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Filme|26 de março de 2016

Drama islandês premiado, Desajustados é muito melhor que seu título nacional

Fúsi (Gunnar Jónsson) é um homem grande, obeso, na faixa dos 40 anos de idade, ingênuo, de interesses e comportamentos ainda infantis. Ao conviver com uma menina vizinha, suas atitudes se equiparam às dela. É virgem, vive com a mãe, tem bom coração, sofre bullying de colegas no trabalho como despachador de malas no aeroporto, mas os perdoa com facilidade.

Ele é o personagem central de “Desajustados”, filme islandês que foi o vencedor do Festival de Tribeca do ano passado, cujo título original é “Fúsi”, o nome do protagonista. O longa revela sua rotina sempre repetitiva, do restaurante, das músicas pedidas no rádio e do seu interesse por reconstruir com soldadinhos, tanques e outras peças, batalhas da 2ª Guerra Mundial, ao lado de seu único amigo.

Que Fúsi possa ser considerado um desajustado, por seus comportamentos, para os padrões sociais esperados para alguém como ele e com sua idade, parece óbvio. Mas o título brasileiro não deixa de ser um julgamento, um rótulo que rejeita a figura. Por que a rejeição a uma doce criatura como essa? Por ser um loser, na visão capitalista difundida pelos Estados Unidos? Por entendê-lo como um doente mental? Ou o quê?

Acontece que o título está no plural, o que engloba também a personagem Alma (Ilmur Kristjánsdóttir), uma mulher ativa e vibrante, que ama flores e trabalhava numa floricultura. Mas perde seu emprego e o que lhe resta é aceitar um trabalho como lixeira. Ela entra na vida de Fúsi por acaso, ele se dedica a ela e a ajuda numa crise de depressão. Chamá-la também de desajustada só agrega julgamento aos que ficam desempregados e aos que sofrem de depressão. Sem que uma coisa precise levar à outra. Não faz sentido. É muito infeliz o título brasileiro desse belo filme islandês.

Na realidade, o filme é terno como seu protagonista e cheio de vida, como a mulher que se envolve com ele, capaz de valorizar o respeito humano e de entender a mente ingênua dos que passam pela vida sem acesso maior aos bens culturais, sem ambições, sem conseguir vencer uma timidez atávica. Ou, quem sabe, sem conseguir entender esse mundo onde vieram parar.

Basta esquecer o título do filme para perceber que estamos diante de figuras humanas frágeis, que se debatem num dia-a-dia frustrante e pouco acolhedor. Não como derrotadas, mas como sobreviventes. Isso também é uma batalha, às vezes tão dura quanto as da guerra que Fúsi reconstrói.

O ator protagonista, Gunnar Jónsson, recentemente visto em “A Ovelha Negra” (2015), está ótimo, perfeito para o papel. Foi premiado nos festivais de Marrakech e de Tribeca em 2015. Merecidamente. Ilmur Kristjánsdóttir, que faz Alma, também está muito bem. O contraste da dupla, em todos os sentidos, é cativante.

O frio e a neve que fazem parte da história, como é inevitável acontecer em filmes da Islândia, servem para acrescentar um clima cinzento e triste à narrativa. Mas é apenas um elemento acessório e nem tão explorado assim pelo diretor Dagur Kári (que já dirigiu, nos EUA, “O Bom Coração”). Os ambientes internos, um tanto escuros, dizem mais dos sentimentos e limites de vida dos personagens do que qualquer outra coisa. Porém, é um filme que também tem muito carinho e muitas flores. Portanto, é também cheio de esperança.

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Antonio Carlos Egypto

Antonio Carlos Egypto é psicólogo educacional e clínico, sociólogo e crítico de cinema. Membro fundador do GTPOS - Grupo de Trabalho e Pesquisa em Orientação Sexual. Autor de "Sexualidade e Transgressão no Cinema de Pedro Almodóvar","No Meu Corpo Mando Eu","Sexo, Prazeres e Riscos", "Drogas e Prevenção: a Cena e a Reflexão" e "Orientação Sexual na Escola: um Projeto Apaixonante", entre outros. Cinéfilo desde a adolescência, que já vai longe, curte tanto os clássicos quanto o cinema contemporâneo de todo o mundo. Participa da Confraria Lumière, é associado da ABRACCINE (Associação Brasileira de Críticos de Cinema) e edita o blog Cinema com Recheio

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