filme comandado por Robert. “O Doce Perfume do Adultério” fez tanto sucesso que, oito anos depois, ganhou um remake americano ainda mais popular – “A Dama de Vermelho” (1986), no qual o papel de Rochefort foi vivido por Gene Wilder. E depois de outra parceria bem-sucedida com o mesmo diretor, “Vamos Todos para o Paraíso” (1977), Rochefort filmou sua primeira comédia em inglês, “Quem Está Matando os Grandes Chefes?” (1978), tornando-se ainda mais conhecido no mundo todo. Ele continuou a acumular sucessos em sua associação com Robert – “Vamos Fugir!” (1979), “O Castelo de Minha Mãe” (1990) e “Esse Mundo é dos Chatos” (1992) – e ao firmar uma nova parceria importante com Patrice Leconte, com quem rodou seis filmes: “Tandem” (1987), “O Marido da Cabeleireira” (1990), “A Dança dos Desejos” (1993), “Os Canastrões” (1996) e o melhor de todos, “Caindo no Ridículo” (1996), uma obra-prima do humor francês, que rendeu a Rochefort nova indicação ao César. A lista se completa com o suspense “Uma Passagem para a Vida” (2002), pelo qual recebeu o prêmio de Melhor Ator no Festival de Veneza. O ator francês também foi dirigido pelo gênio americano Robert Altman em “Prêt-à-Porter” (1994) – que só perde para “Quem É Polly Maggoo?” na lista dos filmes de moda obrigatórios. Très chic. E foi a primeira escolha de Terry Gilliam para estrelar “The Man Who Killed Don Quixote” em 2000, ao lado de Johnny Depp. Mas esta produção foi interrompida por inúmeros desastres e nunca saiu do papel, ao menos como planejado, já que virou um documentário premiado, “Perdido em La Mancha” (2002). Ao final do século 20, Rochefort resolveu diversificar a carreira, aparecendo em minisséries e telefilmes, além de passar a dublar longas animados. É dele a voz do cavalo Jolly Jumper no desenho “Os Daltons Contra Lucky Luke” (2004). Outras animações recentes com sua voz incluem “Titeuf: O Filme” (2011), “Jack e a Mecânica do Coração” (2013) e “Abril e o Mundo Extraordinário” (2015). Entre seus últimos trabalhos, destacam-se ainda o excelente suspense “Não Conte a Ninguém” (2006), de Guillaume Canet, a comédia inglesa “As Férias de Mr. Bean” (2007), a adaptação dos quadrinhos de “Asterix e Obelix: A Serviço de sua Majestade” (2012), e o drama “O Artista e a Modelo” (2012), do espanhol Fernando Trueba, pelo qual foi indicado ao Goya (o Oscar espanhol). Seu papel final foi o personagem do título de “A Viagem de Meu Pai” (2015), de Philippe Le Guay, outro desempenho elogiadíssimo, que encerrou sua carreira no mesmo nível notável com que sempre será lembrado.











