Anouk Aimée, estrela de “Um Homem, uma Mulher” e “La Dolce Vita”, morre aos 92 anos

Atriz francesa brilhou em filmes famosos de grandes mestres do cinema europeu como Lelouch, Demy, Fellini e Bertolucci.

Divulgação/Pathé

Anouk Aimée, a sofisticada atriz francesa que encantou as telas em filmes de Federico Fellini, Jacques Demy, Sidney Lumet, Bernardo Bertolucci e Claude Lelouch, faleceu aos 92 anos nesta terça-feira (17/6) em sua casa em Paris. Aimée, cujo nome verdadeiro era Judith Dreyfus, deixou um legado importante no cinema mundial.

Uma Carreira Brilhante

Nascida em Paris em 27 de abril de 1932, a atriz começou sua carreira no final dos anos 1940. Seu talento logo chamou atenção, levando-a a estrelar em mais de 80 filmes. Entre seus papéis mais icônicos estão a viúva romântica em “Um Homem, uma Mulher” (1966), de Lelouch, pelo qual foi indicada ao Oscar de Melhor Atriz e ganhou um Globo de Ouro; a herdeira rica em “La Dolce Vita” (1960) e a esposa desprezada em “8 1/2” (1963), ambos de Fellini; além da cantora de cabaré de “Lola” (1961), de Demy.

Durante a 2ª Guerra Mundial, a jovem Judith adotou o sobrenome de sua mãe para evitar a perseguição nazista – Dreyfus é um sobrenome judeu. Sua carreira começou logo após o fim do conflito, quando foi descoberta pelo diretor Henri Calef aos 14 anos e foi escalada para seu primeiro filme, “La Maison sous la Mer” (1947) no papel de Anouk. A atriz manteve o nome de sua personagem como identidade artística, adicionando “Aimée” (que significa “amada” em francês) nos anos 1950 a pedido do escritor Jacques Prévert.

Seu começo foi arrebatador. Aos 16, foi Julieta em “Os Amantes de Verona” (1949), adaptação shakespeareana de André Cayette, e aos 17 anos protagonizou sua primeira produção internacional, a aventura britânica “A Salamandra de Ouro” (1950), de Ronald Neame, em que fez par romântico com Trevor Howard, 20 anos mais velho.

Durante a década de 1950, ela virou a rainha dos melodramas franceses, destacando-se em “Os Amantes de Montparnasse” (1958), de Jacques Becker, sobre os últimos dias do pintor Amedeo Modigliani, e “Lola, a Flor Perdida” (1961), de Jacques Demy, como a cantora de cabaré do título, um papel que consolidou sua reputação como uma atriz capaz de incorporar a vulnerabilidade e o charme em igual medida. O longa teve uma sequência, “O Segredo Íntimo de Lola” (1969).

O impacto de Fellini

Foi na década de 1960, após sua parceria com o renomado diretor italiano Federico Fellini, que Anouk se tornou uma estrela internacional. Em 1960, ela foi escolhida para interpretar Maddalena em “La Dolce Vita”, uma herdeira rica e entediada, que se torna uma das figuras centrais do filme, explorando a alta sociedade romana ao lado de Marcello Mastroianni. Três anos depois, em 1963, a parceria foi retomada em “Fellini 8 1/2”, uma das maiores obras-primas do diretor. No filme, ela interpretou Luisa, a esposa do protagonista Guido Anselmi, interpretado novamente por Marcello Mastroianni. Seu personagem é uma mulher complexa, lidando com a infidelidade e as crises existenciais do marido, um diretor de cinema em bloqueio criativo. Os dois filmes foram indicados ao Oscar, receberam aclamação mundial e destacaram ainda mais o trabalho da atriz.

O sucesso dos filmes de Fellini apresentou Anouk para diretores americanos. Ao longo da carreira, ela trabalhou com Howard Hawks em “Sodoma e Gomorra” (1962) e “Crime e Paixão” (1975), Sydney Lumet em “O Encontro” (1969), George Cuckor em “Justine” (1969) e Robert Altman em “Prêt-à-Porter” (1994). Mas seu segundo maior mercado foi mesmo a Itália. A consagração de “La Dolce Vita” e “Fellini 8 1/2” a transformou em querida dos grandes “maestros”. Ela estrelou muitas obras italianas, incluindo as comédias sexuais “Minha Esposa é um Sucesso” (1963), escrito por Ettore Scola e dirigido por Mauro Morassi e Dino Risi, e “Os Castrados” (1964), de Pasquale Festa Campanile e Massimo Franciosa, além de ter brilhado como a esposa sofisticada de Ugo Tognazzi em “A Tragédia de um Homem Ridículo” (1981), de Bernardo Bertolucci, e como a mulher suicida de “O Salto no Vazio” (1980), de Marco Belocchio, que lhe rendeu o troféu de Melhor Atriz no Festival de Cannes.

A mulher de Lelouch

Entretanto, Anouk é indissociável do cinema francês. Em grande parte por conta de seu papel mais lembrado e duradouro: Anne Gauthier, uma viúva que trabalhava como assistente de produção na indústria cinematográfica. Um dia, ela encontra outro viúvo, um piloto de corridas vivido por Jean-Louis Trintignant, ao som romântico do “Chabadabada” de Francis Lai, e o resultado ecoa até hoje. O filme mais famoso do diretor Claude Lelouch, “Um Homem, uma Mulher” (1966), foi um sucesso comercial e crítico, ganhando a Palma de Ouro em Cannes e dois Oscars.

A atriz e Trintignant se reuniram novamente em 1986 para “Um Homem, uma Mulher: 20 Anos Depois”, e em 2019 em “Os Melhores Anos de Uma Vida”, repetindo seus personagens com a direção de Lelouch. O final da trilogia foi também o último filme de Anouk e Trintignant (que faleceu em 2022).

Ela foi casada quatro vezes, incluindo com o ator britânico Albert Finney. Teve uma filha e ganhou vários reconhecimentos por seu talento, incluindo um César Honorário (o Oscar francês) em 2002 e um Urso de Ouro Honorário no Festival de Berlim em 2003. E continuará a ser evocada nas telas, em sua vasta filmografia, com sua beleza enigmática, talento excepcional e contribuições inesquecíveis ao cinema.