Gênio da inovação redefiniu a música negra e a contracultura
Sly Stone, o artista que eletrizou plateias nos festivais de Woodstock e no Fillmore West, mas cuja trajetória foi marcada por problemas com drogas, morreu aos 82 anos. A morte, atribuída a complicações pulmonares e outros problemas de saúde, foi confirmada pela família nesta segunda-feira (9/6). “É com profunda tristeza que anunciamos o falecimento do nosso querido pai”, diz o comunicado oficial. “Sly partiu em paz, cercado pelos três filhos, seu amigo mais próximo e a família estendida. Enquanto lamentamos sua ausência, nos consolamos sabendo que seu extraordinário legado musical continuará a ressoar e inspirar por gerações.”
Começo da carreira aos 8 anos de idade
Nascido Sylvester Stewart em 15 de março de 1943, em Denton, Texas, Sly cresceu em uma família cristã que se mudou para Vallejo, na Califórnia. Ainda criança, formou o grupo gospel The Stewart Four junto aos irmãos, registrando sua primeira gravação aos oito anos de idade. Apelidado de “Sly” na escola, o prodígio musical já dominava teclado, guitarra, baixo e bateria aos 11 anos, e integrou várias bandas escolares, incluindo The Viscaynes, notável pela formação multirracial – algo inédito para a época.
Após estudar no Vallejo Junior College, Stone se destacou como DJ de voz rápida na rádio KSOL, em San Francisco. Conhecido pelo gosto eclético, misturava bandas britânicas como The Beatles e The Rolling Stones ao repertório soul da estação. O gosto eclético o fez ser contratado como produtor da Autumn Records, gravadora indie responsável por bandas como The Beau Brummels, The Charlatans e The Mojo Men. Em 1964, assinou a produção de “C’mon and Swim”, sucesso pop de Bobby Freeman que entrou no Top 5 das paradas.
Como Sly and the Family Stone revolucionou a música?
Stone liderou o grupo Sly and the Stoners antes de formar a Sly and the Family Stone, que incluía sua irmã Rose (teclados), o irmão Freddie (guitarra), Gregg Errico (bateria), Jerry Martini (sax), Larry Graham (baixo) e Cynthia Robinson (trompete). Contratados pela Epic Records, lançaram o álbum de estreia “A Whole New Thing” no fim do Verão do Amor em 1967. Apesar da aclamação crítica, o disco não fez sucesso imediato. Tudo mudou com “Dance to the Music”, música-título do segundo álbum de 1968 que explodiu nas paradas pop e R&B, seguido pelo LP “Stand!”, responsável por quatro singles nas paradas, incluindo a faixa-título, “Everyday People” e o hit de funk psicodélico que marcou Woodstock, “I Want to Take You Higher”. Os discos consolidaram Sly Stone de forma inédita na época, conquistando um público diverso de fãs negros e brancos.
A sonoridade vibrante e as letras espirituosas de Stone influenciaram nomes como George Clinton, cuja Parliament-Funkadelic herdou o espírito irreverente da Family Stone, e Prince, outro gênio multifacetado que navegou pelo funk com influência do rock. O legado de Sly se expandiu ainda mais com o advento do rap e do hip-hop: músicas do artista foram sampleadas e reinterpretadas por De La Soul, Public Enemy, Ice Cube e Beastie Boys, entre outros. Para completou, ele chegou a inspirar até o jazz-funk experimental de Miles Davis, que admitiu ter criado “On the Corner” sob influência direta de Stone, e Herbie Hancock, que batizou uma faixa de seu disco de 1973 com o nome “Sly”.
Queda, legado e consagração tardia
O auge criativo veio em 1971, com “There’s a Riot Goin’ On”. Gravado em clima sombrio de protesto social e de forma quase solitária por Stone, o álbum atingiu o topo das paradas pop e R&B poucas semanas após o lançamento, rendendo o hit “Family Affair” e se tornando uma das obra mais celebradas e influentes da década – um modelo sonoro que antecipou trabalhos de Kanye West e Kendrick Lamar. O disco, que é considerado a síntese negra da contracultura, entrou no Grammy Hall of Fame em 1999, consolidando o status de Sly como inventor da fusão entre crítica social, groove e experimentação sonora.
No entanto, a vida de Stone desmoronou ao longo dos anos 1970, acelerada pelo abuso de drogas e pelas saídas de integrantes-chave da banda. O último grande hit veio em 1973, com “If You Want Me to Stay”. A partir daí, os lançamentos seguintes perderam impacto comercial e, em 1983, sua carreira nas grandes gravadoras chegou ao fim, coincidindo com sua prisão por porte de cocaína.
Dez anos depois, em 1993, a banda Sly and the Family Stone foi finalmente introduzida no Rock and Roll Hall of Fame. O reconhecimento não o levou de volta ao showbusiness e, em 2011, o jornal New York Post revelou que Stone vivia em situação de rua, morando em uma van em Los Angeles. “Por favor, diga a todos, por favor, me dêem um trabalho, toquem minha música. Estou cansado de tudo isso”, desabafou ao jornal.
Mesmo após tanto ostracismo, sua música nunca saiu do centro das atenções. Questlove dedicou ao músico o documentário “Sly Lives”, lançado em 2024 com aclamação internacional. Stone também publicou sua autobiografia recentemente e deixou pronto o roteiro de um filme sobre sua vida, segundo comunicado da família.
O som e o espírito de uma era
“Sly foi uma figura monumental, inovador radical e pioneiro que redefiniu o cenário do pop, do funk e do rock”, diz o texto da família. “Seus hits deixaram uma marca indelével no mundo, e sua influência permanece inegável. Em uma prova de seu espírito criativo, Sly finalizou recentemente o roteiro de sua vida, projeto que queremos compartilhar com o público em breve, seguindo o lançamento do livro de memórias publicado em 2024.”
O artista deixa três filhos e uma trajetória marcada pela inovação. Sly Stone elevou a música a novos patamares, juntando funk, soul, rock, contracultura, psicodelia negra e crítica social em um legado único, que seguirá inspirando gerações.






