O filme “Som da Liberdade” liderou as bilheterias do Brasil em sua estreia, desbancando “A Freira 2” com R$ 5,77 milhões em ingressos vendidos nos cinemas brasileiros no fim de semana, segundo dados da Comscore. O detalhe é que os ingressos não foram vendidos para as 242 mil pessoas que assistiram ao filme entre quinta-feira e domingo (24/9). Eles foram pagos por alguém não identificado e dados para o público.
Tanto o site da produtora Angel Studios como o da distribuidora Paris Filmes distribuíram vários ingressos sem necessidade de pagamento, “graças à generosidade de outras pessoas”, segundo declararam publicamente.
A produtora cristã teria usado a mesma estratégia nos Estados Unidos para alavancar as bilheterias norte-americanas. No Brasil, filmes ligados à Igreja Universal, como “Os Dez Mandamentos” e “Nada a Perder”, foram acusados de seguir a mesma tática, após denúncias de sessões vazias em que todos os ingressos tinham sido vendidos.
As pessoas generosas que bancaram a ida do público ao cinema não foram identificadas. Mas o filme ganhou campanha aparentemente espontânea da produtora Brasil Paralelo, maior especialista no país na produção de vídeos baseados em teorias de conspiração e “desinformação”, que teve seu canal desmonetizado pelo YouTube a pedido do TSE durante as últimas eleições.
A Brasil Paralelo também distribuiu ingressos para o filme e depois alardeou seu “sucesso” nas bilheterias.
Sucesso polêmico
O sucesso norte-americano de “Som da Liberdade”, que retrata a vida de Tim Ballard, foi impulsionado principalmente pelo apoio de grupos da direita do país, que investiram no projeto e o divulgaram – incluindo uma exibição organizada por Donald Trump. Mesmo sendo lançado sem o apoio de grandes estúdios, o longa conseguiu grande sucesso, em parte devido ao seu alinhamento com visões de mundo propagadas por teorias da conspiração como QAnon – o principal delírio da extrema direita dos EUA.
A trama se concentra na busca implacável de Ballard para reunir uma família separada pelo tráfico de pessoas. Inicialmente, ele resgata um menino chamado Miguel na fronteira entre os EUA e o México e, posteriormente, descobre que a irmã de Miguel ainda está desaparecida. Isso o leva a Cartagena, onde ele planeja uma operação ousada para resgatar a menina. O filme inclui uma cena de epílogo com imagens em preto e branco da operação real de Ballard, embora essa cena seja seguida por uma controversa cena de créditos intermediários que tem sido criticada por seu caráter manipulativo, com o objetivo de alimentar questões de guerra cultural.
Como cinema, trata-se de um thriller convencional de ação ao estilo dos longas dos anos 1990, quando americanos heroicos invadiam repúblicas de bananas da América do Sul para fazer Justiça com as próprias mãos. É basicamente a premissa do primeiro filme da franquia “Os Mercenários” e do último filme de Rambo. O que há de diferente é a questão do tráfico de crianças, mostrado de forma apelativa e relacionando às teorias da direita extrema.
Após o lançamento do filme, sete mulheres denunciaram o verdadeiro Tim Ballard por abuso sexual. Elas afirmaram que Ballard usava a desculpa de combate ao tráfico infantil para convencê-las a se passar por suas esposas em missões de infiltração, obrigando-as a ter relações sexuais.