A patrulha ideológica perdeu. O secretário do Audiovisual Alfredo Bertini disse ao jornal O Estado de S. Paulo que o crítico Marcos Petrucelli será mantido na comissão que vai escolher o representante brasileiro para disputar uma vaga na categoria de Melhor Filme Estrangeiro do Oscar 2017. “A polêmica entre Petrucelli e Kleber Mendonça é antiga e envolve questões políticas, não tem nada a ver com a avaliação do filme ‘Aquarius’, que Petrucelli só viu agora na abertura do Festival de Gramado”, declarou Bertini ao jornal.
Ele se refere ao fato de Kleber Mendonça Filho ter pedido publicamente a cabeça do crítico, convencendo um grupo de cineastas a se engajarem em sua campanha. Por meio de uma Carta Aberta à Comissão Brasileira do Oscar, o diretor pernambucano exerceu pressão até sobre os membros do comitê. Dois deles pediram para sair, sendo que a atriz Ingra Lyberato desabafou no Facebook: “Estamos sendo extremamente pressionado por todas as notícias a ponto de ter gente pedindo para sair. Qual é o objetivo? Forçar o Petrucelli a sair? Forçar todos a sair?”
Os dois membros foram substituídos pelos cineastas Bruno Barreto e Carla Camurati, mas três diretores retiram seus filmes da disputa, ecoando uma acusação de “imparcialidade questionável”, que colocaria a comissão em cheque.
Segundo Filho, a inclusão do crítico Marcos Petrucelli, de visão política oposta a sua, refletiria uma perseguição que seu filme “Aquarius” estaria sofrendo por parte do governo, após sua equipe ter se manifestado politicamente durante o Festival de Cannes – com cartazes que afirmavam que “o Brasil não é mais uma democracia” devido a um “golpe de estado”. “Há muito falatório sobre a possibilidade do filme estar sendo sabotado pelo governo ilegítimo”, ele declarou, em entrevista à revista americana Variety, buscando internacionalizar a polêmica. Tudo isso porque Petrucelli teve a audácia de criticar a photo-op de Cannes, o que, na visão dos cineastas retirantes, “solapa sua imparcialidade e legitimidade” para integrar a comissão. Por esta lógica, como os filmes inscritos já passaram no cinema, nenhum crítico poderia participar do processo, já que a categoria costuma fazer exatamente o que acham um absurdo proibitivo: criticar.
Questionado se pensou em retirar o nome do crítico por causa da pressão exercida publicamente por Filho e demais cineastas, Alfredo Bertini foi enfático. “Nem eu nem o ministro Marcelo Calero cogitamos em momento algum retirar o nome de Petrucelli.”
Aceitando que a polêmica seja consequência do ambiente de polarização política que vive o País, Bertini ressalva que também está havendo uma má vontade de alguns profissionais do audiovisual, que não conseguem aceitar a pluralidade de opiniões. Ele ainda ressalta que seguiu as mesmas regras que vinham sendo usadas para compôr as comissões durante os governos Lula e Dilma, que, por sinal, levaram a uma das mais infames seleções da história deste país, quando “Lula, o Filho do Brasil”, financiado por empreiteiras incriminadas pela operação Lava Jato, foi escolhido por unanimidade pelo comitê do Ministério da Cultura do próprio Lula. Na ocasião, nenhum cineasta manifestou indignação.
“Na composição, respeitamos o que vinha sendo feito aqui na Secretaria do Audiovisual, chamando nomes com currículo notoriamente reconhecido, olhando para toda a cadeia produtiva do cinema, com profissionais da área de exibição, produção, direção, etc e, acima de tudo, procurando pessoas de diversas regiões do País. Então, não consigo entender essa má vontade e polêmica”, o secretário explicou.
Com as substituições na comissão e as saídas dos filmes que não tem interesse em representar o país no Oscar 2017, Bertini espera que a polêmica tenha acabado para que se passe a discutir os filmes propriamente ditos. “Vamos deixar essa polêmica estéril de lado e focar nos filmes. Me preocupa que as atenções tenham até agora se centrado apenas entre Petrucelli e Kleber Mendonça, e sobre seu filme ‘Aquarius’”, disse, reparando na tática de polarização enquanto marketing.