Monica Vitti (1931–2022)
Monica Vitti, uma das das mais famosas atrizes do cinema italiano, faleceu nesta quarta (2/2) aos 90 anos, informou o ministro da Cultura da Itália, Dario Franceschini. “Adeus Monica Vitti, adeus à rainha do cinema italiano. Hoje é um dia verdadeiramente triste, morre uma grande artista e uma grande italiana”, escreveu ministro em um comunicado. A voz rouca e sedutora, o olhar melancólico e os cabelos meticulosamente despenteados da atriz marcaram uma coleção de clássicos absolutos do cinema, a partir de sua parceria com o diretor Michelangelo Antonioni. Maria Luisa Ceciarelli (seu nome real) foi “descoberta” pelo maestro em papéis coadjuvantes de comédia dos anos 1950. Os dois se aproximaram, se apaixonaram e ele a lançou ao estrelato em “A Aventura” (1960). Sua beleza não convencional, marcada por expressões tristes, distantes e frias, tornaram Vitti a protagonista perfeita para a trilogia da “incomunicabilidade” de Antonioni, iniciada pelo filme de 1960 e continuada nos cultuadíssimos “A Noite” (1961) e “O Eclipse” (1962), obras sobre o nada, o vazio, a alienação e o tédio, que implodiram a narrativa convencional em favor da exploração da imagem, dos closes de Vitti, conduzindo à evolução da própria linguagem cinematográfica. Depois do quarto filme com Antonioni, “O Deserto Vermelho” (1964), estreia do diretor a cores, Vitti foi estrelar a adaptação dos quadrinhos de “Modesty Blaise” (1966), com direção de Joseph Losey no Reino Unido. Espécie de James Bond feminina, a personagem mudou o perfil da atriz. Graças ao visual fetichista do uniforme de couro da heroína, ela foi alçada à condição de símbolo sexual. Na volta à Itália, Vitti terminou seu romance com Antonioni e passou a explorar sua imagem sexy em várias comédias picantes, virando estrela de produções dos maiores diretores do gênero, como Mario Monicelli (“A Garota com a Pistola”, 1968), Alberto Sordi (“Amor, Ajuda-me”, 1969) e Ettore Scola (“Ciúme à Italiana”, 1970). Entre “A Mulher que Inventou o Rebolado” (1970) e “À Meia-Noite, a Ronda do Prazer” (1975), ambos de Marcello Fondato, ainda foi escalada pelo mestre surrealista Luis Buñuel em “O Fantasma da Liberdade” (1974), estendendo seu alcance aos filmes de língua francesa. Retornou logo em seguida à França para trabalhar ainda com André Cayatte em “A Razão de Estado” (1978). Passada mais de uma década da separação, Vitti reencontrou as câmeras de Antonioni em “O Mistério de Oberwald” (1980). A esta altura, porém, ela estava envolvida com outro cineasta, Roberto Russo. Os dois se conheceram em 1975, quando ele integrava a equipe de “Pato com Laranja”, comédia clássica de Luciano Salce, e se aproximaram durante as filmagens de “Um Caso Quase Perfeito” (1979), filme americano dirigido por Michael Ritchie. Quando Russo estreou como diretor, em “Flirt” (1983), escalou Vitti no papel principal. A interpretação acabou consagrada no Festival de Berlim, estendendo o imaginário criado em torno da atriz como provocadora sensual, que ela estimulou até praticamente o fim da carreira, quando começou a dirigir a si mesma. Com a experiência de ter trabalhado com alguns dos maiores cineastas italianos, a estrela resolveu ir para trás das câmeras em 1990 com apoio de Russo. Ele escreveu e produziu “Escândalo Secreto”, o primeiro longa dirigido por Vitti e também a despedida da atriz do cinema. Ela decidiu sair de cena antes que pudesse envelhecer nas telas, decidindo que o cinema só teria imagens de sua beleza e juventude. E também antes que não pudesse mais atuar, um segredo que só seria conhecido bem mais tarde. Após viver com Roberto Russo por 27 anos, ela se casou com ele em 1995. A esta altura, Vitti já demonstrava sintomas do mal de Alzheimer, situação que só veio a público em 2011. Embora sua decisão de sair de cena fosse interpretada equivocadamente como sinal de vaidade, o reconhecimento conquistado ao longo de sua filmografia comprovam que Monica Vitti foi muito mais que sua beleza lendária, que inverteu signos ao transformar a frieza em algo extremamente quente. Monica Vitti venceu cinco troféus David di Donatello (o Oscar italiano) de Melhor Atriz, mais quatro prêmios especiais da Academia Italiana de Cinema. Também foi premiada em vários festivais internacionais, vencendo o Leão de Prata de Melhor Atriz no Festival de Berlim (por “Flirt”) e o Leão de Ouro honorário do Festival de Veneza, numa homenagem por sua carreira em 1995. Sem qualquer controvérsia, seus filmes estão entre os maiores patrimônios da cultura italiana do século 20.
John Richardson (1934 – 2021)
O ator britânico John Richardson, que contracenou com algumas das atrizes mais icônicas dos anos 1960 em produções clássicas, morreu na terça-feira (5/1) de complicações resultantes de infecção por covid-19, aos 86 anos. Richardson começou sua carreira com pequenos papéis em filmes britânicos notáveis como “Somente Deus por Testemunha” (1958), drama sobre o naufrágio do Titanic, o remake do suspense “Os 39 Degraus” (1959), o noir jazzista “Safira, a Mulher Sem Alma” (1959) e a popular comédia criminal “Os Sete Cavalheiros do Diabo” (1960). Mas só foi se destacar após trabalhar no cinema italiano. Ele participou do filme de estreia oficial do mestre do terror italiano Mario Bava, “A Maldição do Demônio” (1960), como um assistente de médico cujo sangue inadvertidamente traz uma bruxa vampírica (Barbara Steele) de volta à vida. O filme se tornou cultuadíssimo e chamou atenção do lendário estúdio britânico especializado em terror, Hammer Films, que lhe deu seus primeiros papéis de protagonista. Escalado como arqueólogo galã em “Ela”, Richardson se aventurou em busca de uma cidade perdida governada por uma rainha imortal e deslumbrante (Ursulla Andress). A mescla de fantasia e terror fez tanto sucesso que ganhou continuação (sem Andress), “A Vingança da Deusa”, que o ator também estrelou em 1968. Entre os dois lançamentos, ele ainda vestiu tanga em “Mil Séculos Antes de Cristo” (1966), aventura da Hammer com dinossauros que é mais lembrada pelo biquíni pré-histórico de Rachel Welch. Embora tenha estreado em Hollywood em 1970, como coadjuvante de “Num Dia Claro de Verão” (1970), com Barbra Streisand, ele passou o resto da carreira na Itália, onde protagonizou os spaghetti westerns “John, o Bastardo” (1967) e “Execução” (1968), o drama criminal “A Candidate for a Killing” (1969), com Anita Ekberg, o terror trash “Frankenstein ’80” (1972) e a sci-fi trash “Batalha no Espaço Estelar” (1977), entre muitos outros filmes. A lista melhora com seus papéis de coadjuvante, no terror cult “Torso” (1973), de Sergio Martino, e na comédia “Pato com Laranja” (1975), com Monica Vitti, culminando no último título de sua filmografia, o terror “A Catedral” (1989), do mestre Dario Argento. John Richardson foi casado com a também atriz Martine Beswick, que interpretou duas Bond girls (em “Moscou contra 007” e “Contra a Chantagem Atômica”) entre 1967 até seu divórcio em 1973. Curiosamente, ele também esteve cotado a assumir o papel de James Bond no final dos anos 1960, após a breve desistência de Sean Connery. Após sair do cinema, ele virou fotógrafo profissional.

