A ex-“BBB” Flávia Viana chorou e se desculpou nesta quarta (31/3), após a imprensa revelar que ela recebeu dinheiro do governo de Jair Bolsonaro para divulgar uma campanha dúbia do Ministério da Saúde. “Eu não acredito em tratamento precoce dessa doença tão louca que está espalhada por aí”, declarou a ex-sister em desabafo postado nos stories do Instagram.
Ela recebeu R$ 11,5 mil para estimular o “atendimento precoce” em janeiro, enquanto Manaus vivia o auge do colapso na rede hospitalar.
“Em janeiro, a minha equipe foi procurada para a gente fazer um trabalho de divulgação dos cuidados que a gente teria que ter com a covid-19, e os trabalhos incluíam máscara e álcool gel, tudo que a gente tem falado desde o começo dessa pandemia. A minha intenção ao fazer esse trabalho foi única e exclusivamente ajudar”, ela explicou.
Mas o trabalho também incluía enfatizar o “atendimento precoce”, que lotaria ainda mais hospitais e postos de atendimento em momento de colapso, além de fazer confusão com o “tratamento precoce” divulgado por Bolsonaro.
Em sua defesa, a participante da sétima edição do “BBB” fez questão de dizer que tem nojo do governo do Brasil. “Não me meto com político, acho que o que os governantes fazem com a gente é fazer todo mundo de palhaço, eu tenho nojo de falar de quem governa do nosso país”.
A ação fez parte de uma iniciativa do governo Bolsonaro, que custou mais de R$ 1,3 milhão em ações de marketing com influenciadores e mídia. O valor saiu dos orçamentos do Ministério da Saúde e da Secretaria de Comunicação (Secom) e inclui R$ 85,9 mil destinados ao cachê de 19 “famosos” contratados para divulgar campanhas de “conscientização” em suas redes sociais.
Uma das peças de TV veiculadas dentro do projeto focava na hashtag “NãoEspere”, presente no texto divulgado pelos influenciadores. As ações foram pensadas no bojo da campanha anunciada pela Secom no fim de setembro de 2020 para estimular o “atendimento precoce”.
No roteiro da ação, obtido pela Agência Pública através de um pedido via Lei de Acesso à Informação (LAI), a Secom orientava a ex-BBB Viana (2,5 milhões de seguidores) e os influenciadores João Zoli (747 mil seguidores), Jéssika Taynara (309 mil seguidores) e Pam Puertas (151 mil seguidores) a fazer um post no feed e seis stories — todos no Instagram — dizendo para os seguidores que, caso sentissem sintomas da covid, era “importante que você procure imediatamente um médico e solicite um atendimento precoce”.
“O tratamento precoce comprovadamente aumenta as chances de recuperação e diminui a ocorrência de casos mais graves e, consequentemente, o número de internações”, diz o release da campanha, apostando na confusão de termos – atendimento x tratamento precoce.
Poucos dias depois do começo da campanha nas redes sociais, em 16 de janeiro, uma postagem do Ministério da Saúde no Twitter foi marcada como “publicação de informações enganosas e potencialmente prejudiciais relacionadas à covid-19” por mandar os cidadãos que tivessem sintomas buscar uma UBS e solicitar o “tratamento precoce”.
Paralelamente à ação com influenciadores liderada pela Secom, o Ministério da Saúde lançou a plataforma “TrateCov”, que recomendava cloroquina até para bebês. O Conselho Federal de Medicina pediu, em nota, que o aplicativo fosse removido “imediatamente” pelo Ministério. O aplicativo saiu do ar em 20 de janeiro, menos de uma semana depois de seu lançamento.
Mais recentemente, em fevereiro, uma pesquisa no Amazonas apontou que pacientes que tomaram remédios do “tratamento precoce” para evitar ou tratar sintomas iniciais da covid-19 tiveram maiores taxas de infecção que aqueles que não tomaram nada.
Nesta quarta (31/3), a Organização Mundial da Saúde (OMS) recomendou que “não se utilize a ivermectina” para pacientes com covid-19, exceto em ensaios clínicos, “independentemente do nível de gravidade ou duração dos sintomas”. Junto com a cloroquina, a ivermectina é um dos itens do kit covid do “tratamento precoce” incentivado pelo governo.