A pressão da panelinha aumenta. Após “Boi Neon”, de Gabriel Mascaro, e “Mãe Só Há Uma”, de Anna Muylaert, o filme “Para Minha Amada Morta”, de Aly Muritiba, também saiu da disputa à vaga brasileira para buscar indicação na categoria de Melhor Filme Estrangeiro do Oscar 2017.
Em comunicado sucinto, postado no Facebook, Muritiba diz, em nome da equipe de “Para Minha Amada Morta”, que “não reconhecemos a legitimidade da comissão constituída pela SaV (Secretaria do Audiovisual) para escolher o representante brasileiro na disputa do Oscar 2017”.
Quando anunciou sua desistência, Muylaert disse que “era o ano de ‘Aquarius'”, dando a entender a existência de um arranjo de bastidores para eleger o filme de Kleber Mendonça Filho à vaga. Visando se distanciar dessa polêmica, Muritiba ainda postou um esclarecimento na rede social: “Nós não retiramos nosso filme da disputa por filme A ou B. Nós retiramos por não reconhecer o modo como a comissão foi constituída. E acredito que os diretores que contestam a comissão deveriam fazer o mesmo”.
Quem iniciou a contestação foi justamente Kleber Mendonça Filho, que atacou a participação do crítico Marcos Petrucelli na comissão.
Petrucelli não poderia participar da comissão, na visão dos cineastas, por ter criticado a photo-op da equipe de “Aquarius” em Cannes, quando Filho e seus atores ergueram cartazes para denunciar, em inglês e francês, que “o Brasil não era mais uma democracia” após sofrer um “golpe de estado”.
Nenhum deles enxerga ironia no ato de defender o direito de Filho protestar contra o que quiser, enquanto atacam a liberdade de expressão de um crítico, no momento em que ele faz o que lhe é mais natural em sua profissão: criticar. Ao exercer pressão para manipular a formação da comissão para “vetar” desafetos, os cineastas deixam claro que buscam o confronto, confundindo demonstração pública de intolerância e incapacidade de convivência democrática com ato libertário, num desvio nutrido pelo pior tipo de patrulhamento ideológico.
Afinal, onde estava esta indignação seletiva quando, em 2010, “Lula, o Filho do Brasil” foi escolhido para representar o país no Oscar, em plena vigência do governo Lula? Em vez de protestos, Tata Amaral chegou a elogiar a politização da escolha, feita de forma unânime pela comissão da época, aparentemente mais ao gosto dos nossos cineastas democratas. Detalhe: o filme teve sua produção bancada pelas empreiteiras Odebrecht, Camargo Corrêa e OAS, todas suspeitas de propina e lavagem de dinheiro, que tiveram seus dirigentes detidos durante a Operação Lava Jato. “Lula, o Filho do Brasil”, que teria custado R$ 17 milhões, seria fruto de um projeto criminoso? Na pior das hipóteses, representou perfeitamente o Brasil de Lula e a “classe” para o mundo inteiro.
Muritiba também defende que os diretores que contestam a comissão deveriam retirar seus filmes da disputa. Mas Kleber Mendonça Filho já anunciou que não pretende renunciar, uma vez que tudo o que está acontecendo é de seu interesse. “Tenho interesse em ver o processo se completar dentro das regras democráticas”, ele afirmou ao jornal Folha de S. Paulo.
Além dos três cineastas desistentes, dois integrantes da comissão também pediram para sair. Embora o diretor e produtor mineiro Guilherme Fiúza Zenha tenha alegado “questões pessoais” e dito que não falaria com a imprensa, a atriz Ingra Lyberato fez um longo desabafo no Facebook, mencionando pressões extremas da “classe”.
“Estamos sendo extremamente pressionado por todas as notícias a ponto de ter gente pedindo para sair. Qual é o objetivo? Forçar o Petrucelli a sair? Forçar todos a sair?”, ela escreveu.
Aparentemente, o objetivo é este mesmo. Dar a indicação a “Aquarius” por W.O.
Mas isso também reforça, como opção de repúdio à tática de panelinha, a candidatura alternativa de “Chatô, o Rei do Brasil”.
“‘Chatô’ tem grandes qualidades e foi feito com muito esforço. Acho que meus técnicos e atores, que tanto se empenharam, merecem”, acredita o diretor Guilherme Fontes, ao contrário do que acham os diretores desistentes a respeito de seus próprios filmes.