Festival de Cannes 2025 destaca o Brasil em suas principais seções
Evento que começa nesta terça traz filmes brasileiros na disputa da Palma de Ouro, Semana da Crítica, Quinzena dos Realizadores e em homenagens no Cannes Classics
Oscar ignora Sérgio Mendes e Cacá Diegues no segmento In Memoriam
Cerimônia deixou de homenagear os dois brasileiros, apesar da relevância de suas contribuições para o cinema
Brasileiros na Academia do Oscar têm grupo de Whatsapp com objetivo em comum
Profissionais do cinema nacional se organizam para aumentar influência brasileira na premiação
Lula lamenta a morte de Cacá Diegues: “Levou o Brasil para as telas do cinema”
Cineasta de "Xica da Silva", "Bye Bye Brasil" e "Deus é Brasileiro" morreu nesta sexta-feira após complicações cirúrgicas
Cacá Diegues morre aos 84 anos no Rio de Janeiro
O cineasta, um dos fundadores do Cinema Novo, dirigiu clássicos como "Ganga Zumba", "Xica da Silva" e "Bye Bye Brasil"
Carlos Alberto Prates Correia, diretor de “Cabaré Mineiro”, morre aos 82 anos
O diretor Carlos Alberto Prates Correia, renomado cineasta e um dos principais nomes do cinema mineiro das últimas décadas, faleceu na madrugada de domingo (28/5) no Rio de Janeiro, vítima de uma parada cardíaca aos 82 anos. Entre seus trabalhos mais bem sucedidos, estão os filmes “Cabaré Mineiro” (1980), vencedor do Festival de Gramado, e “Noites do Sertão”(1984), que rendeu vários prêmios à atriz Débora Bloch. O cineasta deu início a carreira como crítico de cinema no extinto jornal Diário de Minas, antes de se tornar assistente de direção no longa “O Padre e a Moça” (1965), de Joaquim Pedro de Andrade, que marcou a estreia do ator Paulo José no cinema. Na década de 1960, um período de efervescência cultural no Brasil, o cineasta fundou o Centro Mineiro de Cinema Experimental (Cemice) em Belo Horizonte, reunindo um grupo de amigos apaixonados pela arte cinematográfica. Com o Cemice, Correia produziu “O Milagre de Lourdes” (1965), filme sobre um padre corrupto em conflito com seus fiéis, que se refugiava nos bordéis da Rua Guaicurus, local icônico da cidade. Em 1966, Correa partiu para o Rio de Janeiro, epicentro da produção cinematográfica na época, onde dirigiu o episódio “Guilherme”, da antologia “Os Marginais” (1966), de Moisés Kendler, também com Paulo José. Em seguida, ele trabalhou novamente com o ator no clássico “Macunaíma” (1969), dirigido por Joaquim Pedro de Andrade, como assistente de direção. Após as experiências em projetos renomados, Correia assumiu a direção de seu primeiro longa “Crioulo Doido” (1970). Ambientado em Sabará, o filme narrava a história de Florisberto, um alfaiate humilde que busca ascender socialmente e acaba envolvendo-se em negócios ilícitos, como agiotagem e jogo do bicho. Neste período, ele ainda atuou como produtor nos filmes “Os Inconfidentes” (1972) e “Guerra Conjugal” (1974), ambos do colega Joaquim Pedro de Andrade, e “Vai Trabalhar, Vagabundo” (1973), de Hugo Carvana. Além disso, colaborou com o cineasta Cacá Diegues nos longas “Quando o Carnaval Chegar” (1972) e “Joana Francesa” (1975). Só clássicos absolutos. Por conta desse trabalho, Correio levou seis anos para dirigir seu segundo longa. Lançado em 1976, “Perdida” retratava o dilema de uma mulher indecisa entre o subemprego e a prostituição. Em seguida, vieram os aclamados “Cabaret Mineiro” (1980) e “Noites do Sertão” (1984). Estrelado por Nelson Dantas, “Cabaret Mineiro” acompanha as aventuras de um sertanejo pelo interior de Minas Gerais, explorando elementos culturais da região, como a culinária, as danças tradicionais e a literatura de Guimarães Rosa. O filme recebeu diversos prêmios no Festival de Gramado de 1981, incluindo Melhor Filme, Melhor Direção, Melhor Fotografia, Melhor Ator (Nelson Dantas), Melhor Trilha Sonora (Tavinho Moura) e Melhor Atriz Coadjuvante (Tânia Alves). Naquele mesmo ano, o cineasta decidiu fazer a adaptação da cinematográfica da novela “Buriti”, escrita por Guimarães Rosa. O resultado foi “Noites do Sertão”, que consagrou Débora Bloch com prêmios nos festivais de Gramado, Brasília e até em Cartagena, na Colômbia. Em seguida, Correia dirigiu “Minas-Texas” (1989), que retratava a relação tumultuada entre uma jovem romântica e um peão. Andrea Beltrão venceu o prêmio de Melhor Atriz no Festival de Brasília pelo papel principal do filme, que compõe com “Cabaré Mineiro” e “Noites do Sertão” a trilogia sertaneja do diretor. Entretanto, a carreira do diretor sofreu com a extinção da Embrafilme no ano de 1990, por decisão do governo Collor, que o deixou longe das telas por 18 longos anos. Foi apenas em 2007 que o cineasta retornou para se despedir com seu último longa, “Castelar e Nelson Dantas no País dos Generais”, também vencedor do Festival de Gramado. Depois disso, nunca mais voltou às telas, vivendo uma vida reclusa no Rio de Janeiro. Prates Correia deixa a mulher Margarida e o filho João.
Antonio Fagundes vai estrelar continuação de “Deus É Brasileiro”
O ator Antonio Fagundes vai voltar a ser Deus. Ele acertou seu retorno ao papel na continuação de “Deus É Brasileiro” (2003), de Cacá Diegues. O diretor também estará novamente trás das câmeras na sequência, que recebeu o título de “Deus Ainda É Brasileiro”. A produção vai começar a ser rodada em novembro no Nordeste, mas não há informações sobre o retorno de outros integrantes do elenco original. O filme de 2003 foi um dos primeiros estrelados por Wagner Moura. Com a escalação, Fagundes desiste de esperar por “Segundas Intenções”, novela que deveria acontecer na HBO Max, mas que foi paralisada indefinidamente pela chefia internacional da plataforma. Ele deveria viver um dos personagens principais da produção. Fagundes também estará na série “200 anos”, da TV Cultura, no papel de Dom João VI. Confira abaixo um trecho do ótimo filme de Cacá Diegues.
Maria Lúcia Dahl (1941-2022)
A atriz Maria Lúcia Dahl, que marcou época no cinema brasileiro, morreu nesta quinta (16/6) no Rio de Janeiro, de causa não informada aos 80 anos. Ela sofria de Alzheimer e estava internada no Retiro dos Artistas desde o início de 2020. Carioca, filha de família tradicional, ela conheceu seu primeiro marido quando morava na Itália – o cineasta Gustavo Dahl, com quem compartilhava o amor pelo cinema. A educação nas melhores escolas também a levou a querer trabalhar com Cultura, abrindo caminho para que se transformasse numa das maiores musas do cinema nacional – e da contracultura brasileira. Ela estreou nas telas em “Bahia de Todos os Santos”, drama de 1960 dirigido por José Hipolito Trigueirinho Neto, mas só foi repetir a experiência cinco anos depois, no clássico “Menino de Engenho” (1965), de Walter Lima Jr. Depois disso, porém, emendou um filme atrás do outro, cruzando as fronteiras entre o Cinema Novo, o Cinema Marginal e o cinema comercial. Para ficar só nos anos 1960, a lista inclui o segundo longa de Cacá Diegues, “A Grande Cidade ou As Aventuras e Desventuras de Luzia e Seus 3 Amigos Chegados de Longe” (1966), o primeiro filme de Daniel Filho, “Pobre Príncipe Encantado” (1969), e os clássicos “Cara a Cara”, de Júlio Bressane, e “Macunaíma” (1969), de Joaquim Pedro de Andrade. Sem esquecer de “O Bravo Guerreiro” (1969), primeira e única vez em que foi dirigida pelo marido, Gustavo Dahl. Vivendo tudo o que tinha direito na era das grandes loucuras, experimentou um casamento aberto, que acabou em divórcio no fim dos anos 1960, quando se apaixonou pelo líder estudantil Marcos Medeiros. Junto do segundo marido, acabou se engajando no movimento contra a ditadura militar, sofreu ameaças e fugiu do país com a ajuda da irmã, hoje figurinista da Globo, Marilia Carneiro. Ela viveu exilada em Paris, onde teve a filha Joana, que criou sozinha. Por volta dessa época, a morte do pai fez a família perder a estabilidade financeira, o que a a trouxe de volta ao Brasil em meados nos anos 1970, buscando retomar a carreira na televisão. Passando a dividir a tela grande com a tela da Globo, participou de novelas como “O Espigão” (1974), “Gabriela” (1975), “Espelho Mágico” (1977) e “Dancin’ Days” (1978), a primeira produção das oito de Gilberto Braga, com quem depois desenvolveu uma parceria bem-sucedida em novo formato. Ao mesmo tempo, consolidou-se como símbolo sexual da era das pornochanchadas, emendando produções de títulos bastante sugestivos – de “Deixa, Amorzinho… Deixa” (1975) a “O Gosto do Pecado” (1980), com destaque para “A Árvore do Sexo” (1977) e “Mulher Objeto” (1981), ambos dirigidos por Silvio de Abreu (hoje mais conhecido por suas novelas). Na década passada, a revista TPM lembrou que ela foi a única mulher capaz de circular com a mesma desenvoltura entre o clubes privados da elite carioca e os estúdios da pornochanchada. Filmes mais tradicionais também não faltaram no período, como “Um Homem Célebre” (1974), de Miguel Faria Jr., e “Guerra Conjugal” (1975), de Joaquim Pedro de Andrade, além da parceria com Antônio Calmon, iniciada em 1977 com “Revólver de Brinquedo”. Os dois trabalharam juntos em cinco filmes consecutivos no curto espaço de dois anos – até “Eu Matei Lúcio Flávio” (1979). Mas por volta da consagração de “Eu Te Amo” (1981), de Arnaldo Jabor, o cinema nacional entrou em crise, levando-a fortalecer sua presença na TV. Ela fez principalmente novelas leves com tons de humor, como “Ti Ti Ti” (1985), “Cambalacho” (1986), “Bambolê” (1987), “Salsa e Merengue” (1996) e “Aquele Beijo” (2006). A exceção foi sua única novela das oito, “Torre de Babel” (1998), numa participação especial para o velho parceiro Silvio de Abreu. A atriz também integrou o elenco das minisséries mais famosas de Gilberto Braga: “Anos Dourados” (1986), “O Primo Basílio” (1988) e “Anos Rebeldes” (1992). A partir da retomada do cinema brasileiro em meados dos anos 1990, Maria Lúcia retomou sua primeira paixão, aumentando sua filmografia com “Veja Esta Canção” (1994), de Cacá Diegues, “Quem Matou Pixote?” (1995), de José Joffily, e outros, até “O Gerente” (2011), do veterano Paulo César Saraceni. Na fase final de sua carreira, ainda demonstrou novos talentos, assinando o roteiro de “Vendo ou Alugo” (2013), comédia dirigida por Betse de Paula, que lhe rendeu o prêmio de melhor roteirista no Festival Cine-PE. Por sinal, ela também escreveu cinco livros e manteve uma coluna no antigo Jornal do Brasil por 20 anos. Sua última aparição nas telas foi no documentário “Marcos Medeiros Codinome Vampiro” (2018) sobre seu segundo marido. Marcos Medeiros foi preso, torturado e exilado na Europa, onde iniciou uma carreira como curtametragista de vanguarda (e roteirista do clássico documentário de Glauber Rocha “História do Brasil”), antes de falecer em 1997, após uma longa internação no Pinel. Maria Lúcia Dahl teve com ele sua única filha, Joana Medeiros, também atriz. E foi com ela que fez um dos ensaios nus mais famosos da Playboy brasileira, em 1985. Detalhe: Joana tinha apenas 14 anos.
Cadu Barcellos (1986 – 2020)
Morto a facadas durante um assalto, na madrugada desta quarta-feira (11/11), o diretor Cadu Barcellos, de 34 anos, era um exemplo de superação para a juventude das comunidades pobres do Rio Aos 23, ele foi um dos cinco jovens cineastas aspirantes selecionados para dirigir episódios da antologia “5x Favela, Agora por Nós Mesmos” em 2009. O filme era uma atualização da antologia clássica do Cinema Novo “Cinco Vezes Favela”, originalmente dirigida por diretores iniciantes que se transformaram em grandes cineastas brasileiros. Cacá Diegues, que estreou em longa no filme de 1962, foi o produtor do projeto, que inclui apenas equipes de comunidades pobres, registrando seus cotidianos. Ele já trabalhava no setor audiovisual antes de ser “descoberto”, produzindo vídeos independentes desde a adolescência. Com 17 anos, já participava de cursos de internet e audiovisual em ONGs do Rio. Formado pela Escola Popular de Comunicação Critica (ESPOCC), projeto do Observatório de Favelas, virou oficialmente diretor aos 20 com o curta-metragem “Feira da Teixeira” (2006). No ano seguinte, assinou o programa “Crônicas da Cidade”, do Canal Futura. Barcellos foi selecionado por Diegues pela experiência precoce e por se destacar em oficinas dedicadas ao cinema nas comunidades do Rio de Janeiro. O diretor afirmou ao jornal O Globo que Cadu foi um de seus melhores alunos. “Quando nós resolvemos produzir ‘5x Favela, Agora por Nós Mesmos’ apenas com moradores de favela, um dos destaques que nós tivemos logo foi o Cadu Barcellos. Ele era tão inteligente, tão bem-humorado, tão talentoso, que nós demos a ele um dos episódios”, disse Diegues ao Globo. “Isso me deixa muito mal por ele, que foi uma pessoa que conheci muito, que foi muito meu amigo, como também pelo Rio de Janeiro que tá uma cidade impossível de se viver”, afirmou. Após “5x Favela” ser exibido no Festival de Cannes e ganhar o prêmio do público no Festival de Paulínia, o jovem deu sequência à carreira de diretor e roteirista com a série “Mais X Favela”. Ele escreveu 13 episódios e dirigiu três capítulos das duas temporadas da atração, exibida entre 2011 e 2014 no Multishow. Também escreveu e dirigiu o documentário “5x Pacificação” (2012) sobre a implementação das UPPs (Unidades de Polícia Pacificadora) nos morros do Rio, participou do roteiro de “Favela Gay” (2014) e foi diretor assistente de “Rio de Fé” (2013), documentário assinado por Cacá Diegues. Paralelamente, ajudou a lançar o Maré Vive, um canal de mídia comunitária feito de forma colaborativa por moradores do Complexo da Maré, e coordenou o projeto Jpeg, na ONG Promundo, em que liderava um grupo de jovens que promovia ações ligadas à saúde e à igualdade de gênero. Também foi dançarino e participou do Corpo de Dança da Maré, dirigido pelo coreógrafo Ivaldo Bertazzo, com espetáculos que rodaram o país, nos quais dançou por três anos. Em 2020, o profissional multitalentoso entrou para a equipe do Porta dos Fundos. Ele foi contratado como assistente de direção do programa “Greg News”, apresentado por Gregorio Duvivier e exibido pela HBO. Em seu perfil no Twitter, Duvivier afirmou que Barcellos era uma das melhores pessoas que já conheceu. “Um ser humano bom. Brilhante. Família. A morte do Cadu Barcellos deixa um buraco do tamanho do mundo.” Em nota, a equipe do Porta dos Fundos também ressaltou o talento do cineasta e disse que espera por justiça. “Hoje, nós do Porta dos Fundos acordamos profundamente tristes com a notícia do falecimento de Cadu Barcellos, um profissional amável, gentil, talentoso e dedicado, que trabalhou com a gente como assistente de direção na temporada de 2020 do programa “Greg News” (HBO). Aguardamos a apuração dessa tragédia e esperamos pela justiça, cientes de que nada pode reparar a perda da vida de uma pessoa tão jovem e querida.” O cineasta deixa a esposa e um filho de dois anos.
Leonardo Villar (1923 – 2020)
O ator Leonardo Villar, consagrado pelo Festival de Cannes em “O Pagador de Promessas” (1962), morreu na manhã desta sexta-feira (3/7) em São Paulo, aos 96 anos, vítima de uma parada cardíaca. Ele tinha sido internado em uma Unidade de Terapia Intensiva (UTI) após se sentir mal na noite de quarta. Nascido em Piracicaba, no interior de São Paulo, Leonildo Motta (seu nome de batismo) foi virar Leonardo Villar no teatro. Ele atuou em peças da Companhia Dramática Nacional (CDN), no Teatro Brasileiro de Comédia (TBC) e no programa televisivo de clássicos da dramaturgia “Grande Teatro Tupi” (entre 1952 e 1959) antes de ser alçado ao estrelato mundial como Zé do Burro, o personagem principal de “O Pagador de Promessas”. O filme tinha sido rejeitado pelo autor da peça original, Dias Gomes, após mudanças no texto promovidas pelo então galã transformado em cineasta Anselmo Duarte. Até os diretores do Cinema Novo atacaram a produção, jamais superando a inveja por sua consagração. Mas o fato é que “O Pagador de Promessas”, com um galã atrás das câmeras e um estreante no cinema diante delas, encantou a crítica mundial e faturou a Palma de Ouro. É até hoje, 58 anos depois, o único filme brasileiro vencedor de Cannes. E com o seguinte detalhe: venceu “apenas” os clássicos absolutos “O Anjo Exterminador”, de Luís Buñuel, “Cléo das 5 às 7”, de Agnès Varda, “O Eclipse”, de Michelangelo Antonion, e “Longa Jornada Noite Adentro”, de Sidney Lumet. Foi também o primeiro filme da carreira de Villar. Ator de teatro, ele ficou com o papel por insistência de Duarte, que recusou “sugestões” sucessivas para que Mazzaropi estrelasse o longa, o que facilitaria seu sucesso comercial. A grande ironia é que o filme tornou-se um sucesso justamente pela interpretação crível e inesquecível do ator, que deu vida ao simples Zé do Burro, um homem que só queria pagar uma promessa, carregando uma cruz gigante contra a vontade da Igreja local. Villar foi a alma de “O Pagador de Promessas”, carregando-o nas costas como o personagem, até o tapete vermelho da Academia de Artes e Ciências Cinematográficas dos EUA, que encerrou a trajetória consagradora do longa com uma indicação ao Oscar de Melhor Filme Estrangeiro. Graças à fama de Zé do Burro, Villar se estabeleceu como um dos principais astros do cinema brasileiro, dando vida a outros personagens e obras icônicas, como os papéis-títulos de “Lampião, Rei do Cangaço” (1964), de Carlos Coimbra, e o excepcional “A Hora e a Vez de Augusto Matraga” (1965), de Roberto Santos, que lhe rendeu o troféu Candango de Melhor Ator no Festival de Brasília. Estabelecendo uma bem-sucedida parceria com Coimbra, ainda estrelou dois sucessos do diretor, “O Santo Milagroso” (1967) e “A Madona de Cedro” (1968), sem esquecer o maior título da carreira de Cacá Diegues, “A Grande Cidade ou As Aventuras e Desventuras de Luzia e Seus 3 Amigos Chegados de Longe” (1966). Ele viveu até Jean Valjean na versão brasileira de “Os Miseráveis”, clássico de Victor Hugo transformado em novela por Walther Negrão em 1967, na Bandeirantes. Mas a partir da entrada na rede Globo, com “Uma Rosa Com Amor” em 1972, praticamente trocou o cinema pelas novelas, com passagens por cerca de 30 sucessos da emissora, incluindo “Estúpido Cupido”, “Tocaia Grande”, a versão original e o remake de “Os Ossos do Barão”, “Barriga de Aluguel”, “Laços de Família”, “Pé na Jaca”, até “Passione”, seu último trabalho em 2011, em que viveu o divertido Antero Gouveia. Entre uma novela e outra, intercalou telefilmes da Globo, entre eles “O Duelo” (1973) e “O Crime do Zé Bigorna” (1974), com Lima Duarte, mas isso também significou longos períodos afastado do cinema. De todo modo, os poucos filmes da fase final de sua carreira marcaram época, como “Ação Entre Amigos” (1998), de Beto Brant, “Brava Gente Brasileira” (2000), de Lúcia Murat, e “Chega de Saudade” (2007), de Laís Bodanzky.
Cacá Diegues fará continuação de Deus É Brasileiro para questionar rumos do país
O cineasta Cacá Diegues, que completa 80 anos nesta terça (19/5), anunciou que vai filmar uma continuação de “Deus É Brasileiro”, filme de 2003 em que Deus visitava o país. Em depoimento ao jornal Folha de S. Paulo, o diretor revelou que o roteiro de “Deus Ainda É Brasileiro” já está pronto e vai virar o 19º longa-metragem de sua carreira – se, claro, puder filmá-lo. Não tanto pela saúde, mas por conta de Jair Bolsonaro. O filme terá o retorno do personagem celestial, mais uma vez interpretado por Antônio Fagundes, que voltará ao Brasil para questionar: “O que aconteceu nesse país?”. Diegues, que famosamente retratou as mudanças trazidas do país de quatro décadas atrás em “Bye Bye Brasil” (1979), disse que identifica novas transformações sob Bolsonaro, para concluir: “Nem a ditadura militar foi tão ruim como é esse governo”. “O mundo todo está rindo do Brasil! Leio jornais estrangeiros, tenho muitos amigos de outros países. Ou riem ou têm pena da gente”, explica, revelando a inspiração do novo longa. O projeto de “Deus Ainda É Brasileiro” chega dois anos após seu último filme, “O Grande Circo Místico”, ter sido indicado como representante do Brasil na busca por uma vaga no Oscar de Melhor Filme em Língua Estrangeira (hoje, Melhor Filme Internacional). Mas este não era a produção que ele imaginava para suceder o musical circense. “Eu queria fazer um filme com a minha filha e ela faleceu”, contou o cineasta. Flora Diegues morreu em junho do ano passado, aos 32 anos. “Passei quatro anos tratando dela, que estava com um câncer no cérebro. Não pensei em mais nada nesse período. Havia um roteiro que eu queria fazer com ela e não farei mais”, declarou. O novo projeto foi desenvolvido na quarentena. “Estou há cinco semanas sem sair de casa. Tenho medo e sou muito obediente. Como estou prestes a fazer 80 anos, estou no grupo de risco”, disse o diretor. O filme de 2003, que também trazia um novato Wagner Moura em seu elenco, terminava com Deus indo embora. “Agora, quase 20 anos depois, ele volta ao país. Deus diz: ‘Quando saí daqui, estavam todos satisfeitos, o Brasil pentacampeão do mundo. Agora volto e estão desempregados, chorando. Perderam de 7 a 1 da Alemanha. O que aconteceu nesse país?’”. O que aconteceu com o cinema brasileiro, ele também pergunta, claramente. Mas não no sentido que o governo tentou emplacar. Para contrariar Bolsonaro, que disse que o cinema brasileiro não faz nada de bom há muitos anos, Diegues afirma: “Tenho 60 anos de cinema praticamente e posso garantir que estamos vivendo o melhor momento em matéria de criatividade. Nunca vi um cinema brasileiro tão diverso, com diferenças geracionais, regionais, políticas, estéticas…”. Mas faz uma necessária ressalva, justamente por causa de Bolsonaro. “Ao mesmo tempo, esse é o pior momento da história da economia do cinema brasileiro. Há dois anos, a Ancine não produz nada. É uma economia que está sufocando a gente. Quando acabar a quarentena, como é que você vai produzir? Eu não sei como farei o meu filme”, lamenta.
Patricio Bisso (1957 – 2019)
O artista argentino Patricio Bisso morreu no domingo passado (13/10) em Buenos Aires, após sofrer um ataque cardíaco, aos 62 anos. Natural da capital argentina, Bisso mudou-se para a cidade de São Paulo aos 17 anos, no fim dos anos 1970, e teve a maior parte de sua carreira no Brasil. Ele se projetou inicialmente como ilustrador, publicando seus trabalhos no jornal Folha de S. Paulo, mas logo se tornou um ícone na noite LGBTQIA+ paulistana por suas performances de humor, na maioria das vezes travestido. Uma das personagens que criou nesses shows foi até parar na Globo, a russa Olga del Volga, sexóloga e conselheira sentimental. Além de personagens próprios, ele recriava nos shows o visual de divas da música internacional dos anos 1950 e 1960, como Connie Francis e Gigliola Cinquetti. Acompanhado pela banda Os Boko Mokos e pelo trio vocal As Notas Pretas, seu show “Louca Pelo Saxofone” estreou em 1985 e ficou anos em cartaz. No ano passado, o selo Discobertas relançou pela primeira vez em CD o álbum “Louca pelo Saxofone”, derivado do show, que serve como testamento de sua genialidade. Bisso quase materializou uma carreira musical, participando do movimento de músicos Vanguarda Paulista, mas foi mais consistente como ator de cinema, atividade iniciada em “Maldita Coincidência” (1979), de Sergio Bianchi. Ele participou de clássicos da filmografia nacional, como “Das Tripas Coração” (1982), de Ana Carolina, “O Homem do Pau-Brasil” (1982), de Joaquim Pedro de Andrade, “Onda Nova” (1983) e “A Estrela Nua” (1984), ambos da dupla José Antonio Garcia e Ícaro Martins, antes de levar Olga del Volga para a Globo, na novela “Um Sonho a Mais” (1985). A versão Olga de Patricio também foi uma convidada frequente do programa de Hebe Camargo, o que acabou lembrado no longa “Hebe – A Estrela do Brasil”, atualmente em cartaz. Bisso também atuou e foi figurinista do filme “O Beijo da Mulher-Aranha” (1985), de Hector Babenco, e seguiu trabalhando com os figurões do cinema brasileiro, como Bruno Barreto, em “Além da Paixão” (1986), e Cacá Diegues em “Dias Melhores Virão” (1989), até sair do Brasil. Na época, dizia que tinha se cansado, por não conseguir dinheiro para projetos mais ambiciosos, como um longa-metragem focado em Olga Del Volga. Mas a gota d’água pode ter sido sua prisão em flagrante na noite de 3 de dezembro de 1994. Ele acabava de terminar a temporada do show “Bissolândia”, o mais elaborado de sua carreira, em que recriava canções dos personagens da Disney, quando foi preso por sexo com dois outros homens em plena praça Roosevelt, no centro de São Paulo. Passou a noite em cana, pagou fiança e saiu dizendo ter apanhado na delegacia. Em seguida, voltou a morar em sua Buenos Aires natal, no mesmo prédio de sua mãe, praticamente sumindo do mundo pop. Mesmo assim, voltou a trabalhar com o conterrâneo Babenco em 2007, desenhando figurinos do filme “O Passado”, em que o cineasta também voltou (provisoriamente) à Argentina em que nasceu. E chegou a ensaiar uma volta por cima com o musical satírico “Castronauts”, que ele concebeu. Após ser exibido em um festival em Nova York, Bisso planejava em transformá-lo em filme. Mas foi outro projeto frustrado. Nos últimos anos, ele passou a compartilhar seu humor ácido, acompanhado por ilustrações sessentista e referências à iconografia das pin-ups, com os seguidores de seu perfil no Facebook, onde, de forma significativa, sempre escrevia em português. Seu último post foi publicado no sábado (12/10).










