Novo X-Men decepciona, mas não chega a ser um apocalipse

Não foi Christopher Nolan, com a trilogia do “Cavaleiro das Trevas”, que levou a sério um filme de super-herói pela primeira vez. Foi Bryan Singer no “X-Men” original de 2000, abrindo as […]

Não foi Christopher Nolan, com a trilogia do “Cavaleiro das Trevas”, que levou a sério um filme de super-herói pela primeira vez. Foi Bryan Singer no “X-Men” original de 2000, abrindo as portas para um novo universo nos cinemas, mais realista que as tentativas anteriores. Só que, desta vez, o diretor que praticamente definiu um gênero, perdeu o rumo ao abraçar o irreal com todas as forças em “X-Men: Apocalipse”, seu trabalho mais fraco à frente da franquia e o pior da trilogia estrelada pela nova geração, como fala Jean Grey numa cena, em que a brincadeirinha com “O Retorno de Jedi” (1983) saiu pela culatra: “Well, at least we can all agree, the third one is always the worst”.

Estaria tudo certo se Bryan Singer seguisse o que ele mesmo ensinou: os mutantes são tão ou mais humanos que nós, homo sapiens. Seus poderes extraordinários sempre ficaram em segundo plano. Mas não neste filme, que exige dos X-Men um esforço para a utilização máxima de suas habilidades, para deter um vilão poderosíssimo, o primeiro mutante a andar na Terra, vindo da era de Imhotep e Anck Su Namun, colecionando os atributos de outros mutantes e se vendendo como uma divindade. Na verdade, porém, Apocalipse não passa de um fanfarrão que quer mandar tudo pelos ares. E ele acorda na década de 1980, dez anos após os eventos de “X-Men: Dias de um Futuro Esquecido” (2014), graças a uma solução vergonhosa do superestimado roteirista Simon Kinberg, que Singer jamais deveria ter aprovado.

Se você não conseguiu enxergar (e não é culpa sua), pode acreditar que Oscar Isaac (“Star Wars: O Despertar da Força”) é o ator por trás da maquiagem e o “cospobre” de Apocalipse, que daria orgulho aos profissionais que trabalharam em “Power Rangers”, “Jaspion” e “Spectreman”, heroicos artistas que fizeram milagres com um orçamento ridículo. O vilão patético surge com voz de megafone e mais imobilizado, sem expressões ou personalidade, que Darth Vader e RoboCop, o que lhe deixa inerte em cena e obriga a trama e os X-Men a reagirem à sua presença. Então, é hora de dar porrada e descarregar os poderes em cima da criatura estúpida. Pior que a franquia sempre se concentrou em vilões humanos como contraponto aos mutantes. E agora… isso.

Desta vez, infelizmente, qualquer traço de humanidade valorizado por Singer nos filmes anteriores foi deixado de lado, apesar do início intrigante. Especialmente a boa parte dramática envolvendo Magneto (Michael Fassbender). Mas é um filme cheio de repetecos, como os dilemas de Jean Grey (agora a talentosa Sophie Turner, de “Game of Thrones”) e o retorno de Mercúrio (o excelente Evan Peters) fazendo exatamente o mesmo de “Dias de um Futuro Esquecido”, mas numa versão estendida em cenário diferente. E, claro, Mística (Jennifer Lawrence), pela milésima vez, tentando nos enganar ao se passar por outra pessoa. Sem esquecer do showzinho básico do Magneto voador arremessando metais para todos os lados.

Mas tirando Oscar Isaac, embora seja injusto colocar o mico do figurino em sua conta, o elenco garante a diversão com sua competência indiscutível. Destaque, de novo, para James McAvoy (Charles Xavier) e os já citados Michael Fassbender, Jennifer Lawrence, Evan Peters e Sophie Turner. Vale ainda apontar o jovem Tye Sheridan, que se sai muito melhor que o ex-Ciclope, o insosso James Marsden. Singer só esqueceu de dar um pouco de voz aos “seguranças” do vilão, os quatro modernos cavaleiros do apocalipse. Magneto é o único que não entra mudo e sai calado.

Também não espere discussões profundas sobre a origem de Apocalipse e consequentes interpretações bíblicas, embora houvesse material de sobra para agitar um debate interessante sobre o assunto, mas talvez tenha faltado coragem para jogar lenha na fogueira. Fora isso, não há muito o que dizer nessa história, que está lá para servir de apoio para o clímax apoteótico, dominado por uma avalanche de efeitos visuais que fazem o filme de 2000 parecer uma produção rodada no quintal da casa de Bryan Singer, embora tivesse um roteiro bem melhor e personagens mais ricos em humanidade. Aqui, o exagero toma conta da tela, embora a solução final para a batalha pudesse vir a qualquer momento – mas isso transformaria o filme num curta.

Apesar de pouco inspirado, Bryan Singer tem crédito, ainda consegue prender a atenção e divertir na medida do possível – não tem como ficar indiferente, por exemplo a uma participação especial lá pela metade do filme, em alusão à história clássica dos quadrinhos “Arma X”. Os fãs piram. E temos uma competente reconstrução dos coloridos e exagerados anos 1980 – que talvez seja uma desculpa para o filme ir pelo mesmo caminho. O fato é que “X-Men: Apocalipse” tem problemas, mas (desculpe-me por isso) não chega a ser o fim do mundo. Verdadeiro apocalipse foram “X-Men: O Confronto Final” (2006) e “X-Men Origens: Wolverine” (2009).