Biz Markie (1964–2021)
O ator e rapper Biz Markie morreu na sexta-feira (16/7), aos 57 anos, em um hospital de Baltimore de complicações de diabetes. Nascido Marcel Theo Hall no Harlem, em Nova York, ele adotou o nome artístico de Biz Markie ao buscar sucesso como rapper nos anos 1980. Seu álbum de estreia, “Goin ‘Off”, foi lançado em 1988 e emplacou o hit “Make the Music with Your Mouth, Biz”, que destacava sua habilidade como beat box humano. Mas foi o segundo disco, “The Biz Neverleep”, de 1989, que o catapultou para o topo das paradas de sucesso, graças à faixa “Just a Friend”, um rap romântico até hoje em evidência graças à inúmeros samples em gravações da nova geração. Sua carreira sofreu um baque na época do terceiro álbum. “I Need a Haircut” (1991) foi tirado de circulação pela gravadora Warner após um processo ruidoso do compositor Gilbert O’Sullivan, devido ao uso sem permissão de um trecho de seu sucesso de 1972, “Alone Again (Naturally)”. O caso se provou histórico e forneceu uma lição cruel para os artistas de hip-hop, demonstrando a necessidade de obter autorização dos detentores dos direitos autorais antes de utilizar discos de terceiros como bases musicais. Biz Markie brincou com a situação com o título de seu quarto álbum, “All Samples Cleared!” (todos os samples liberados, de 1993), mas o lançamento não fez o mesmo sucesso de outrora e ele só foi lançar outro disco dez anos depois – “Weekend Warrior” (2003), que teve ainda menos repercussão e encerrou sua discografia. Apesar disso, ele continuou sendo celebrado como pioneiro do rap por seus trabalho clássicos, recebendo convites para parcerias com vários artistas ao longo dos anos, incluindo os Beastie Boys em três álbuns – “Check Your Head” (1992), “Ill Communication” (1994) e “Hello Nasty” (1998) – , além de Snoop Dogg (o single “The Vampors”), Will Smith (“So Fresh”) e até os Rolling Stones (“Anybody Seen My Baby?”). Ao mesmo tempo em que a carreira musical estagnava, Markie foi convidado pelo cineasta Robert Townsend para interpretar a si mesmo na comédia de super-herói “Homem Meteoro” (1993). Entusiasmado com a experiência, fez aparições no humorístico “In Living Color” em 1994, mas a carreira de ator não fez sombra a seu legado como rapper. Ainda assim, fez algumas figurações que chamaram atenção, como um rapper alienígena em “Homem de Preto II” (2002) e um pizzaiolo em “Sharknado 2: A Segunda Onda” (2014). Nos últimos anos, ainda apareceu como ele mesmo em episódios das séries “Empire” (em 2016) e “Black-ish” (em 2016), além de fazer discotecagens e apresentar um programa de rádio. O artista estava trabalhando num filme chamado “Chaaw” antes de passar mal e precisar ser internado. Notícias de sua morte chegaram a circular na semana passada, mas foram prematuras. Ele deixa sua esposa, Tara Hall. Lembre abaixo o grande sucesso de Biz Markie.
Natalie Desselle (1967 – 2020)
Natalie Desselle, uma das estrelas da série “Alfinetadas” (Eve) e da comédia “Ricas e Gloriosas”, morreu na manhã desta segunda-feira (7/12), aos 53 anos, após uma batalha contra o câncer de cólon. Seus primeiros papéis foram pequenas aparições no filme de assalto “Até as Últimas Consequências”, estrelado por Jada Pinkett Smith, Queen Latifah, Kimberly Elise e Vivica A. Fox, e na sitcom “Family Matters”, ambos em 1996. Mas já no ano seguinte foi protagonista de “Ricas e Gloriosas”, ao lado de Halle Berry. No filme de 1997, dirigido por Robert Townsend, as duas viviam garçonetes em um restaurante de soul food da Geórgia, que acabavam cuidando de um velho milionário de Beverly Hills (Martin Landau) e se tornando “Princesas Negras”. Desselle Reid interpretou a personagem Mickey de maneira memorável. No mesmo ano, ela ainda entrou na série “Built to Last”, que só durou uma temporada (o contrário do que afirmava seu título), estrelou a comédia “Armadilhas do Amor” e viveu a irmã malvada de “Cinderella”, na versão estrelada pela cantora Brandy. Mas depois desse começo energético, passou os últimos anos fazendo televisão, com papel recorrente em “For Your Love” (entre 1998 e 2000) e fixo em “Alfinetadas” (2003-2006), entre muitas participações especiais. Dentre seus poucos trabalhos cinematográficos recentes, destaca-se ainda uma inclusão na família cinematográfica de Madea, personagem do comediante Tyler Perry que virou franquia com quase duas dezenas de filmes. Desselle apareceu apenas num deles: “Madea’s Big Happy Family” (2011).
Little Richard (1932 – 2020)
O cantor, músico e ator Little Richard, um dos pais do rock’n’roll, morreu aos 87 anos, de causa ainda não revelada. Ele vendeu 30 milhões de discos em todo mundo e influenciou gerações de artistas que atingiram ainda maior projeção, como Elvis Presley, Beatles, Elton John e Prince. Pioneiro incontestável, desbravou todo o potencial do piano como instrumento de rock, ensinou Mick Jagger a dançar e Paul McCartney a cantar. Little Richard se destacou, ao lado de Chuck Berry e Fats Domino, na primeira leva de artistas de R&B (rhythm and blues) a fazer sucesso entre o público branco americano. Mas antes de assinar seu primeiro contrato musical em 1951, ele era apenas Richard Wayne Penniman, um jovem caipira de Macon, no estado da Geórgia, que só tocava em lugares segregados. Filho de diácono batista, ele começou a cantar na igreja. Mas a religião lhe traiu muitas vezes. A primeira, aos 15 anos de idade, quando foi expulso de casa pelo pai crente, devido a seus modos afeminados. Isso o levou ao “vaudeville” para sobreviver, onde chegou a tocar travestido para atrair plateias interessadas em freakshows. Foram nesses shows restrito aos negros que Little Richard conheceu sua maior inspiração, o “príncipe do blues” Billy Wright, que se apresentava em ternos coloridos, tinha um topete enorme e um bigode estreitíssimo. O jovem Richard logo passou a imitá-lo. Os shows energéticos que se seguiram chamaram atenção da indústria. Ele assinou com a RCA em 1951. Mas suas músicas só começaram a chegar no rádio em 1955 e por outra gravadora, a Specialty Records, quando o produtor Robert Blackwell o encorajou a revisitar sua época do vaudeville e cantar uma música que costumava entoar, com palavras inventadas e que começava com um grito. Era “Tutti Frutti” e sua carreira deslanchou. Mesmo assim, nada superava vê-lo ao vivo, tocando piano como ninguém – de pé diante do piano, com o pé sobre o piano, de pé em cima do piano. Jerry Lee Lewis tentou superá-lo colocando fogo no instrumento. Mas chegou depois de Little Richard ter incendiado a juventude dos EUA. Quando Elvis assinou com a RCA, Little Richard já era astro de cinema. Ele fez parte do elenco de “Música Alucinante” (Don’t Knock the Rock, 1956), ao lado de Bill Haley and the Comets, cantou a música-título de “Sabes o que Quero” (The Girl Can’t Help It, 1956) e arrebentou em “O Rei do Rock and Roll” (Mister Rock and Roll, 1957) com “Lucille”. Foi no primeiro filme que eternizou as performances de suas músicas mais famosas, “Long Tall Sally” e aquela que começa a frase icônica “A-wop-bop-a-loo-lop-a-lop-bam-boom!”, a célebre “Tutti-Frutti”, uma das canções mais regravadas de todos os tempos. Tanto Elvis quanto os Beatles gravaram versões das duas músicas. Na verdade, os Beatles gravaram até o lado B de “Long Tall Sally”, “Slippin’ and Slidin'” – além de incluir “Lucille” e “Good Golly, Miss Molly” em seu repertório. Paul McCartney foi uma das poucas pessoas do mundo capaz de cantar como Little Richard, porque o próprio Little Richard lhe ensinou em 1962, na época em que tocaram e conviveram juntos entre shows na Inglaterra e na Alemanha. Mas antes de escolher seu sucessor, a indústria tentou embranquecer suas canções à força, dando seu repertório para o ídolo pop Pat Boone gravar. As músicas de Boone eram versões literalmente pálidas das originais. Mesmo assim, era o galã quem aparecia na TV tocando “Tutti-Frutti”. O sucesso de Elvis trouxe nova versão de “Tutti-Frutti” para as paradas. Só que em vez de popularizar o artista original, Elvis acabou substituindo-o. Até a juventude inglesa reconhecer na década seguinte que Little Richard era insubstituível. Beatles e Rollings Stones chegaram a servir de bandas de abertura para shows do cantor, em reverência a seu talento. Mas Richard, que foi o primeiro artista para quem fãs atiraram calcinhas no palco, acabou se convertendo à religião no auge da carreira. Ele apelou a Deus ao achar que ia morrer durante uma forte turbulência num voo para shows na Austrália e, depois de sobreviver, jurou ter visto um sinal dos céus – o satélite Sputnik reentrando na atmosfera. Em 1958, ele formou uma banda evangélica e passou a cantar gospel. A fase não foi longa. Ao embarcar em turnê com esse repertório, passou a ser vaiado por fãs que queriam ouvir rock. Em 1962, ele encontrou os Beatles e retomou seus antigos hits. No ano seguinte, os Stones abriram seu show. Ele se tornou adorado pelo público britânico e chegou a ganhar um especial na TV, que, a perdido dos fãs, foi reprisado várias vezes. E em 1964 contratou um guitarrista chamado Jimi Hendrix para integrar sua banda. A carreira musical, porém, jamais retomou o sucesso original nos EUA. Para complicar, ele passou a enfrentar a ira de religiosos por ter trocado a música de Deus pela música do diabo. A conversão religiosa acabou prejudicando até sua identidade sexual. Ele chegou a casar (entre 1959 e 1963) e passou a vida tentando negar rumores de que era homossexual. De fato, disse que considerava a homossexualidade “contrária à natureza”, anos depois de confessar publicamente que era gay em 1995. Ele começou a aparecer mais na TV que no rádio a partir dos anos 1960. Chegou a participar até do programa de Pat Boone, além de encontrar os Monkees num especial. E de repente se descobriu ator, explodindo na nova carreira nos anos 1980. Após ser escalado num episódio de “Miami Vice”, teve seu primeiro grande papel cinematográfico na comédia “Um Vagabundo na Alta Roda” (1986) e ainda contribuiu com uma música inédita para a trilha sonora. Esta revitalização coincidiu com sua premiação no Grammy em 1988, quando se autodeclarou “o arquiteto do rock’n’roll!”, com a plateia aplaudindo de pé. Desde então, tornou-se convidado frequente de programas de TV, séries e filmes, conquistando novos fãs com seu “timing cômico único”. A lista de aparições inclui o blockbuster “O Último Grande Herói” (1993), com Arnold Schwarzenegger, e se encerra com “Um Chefe Muito Radical” (1998), produção estrelada pelo comediante Carrot Top. Além disso, em 2000, sua vida foi dramatizada num telefilme com seu nome, dirigido por Robert Townsend (“Ritmo & Blues – O Sonho do Sucesso”). Little Richard continuou excursionando e fazendo shows para plateias entusiasmadas até que as dores de quadril se tornaram insuportáveis. Ele anunciou a aposentadoria em 2013, mas ainda continuou saudado pelo público em aparições ocasionais. A última foi no ano passado, quando recebeu um prêmio pela carreira do governador do Tennessee, nos EUA. “Deus abençoe Little Richard, um dos meus maiores heróis musicais”, escreveu Ringo Starr, baterista dos Beatles, nas redes sociais. “Ele foi uma das minhas maiores inspirações na adolescência”, disse Mick Jagger, a voz dos Rolling Stones. “Quando fizemos uma turnê juntos, eu observei atentamente seus movimentos todas as noites, para saber como entreter e envolver o público, e ele generosamente ainda me deu conselhos. Ele contribuiu tanto para a música que eu vou sentir sua falta para sempre”, acrescentou. “Uma perda muito triste”, ecoou Jimmy Page, guitarrista do Led Zeppelin. “As canções de Little Richard impulsionaram o rock’n’roll”.
John Witherspoon (1942 – 2019)
O ator John Witherspoon, parceiro de comédias de Eddie Murphy e Ice Cube, morreu na terça (29/10) aos 77 anos. Sua família confirmou a notícia no Twitter, sem divulgar a causa da morte. Witherspoon começou a carreira como comediante de stand-up. Após tentar, sem sucesso, se apresentar em shows de comédia em Las Vegas, foi para Los Angeles e começou a frequentar as noites de microfone aberto na Comedy Store. Ele também trabalhou de porteiro no clube de comédia e acabou contratado como MC, para apresentar os shows. Acabou criando amizade com o famoso comediante Richard Pryor, que o convidou a participar de seu programa humorístico, “The Richard Pryor Show”. Foi a estreia de Witherspoon nas telas, em 1977. Ele também apareceu em séries dramáticas, como “O Incrível Hulk”, “Barnaby Jones” e “Chumbo Grosso” (Hill Street Blues), antes de se lançar no cinema com um pequeno papel no remake de “Nasce um Cantor” (1980). A carreira cinematográfica ganhou fôlego no final dos anos 1980, a partir de parcerias com os cineastas que se destacaram nas primeiras comédias de elenco negro no período. Escalado no sucesso “Confusões em Hollywood” (1987), de Robert Townsend, ele entrou em seguida em “Vou Te Pegar Otário” (1988), de Keenen Ivory Wayans (que escreveu o filme anterior), e ainda repetiu a parceria com Townsend no cultuado musical “Ritmo & Blues – O Sonho do Sucesso” (1991) e em “Homem Meteoro” (1993). Também apareceu em mais duas obras clássicas relacionadas à música, a cinebiografia “Bird” (1988), sobre a vida do jazzista Charlie “Bird” Parker, dirigida por Clint Eastwood, e na popular comédia “Uma Festa de Arromba” (1990), de Reginald Hudlin, com os rappers adolescentes Kid & Play. Hudlin foi quem o transformou em parceiro de Eddie Murphy, dirigindo ambos em “O Príncipe das Mulheres” (1992). Witherspoon ainda filmou “Um Vampiro no Brooklyn” (1995), “Dr. Dolittle 2” (2001) e “As Mil Palavras” (2012) com o famoso comediante. Mas foi a comédia “Sexta-Feira em Apuros” (1995) que lhe deu seu papel mais famoso: Willie Jones, o pai do personagem preguiçoso de Ice Cube. Willie era, entre outras coisas, propenso a dar conselhos paternais enquanto usava o banheiro. Witherspoon apareceu em três filmes da franquia Ele também participou de mais de 100 episódios da série de comédia “Dupla do Barulho” (1995-1999), estrelada pelos irmãos Marlon e Shawn Wayans, com quem ainda contracenou no cinema em “O Pequenino” (2006). Sua filmografia inclui até uma produção de Adam Sandler, “Um Diabo Diferente” (2000), em meio a dezenas de outros projetos. Entre seus últimos trabalhos estão a dublagem da série animada “The Boondocks” (2005-2014), como o vovô Robert Freeman, e a série de comédia “Black Jesus”, atualmente em sua 3ª temporada.
Diahann Carroll (1935 – 2019)
A atriz e cantora Diahann Carroll, primeira artista negra a protagonizar uma série americana, morreu nesta sexta (4/10), aos 84 anos, vítima de um câncer de mama. Durante três anos, entre 1968 e 1971, ela viveu Julia Baker, uma enfermeira viúva que cuidava do filho na série “Julia”, que marcou época pelo pioneirismo. A série foi especial para a atriz, porque sua mãe era enfermeira de verdade. Mas chegou após sua carreira já estar consolidada, com diversos prêmios e muitos exemplos de seu pioneirismo como estrela multitalentosa. Carol Diahann Johnson nasceu no Bronx, em Nova York, em 17 de julho de 1935, filha de uma enfermeira e de um condutor de metrô. Antes de atuar, ela foi modelo. Aos 15 anos, já era fotografada para revistas voltadas ao público afro-americano, como Ebony, Tan e Jet. Com apoio dos pais, passou a participar e vencer concursos de talentos para adolescentes, mas com a exigência que continuasse os estudos. Ela entrou na NYU (Universidade de Nova York), enquanto frequentava shows de calouros na televisão. Os prêmios foram incentivos para sua carreira e a levaram a se apresentar como cantora em casas de show famosas dos anos 1950. De Nova York, passou a cantar em Las Vegas e até em Paris. Até que decidiu virar atriz, viajando para Los Angeles para participar de um teste do filme “Carmen Jones”, uma versão negra da ópera “Carmen” (1954), com direção do renomado Otto Preminger. Ela conquistou um papel de coadjuvante, contracenando com Harry Belafonte e Dorothy Dandridge em sua estreia nas telas. A estreia na Broadway aconteceu no mesmo ano. E em seguida ela estrelou outro musical negro importantíssimo de Hollywood, a adaptação de “Porgy & Bess” em 1959, no qual cantou a música clássica “Summertime”, de George Gershwin, novamente sob direção de Preminger. Foi durante essa filmagem que Carroll começou seu relacionamento tumultuado de nove anos com o astro Sidney Poitier, com quem também contracenou em “Paris Vive à Noite” (1961). Em 1960, passou a participar de séries. E por seu papel como professora em sua segunda aparição televisiva, num episódio de “Cidade Nua” exibido em 1962, foi indicada a seu primeiro Emmy. O sucesso de Diahann Carroll tornou-se impossível de ignorar quando o célebre compositor Richard Rodgers decidiu criar um musical especialmente para ela. O resultado foi “No Strings”, uma história romântica sobre uma modelo negra (Carroll) e um tímido escritor branco (Richard Kiley), que rendeu um Tony Award para a atriz, o primeiro conquistado por uma mulher negra pelo papel de protagonista num musical. Após filmar novamente com Preminger, em “O Incerto Amanhã” (1967), ao lado de Michael Caine e Jane Fonda, ela recebeu o convite de estrelar sua própria série. Mas duvidou da coragem dos produtores. “Eu realmente não acreditava que ‘Julia’ fosse funcionar”, ela revelou durante uma entrevista de 1998 para o site The Interviews: An Oral History of Television. Ironicamente, o que mudou sua decisão foi saber que Hal Kanter, o veterano produtor-roteirista que criou o programa, a considerava muito glamourosa para o papel. Ela resolveu mostrar que era capaz de viver uma mãe trabalhadora. Mudou o penteado, postura e inflexão vocal e arrebentou no piloto, convencendo-o rapidamente de que ela era a atriz certa. Carroll se tornou a primeira mulher afro-americana a estrelar um papel não estereotipado em sua própria série no horário nobre da TV americana. Até 1968, data de estreia de “Julia”, negras só apareciam em séries no papel de empregadas domésticas. Mas o impacto da atração não ficava só nisso. Ela era viúva de um soldado que morreu lutando na guerra do Vietnã, conflito muito contestado pela juventude da época, justamente pela grande quantidade de mortos. Sua personagem era muito bem educada, tendo estudado na França, e ela só namorou homens que também eram exemplos de negros bem-sucedidos. “Estávamos dizendo ao país: ‘Vamos apresentar uma mulher negra de classe média alta criando seu filho, e o drama da história não será sobre o sofrimento no gueto'”, observou Carroll na mesma entrevista. “Muitas pessoas ficaram furiosas com isso. Eles achavam que negros não tinham tantas oportunidades para representar nossa situação como povo oprimido… Sentiam que a realidade era muito grave para que fosse trivializada por meio de uma mulher de classe média que lidava com as dificuldades de criar uma criança e trabalhar como enfermeira. Mas nós achamos que estávamos fazendo algo importante, mesmo que algumas dessas críticas fossem válidas. Acreditávamos que esse era um programa diferente e que era importante fazer essa série”. Diahann Carroll foi indicada ao Emmy e venceu o Globo de Ouro pelo papel-título em “Julia”, que durou três temporadas. Depois disso, o Oscar. Ela estrelou no cinema a comédia “Claudine” (1974), interpretando uma mulher do Harlem que criava seis filhos sozinha e se apaixonava por um coletor de lixo (James Earl Jones). Em reconhecimento ao seu desempenho, foi indicada como Melhor Atriz ao prêmio da Academia de Artes e Ciências Cinematográficas. Ela seguiu sua carreira intercalando espetáculos da Broadway e participações televisivas, entre elas o famoso especial de Natal de “Star Wars” (1978), até que, pela primeira vez, resolveu que queria um papel numa série que já era sucesso. Fã de “Dinastia”, uma das atrações mais populares dos anos 1980, Carroll decidiu pressionar o produtor Aaron Spelling por um papel na atração. “Eles tinham feito tudo, incesto, homossexualidade, assassinato. Eu acho que eles estavam lentamente avançando rumo ao romance inter-racial”, ela lembrou em uma matéria de 1984 da revista People. “E eu queria ser rica e cruel… queria ser a primeira malvadona negra da televisão.” Como a sensual fashionista Dominique Deveraux, a primeira personagem afro-americana de destaque em um drama novelesco, Carroll interpretou a personagem mais ousada de “Dinastia” por três temporadas, bem como no spin-off “The Colbys”, duelando deliciosamente com a vilã Alexis Carrington Colby, vivida pela diva Joan Collins. Sua filmografia ainda acrescentou mais três clássicos, mostrando-a como cantora em “Mais e Melhores Blues” (1990), de Spike Lee, viúva de um empresário musical em “Ritmo & Blues – O Sonho do Sucesso” (1991), de Robert Townsend, e feiticeira da Louisiana em “Amores Divididos” (1997), de Kasi Lemmons. Mas nos últimos anos seus principais papéis foram na televisão. Ela teve um arco importante como mãe do Dr. Preston Burke (Isaiah Washington) em “Grey’s Anatomy”, entre 2006 e 2007, pelo qual voltou a ser indicada ao Emmy, e uma participação recorrente ainda mais destacada em “Crimes do Colarinho Branco” (White Collar), ao longo das seis temporadas da série (2009–2014), como a viúva de um golpista que aluga seu apartamento para o vigarista vivido por Matt Bomer (no papel que o projetou). Em meio às gravações da última série, ela foi introduzida no Hall da Fama da Televisão, numa cerimônia que aconteceu em 2011, quando teve a oportunidade de ser celebrada por todos os seus colegas. “Ela abriu trilhas por florestas densas e despejou diamantes elegantemente ao longo do caminho para que o resto de nós pudesse seguir”, tuitou a cineasta Ava DuVernay (“Olhos que Condenam”), refletindo sobre a importância da artista, com pesar por sua morte. “Obrigado por ajudar a abrir o caminho para mim e tantas outras. Eu tive e tenho a honra de te saudar como uma lenda no passado, no presente e para sempre”, acrescentou a atriz, apresentadora e empresária Oprah Winfrey (dona do canal pago americano OWN). “O impacto que você teve em mim, em Hollywood, nos Estados Unidos e no mundo significa que Deus existe”, completou o diretor e produtor Lee Daniels (criador da série “Empire”).


