Jornalismo, guerra e espionagem serviram de matéria-prima para a ficção
Frederick Forsyth, celebrado autor britânico e referência mundial do thriller político, morreu nesta segunda-feira (10/6) aos 86 anos, em sua residência em Buckinghamshire, Inglaterra. O anúncio foi feito por sua agência literária, Curtis Brown. Ex-piloto da Royal Air Force e correspondente internacional da Reuters e BBC, Forsyth construiu uma carreira literária notável ao transpor para a ficção as experiências de quem cobriu conflitos armados, conviveu com agentes de inteligência e presenciou as zonas cinzentas da política internacional.
Conhecido pela escrita precisa, que dispensava computadores em favor da máquina de escrever, Forsyth se notabilizou ao unir fatos reais, apuração rigorosa e imaginação eletrizante em livros que venderam milhões de exemplares ao redor do mundo.
“O Dia do Chacal” inaugurou uma nova era para o romance policial
O primeiro best-seller de Forsyth, “O Dia do Chacal” (1971), revolucionou o gênero ao narrar, com minúcia jornalística, a caçada de um assassino profissional contratado para matar o presidente francês Charles de Gaulle em 1963. O romance, que rendeu ao autor um Edgar Award e sete semanas no topo da lista do New York Times, nasceu da experiência do próprio Forsyth como correspondente em Paris durante o período de atuação da OAS (Organização do Exército Secreto).
“No momento em que fui enviado para Paris, a OAS estava à beira de assassinar o presidente. Mesmo na época, achei que só conseguiriam se contratassem um profissional de verdade com um rifle de precisão”, disse ele à Publishers Weekly em 2018. Escrito em apenas 35 dias, o livro tornou-se fenômeno editorial e, em 1973, foi adaptado para o cinema por Fred Zinnemann, com Edward Fox no papel principal. O longa foi um dos maiores sucessos de bilheteria do ano, ganhando nova versão em 1997 com Bruce Willis e uma série em 2024 com Eddie Redmayne.
Obras mergulharam no submundo do pós-guerra e da espionagem
Em 1972, Forsyth lançou “O Dossiê Odessa”, que encabeçou as listas de mais vendidos ao revelar o funcionamento de uma rede secreta de ex-SS nazistas protegendo criminosos de guerra. A adaptação cinematográfica veio em 1974, com Jon Voight como protagonista e Maximilian Schell interpretando Eduard Roschmann, o “Açougueiro de Riga”. O próprio Roschmann seria localizado e preso anos depois na Argentina, após as revelações do livro.
Outros títulos consagrados de Forsyth também ganharam vida nas telas: “Cães de Guerra” (1974) virou filme com Christopher Walken em 1980; “O Quarto Protocolo” (1984), um suspense da Guerra Fria sobre um plano soviético para detonar uma bomba nuclear na Inglaterra, foi adaptado em 1987 com Michael Caine e Pierce Brosnan. O autor assinou ainda diversas outras obras transformadas em telefilmes.
De repórter de guerra a voz do thriller contemporâneo
Frederick McCarthy Forsyth nasceu em 25 de agosto de 1938 em Ashford, Kent. Filho de comerciantes, ele cresceu fascinado pela aviação após presenciar o céu ocupado por caças durante a Batalha da Grã-Bretanha, em 1940. Realizou o sonho de voar ao ingressar na Royal Air Force aos 19 anos, pilotando o de Havilland Vampire. Formado em Tonbridge e na Universidade de Granada, atuou como correspondente internacional em países como França, Alemanha Oriental e Nigéria, cobrindo a guerra civil de Biafra — tema de seu primeiro livro, “The Biafra Story”, publicado em 1969.
Mesmo após o sucesso mundial, Forsyth nunca abandonou o jornalismo, escrevendo colunas para o Daily Express até os últimos anos de vida. Em 2010, foi responsável pelo texto-base do musical “Love Never Dies”, sequência de “O Fantasma da Ópera” de Andrew Lloyd Webber, inspirada no seu romance “The Phantom of Manhattan” (1999). Recebeu o título de Comandante da Ordem do Império Britânico (CBE) em 1997, e publicou sua autobiografia, “The Outsider: My Life in Intrigue”, em 2015.
Testemunha de seu tempo, escritor de outro mundo
Forsyth se autodefinia como um “escritor jornalístico”, fiel aos fatos e ao rigor documental. “Meus livros sempre foram baseados em acontecimentos contemporâneos, aquilo que vi e vivi. Fiz muitos erros e vivi tantas coisas, escolhi escrever sobre elas, ou não”, disse em 2015. Sobre a profissão, sentenciou: “O jornalista nunca deve se unir ao poder, não importa o quanto seja tentador. Nosso papel é questionar, não se associar. Em um mundo obcecado por poder, dinheiro e fama, jornalista e escritor devem ser outsiders — observando, notando, comentando, mas nunca aderindo”.
Frederick Forsyth deixa os filhos Stuart e Shane, frutos do casamento com Carol Cunningham, e obras que marcaram a literatura e o cinema.