Cineastas afegãs relatam fim do cinema e das artes no país
O Festival de Veneza dedicou espaço em sua programação neste sábado (4/9) para duas jovens cineastas afegãs se manifestarem sobre a situação do país, que perdeu não só a capacidade de fazer cinema, mas de se expressar por meio das artes com a tomada do poder pelo Talibã, grupo radical religioso que não admite músicas nem fotografias. Num depoimento emocionado, Sahraa Karimi, a primeira mulher a chefiar a Organização de Cinema do Afeganistão, e Sahra Mani, diretora do documentário “A Thousand Girls Like Me” (2018), sobre uma mulher violentada pelo pai durante anos, clamaram por solidariedade da comunidade internacional. “Em apenas duas semanas, as figuras mais brilhantes do país partiram”, disse Karimi. “Imagine, um país sem artistas!”, lamentou a cineasta diante de um grupo de jornalistas e cineastas convidados, entre eles o diretor do festival, Alberto Barbera. A cineasta descreveu um quadro sombrio no país. “Tudo parou no espaço de algumas horas. Os arquivos estão sob o controle do Talibã. O trabalho dos diretores desapareceu”, relatou ela. “Pela primeira vez na história do cinema afegão, um filme foi convidado para o festival francês de Cannes… Estávamos preparando a segunda edição do prêmio nacional de cinema”, ela enumerou, sobre os esforços perdidos. “Os talibãs estão destruindo os instrumentos de música, os estudantes se escondem”, acrescentou Mani, fazendo um apelo: “Por favor, sejam nossas vozes e falem da nossa situação”. “Não temos mais casa, não temos país (…) a Arte é proibida. Minha geração não quer isso”, retomou Karimi, reforçando um pedido de ajuda para os artistas afegãos à comunidade internacional.
Cineasta faz posts desesperados no Afeganistão: “Estão vindo nos matar”
A cineasta afegã Sahraa Karimi, primeira mulher a ter um doutorado em Cinema em seu país, vem publicando posts desesperados nas redes sociais. Num deles, ela conclama o mundo a “acordar para o impacto da rápida tomada do Afeganistão pelo Talibã”. Karimi, que abordou a situação das mulheres afegãs em seu filme mais recente, “Hava, Maryam, Ayesha”, exibido no Festival de Veneza, manifestou-se angustiada pelo abandono internacional a seu país, em meio a retirada total das tropas dos EUA, que permitiram o avanço dos extremistas religiosos. A carta foi enviada a organizações de mídia internacionais e postada em diferentes redes sociais. “Se o Talibã assumir o controle, eles vão banir toda a arte. Eu e outros cineastas podemos ser os próximos em sua lista de alvos. Eles vão tirar os direitos das mulheres: seremos empurradas para as sombras de nossas casas e de nossas vozes, e nossa expressão será abafada no silêncio”, ela escreveu. “Quando o Talibã esteve antes no poder, nenhuma menina frequentava escolas. Desde que o grupo deixou o controle do país, mais de 9 milhões de meninas afegãs se matricularam na escola. Isso é incrível. Herat, a terceira maior cidade que acabou de ser dominada pelo Talibã, tinha quase 50% de mulheres em sua universidade. São ganhos incríveis que o mundo mal conhece. Nessas poucas semanas, porém, o Talibã destruiu muitas escolas e 2 milhões de meninas foram forçadas a deixar a escola novamente”, acrescentou a cineasta, que tem publicado vídeos expondo a gravidade da situação no país. Num dos vídeos (veja abaixo), ela conta que foi ao banco tirar dinheiro e o local estava fechado e vazio. “Não consigo acreditar que isso aconteceu. Peço outra vez que rezem por nós. Pessoas do mundo, por favor, não fiquem em silêncio. Eles estão vindo nos matar”. “Não entendo este mundo. Não entendo o silêncio (do mundo). Vou ficar e lutar pelo meu país, mas não posso fazer isso sozinha. Preciso de aliados como você. Ajude-nos a fazer com que o mundo se preocupe com o que está acontecendo conosco”, conclamou. “É uma crise humanitária, mas o mundo está em silêncio. Acostumamo-nos a este silêncio, mas sabemos que não é justo”. Ver essa foto no Instagram Uma publicação compartilhada por Sahraa Karimi صحرا كريمي (@sahraakarimi) Ver essa foto no Instagram Uma publicação compartilhada por Sahraa Karimi صحرا كريمي (@sahraakarimi) Ver essa foto no Instagram Uma publicação compartilhada por Sahraa Karimi صحرا كريمي (@sahraakarimi) Ver essa foto no Instagram Uma publicação compartilhada por Sahraa Karimi صحرا كريمي (@sahraakarimi)
