Reynaldo Boury, diretor mais importante da TV brasileira, morre aos 90 anos
O veterano diretor de novelas Reynaldo Boury morreu neste domingo (25/12), dia de Natal, aos 90 anos. A notícia foi anunciada por sua filha, a novelista Margareth Boury. Diretor que disputa com Daniel Filho o título de mais importante da TV brasileira, Boury foi revolucionário, responsável por clássicos como “Irmãos Coragem” e “Selva de Pedra”, além da série “Sítio do Picapau Amarelo” na Globo, sem esquecer os maiores sucessos da História do SBT. Ele começou a carreira como fotógrafo, clicando atores na TV Tupi, para que pudessem se ver em cena nos teleteatros ao vivo, no começo da TV – quando ainda não havia videotape. Em pouco tempo, trocou esse emprego pelo de cameraman. Foi nessa função que assinou contrato com a TV Excelsior, onde iniciou sua trajetória atrás da câmera de “A Outra Face de Anita” (1964). Na Excelsior, Boury participou da implantação das primeiras novelas diárias no país, virou diretor e ainda dirigiu a maior quantidade de episódios de uma mesma novela na TV brasileira: “Redenção” (1966), que durou 596 capítulos. Ele quase quebrou seu recorde muitas décadas depois, ao gravar 523 episódios de “Chiquititas” – a maior novela de todos os tempos, com mais de 800 episódios. Com o fechamento da Excelsior, o diretor foi contratado pela Globo em 1970 e colocado à frente do projeto mais ousado da emissora até aquele momento: “Irmãos Coragem”, de Janete Clair, que marcou a teledramaturgia com sua história de aventura, romance e barbárie no garimpo, em clima de Velho Oeste. Os papéis principais, como os irmãos do título, consagraram os atores Tarcisio Meira, Claudio Marzo e Cláudio Cavalcanti. Boury também foi responsável por “Minha Doce Namorada” (1971), que rendeu o apelido de “namoradinha do Brasil” a Regina Duarte, e “Selva de Pedra” (1972), primeira novela da História a atingir 100% de audiência, segundo medição da época. Após a consagração no horário nobre das novelas, ele ajudou a estabelecer a faixa das 18h da Globo, assinando “Bicho do Mato” (1972) e “A Patota” (1973), respectivamente segunda e terceira novela exibidas na nova linha de programação. Em seguida, assumiu o controle das produções das 19h, começando por “Supermanoela” (1974), que projetou Marília Pêra no papel-título, e pela hilária “Corrida do Ouro” (1975), que encontrou o tom de humor da faixa. Nessa pegada, fez igualmente “Chega Mais” e “Plumas & Paetês” (ambas em 1980). O diretor também foi pioneiro da dramaturgia infantil da Globo, com o lançamento da série “Shazan, Xerife & Cia.” em 1972, seguida pelo grande sucesso do “Sítio do Picapau Amarelo” em 1977. Na Globo, ainda comandou o programa Caso Verdade (1982-1986), a premiada minissérie “O Primo Basílio” (1988) e novelas das oito famosas como “Sol de Verão” (1982), “Tieta” (1989), “Meu Bem, Mel Mal” (1990) e o remake de “Irmãos Coragem” (1995). Apesar dessa trajetória, acabou na geladeira da emissora, de onde saiu para reinventar sua carreira com novos feitos históricos, a começar pela direção da primeira novela da TV angolana, “Minha Terra, Minha Mãe”, em 2009. Em 2011, assinou com o SBT para comandar “Amor e Revolução”, e mais uma vez fez História, ao gravar o primeiro beijo gay de uma novela brasileira. No ano seguinte, assumiu a direção de dramaturgia da emissora e transformou o SBT numa fábrica de sucessos infantis, assinando mais de 1,5 mil capítulos entre as produções de “Carrossel” (2012-2013), “Chiquititas” (2013-2015), “Cúmplices de um Resgate” (2015-2016) e “As Aventuras de Poliana” (2018-2020), seu último trabalho. Intérprete de Poliana, a atriz Sophia Valverde publicou um longo texto nas redes sociais, emocionada com a morte do diretor, com quem criou uma relação muito próxima. “Eu amava ele porque ele era um diretor incrível, uma pessoa maravilhosa, estava sempre pronto a me escutar quando eu precisasse e me ensinou muito! No nosso último encontro, que foi na pizzaria, ele me fez chorar com as palavras que disse pra mim, sempre com muito carinho, ele me orientava para tentar sempre ser uma atriz melhor”, declarou ela. Larissa Manoela também celebrou a parceria com o diretor nas redes. “Grande mestre! Meu diretor de 3 das novelas que fiz. Seu legado será mantido, seus ensinamentos levados adiante e toda sua genialidade guardada em minha memória porque só quem teve a honra de ser dirigida por Reynaldo Boury sabe o quanto ele realmente era genial”, disse.
Maria Lúcia Dahl (1941-2022)
A atriz Maria Lúcia Dahl, que marcou época no cinema brasileiro, morreu nesta quinta (16/6) no Rio de Janeiro, de causa não informada aos 80 anos. Ela sofria de Alzheimer e estava internada no Retiro dos Artistas desde o início de 2020. Carioca, filha de família tradicional, ela conheceu seu primeiro marido quando morava na Itália – o cineasta Gustavo Dahl, com quem compartilhava o amor pelo cinema. A educação nas melhores escolas também a levou a querer trabalhar com Cultura, abrindo caminho para que se transformasse numa das maiores musas do cinema nacional – e da contracultura brasileira. Ela estreou nas telas em “Bahia de Todos os Santos”, drama de 1960 dirigido por José Hipolito Trigueirinho Neto, mas só foi repetir a experiência cinco anos depois, no clássico “Menino de Engenho” (1965), de Walter Lima Jr. Depois disso, porém, emendou um filme atrás do outro, cruzando as fronteiras entre o Cinema Novo, o Cinema Marginal e o cinema comercial. Para ficar só nos anos 1960, a lista inclui o segundo longa de Cacá Diegues, “A Grande Cidade ou As Aventuras e Desventuras de Luzia e Seus 3 Amigos Chegados de Longe” (1966), o primeiro filme de Daniel Filho, “Pobre Príncipe Encantado” (1969), e os clássicos “Cara a Cara”, de Júlio Bressane, e “Macunaíma” (1969), de Joaquim Pedro de Andrade. Sem esquecer de “O Bravo Guerreiro” (1969), primeira e única vez em que foi dirigida pelo marido, Gustavo Dahl. Vivendo tudo o que tinha direito na era das grandes loucuras, experimentou um casamento aberto, que acabou em divórcio no fim dos anos 1960, quando se apaixonou pelo líder estudantil Marcos Medeiros. Junto do segundo marido, acabou se engajando no movimento contra a ditadura militar, sofreu ameaças e fugiu do país com a ajuda da irmã, hoje figurinista da Globo, Marilia Carneiro. Ela viveu exilada em Paris, onde teve a filha Joana, que criou sozinha. Por volta dessa época, a morte do pai fez a família perder a estabilidade financeira, o que a a trouxe de volta ao Brasil em meados nos anos 1970, buscando retomar a carreira na televisão. Passando a dividir a tela grande com a tela da Globo, participou de novelas como “O Espigão” (1974), “Gabriela” (1975), “Espelho Mágico” (1977) e “Dancin’ Days” (1978), a primeira produção das oito de Gilberto Braga, com quem depois desenvolveu uma parceria bem-sucedida em novo formato. Ao mesmo tempo, consolidou-se como símbolo sexual da era das pornochanchadas, emendando produções de títulos bastante sugestivos – de “Deixa, Amorzinho… Deixa” (1975) a “O Gosto do Pecado” (1980), com destaque para “A Árvore do Sexo” (1977) e “Mulher Objeto” (1981), ambos dirigidos por Silvio de Abreu (hoje mais conhecido por suas novelas). Na década passada, a revista TPM lembrou que ela foi a única mulher capaz de circular com a mesma desenvoltura entre o clubes privados da elite carioca e os estúdios da pornochanchada. Filmes mais tradicionais também não faltaram no período, como “Um Homem Célebre” (1974), de Miguel Faria Jr., e “Guerra Conjugal” (1975), de Joaquim Pedro de Andrade, além da parceria com Antônio Calmon, iniciada em 1977 com “Revólver de Brinquedo”. Os dois trabalharam juntos em cinco filmes consecutivos no curto espaço de dois anos – até “Eu Matei Lúcio Flávio” (1979). Mas por volta da consagração de “Eu Te Amo” (1981), de Arnaldo Jabor, o cinema nacional entrou em crise, levando-a fortalecer sua presença na TV. Ela fez principalmente novelas leves com tons de humor, como “Ti Ti Ti” (1985), “Cambalacho” (1986), “Bambolê” (1987), “Salsa e Merengue” (1996) e “Aquele Beijo” (2006). A exceção foi sua única novela das oito, “Torre de Babel” (1998), numa participação especial para o velho parceiro Silvio de Abreu. A atriz também integrou o elenco das minisséries mais famosas de Gilberto Braga: “Anos Dourados” (1986), “O Primo Basílio” (1988) e “Anos Rebeldes” (1992). A partir da retomada do cinema brasileiro em meados dos anos 1990, Maria Lúcia retomou sua primeira paixão, aumentando sua filmografia com “Veja Esta Canção” (1994), de Cacá Diegues, “Quem Matou Pixote?” (1995), de José Joffily, e outros, até “O Gerente” (2011), do veterano Paulo César Saraceni. Na fase final de sua carreira, ainda demonstrou novos talentos, assinando o roteiro de “Vendo ou Alugo” (2013), comédia dirigida por Betse de Paula, que lhe rendeu o prêmio de melhor roteirista no Festival Cine-PE. Por sinal, ela também escreveu cinco livros e manteve uma coluna no antigo Jornal do Brasil por 20 anos. Sua última aparição nas telas foi no documentário “Marcos Medeiros Codinome Vampiro” (2018) sobre seu segundo marido. Marcos Medeiros foi preso, torturado e exilado na Europa, onde iniciou uma carreira como curtametragista de vanguarda (e roteirista do clássico documentário de Glauber Rocha “História do Brasil”), antes de falecer em 1997, após uma longa internação no Pinel. Maria Lúcia Dahl teve com ele sua única filha, Joana Medeiros, também atriz. E foi com ela que fez um dos ensaios nus mais famosos da Playboy brasileira, em 1985. Detalhe: Joana tinha apenas 14 anos.
Gilberto Braga (1945-2021)
Gilberto Braga, um dos mais importantes autores de novelas do Brasil, morreu nesta terça-feira (26/10). O escritor, que completaria 76 anos na próxima segunda-feira, estava internado no Hospital Copa Star, no Rio de Janeiro, onde enfrentava uma infecção sistêmica após uma perfuração do esôfago – lesão apontada como causa da morte. Casado com o decorador Edgar Moura Brasil, o autor também sofria do Mal de Alzheimer. Braga escreveu mais de 20 novelas, especializando-se em apresentar tramas de assassinato misterioso, que precisava ser resolvido nos últimos capítulos. Ele foi o primeiro teledramaturgo autêntico do Brasil, o primeiro autor brasileiro formado exclusivamente na televisão – jamais escreveu para teatro – , e fez sua trajetória praticamente inteira na rede Globo, iniciando com tramas do “Caso Especial” (antologia de teledramas) em 1972. Em toda a carreira, ele só fez uma obra fora da Globo, o roteiro do filme “Fim de Festa”, dirigido por Paulo Porto em 1978. A especialização em novelas aconteceu por acaso e sob pressão. Após entregar o quinto roteiro de “Caso Especial”, foi convencido pelo diretor Daniel Filho, na época responsável pela dramaturgia da Globo, a escrever seu primeiro folhetim em 1974, em parceria com o já experiente Lauro César Muniz. O resultado foi a novela “Corrida do Ouro”, desenvolvida para o horário das 19h “aos trancos e barrancos”, como ele próprio descreveu em entrevista à sua irmã historiadora Rosa Maria Araujo, num especial sobre os 70 da televisão do jornal O Globo. Em seguida, recebeu de Daniel Filho a missão de preencher o novo horário de novelas da emissora às 18h, inaugurando a fase áurea de adaptações de romances históricos com “Helena”, de Machado de Assis, em 1975. No mesmo ano, ainda escreveu a adaptação de “Senhora”, de José de Alencar, antes de criar seu primeiro fenômeno de audiência. Estrelada por Lucélia Santos, “Escrava Isaura” marcou época. A versão televisiva do romance de Bernardo Guimarães tornou-se a novela das 18h mais famosa de todos os tempos, ampliando sua popularidade com a passagem do tempo, graças a várias reprises. A produção também virou o primeiro grande produto de exportação da Globo, numa época em que a emissora carioca mal tinha planos de expansão internacional. Foi exibida até na China. Depois de despedir-se das 18h com “Dona Xepa” (1977), outro sucesso, foi direto, sem escalas, para o horário nobre, assinando sua primeira novela das 20h: o estouro “Dancin’ Days” em 1978. O melodrama, que combinava vida noturna moderna e drama existencial de uma ex-presidiária, foi a primeira novela urbana de Sonia Braga, fez deslanchar a carreira da adolescente Gloria Pires e contou com uma das melhores brigas femininas da história da TV brasileira (entre Sonia Braga e Joana Fomm), sem esquecer que lançou moda, vendeu muitos discos e ajudou a popularizar as discotecas no país. O autor continuou a fazer sucesso em “Água Viva” (1978), na qual inaugurou sua mania de mistérios criminais, lançando o bordão “Quem matou Miguel Fragonard?” (Raul Cortez), além de ter sido responsável por introduzir em “Brilhante” (1980) o primeiro protagonista homossexual (então no armário) da teledramaturgia nacional, vivido por Dennis Carvalho. Mais: com “Corpo a Corpo” e a genial atriz Zezé Motta, assinou mais um divisor de águas, transformando racismo em tema de novela em 1984. Entre tantas novelas, Braga ainda teve tempo para revolucionar as minisséries com sua primeira incursão no gênero, a romântica e nostálgica “Anos Dourados”, que fez o país se apaixonar por Malu Mader em 1986, seguida pela produção de “O Primo Basílio”, adaptação primorosa do romance histórico de Eça de Queirós. Revigorado pelas minisséries, ele voltou com tudo às narrativas longas. E dez anos depois de eletrizar o público com “Dancin’ Days”, parou o Brasil com “Vale Tudo” (1988). A trama de mau-caratismo consagrou a jovem adulta Gloria Pires como a malvadinha Maria de Fátima, eternizou a diva Beatriz Segall como a vilã das vilãs, Odete Roitman, e terminou quebrando todos os recordes de audiência, graças ao mistério de “Quem matou Odete Roitman”. Ironicamente, foi quando se achou o dono do mundo, em que nada que escrevia parecia falhar, que Braga amargou seu maior – talvez o único – dissabor, com a rejeição do público à trama de “O Dono do Mundo” (1991). A novela enfrentou vários protestos por sua premissa, em que Antonio Fagundes apostava ser capaz de tirar a virgindade de Malu Mader. A intenção era discutir ética. Mas o público se assustou. A ironia é que, dois anos depois, o mesmo público foi lotar os cinemas para ver uma parábola moral similar, só que made in Hollywood, no filme americano “Proposta Indecente”. O autor se vingou com a minissérie “Anos Rebeldes” (1992), retratando a resistência à ditadura, então ainda recente, com cenas de tortura para sacudir o público. A série acabou projetando Cláudia Abreu, que depois faria o melhor papel da carreira na melhor novela de Braga, “Celebridade”, em 2003. Juntando suas estrelas de “Anos Dourados” e “Anos Rebeldes”, Braga mostrou um novo “Vale Tudo” na era do culto às celebridades e com direito até a um “quem matou Lineu?” (Hugo Carvana). Só que, diferente dos anos 1980, pela primeira vez controlou todos os aspectos da obra, da escalação do elenco à trilha sonora. Por isso, dizia que “Celebridade” era sua novela favorita. Entre outras novelas, ainda se consagrou com “Paraíso Tropical” (2008), que também é lembrada por seus vilões – Bebel e Olavo, vividos por Camila Pitanga e Wagner Moura. A obra recebeu indicação ao Emmy Internacional. Ele continuou a escrever novelas até 2015, quando assinou “Babilônia”, mas a doença o tirou da TV. Nos últimos anos, tornou-se recluso. Mesmo assim, tinha planos. Na entrevista à irmã, publicada em 2020 em O Globo, disse que estava aproveitando a quarentena da pandemia para realizar com colaboradores uma adaptação do clássico britânico “Feira das Vaidades”, de William Makepeace Thackeray, passada no Rio de Janeiro dos anos 1920.
Ben Kingsley vai estrelar e produzir adaptação internacional de O Primo Basílio para a TV
O ator britânico Ben Kingsley vai adaptar para a TV o romance português clássico “O Primo Basílio”, de Eça de Queirós, publicado em 1878. Segundo o site Deadline, Kingsley vai produzir e também terá um papel de destaque na minissérie, interpretando o pseudo-intelectual Conselheiro Acácio. A atração será coproduzida pelas empresas Lavender Pictures, de Kingsley, e a Nevision. Ainda não há emissora ligada ao projeto. No romance, Eça de Queirós investiga a aparente perfeição de um lar burguês na Portugal do século 19 a partir, acompanhando uma dona de casa entediada, Luisa, e o caso que mantém com seu primo, o Basílio do título. Mas o caso desperta suspeitas, e quando uma de suas empregadas descobre provas, começa a chantagear a patroa, que adoece de preocupação, com medo que seu marido descubra tudo. A história já teve várias adaptações. A mais antiga é da época do cinema mudo, uma produção portuguesa de 1923. Mas o romance também foi encenada no Brasil, numa minissérie da Globo de 1988 e numa versão cinematográfica dirigida por Daniel Filho em 2007.



