
Instagram/Wesley Safadão
Justiça cassa mandato do prefeito por uso eleitoral de show de Wesley Safadão
Político do Rio Grande do Norte e seu vice foram condenados por abuso de poder político e econômico em festival bancado com verba pública
Sentença atinge prefeito e vice de Pedra Grande
A Justiça Eleitoral do Rio Grande do Norte cassou os diplomas do prefeito de Pedra Grande, Pedro Henrique (PSDB), e do vice, Agricio Pereira (MDB). Os dois foram considerados responsáveis pelo uso eleitoral do festival “Verão da Gente”, realizado nos dias 13 e 14 de janeiro de 2024 com shows de Wesley Safadão e Cláudia Leitte pagos integralmente com recursos públicos.
Segundo o colunista Carlos Madeiro, do UOL, a decisão foi tomada pela juíza Cristiany Maria de Vasconcelos Batista, da 52ª Zona Eleitoral, e assinada na segunda-feira passada (22/9). Como se trata de julgamento em primeira instância, ambos permanecem nos cargos até que o Tribunal Regional Eleitoral (TRE) analise o recurso.
Por que o evento foi considerado irregular?
Na sentença revelada pelo UOL, a magistrada destacou o caráter desproporcional dos gastos em relação ao porte do município de 3.600 habitantes. O Ministério Público Eleitoral apontou que as despesas subiram de R$ 510 mil em 2023 para R$ 2,1 milhões em 2024. Já em 2025, fora do período eleitoral, o valor caiu para R$ 634 mil. Para a magistrada, os valores são exorbitantes para um município de 3.600 pessoas e foram gastos para a promoção pessoal do prefeito, já que ele subiu ao palco, fez “dancinha” e repercutiu jingle na condição de pré-candidato à reeleição.
“O jingle, segundo a ação, foi cantado por Wesley Safadão no palco no dia do show. A manifestação ‘JÁ GANHOU, TAN-TAN-TAN’ feita por um artista de enorme alcance, na presença e com a anuência do prefeito candidato à reeleição, configurou inegável propaganda eleitoral antecipada, ainda que de forma dissimulada”, registrou a juíza.
O Ministério Público sustentou que houve utilização indevida de recursos públicos e abuso de poder político e econômico. Testemunhas descreveram o evento como “fora de controle, fora da realidade do município”.
Qual foi a defesa apresentada?
Em nota enviada ao UOL, a assessoria jurídica de Pedro Henrique afirmou: “Respeitamos, mas não concordamos com a decisão que cassou, em primeira instância, o mandato confiado por 80,80% da população de Pedra Grande ao prefeito Pedro Henrique, nas eleições de 2024. Recebemos a decisão com serenidade e contra ela apresentaremos o recurso cabível, no prazo e modo adequados”.
A defesa também argumentou que a manifestação de Safadão ocorreu sem orientação dos investigados. Além disso, o “Verão da Gente” é realizado desde 2020 com o objetivo de incentivar o turismo e movimentar a economia local. O prefeito cita que pesquisa da Fecomércio, em parceria com a prefeitura, que apontou impacto de R$ 13,4 milhões na economia de Pedra Grande, com público de 75 mil pessoas.
Quais foram as penalidades aplicadas?
Além da cassação dos diplomas, Pedro Henrique foi declarado inelegível por oito anos. Ele e o vice também receberam multa de R$ 30 mil cada por condutas vedadas a agentes públicos. Entretanto, ainda cabe recurso.
Na semana passada, por exemplo, a prefeitura de Teresópolis conseguiu reverter um pedido de liminar do Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro (MP-RJ) para suspender a contratação de Leonardo em evento na cidade. O órgão alegava possível superfaturamento no cachê de R$ 800 mil e afronta aos princípios da moralidade e razoabilidade administrativa, considerando dívidas com hospitais, atrasos salariais e inscrições em cadastros de inadimplência.
Atuação do MP começou após “efeito tororó” de Anitta
A atuação do Ministério Público sobre contratos de shows sertanejos e de forró ganhou força após um episódio envolvendo Zé Neto, da dupla com Cristiano, em 2022. Durante apresentação, o cantor fez críticas à cantora Anitta, afirmando que “não precisa fazer tatuagem no ‘toba’ para mostrar se está bem ou não” e reforçou uma narrativa de extrema direita contra a chamada “mamata da Lei Rouanet”. “Nós somos artistas que não dependemos de Lei Rouanet. Nosso cachê quem paga é o povo. […] A gente não precisa fazer tatuagem no ‘toba’ para mostrar se a gente está bem ou não. A gente simplesmente vem aqui e canta, e o Brasil inteiro canta com a gente”, disse o sertanejo.
A cantora respondeu com humor à referência ao local da tatuagem — que apelidou de “tororó” —, mas rebateu o uso da Lei Rouanet com a exposição de práticas de superfaturamento em cachês pagos por prefeituras. Segundo ela, a produtora de seus shows já havia recebido propostas para esse tipo de contrato, o que foi recusado.
A denúncia pública motivou procuradores de diversos Estados a examinar convênios e pagamentos considerados incompatíveis com a realidade orçamentária de municípios. O movimento ficou conhecido informalmente como “efeito tororó” e resultou em uma série de suspensões e investigações que permanecem em andamento até hoje.
Shows com suspeita de superfaturamento
Um dos primeiros alvos foi Gusttavo Lima. Diversas apresentações do cantor foram canceladas por decisões judiciais ou recuos das prefeituras, depois que investigações questionaram cachês que ultrapassavam R$ 1 milhão em cidades com menos de 10 mil habitantes.
No ano passado, reportagem do ICL Notícias revelou que shows de Gusttavo Lima consumiam até 50% de orçamento de Cultura de pequenas cidades. Um dos casos mais graves aconteceu em Campo Alegre de Lourdes, cidade do interior baiano, que contratou show do sertanejo por R$ 1,3 milhão enquanto estava em situação de emergência por conta da seca. Detalhe: o orçamento da cidade para a Cultura era três vezes menor que o cachê cobrado.
Em maio passado, o Tribunal de Justiça do Mato Grosso também anulou um contrato de R$ 750 mil entre a prefeitura de Gaúcha do Norte, cidade de pouco mais de 8 mil habitantes, e a empresa Talismã Music para um show de Leonardo. Este caso chamou atenção porque o show chegou a acontecer logo em seguida, mediante liminar, o que fez a Justiça determinar a devolução de R$ 300 mil para os cofres públicos pela empresa da qual o sertanejo é sócio. O prefeito também é alvo da ação. Ainda cabe recurso.
Shows de Leonardo, César Menotti e Fabiano, Israel e Rodolffo, Bruno e Marrone, Ana Castela e Gian e Giovani também motivação ações do MP. A lista inclui ainda investigação do evento em Sorriso, onde Zé Neto detonou a polêmica com seu discurso contra Anitta e Rouanet, ganhando cachê de R$ 400 mil.
O espaço segue aberto para posicionamentos, declarações e atualizações das partes citadas, que queiram responder, refutar ou acrescentar detalhes em relação ao que foi noticiado.