Na briga entre o Festival do Rio e a Mostra de São Paulo, o público cinéfilo continua a ser a maior vítima. Graças à exigência de exclusividade, filmes que passam no Rio não são exibidos para o público paulista e vice-versa. Entretanto, organizadores de ambos os eventos reclamam da dificuldade de formar suas programações grandiosas.
A maior consequência dessa política se fez sentir na programação da Mostra de São Paulo, que, ao completar 40 anos, não terá, como vinha sendo tradição, o vencedor de algum festival top europeu. O vencedor de Berlim já passou pela capital paulista no festival É Tudo Verdade. Já os de Cannes e Veneza integraram o Festival do Rio.
Assim, os destaques da Mostra 2016 são filmes que tiveram repercussão crítica, como “Elle”, de Paul Verhoeven, um dos títulos mais comentados de Cannes, mas que saiu do festival francês sem reconhecimento do juri da Palma de Ouro. Há também “A Garota Desconhecida”, o drama de pior recepção crítica da carreira dos irmãos Dardenne.
Caso exemplar, o filme de Lav Diaz que venceu o Leão de Ouro em Veneza (“A Mulher que se Foi”) ficou com a organização carioca, enquanto seu outro longa de 2016 (“Canção para um Doloroso Mistério”), que “abriu novas perspectivas” em Berlim, vem a São Paulo.
Mesmo assim, é possível garimpar obras premiadas, que estão inclusive cotadas para o Oscar, como “Animais Noturnos”, segundo filme do estilista Tom Ford, que levou o Grande Prêmio do Juri em Veneza, e “The Birth of a Nation”, vencedor do Festival de Sundance, que teve suas chances de premiação eclipsadas por um escândalo antigo da vida do diretor, roteirista e ator Nate Parker.
De todo modo, não deixa de ser sintomática a ideia de exibir dois episódios de uma minissérie da TV durante o evento. Certo, Veneza também projetou os capítulos de “The Young Pope”, mas é diferente um festival italiano oferecer seu tapete vermelho para Paolo Sorrentino, um dos grandes cineastas do país, como Cannes já havia feito anteriormente com as minisséries “Carlos”, de Olivier Assayas, e “O Pequeno Quinquin”, de Bruno Drumont. Para dar crédito à Mostra, com o crescimento dos serviços de streaming, talvez este seja mesmo o futuro dos festivais: ampliar o espaço das narrativas serializadas.
Para chegar nos mais de 300 títulos da programação já adiantada, boa parte das exibições será composta de retrospectivas. A principal delas será dedicada ao cineasta italiano Marco Bellocchio, que assina o pôster da 40ª Mostra. Ele virá para o evento, assim como o diretor americano William Friedkin, conhecido por filmes como “O Exorcista” e “Operação França”, que também serão exibidos em uma retrospectiva. Os dois cineastas ainda ministrarão uma masterclass de cinema.
Além deles, haverá duas homenagens póstumas: ao cineasta Hector Babenco, morto em julho, e ao polonês Andrzej Wajda, falecido há menos de duas semanas.
A tendência nostálgica se reforça com uma seleção de filmes que marcaram os 40 anos da Mostra e se completa com a escolha do clássico mudo “A General”, de Buster Keaton, como filme de encerramento.