SBT cria polêmica com fake news sobre caminhões de doações multados no RS

Notícia foi desmentida pela Agência Nacional de Transportes Terrestres e pela própria empresa supostamente "multada"

Divulgação/SBT

O SBT foi acusado na terça-feira (7/5) de propagar notícia falsa envolvendo a tragédia no Rio Grande do Sul. A reportagem feita por Márcia Dantas (“Tá na Hora”) sugeria que os motoristas de caminhões estavam sendo “barrados e multados”, mas a realidade era outra: os veículos eram parados para apenas pesagem simplificada. A publicação foi apagada pela emissora nesta quarta-feira (8/5) devido a repercussão negativa.

A jornalista compartilhou a denúncia exclusiva com alegações de que os caminhões estavam sendo impedidos de levar doações para as vítimas. “A ANTT (Agência Nacional de Transportes Terrestres) estaria barrando caminhões da Defesa Civil, com ajuda humanitária, porque não têm nota fiscal e está um pouco acima do peso”, disse ela, durante o suposto flagrante em Porto Alegre.

Diante da situação, Marcão do Povo lamentou o posicionamento das autoridades locais: “Eu fico emocionado, pois estamos passando por um dos momentos mais difíceis, uma das maiores catástrofes da história do país. O povo sofrendo, morrendo, sem ter o que comer. O Brasil mobilizado e alguns caminhões multados porque não tem nota fiscal. Uma tristeza muito grande”.

Reportagem foi desmentida

A ANTT desmentiu a informação e esclareceu como está ocorrendo o procedimento nas estradas neste período emergencial. “Não está retendo veículos de carga nas vias de acesso ao Rio Grande do Sul. Os veículos de carga que passam nas balanças em rodovias que acessam o Estado passam por um procedimento simplificado de fiscalização e são liberados para seguir viagem. Não há solicitação de nota fiscal e nem aplicação de multas sobre veículos que transportam donativos”, informou a ANTT.

“Os vídeos que circulam na internet que afirmam que a ANTT reteve veículos de doação não condizem com a realidade dos fatos. A ANTT está empenhada na facilitação da movimentação de cargas, sobretudo gênero de primeiras necessidades, para abastecimento da população atingida pelas chuvas no Rio Grande do Sul, além de mobilizar equipes da própria Agência e dos entes regulados no auxílio à população atingida e no reestabelecimento da normalidade”, completou.

Repercussão gerou críticas ao governo

A falsa denúncia do SBT foi compartilhada à exaustão por perfis conservadores e bolsonaristas, que compraram a narrativa e propagaram nas redes sociais. O coach Pablo Marçal, que tenta viabilizar sua candidatura à prefeitura de São Paulo, foi citado nominalmente pela jornalista Natuza Nery no GloboNews como um dos principais impulsionadores da fake news, e reagiu de forma raivosa afirmando que iria processar todo mundo, usando como defesa justamente a reportagem do SBT. Contudo, esta repercussão fez com que o conteúdo fosse apagado dos canais da emissora.

A multiplicação de postagens colocou sob suspeita o estado, atrapalhando o esforço humanitário para ajudar as vítimas das enchentes.

Segundo apuração do NaTelinha, uma avaliação interna do SBT considerou que o material produzido por Márcia Dantas possui “diversos pontos equivocados na abordagem”. Outro problema teria sido o tom ideológico adotado por Marcão do Povo ao dar a notícia no “Tá na Hora”.

Brasília coloca PF contra fake news

A repercussão ainda levou o Governo Federal a acionar a Polícia Federal e a Advocacia Geral da União contra as notícias falsas envolvendo as enchentes no Rio Grande do Sul. “Eu estou indignado mesmo. Acho que é uma sacanagem. Tem gente trabalhando 24 horas por dia, quatro dias sem dormir”, lamentou o ministro Paulo Pimenta.

“As pessoas colocando a vida em risco para salvar as pessoas. Enquanto isso, há uma indústria de fake news alimentada por parlamentares, por influencers, por pessoas que se dedicam a atrapalhar o esforço que está sendo feito para salvar vidas”, completou o ministro que atua na Secretaria de Comunicação Social.

Justificativa de Márcia Dantas

Márcia Dantas também se manifestou sobre a notícia falsa em uma sequência de vídeos publicados no Instagram. “O jornalismo do SBT não é baseado em política. Então, pessoas que estão vindo nesse perfil para elogiar com base em política ou para atacar… Não é isso!”, disse ela nos Stories.

“Em relação à denúncia dos caminhoneiros, nós apenas reportamos o que aconteceu com a nossa equipe. Houve uma fiscalização, houve multa, nós reportamos isso e a ANTT disse que iria rever essas multas. A situação foi essa e existe uma burocracia que, às vezes, atrapalha a chegada das doações. Mas eu não quero polêmica com isso.”

“O nosso objetivo como jornalista é fazer com esse trabalho voluntário seja melhor, ou seja, que as pessoas sejam ajudadas de forma mais rápida. A gente não quer atacar o governo, não queremos atacar lado A ou B, quem falou a verdade ou quem não falou. Nós fizemos a denúncia, a ANTT atendeu ao nosso chamado e mandou uma nota. Esse é o nosso papel”, completou a jornalista.

No entanto, a repórter não ficou satisfeita com seu posicionamento e voltou a comentar nesta quarta-feira (8/5) sobre o assunto ao vivo no “Chega Mais”, onde emitiu um comunicado da própria emissora. “Não estamos aqui para divulgar discursos de ódio e discursos políticos. O SBT não divulga fake news, nós somos uma emissora com compromisso da verdade, estamos aqui para ajudar a população do Rio Grande do Sul, estamos aqui para informar, para ajudar nessas doações”, comentou Márcia.

“Em nenhum momento a gente divulgou fake news. Nós fomos ontem pegos de surpresa por uma situação, informando que a nossa emissora estaria indo de encontro com outras emissoras, fazendo um discurso de ódio, e na verdade não é o nosso objetivo. Então a situação dos caminhoneiros que nós flagramos vindo para cá em Santa Catarina, ela de fato aconteceu. A Agência Nacional de Transportes Terrestres emitiu uma nota agora há pouco dizendo que a multa vai ser anulada, que eles reconhecem que a multa foi feita, mas que ela será anulada.”

“Se o nosso jornalismo cometer qualquer erro, nós seremos transparentes e iremos colocar aqui essa informação e consertá-la porque é o nosso compromisso. Mas nesse caso não divulgamos fake news, não fomos politizados também e não estamos usando esse discurso político para nada e é importante deixarmos isso muito claro”, finalizou Márcia Dantas.

Não há multas

A ANTT deu mais detalhes na quarta, afirmando que não houve qualquer apreensão de carga das doações ao Rio Grande do Sul ou multa. Ao contrário da reportagem, que chegou a mencionar notas fiscais, o problema do caminhão foi excesso de peso, com autuação e sugestão de divisão da carga com outro caminhão da mesma empresa. A eventual multa não foi processada devido à situação excepcional.

Entretanto, Rafael Vitale, diretor-geral da ANTT, admitiu que houve seis casos de caminhões com excesso de peso: “Durante o período das chuvas críticas, especificamente a partir de sábado, dia 4 de maio, passaram pelo posto de fiscalização de Araranguá, Santa Catarina, 7.928 veículos de carga que seguiram viagem. Houve casos isolados de autuação por excesso de peso, na balança de Araranguá, que não se tornarão multa e serão devidamente anulados. É importante dizer que todos esses casos, foram seis, seguiram suas viagens sem retenção na balança, ao constatarmos que eram doações.”

(Texto atualizado com as declarações do diretor da ANTT)