Para criar os “filtros” (eufemismo para censura) que pretende implantar no fomento do cinema e séries brasileiras, o presidente Jair Bolsonaro já mexeu na estrutura do Conselho Superior do Cinema (CSC), órgão responsável por propor e formular a política nacional para a área.
Ele reduziu a participação de membros da indústria do audiovisual e da sociedade civil no colegiado, que agora passa a contar com mais integrantes do governo do que nomes ligados ao setor — são sete ministros e cinco representantes do audiovisual.
O colegiado, que tinha seis representantes ligados à indústria audiovisual, agora contará com apenas três membros. Já o número de representantes da sociedade civil, como diretores e cineastas, caiu de três para dois integrantes.
No novo organograma, o ministro da Casa Civil Onyx Lorenzoni fica responsável por presidir o colegiado que determinará o futuro do cinema nacional. Além dele, também decidirão que filmes serão feitos com o dinheiro das taxas obrigatórias Condecine e Fistel os ministros da Justiça e Segurança Pública (Sérgio Moro), das Relações Exteriores (Ernesto Araújo), da Educação (Abraham Weintraub), da Cidadania (Osmar Terra), da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações (Marcos Pontes) e da Secretaria de Governo da Presidência da República (Luiz Eduardo Ramos).
Com isso, também não há mais representantes da área econômica do governo no CSC. Nos conselhos precedentes, havia integrantes do Ministério da Fazenda e do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior.
No governo de Bolsonaro, o cinema não é considerado de importância econômica, o que já vinha se refletindo em ações como proibição de patrocínio estatal, fim de apoio da Apex (Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos) para o programa Cinema do Brasil, voltado à exportação de filmes brasileiros, e outras iniciativas resumidas em cortes, cortes e cortes.
As novas mudanças foram publicadas na sexta-feira (19/7) no Diário Oficial e constam do mesmo decreto, anunciado durante cerimônia em comemoração aos 200 dias de governo, em que Bolsonaro transferiu a estrutura do CSC da Secretaria da Cultura, ligada ao Ministério da Cidadania, para a Casa Civil, no Palácio do Planalto.
Bolsonaro anunciou que deseja interferir no tipo de filme que se produz no Brasil, atacando a produção nacional como pornográfica, mesmo sem ter visto os filmes que cita como exemplo, e lamenta até os títulos dos filmes disponíveis no mercado, não se sabe quais.
Ao assinar o decreto, o presidente disse que o dinheiro público não será mais usado para bancar filmes que, segundo ele, contrariam o “respeito com as famílias”.
“Com o Osmar Terra [ministro da Cidadania] fomos a um canto e nos acertamos. Eu não posso admitir que com o dinheiro público se faça um filme como ‘Bruna Surfistinha’. Não temos problema com essa opção ou aquela. O ativismo que não podemos permitir, em respeito com as famílias”, afirmou. No dia seguinte, disse que nunca viu “Bruna Surfistinha”, mas manteve o ataque.
Ao mudar a composição do CSC para impor “filtros” em conteúdo, mudando regras criadas para evitar direcionamentos e favorecimentos – como, por exemplo, a um filho de presidente – , Bolsonaro assume franca atitude intervencionista diante do mercado, demonstrando, na prática, que nunca foi um político liberal, mas estatizante como acusava o PT de ser.
É bom lembrar que as regras de fomento só garantem a competitividade e a igualdade de condições no mercado por incluir a proibição de barreiras temáticas ou julgamento de conteúdos na destinação de sua verbas. Este é um dos maiores princípios liberais de distribuição de dinheiro público.