Corpo e Alma combina imagens repulsivas e oníricas para contar uma história de amor
“Corpo e Alma” é um filme imageticamente forte. Sua abordagem do matadouro de animais onde se passa a história mostra, de um lado, toda a assepsia exigida pelos controles oficiais, ao mesmo tempo em que exibe o sangue e as entranhas dos animais, a selvageria que é o abatedouro e o esquartejamento. O paradoxo é que o dono do estabelecimento, que com ele lucra e vive, nem aguenta ver o que se faz lá e não entende quando um candidato a funcionário não se incomoda com o que vê. O natural é se incomodar, claro, se houver alguma sensibilidade. Esse mesmo personagem, Endre (Morcsányi Géza), mostra-se reservado, até tímido, no seu ambiente de domínio e se aproxima com dificuldade de uma nova colaboradora, inspetora que lá chegou: Mária (Alexandra Borbély). Ela é travada ao contato e às relações, numa existência despreparada para o convívio humano que escape aos rígidos códigos de controle que ela utiliza no trabalho, sem nenhuma flexibilidade. Esses dois personagens carentes se encontrarão numa narrativa bem construída, em que se destaca o inusitado fato de que, noite após noite, eles experienciam sonhos idênticos. Sonhos que remetem a impulsos de caráter instintivo, projetados em animais, não o gado abatido no matadouro, mas cervos se encontrando na neve. E aqui, novamente, as imagens dessa natureza gelada e dos bichos são bastante sedutoras. Ou seja, os sonhos são belos, remetem a uma história de amor. Intrigante, estranha, assustadora, mas, sim, uma história de amor. A realização cinematográfica se vale do onírico e do poético para mostrar a fragilidade e a vulnerabilidade do humano e da possibilidade de amar. A crueldade está presente no cotidiano e o sofrimento parece ser uma condição indissociável da própria vida. A diretora Ildiko Enyedi mostra mão firme num tema rarefeito, que pede personagens inibidos, bloqueados. Exigindo, portanto, desempenhos contidos, voltados para dentro. Um desafio que, sobretudo, Alexandra Borbély vence brilhantemente. Mas todo o clima do filme e o desempenho do elenco seguem no mesmo diapasão. “Corpo e Alma” venceu o Urso de Ouro na edição do ano passado do Festival de Berlim, como Melhor Filme, e foi indicado pela Hungria para disputar uma vaga no Oscar 2018 de Filme de Língua Estrangeira.
Melhor filme europeu de 2017, The Square vence seis prêmios da Academia Europeia de Cinema
A Academia Europeia de Cinema divulgou os vencedores de seus prêmios de 2017, os European Film Awards, equivalente continental ao Oscar americano. E o grande vencedor foi a comédia sueca “The Square”, de Ruben Ostlund. Além de vencer como Melhor Filme Europeu do ano, faturou mais cinco prêmios – Melhor Comédia, Diretor, Ator, Roteiro e Design de Produção. “The Square” já tinha vencido a Palma de Ouro no Festival de Cannes 2017. Em tom de humor negro, acompanha o curador de um importante museu de arte contemporânea de Estocolmo, que a partir de um pequeno incidente desencadeia uma série de situações vexaminosas. Intérprete do curador, o dinamarquês Claes Bang (da série “Bron/Broen”) venceu o prêmio de Melhor Ator, enquanto o cineasta Ruben Östlund faturou duas estatuetas, como diretor e roteirista do filme. Ele já tinha causado boa impressão com seu filme anterior, “Força Maior” (2014), exibido e premiado na seção Um Certo Olhar do Festival de Cannes há três anos. O filme premiado vai ser lançado no Brasil em 4 de janeiro com o subtítulo “A Arte da Discórdia”. Entre os demais, “Com Amor, Van Gogh” foi premiado como Melhor Animação, o drama de época britânico “Lady Macbeth” levou o prêmio da crítica, “Corpo e Alma” premiou a atriz tcheca Alexandra Borbély, “120 Batimentos por Minuto” rendeu um troféu de montador para o cineasta francês Robin Campillo, e a produção russa “Loveless” se destacou com dois prêmios técnicos. Confira a lista completa dos vencedores abaixo. Melhores do Ano: European Film Awards 2017 Melhor Filme Europeu: “The Square” (Suécia) Melhor Animação: “Com Amor, Van Gogh” (Polônia/Reino Unido) Melhor Comédia: “The Square” (Suécia) Melhor Documentário: “Communion” (Polônia) Melhor Descoberta – Prêmio da Crítica: “Lady Macbeth” (Reino Unido) Melhor Diretor: Ruben Östlund, por “The Square” (Suécia) Melhor Atriz: Alexandra Borbély, em “Corpo e Alma” (Hungria) Melhor Ator: Claes Bang, em “The Square” (Suécia) Melhor Roteiro: Ruben Östlund, por “The Square” (Suécia) Melhor Edição: Robin Campillo, por “120 Batimentos por Minuto” (França) Melhor Fotografia: Michail Krichman, por “Loveless” (Rússia) Melhor Trilha Sonora: Evgueni Galperine e Sacha Galperine, por “Loveless” (Rússia) Melhor Som: Oriol Tarragó, por “Sete Minutos Depois da Meia-Noite” (Espanha) Melhor Design de Produção: Josefin Asberg, por “The Square” (Suécia) Melhor Figurino: Katarzyna Lewinska, por “Pokot” (Polônia) Melhor Maquiagem: Leendert van Nimwegen, por “Amaldiçoada” (Holanda) Melhor Curta-Metragem: “Timecode”, de Juanjo Giménez (Espanha) Prêmio do Público: “Stefan Zweig: Farewell to Europe”, de Maria Schrader (Alemanha/Áustria) Prêmio por Realização no Cinema Estrangeiro: Julie Delpy (França) Prêmio pela Carreira: Aleksandr Sokurov (Rússia)

