Pedro Carlos Rovai (1938 – 2018)
O cineasta Pedro Carlos Rovai morreu na madrugada de quinta-feira (1/11), no Rio, em consequência de complicações de um câncer. Ele tinha 80 anos e uma longa carreira como produtor e diretor de filmes brasileiros. Seu nome está ligado tanto à explosão da pornochanchada quanto ao surgimento das franquias infantis no cinema nacional, além ter sido pioneiro da atual fase de comédias românticas comerciais e ter produzido grandes sucessos teatrais. Natural de Ourinhos, no interior de São Paulo, Rovai praticamente inventou o gênero conhecido como pornochanchada ao dirigir, escrever e produzir “Adultério à Brasileira” em 1969. O filme era, na verdade, uma antologia à italiana, juntando três histórias cômicas com teor sexual, como vinha sendo feito com sucesso no cinema italiano da época. A produção inspirou novas antologias sensuais, como “Lua-de-Mel e Amendoim” (1971) e “Os Mansos” (1972), que contaram com segmentos realizado por Rovai, e demonstrou a viabilidade das comédias sexuais no país. O próprio Rovai assinou um dos maiores sucessos do gênero, “Ainda Agarro esta Vizinha” (1974), inspirado em texto de Oduvaldo Vianna Filho (criador de “A Grande Família”) e estrelado por Adriana Prieto (dos clássicos “Os Paqueras” e “Lúcia McCartney, Uma Garota de Programa”), que ele também dirigiu em “A Viúva Virgem” (1972). Visto por mais de 4 milhões de pessoas, “Ainda Agarro esta Vizinha” se tornou uma das maiores bilheterias da época, mostrando o microcosmo de um prédio de Copacabana, habitado pela vizinha gostosa, um redator publicitário, um mágico sem talento e um porteiro gay, entre outros. A partir do sucesso desse filme, ele passou a se dedicar à carreira de produtor, tornando-se um dos mais prolíficos da pornochanchada e se destacando pela variedade de temas, da comédia explícita, como “Eu Dou o que Ela Gosta” (1975), do especialista Braz Chediak, ao thriller “Ariella” (1980), adaptação do romance de Cassandra Rios. Suas produções atingiram refinamento que transcenderam o rótulo de pornochanchada, resultado em clássicos como “Bonitinha, mas Ordinária” (1981), adaptação de Nelson Rodrigues com Lucélia Santos e direção de Chediak. Ele tentou acompanhar as mudanças de rumo do mercado, dirigindo o musical “Amante Latino” (1979), estrelado pelo cantor Sidney Magal, mas após a produção de “Beijo na Boca” (1982), com Claudia Ohana e direção de Paulo Sérgio de Almeida, seu ímpeto foi tolhido pela estagnação comercial do cinema brasileiro. Mas isso não o tirou de cena, apenas mudou seu cenário. Ele trocou as câmeras pelos palcos de teatro, ao produzir mais de 12 peças, como “A Gaiola das Loucas”, com Vera Gimenez, e “Piaf”, com Bibi Ferreira, a maior parte delas nos anos 1980. Rovai só foi voltar ao cinema após a chamada Retomada, e visando público completamente diferente daquele que o consagrou. Em 2000, ele produziu “Tainá – Uma Aventura na Amazônia”, sobre as aventuras infantis de uma indiazinha amazônica. E novamente encontrou sucesso, tanto que o título virou uma trilogia, com os lançamentos de “Tainá 2 – A Aventura Continua” (2005) e “Tainá – A Origem” (2013), inaugurando o filão das franquias infantis bem antes dos filmes derivados da novelinha “Carrossel”. O passo seguinte foi voltar à direção, com “As Tranças de Maria” (2003), baseado em conto-poema de Cora Coralina, mas, embora premiado em festivais do Nordeste, a falta de sucesso comercial desestimulou Rovai a continuar filmando. Foi seu último trabalho como diretor. Mas ele ainda seguiu investindo com êxito na produção, realizando os dois filmes da franquia “Qualquer Gato Vira-Lata”, estrelados por Cleo Pires. O primeiro, de 2012, pegou o começo da explosão das comédias românticas, mostrando que Rovai continuava antenado às tendências do mercado. Para completar, também produziu a obra-prima “O Outro Lado do Paraíso” (2015), drama premiado de André Ristum sobre a construção de Brasília, estrelado por Eduardo Moscóvis, que acumulou troféus nos festivais de Gramado, Brasília e no exterior. Pedro Carlos Rovai continuava em plena atividade e absolutamente relevante aos 80 anos.
Eloísa Mafalda (1924 – 2018)
Morreu Eloísa Mafalda, a Dona Nenê da versão original da série “A Grande Família” e atriz que marcou época na TV brasileira. Ela faleceu aos 93 anos em casa, em Petrópolis, região serrana do Rio de Janeiro, na noite de quarta-feira (16/5) de causas naturais. A veterana atriz foi, ao longo de meio século de atividade, a grande mãe da TV brasileira, intérprete de inúmeras figuras maternas que embalaram séries e novelas da Globo. Mas Mafalda Theotto, que nasceu em 1924, em Jundiaí, interior de São Paulo, podia ter se tornada famosa por outro talento que possuía e que nada tinha a ver com interpretação. Em 1936, aos 12 anos de idade, foi convidada a integrar o time olímpico brasileiro, como atleta de natação. Porém, seu pai não deixou. Em vez disso, incentivou-a a trabalhar como costureira e auxiliar de escritório nas Emissores Associadas para ajudar nas contas da família. Assim que o irmão conseguiu emprego como locutor de rádio no Rio de Janeiro, ela aproveitou seus contatos para fazer um teste de elenco e acabou estreando nas radionovelas da Rádio Nacional. Ao se destacar com sua voz, ambicionou mais e conseguiu figurar num filme em 1950, arranjando em seguida trabalho como atriz no “Teledrama” da TV Paulista, onde ficou até a emissora ser vendida para a TV Globo. Eloísa Mafalda estrelou a primeira “novela das oito” da Globo, “O Ébrio”, em 1965. E já na época não era uma donzela, com 41 anos. Pela idade, acabou se especializando nos papéis de mãe, quase sempre da classe trabalhadora, da qual Dona Nenê é a maior representante. Isto lhe dava enorme identificação com o público alvo da emissora, as então chamadas “donas de casa”, que tinham nas telenovelas seu principal passatempo. Não por acaso, a maioria de seus personagens se chamou “dona”: dona Consolação (“O Astro”, 1977), dona Mariana (“Paraíso”, 1982), dona Pombinha (“Roque Santeiro”, 1985), dona Delfina (“Meu Bem Querer”, 1991), etc. Mas não eram mulheres fracas. E a mais forte de todas dispensava reverências simbólicas, por ser dona de si mesma: a fantástica cafetina Maria Machadão (“Gabriela”, 1975). Versátil, apesar da insistência com que foi escalada como mãezona, também interpretou papel oposto, como a beata Gioconda (“Pedra sobre Pedra, 1992). Sua última novela foi “O Beijo do Vampiro”, de 2001, onde interpretou mais uma dona de sua galeria: Dona Carmem. Os dramaturgos da emissora a amavam e gostariam que ela fosse mãe eterna de seus personagens. Mas Mafalda decidiu por conta própria se aposentar, porque já na época da última novela encontrava dificuldades para decorar os textos, lutando contra a perda de memória. Mesmo assim, acabou convencida a fazer um curta em 2010 pelo ator (e diretor da obra) Giancarlo Di Tommaso, “Obrigada!”, em que aparecia numa cadeira de rodas. Foi seu último trabalho. Ela fez poucos filmes, embora tenha começado a carreira cinematográfica em 1950, como figurante de “Somos Dois”. Outros trabalhos incluem participações nas antologias “Os Mansos” (1976) e “O Ibraim do Subúrbio” (1976), nos dramas “O Mau-Caráter” (1974), de Jece Valadão, e “Beijo 2348/72” (1990), de Walter Rogério, e na comédia infantil “Simão, o Fantasma Trapalhão” (1998), escrita e estrelada por Renato Aragão. Foram muitos papéis, mas ela será sempre lembrada como a Dona Nenê, personagem que virou título até de música dos Titãs. Dona Nenê foi a mãe que simbolizou as famílias brasileiras no pior momento do país, entre 1972 e 1975, fazendo de tudo para manter todos unidos contra as inúmeras adversidades, como crises financeiras e de relacionamento, num Brasil de inflação desenfreada, censura e repressão. Bem diferente do país do remake, que até chegou colorido, quando lançado em 2001.

