Walter Bernstein (1919 – 2021)
O roteirista Walter Bernstein, que transformou sua amarga experiência na lista negra de Hollywood na comédia “Testa-de-Ferro por Acaso”, morreu na sexta-feira (22/1) aos 101 anos. Nascido no Brooklyn, em Nova York, Bernstein ingressou no Partido Comunista enquanto estudava na universidade de Dartmouth, e esse ímpeto estudantil acabou lhe custando perseguição política e desemprego, mesmo tendo servido, de forma patriótica, no Exército dos Estados Unidos durante a 2ª Guerra Mundial. Depois de escrever um livro sobre suas aventuras na guerra, “Keep Your Head Down”, ele resolveu seguir para Hollywood, onde ajudou na adaptação do clássico noir “Amei um Assassino” (1948). Mas ao mesmo tempo o senador Joseph McCarthy e o Comitê de Atividades Não Americanas da Câmara estavam iniciando uma caça às bruxas para erradicar os comunistas do showbusiness, que atropelaria a carreira nascente do jovem roteirista. “Eu estava escrevendo uma série para a CBS, chamada ‘Danger’, escrevendo muito feliz para eles”, disse o roteirista numa entrevista ao site The Hollywood Reporter. “Até que, um dia, o produtor Charles Russell me disse: ‘Há um problema aqui, você tem que colocar outro nome no roteiro. Eu não sei [o que está acontecendo], eles me disseram lá em cima que não podem usar mais você.” O nome de Bernstein apareceu na lista negra, num boletim com nomes de supostos comunistas que trabalhavam em Hollywood, no verão de 1950. A única maneira de continuar sua carreira seria trair os colegas, testemunhar e apontar outros esquerdistas de Hollywood. Mas ele se recusou. Para sua sorte, o produtor de “Danger” e alguns de seus diretores, como o futuro cineasta Sidney Lumet, decidiram arriscar suas próprias carreiras para lhe oferecer uma saída. Eles permitiram que ele continuasse escrevendo secretamente com um pseudônimo. Um dos produtores da série – e outro futuro cineasta – Martin Ritt também foi mantido na atração desta forma. Charles Russell, inclusive, convidou Bernstein a escrever para outro programa, o jornalístico “You Are There”, apresentado pelo mais famoso telejornalista dos EUA, Walter Cronkite. E assim Bernstein sobreviveu ao desemprego nos anos 1950. Da mesma forma, ele desenvolveu roteiros de filmes sem receber créditos, incluindo o famosíssimo western “Sete Homens e um Destino” (1960). Até que Sidney Lumet resolveu acabar com aquele absurdo. O diretor convenceu o produtor italiano Carlo Ponti que Bernstein era o melhor roteirista para um filme que ele faria com Sofia Loren, “Mulher Daquela Espécie”. Sem se importar com política americana, Ponti autorizou a contratação e os créditos, acabando com o bloqueio da lista negra em 1959. Meses depois, Kirk Douglas fez o mesmo em “Spartacus”, revelando o nome do roteirista Dalton Trumbo, e uma página vergonhosa de cerceamento de direitos e perseguição às liberdades foi superada nos EUA. Livre para trabalhar, Bernstein fez parceria com o colega de lista negra Martin Ritt em “Paris Vive à Noite” (1961), uma ode ao jazz estrelada por Paul Newman, Joanne Woodward e Sidney Poitier. E entregou um de seus melhores roteiros para Sidney Lumet a seguir, “Limite de Segurança” (1964), clássico sobre o perigo nuclear da Guerra Fria, com Henry Fonda no papel de presidente dos EUA. Depois, escreveu o thriller de ação “O Trem” (1964), dirigido por John Frankenheimer, com quem também tinha trabalhado de forma incógnita na série “Danger”. E foi arriscar com Ritt um tema abertamente comunista em “Ver-te-ei no Inferno” (1970), estrelado por Sean Connery, sobre mineiros do século 19 em luta por melhores condições de trabalho. A parceria dos dois ex-integrantes da lista negra chegou ao auge em “Testa-de-Ferro por Acaso” (1976), no qual decidiram contar suas experiências durante o período da caça às bruxas. O filme ainda juntou ao grupo Zero Mostel, ator que sofreu a mesma perseguição política e sentiu o desemprego na pele – algumas das histórias que seu personagem vive, Mostel viveu na vida real. O plano original era apresentar o longa como uma grande tragédia, usando elementos da história de Philip Loeb, um ator na lista negra que cometeu suicídio após ser banido da indústria. Mas os executivos da Columbia Pictures acharam alguns trechos engraçados e decidiram que o filme funcionaria melhor como comédia. Para tanto, sondaram Woody Allen para o papel principal e ele surpreendentemente aceitou, tornando o filme um raro projeto que Allen estrelou sem escrever ou dirigir durante sua ascensão como autor – que lhe daria o Oscar um ano depois. “Testa-de-Ferro por Acaso” foi aclamado pela crítica e rendeu a Bernstein sua única indicação ao Oscar de Melhor Roteiro. O filme também foi indicado ao prêmio do Sindicato dos Roteiristas, assim como o trabalho seguinte do escritor, a comédia “A Disputa dos Sexos” (1977), estrelada por Burt Reynolds. Além disso, Woody Allen gostou tanto do texto de Bernstein que decidiu homenageá-lo, convidando-o a fazer uma participação especial em “Noivo Neurótico, Noiva Nervosa” (1977), grande vencedor do Oscar 1978. Bernstein ainda adaptou o drama de guerra “Os Yankees Estão Voltando” (1979) para o diretor John Schlesinger, antes de decidir dirigir seu próprio filme, a comédia infantil “A Garotinha que Caiu do Céu” (1980). Entretanto, sua carreira cinematográfica não passou dos anos 1980, encerrando-se com o suspense neo-noir “Pesadelo na Rua Carroll” (1987), novamente sobre a lista negra, e a comédia besteirol “Uma Alucinante Viagem” (1988), com Dan Aykroyd e Walter Matthau. Mas ele não se aposentou. Passou a dar aulas de roteiro em três universidades distintas e continuou trabalhando para a TV até ultrapassar os 90 anos de idade. O roteirista voltou a dirigir (o telefilme “Homens e Mulheres 2 – Um Jogo de Sedução”, de 1991), foi indicado ao Emmy (pelo roteiro de “Miss Evers’ Boys”, de 1997) e até criou uma série (“Hidden”, em 2011 no Reino Unido). Sua despedida das telas, porém, foi diante das câmeras. Ele atuou pela segunda vez na vida em “Indignação” (2016), de James Schamus, com 97 anos.
Atriz de Ozark será assistente de Weinstein no primeiro filme sobre o escândalo sexual do produtor
A atriz Julia Garner, que trabalhou em “The Americans” e está atualmente na série “Ozark”, vai interpretar uma das assistentes de Harvey Weinstein no primeiro filme de ficção sobre as denúncias de assédio sexual contra o produtor. Ainda sem título, o filme tem direção de Kitty Green (“Quem é JonBenet”), que passou mais de um ano analisando documentações das denúncias de assédio contra Weinstein e entrevistando pessoas envolvidas nos casos. Diversas assistentes foram citadas em denúncias de assédio contra o produtor – em alguns casos, elas levavam as mulheres que seriam abusadas por Weinsten até os quartos de hotel onde tudo aconteceria. Em comunicado, o produtor James Schamus explicou o projeto: “Kitty Green entende que o exercício de poder burocrático corporativo, tão frequentemente estruturado contra as mulheres e mobilizado contra uma força de trabalho vulnerável, é um tipo diferente de terror. Para entender completamente as predações de Harvey Weinstein, precisamos conhecer o cenário que possibilitou que elas continuassem acontecendo”. A produção ainda não tem previsão de estreia
Indignação é um belo filme sobre a juventude
James Schamus é um produtor de bom gosto, que trabalhou diversas vezes com Ang Lee e talvez por isso tenha herdado uma sensibilidade especial, de modo a conseguir um resultado muito bom em sua estreia como diretor. Sua principal opção estética ao filmar “Indignação” foram sequências longas, ainda que com muito uso de campo e contracampo, para que dar conta do texto denso de Philip Roth (“Revelações”), autor do romance homônimo lançado em 2008, que serve de base para a trama. A história se passa durante o período de juventude do escritor, na década de 1950, mais especificamente no ano de 1951, quando explodia a Guerra da Coreia e antes do nascimento oficial do rock’n’roll, que se manifestaria como uma forma de extravasar a energia e a intensidade daquela geração. O personagem principal, o jovem Marcus (Logan Lerman, de “As Vantagens de Ser Invisível”), é um garoto bom e aparentemente muito centrado e correto. Mas há algo nele que o deixa particularmente irritado com as regras impostas pela sociedade. E é interessante esse aspecto, pois, por mais que convide o espectador a assumir seu ponto de vista, especialmente a cada cena positiva entre ele e Sarah Gadon (da minissérie “11.22.63”), o filme não o torna dono da verdade. É possível questioná-lo sempre, por mais que a sabatina com o reitor da universidade (grande momento de Tracy Letts) seja um tanto desnorteadora. A trama se inicia nos últimos dias de Marcus com sua família em New Jersey, antes dele passar a morar na universidade de Winesburg, em Ohio. É lá que percebemos sua dificuldade (ou má vontade) de socialização, por mais que, inicialmente, tenha simpatizado com seus dois colegas de quarto. Sua intenção ali é essencialmente estudar. Quem acaba fazendo com que mude de ideia é a bela e aparentemente recatada Olivia Hutton (Gadon), cujo nome ele recita em voice-over com ar respeitoso, de modo a torná-la, desde o primeiro instante, especial. O tímido e inexperiente Marcus resolve convidá-la para sair. E o resultado do primeiro encontro é inesquecível. Tanto que o rapaz, com aquela mentalidade tão conservadora do início dos anos 1950, não sabe como lidar com o comportamento mais ousado daquela moça, que, para nós, espectadores, é uma promessa de felicidade, algo a não se deixar escapar. Tudo bem que Olivia Hutton é uma garota complexa – tem um histórico de problemas mentais em uma instituição psiquiátrica –, mas sua doçura, beleza e encantamento compensam tudo isso. Schamus sabe muito bem quando inserir as poucas intervenções narrativas extraídas do livro de Roth e quando utilizar apenas imagens para compor seu filme, que nos leva junto do protagonista. O trabalho de direção de atores, o cuidado com a montagem das cenas, especialmente as mais longas e tensas (ou intensas), além dos belos enquadramentos em scope, fazem de “Indignação” um dos melhores filmes de estreia dos últimos anos, provavelmente por sua capacidade de criar identificação com esse momento tão conturbado e ao mesmo tempo tão mágico, que é a juventude e seus encantos e dissabores.
Vida da família de Karl Marx vai virar série épica
A vida do pai do comunismo vai virar produto premium do capitalismo. O produtor James Schamus, que estreou como diretor este ano, no longa “Indignação”, fechou parcerias europeias para desenvolver “Love and Capital”, uma série épica, baseada na biografia homônima de Mary Gabriel, sobre a família de Karl Marx. A série será desenvolvida pela roteirista Alice Birch (“Lady Macbeth”) e gravada na Europa, narrando a vida real do filósofo alemão, suas lutas ao lado do parceiro Friedrich Engels, e seu relacionamento com a esposa Jenny, suas três filhas extraordinárias, Jennychen, Laura e Eleanor, e as duas mulheres de Engels, as irmãs irlandesas Mary e Lizzie Burns. Em comunicado, Schamus afirma que a produção vai mostrar como as vidas dessas pessoas foram agitadas no século 19, repletas de casos ilícitos, tramas revolucionárias, pactos suicidas, fugas à meia-noite, de um luxo aristocrático e de uma pobreza digna dos romances de Dickens, tendo como pano de fundo um mundo em chamas e a formação de ideias que transformariam a sociedade dos séculos seguintes. Publicado em 2011, “Love and Capital” foi resultado de anos de pesquisa junto à família Marx, sendo indicado a vários prêmios, inclusive o Pulitzer. Marx é bastante conhecido por suas teorias sobre a sociedade, economia e política – o chamado marxismo – , mas sua vida privada nunca foi muito comentada. E um detalhe interessante no livro de Mary Gabriel é que ele privilegia o olhar das muitas mulheres que acompanharam Marx e Engels em sua jornada. “Ao permitir-nos experimentar esta extraordinária história através dos olhos das mulheres que viveram isso, Mary Gabriel nos permite, pela primeira vez, sentir todo o drama humano do homem que desafiou o nosso mundo”, escreveu Schamus. “Esta série será um evento televisivo e um tema perfeito para uma produção de grande escala europeia com parceiros de tremenda distinção e gosto”. A produção também será a primeira incursão da Symbolic Exchange, empresa do ex-CEO da Focus Features, no mercado televisivo. Para esse negócio, ele se associou à X-Filme Creative Pool, uma produtora alemã que tem entre seus sócios os diretores Wolfgang Becker (“Adeus, Lenin!”) e Tom Tykwer (“A Viagem”), à francesa Haut et Court, que produziu a série britânica “The Last Panthers”, e à britânica Potboiler, responsável pelas adaptações recentes de John Le Carré, como “O Jardineiro Fiel” (2005), “O Homem Mais Procurado” (2014) e “Nosso Fiel Traidor” (2016).
Indignação: Logan Lerman sofre por amor e repressão em trailer legendado de drama de época
A Sony divulgou 18 fotos, o pôster e o trailer legendado de “Indignação”, drama de época baseado no livro homônimo de Philip Roth (“Revelações”), que marca a estreia na direção do roteirista e produtor James Schamus, grande parceiro do cineasta Ang Lee em filmes como “O Tigre e o Dragão” (2000), “O Segredo de Brokeback Mountain” (2005), “Desejo e Perigo” (2007) e “Aconteceu em Woodstock” (2009). A prévia destaca um clima sufocante e uma interpretação contida, porém surpreendente, do jovem Logan Lerman (“Corações de Ferro”). A trama se passa em 1951, quando Marcus (Lerman), um jovem judeu de Nova Jersey, ingressa na Universidade Winesburg, em Ohio. Entre novas experiências, Marcus terá que lidar com o conservadorismo na faculdade, além de anti-semitismo e forte repressão sexual, que afetará seu relacionamento com uma jovem. O elenco também destaca Sarah Gadon (“Drácula: A História Nunca Contada”) e Tracy Letts (série “Homeland”). Além de dirigir o longa, James Schamus assina o roteiro, que é a segunda adaptação de Philip Roth com lançamento marcado para o fim do ano – a outra é “Pastoral Americana”. Exibido nos festivais de Sundance e do Rio, “Indignação” chega aos cinemas brasileiros no dia 3 de novembro de 2016.




