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    Ovelha Negra explora as peculiaridades da vida na Islândia

    20 de fevereiro de 2016 /

    Na Islândia, um país nórdico de baixa densidade populacional, há mais carneiros e ovelhas do que gente. São cerca de 800 mil desses animais, para um contingente populacional de 320 mil pessoas. Compreensível, portanto, que “Ovelha Negra” construa sua narrativa em torno desse relacionamento dos seres humanos com os animais. Os irmãos Gummi (Sigurour Sigurjónsson) e Kiddi (Theodór Júlíusson) criam e cuidam de rebanhos de ovelhas e disputam entre si não só os prêmios anuais para os melhores espécimes, mas o próprio espaço comum que herdaram dos pais. E o mais incrível: não se falam há 40 anos. O meio de contato, quando necessário, é um cachorro que serve de mensageiro. A Islândia tem vulcões e água quente disponível em grandes proporções, mas tem um clima muito frio, em que a neve abunda e as paisagens dominadas por montanhas glaciais encantam. A terceira maior geleira do mundo se encontra lá. As geleiras ocupam 15% do seu território. Muito apropriado que no filme “Ovelha Negra” terríveis nevascas entrem na história e, de quando em quando, alguém tenha de ser socorrido em meio à forte neve, antes de que congele. Grandes espaços se abrem para serem enquadrados pelas câmeras numa região de fazendas agrícolas, nos arredores das montanhas nevadas. Tudo muito bonito e tão convincente que dá para sentir o frio dentro do cinema, mesmo acabando de passar por uma temperatura de mais de 30 graus lá fora. Claro que o cinema tem ar condicionado, mas é mais do que um simples refresco o que se sente diante das imagens cobertas de gelo que ocupam a telona. Tudo isso pode ser interessante e exótico, mas o filme do diretor Grímur Hákonarson, vencedor da mostra Um Certo Olhar do Festival de Cannes 2015, vai muito além. Ele nos coloca diante do problema da difícil convivência humana, que pode comprometer relações fraternas, da competitividade, do orgulho ferido, da complexa teia de comportamentos que avançam e retrocedem no afeto que as envolve, na solidariedade, a necessária e a possível, no desmoronar de barreiras aparentemente indestrutíveis. É um filme humanista e sensível, cercado de uma natureza exuberante e muito branca, em belos enquadramentos, e com ovelhas por todos os lados, brancas ou negras. Conta com dois atores veteranos como protagonistas, que conduzem com muita força e dedicação seus personagens.

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    Hilário e irresponsável, Deadpool é o filme de super-herói que a Disney jamais faria

    12 de fevereiro de 2016 /

    Lá nos idos de 2008, a Marvel apresentou, com “Homem de Ferro”, uma fórmula de muita cor e humor em contraposição ao sombrio mundo do Batman e X-Men, e que acabou se tornando a regra do sucesso em termos de filmes de super-herói. E se “Guardiões da Galáxia” (2014) elevou o humor despretensioso à categoria da zoeira sem limites, “Deadpool” leva a fórmula audaciosamente onde a Disney jamais esteve (e dificilmente estará algum dia). A adaptação do herói criado em 1991 por Fabian Nicieza e Rob Liefeld é a evolução natural da fórmula Marvel (apesar da produção ser da Fox, o personagem nos quadrinhos é da Marvel e seu filme só existe como resposta às produções da Marvel): muita ação, muito humor, personagens principais que não se machucam de verdade e… sangue, decapitação, nudez, palavrões, sexo, piadas de humor duvidoso, drogas e rock’n’roll – e um pouco de Wham!. A estreia em longas do diretor Tim Miller capta muito bem as origens do anti-herói criado numa época em que o que parecia importar mais nos quadrinhos era o estilo acima do conteúdo: a história de Wade Wilson e como ele se torna Deadpool está lá apenas como base para o filme abusar da metalinguagem com muito bom humor. Ryan Reynolds se redime de “Lanterna Verde” (2013), “Blade 3” (2004), “X-Men Origens: Wolverine” (2009) e todas aquelas suas comédias românticas (acredite, há referências a tudo isso) carregando o filme com carisma e sabendo rir de si mesmo e de sua situação enquanto astro de um filme de quadrinhos. A Fox parece ter colocado dois X-Men na história apenas para garantir uma marca conhecida em uma produção de um personagem pouco conhecido. Não era necessário: Deadpool é o dono da cena e o filme só perde com a entrada dos outros mutantes. O personagem é tão alucinado – uma espécie de Pernalonga para maiores – que causa um estranhamento quando vemos a “Escola Xavier para Jovens” e lembramos que ele deve estar no mesmo universo sombrio dos X-Men. Sua presença neste mundo só funciona porque Wade Wilson tem consciência de estar em um filme e, desta forma, assume a fantasia de que nada precisa fazer muito sentido nesta trama ficcional. É uma estratégia que vem dos quadrinhos do personagem e funciona muito bem na tela do cinema. Embora o clímax decepcione ao se entregar a tudo aquilo que o filme parecia criticar (muitos personagens poderosos, explosões grandiosas) e perca um pouco do ritmo que vinha sendo mantido até então, “Deadpool” se destaca pela originalidade, como uma alternativa bem-vinda ao padronizado universo da Marvel no cinema. É a produção certa no momento certo: um filme de quadrinhos que é como se fosse um meme sobre filmes de quadrinhos. É a zoeira das redes sociais com milhões de dólares de orçamento. Com a boca suja de comentaristas de internet, atitude de youtuber e irresponsabilidade de alguns provedores de conteúdo online, Deadpool é o herói que a atual geração tanto aguardava para idolatrar. E também é divertido pra caramba.

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    O Regresso materializa um espetáculo de sobrevivência visceral

    5 de fevereiro de 2016 /

    Certa vez, Alfred Hitchcock comentou que no cinema se morre facilmente, mas que matar um homem é muito mais complicado e difícil de executar. Exemplificou isso na famosa cena do assassinato no fogão, do filme “Cortina Rasgada”, de 1966. O filme “O Regresso”, um dos mais fortes concorrentes ao Oscar 2016, mostra o personagem Hugh Glass (Leonardo DiCaprio) com sete vidas, ou seja, sobrevivendo a tudo, ao impossível, ao inimaginável. O regresso do título se refere ao retorno à vida após a morte iminente, decretada, com direito até à cova e à terra por cima do corpo. Sobreviver significa uma luta sem tréguas, uma tenacidade, uma disposição de espírito invejável, nas condições mais adversas. Trata-se, na narrativa, de um explorador/caçador nas florestas selvagens norte-americanas, convivendo com exploradores rivais e suas armas de fogo, grupos indígenas e suas flechas, com um inverno cruel, de tão rigoroso, e com os animais na selva, ursos, entre eles. E, claro, com a cobiça e a competitividade humanas, em seus aspectos mais agressivos. É uma aventura épica de sobrevivência das mais incríveis e viscerais. Mostrada com muita técnica e efeitos especiais, mas de forma realista, informando que se baseia em fatos reais – inclusive já filmada anteriormente, no longa “Fúria Selvagem” (1971). Não se assemelha às habituais batalhas ao estilo videogame, em que a morte nunca parece uma questão real e possível de alcançar o herói. Aqui, não, o protagonista está em risco de vida o tempo inteiro. Destruído, semimorto ou renascendo das cinzas. É uma trama intensa, sofrida, violenta e, também, sangrenta. Trata-se, porém, de um filme magnificamente bem realizado, espetaculares movimentos de câmera exploram uma locação de grande beleza, que nos possibilitam uma forte imersão nessa selva inóspita, que cheira a morte, com muita ação. A caracterização dos personagens, os figurinos, a maquiagem e um esplêndido trabalho de som, além da música também espetacular, do conhecido talento de Ryuchi Sakamoto (“Furyo, Em Nome da Honra”), fazem de “O Regresso” um forte espetáculo cinematográfico. Capaz de aproveitar os recursos tecnológicos do cinema atual e de suas salas de exibição contemporâneas. Não por acaso, esse espetáculo foi o que recebeu mais indicações para o Oscar. São 12, vejam só: filme, direção, figurino, fotografia, ator e ator coadjuvante, efeitos especiais, mixagem de som, edição de som, direção de arte, maquiagem e edição. Já recebeu diversos prêmios dos sindicatos de Hollywood, inclusive o de Melhor Ator para Leonardo DiCaprio. Está com tudo, no momento. Será que desta vez o ator leva o Oscar? Bem provável, e será merecido, sem dúvida. Aliás, até já amadureceu demais a sua vez. E o diretor diretor mexicano Alejandro González Iñárritu? Bisará seu Oscar? Ele tem uma carreira de prestígio no cinema norte-americano, pelos grandes filmes que realizou e pelos prêmios já conquistados, a partir de “Amores Brutos”, em 2000, premiado com o BAFTA, indicado ao Oscar de filme estrangeiro, e “21 gramas”, em 2003, “Babel”, em 2006, e especialmente com “Birdman”, que levou no ano passado os principais Oscar, de melhor filme e diretor. Méritos como realização, “O Regresso” tem, especialmente se o olharmos pelo prisma do grande espetáculo. Além disso, não é um filme vazio, é uma celebração da luta pela vida, uma obsessão permanente pela autopreservação. Nossos tempos parecem ser especialmente difíceis e desafiadores para essa luta, com tantas guerras, terrorismo, intolerância religiosa e radicalizações de todos os tipos. É, portanto, bem-vinda essa celebração.

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    Trumbo lembra histeria anticomunista que afligiu Hollywood

    28 de janeiro de 2016 /

    Dalton Trumbo foi um dos mais bem-sucedidos roteiristas da história de Hollywood. Escritor muito talentoso, era capaz de produzir desde histórias banais, com personagens sem sentido, em função de atender às expectativas de lucro fácil dos produtores, a obras elaboradas, sofisticadas, passando por épicos, blockbusters e outros tipos de sucessos populares. Mas filiou-se ao Partido Comunista Americano num período em que, por conta da 2ª Guerra Mundial e suas consequências, muitos acreditavam que poderiam melhorar, transformar o mundo. Ocorre que, no pós-guerra, a paranoia anticomunista atingiu níveis brutais nos Estados Unidos, culminando na Guerra Fria e na política que sustentou as ditaduras da América Latina. Mas tudo começou com um movimento nacional de “caça às bruxas”. A partir de 1947, o chamado Comitê de Atividades Antiamericanas do Congresso dos Estados Unidos voltou sua atenção para Hollywood e pretendeu extirpar de seu meio os que eram denunciados como comunistas. E o fez marcando-os, publicamente, impedindo-os de trabalhar em seu ofício e, em vários casos, encarcerando-os por algum tempo. Foi precisamente o caso do roteirista, cuja história é narrada no filme “Trumbo – A Lista Negra”, dirigido por Jay Roach (“Entrando numa Fria”). O filme procura mostrar quem foi esse personagem, suas relações profissionais e familiares, suas crenças e, sobretudo, a luta que travou para poder trabalhar e viver, dando trabalho a outros talentosos escritores banidos, além de seu permanente combate pelo fim da lista negra. Por mais de uma década, ele atuou clandestinamente, sem poder assinar seus roteiros e, ironicamente, venceu o Oscar por duas vezes, com os filmes “A Princesa e o Plebeu” (1953) e “Arenas Sangrentas” (1957), impedido de aparecer para receber o prêmio, que não estava em seu nome. Só a partir de “Spartacus”, dirigido por Stanley Kubrick, e por iniciativa do ator Kirk Douglas, seu nome pôde voltar a figurar nos créditos. No mesmo ano, em 1960, ele também assinou “Êxodus”, dirigido por Otto Preminger, e a abominável lista caiu por terra. Não está no filme, que vai até 1970, mas um dos mais importantes trabalhos de Dalton Trumbo no cinema foi a adaptação de sua obra literária “Johnny Vai À Guerra”, de 1939, que ele mesmo dirigiu em 1971. Vale a pena complementar a sessão, pois se trata de um dos mais importantes filmes sobre guerra já feitos. “Trumbo – A Lista Negra” funde cenas dos filmes originais à filmagens feitas agora, tanto em preto e branco como a cores, de um modo muito eficiente. Tem atuações marcantes do trio central de atores: Bryan Cranston (série “Breaking Bad”), como Trumbo (indicado ao Oscar pelo papel), Diane Lane (“O Homem de Aço”), como sua mulher, Cleo Trumbo, e a vilã da história, representada pela personagem Hedda Hopper, ex-atriz do cinema mudo e colunista de sucesso, que combateu ferozmente os chamados traidores comunistas de Hollywood. O papel coube à grande Helen Mirren (“A Dama Dourada”), que faz a vilã em um figurino excêntrico, com um chapéu diferente a cada cena, cada um mais extravagante do que o outro. E roupas de igual teor. O figurino e a caracterização de época são outro ponto alto do filme, por sinal. E seu senso de humor, também. Trata-se, no entanto, de um filme político e muito atual. A paranoia anticomunista continua por aí, travestida de outros nomes, às vezes. Mas nada mudou, essencialmente. As práticas políticas se repetem à exaustão, incluindo o ódio e a intolerância, simplistas e grosseiros, que fizeram parte do legado do período macartista da caça às bruxas, quando Dalton Trumbo realizava seu trabalho, com muito esforço e dedicação, em Hollywood.

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    Jennifer Lawrence é o verdadeiro Nome do Sucesso de Joy

    28 de janeiro de 2016 /

    Curioso como Jennifer Lawrence está deixando de ser queridinha da crítica para ganhar a fama de atriz superestimada, na opinião de alguns. Mas, se não fosse por ela, o que seria de “Joy – O Nome do Sucesso”? Certamente é o mais frágil dos trabalhos de David O. Russell, que tem uma carreira marcada por altos e baixos, apesar de sua galeria de personagens memoráveis e bem interessantes. Em sua terceira parceria com o cineasta, depois de vencer o Oscar por sua interpretação em “O Lado Bom da Vida” (2012) e ser nomeada por “Trapaça” (2013), Jennifer Lawrence volta a eclipsar seus coadjuvantes famosos, como Robert De Niro, Bradley Cooper e Isabella Rossellini, obtendo, com sua performance, a única indicação de “Joy” no Oscar 2016. O filme é uma ode à capacidade humana de vencer os obstáculos. Embora de tom agridoce, é uma história real de superação e conquista de alguém que veio de uma classe pouco privilegiada, mas que conseguiu o sucesso graças à sua criatividade. “Joy” conta a história de Joy Mangano, uma jovem que mora com a mãe depressiva e viciada em telenovelas (Virginia Madsen), o ex-marido (Édgar Ramírez) e os filhos em uma casa em estado precário. Como se não bastasse, o pai (De Niro) também aparece para tumultuar o ambiente, depois de ser dispensado pela namorada. Diante desse caos, e tendo que trabalhar para manter a todos, Joy tem uma ideia: criar um esfregão prático, que até então não existia nos Estados Unidos. O problema estava em como capitalizar a ideia, vender o produto e ganhar dinheiro num mercado repleto de advogados e empresários picaretas. Mesmo se revelando uma obra menor, fica claro o quanto o filme deve à força e à presença de cena da atriz, que leva o filme nas costas, conferindo autenticidade a uma personagem que é mais velha que ela própria. Ela é responsável por momentos particularmente emocionantes, como a primeira apresentação de seu produto em um canal de vendas, especializado em infomerciais, além de voltar a evidenciar sua boa química com Bradley Cooper, embora o papel dele seja menor do que se espera. A obra, porém, tem uma fragilidade estrutural que coloca sua realização em cheque. Ainda que deliberadamente cômico, o tom se perde entre a recriação de época e o conto de fadas, terminando de forma pouco realista. Praticamente uma fábula encantada do capitalismo, “Joy” tem momentos de musical, em que atriz canta em dueto com Edgar Ramíres, além do otimismo antiquado de “A Felicidade Não se Compra”, sem esquecer o perdão aos parentes aproveitadores da “Cinderela”. Ao final, a gata borralheira não se contenta com a coroa de princesinha do empreendedorismo, almejando também o lugar da fada madrinha.

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    Cinco Graças mostra a beleza reprimida pela cultura patriarcal

    28 de janeiro de 2016 /

    “Cinco Graças”, estreia da cineasta turca radicada na França Deniz Gamze Ergüven, é um exemplo representativo de cinema feminista, mas, por se passar em um vilarejo na Turquia, também se projeta como filme de resistência contra certas tradições culturais e religiosas, que se revelam desumanas. Mais que feminista, é uma obra humanista. Concorrente francês ao Oscar de Melhor Filme Estrangeiro, a produção acompanha cinco irmãs de idades diferentes, que querem ser felizes, mas tudo o que encontram são imposições, barreiras, grades. A mais velha e mais esperta até consegue fugir de casa para transar com o namorado, usando métodos ousados para evitar perder a virgindade ou engravidar. Mas é a mais nova, uma criança ainda, quem narra o filme, e é por seus olhos que vemos a história se desenrolar. Olhos que já começam o filme chorando, ao se despedir da professora, no final do ano letivo. A natureza chama as meninas para os prazeres do amor e do sexo, e isso leva sua família a tomar atitudes drásticas. Encarceradas, elas são condenadas a casamentos de conveniência, para que possam sair de casa sem envergonhar os parentes. E assim as “Cinco Graças” vão se desmantelando. Mas como a trajetória de cada uma delas é singular, a história é rica em surpresas e momentos comoventes. De fotografia deslumbrante, a obra lida muito bem com a beleza dos corpos das moças, em fase de autodescoberta e também da descoberta do mundo em que habitam, que subitamente se revela cheio de maldade. Uma maldade não necessariamente deliberada, mas fruto de anos e anos de cultura arcaica, que exige submissão feminina em pleno século 21. A trama é apresentada com muita simplicidade, até para tornar sua denúncia mais eficaz, como um soco no estômago. E embora retrate uma situação específica, refletindo uma sociedade sob influência da religião muçulmana, poderia se passar em qualquer outro lugar ermo, até no interior do Brasil, onde o patriarcado ainda ditar as regras da convivência.

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    A Grande Aposta confunde para explicar e atordoa ao concluir

    28 de janeiro de 2016 /

    “A Grande Aposta”, de Adam McKay, lida com os bastidores do mercado financeiro com humor, mas de forma bem diferente do provocativo “O Lobo de Wall Street” (2013), de Martin Scorsese. Desta vez, não são golpistas que pretendem lucrar com a bolsa de valores. O golpe é a próprio mercado de valores imobiliários. Além disso, o diretor de “Tudo por um Furo” (2013), “Quase Irmãos” (2008) e outras comédias bobas surpreende ao optar por um registro contido e nervoso, ao abordar o colapso econômico de 2008, que levou não só os EUA ao buraco, mas todo o mundo. Baseado no livro de Michael Lewis (autor também de “O Homem que Mudou o Jogo”), o filme conta a história de quem se antecipou ao apocalipse financeiro. Enquanto os supostos especialistas reagiram com surpresa ao quebra-quebra dos bancos, atingidos pela crise especulativa e a inadimplência das hipotecas, uma pessoa olhou os números, fez as contas e antecipou o desastre: um médico de olho de vidro, fã de heavy metal, chamado Michael Bury (papel de Christian Bale), que administrava um fundo de investimentos milionário. Ao perceber a podridão dos ativos negociados na bolsa, a inclinação de Bury foi, imediatamente, apostar contra o sistema, investindo os milhões de seu fundo na criação de um seguro contra a falência do mercado. Foi taxado de louco, virou piada na bolsa, perdeu fortunas, credibilidade e recebeu ameaças de processo dos clientes cujo dinheiro ele investiu, antes de tudo vir abaixo e seu lucro se tornar bilionário. Essa é a grande aposta do título. Assim que Wall Street soube do negócio, abriu as portas para o louco, criando o seguro contra o que jamais, na opinião dos operadores, aconteceria. Mas a criação desse seguro permitiu que outros copiassem a iniciativa de Bury, após sua dica os levar a pesquisar o mercado. É onde entram os personagens de Steve Carell, Ryan Gosling e Brad Pitt, entre outros. Mas apostar contra a casa que controla o jogo é sempre arriscado. O filme também mostra o quanto os bancos tentaram disfarçar a crise do mercado imobiliário, apelando até mesmo para a fraude quando a profecia de Bury começou a se cumprir. A vitória desta aposta, porém, teve um saldo cruel. Como diz o personagem de Brad Pitt a certa altura, a fortuna obtida pelos que investiram na falência do sistema econômico foi diretamente proporcional à escalada do desemprego, perdas de lares e difusão da miséria. O filme lembra que não é apenas o lucro que está em jogo. E a lembrança do lado humanitário da crise ajuda a enquadrar todas as gracinhas do roteiro numa história que jamais esconde ser uma autêntica tragédia. Adam McKay fala muito sério com seu humor, repleto de recursos metalinguísticos. Ele usa o personagem de Ryan Gosling como comentarista da trama, fazendo-o quebrar a quarta parede para se dirigir ao público e explicar jargões técnicos, visando construir um contexto para a narrativa. Mas também chama celebridades para ajudar a montar o quadro, o que torna seu filme um exercício de edição, com influência de reality show, documentário e até da MTV. O caso mais emblemático é a participação de Margot Robbie, estrela do “Lobo”, que é convidada a dar explicações econômicas numa sequência didática da trama. Ela aparece dentro de uma banheira, detalhando o funcionamento dos negócios imobiliários. Mas quem consegue prestar atenção a algo mais que seu banho de espumas? Esta é a razão pela qual ninguém sairá do filme expert no mercado financeiro. McKay finge que explica, o público se diverte fingindo que entendeu, e tudo vira bolha de sabão. Acostumado a dirigir as comédias estúpidas de Will Ferrell, o cineasta parece temer um resultado dramaticamente mais profundo. Mas isso não impede que a cacofonia de “A Grande Aposta” tenha subtexto. As dissonâncias da trama, que visam mais confundir que esclarecer, lembram as táticas do velho Chacrinha, de divertir as massas, enquanto passa mensagens cifradas. O atordoamento é a sensação dominante e faz sentido que seja, pois a conclusão é que a corrupção e a falta de limites para a ganância sempre ficarão impunes. Afinal, independente do tamanho da aposta, mesmo quebrando a banca, a casa jamais perderá – com apoio político e econômico do governo. Ao menos, o filme permite uma compreensão básica do mercado financeiro, ajudando a expressá-lo em termos populares, com merecidos palavrões.

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    Carol é um dos filmes mais belos da temporada de premiações

    28 de janeiro de 2016 /

    Um dos filmes mais belos desta atual temporada de premiações é “Carol”, de Todd Haynes, cineasta que já havia mostrado sua sensibilidade no trato de relacionamentos proibidos no igualmente ótimo “Longe do Paraíso” (2002), que também se passava na década de 1950 e que emulava, de maneira mais forte, o cinema de Douglas Sirk, o mestre do melodrama na velha Hollywood. A diferença é que nos filmes de Haynes, e em “Carol” especificamente, as emoções são mais contidas. Como numa tentativa de captar também o sentimento de impotência diante de uma sociedade que não permite seguir impulsos fora da norma. As paixões devem ser tolhidas ou muito bem escondidas, o que não é fácil, especialmente para uma mulher casada, como é o caso de Carol, vivida brilhantemente por Cate Blanchett. Conhecemos inicialmente Carol pelos olhos assustados, mas também muito curiosos, de Therese (Rooney Mara), uma moça que trabalha como balconista em uma loja de departamentos e que sonha em ser fotógrafa. É nessa loja que as duas se descobrem, com uma troca de olhares e de informações e um par de luvas esquecido que faz com que Therese queira mudar de vida, deixar para trás tudo aquilo que não lhe faz mais sentido, inclusive o namorado. Já Carol tem uma história de vida mais longa e complicada. Está passando por um processo de divórcio e tem uma filha que ela corre o risco de perder na justiça para o marido. Aliás, a questão da filha chega a causar mais emoção do que o próprio relacionamento entre as duas mulheres, que é tratado de maneira mais sutil e sóbria. As cenas fotografadas através de vidros e véus funcionam como uma metáfora da dificuldade de alcançar o objeto de desejo naquela sociedade que arruinava a vida de quem fugisse ao padrão estipulado de família. Se nos dias de hoje ainda é um pouco assim, que dirá na década de 1950, quando astros de Hollywood eram obrigados a esconder suas preferências sexuais, ainda que fossem óbvias. Haynes recria a época com apuro, emoldurando tudo de maneira muito elegante. Cada detalhe de roupa, penteado ou mobília ao redor do casal é cuidadosamente pensado, a fim de compor uma espécie de pintura viva, em movimento. Os detalhes da intimidade compartilhada se beneficiam com a direção segura, mas também com a bela atuação do par central, indicadas ao Oscar, assim como a fotografia, o desenho de produção, a trilha e o roteiro adaptado. Curiosamente, o filme é baseado em um romance de Patricia Highsmith, mais conhecida por escrever livros policiais – ela é a autora de “Pacto Sinistro”, que virou um clássico de Alfred Hitchcock, e criadora do assassino serial Ripley, já adaptado em diversos filmes. Mas “Carol”, de certa forma, é um filme sobre um crime, pelo menos um crime para as normas que deviam ser seguidas naquela época. Como dois ladrões, as duas mulheres fogem de carro pelos Estados Unidos em busca de liberdade, paz e amor.

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    Comédia O Novíssimo Testamento deixa Deus em apuros

    27 de janeiro de 2016 /

    Deus existe e mora em Bruxelas. Se for assim, é porque a União Europeia é o centro do mundo terrestre? Nem tanto. Afinal, Deus é um sujeito de má índole, sacana, mal-humorado, que subjuga a mulher e deixa a filha de 10 anos irritada, querendo sair da prisão em que está metida. Além disso, ele não é nada sem o seu computador divino, de onde comanda o destino dos humanos. E a sua filha vinga-se dele, enviando a todos os seres humanos do planeta Terra a informação de quando, exatamente, ocorrerá a morte de cada um. Esse é o mote propulsor do filme “O Novíssimo Testamento”, de Jaco van Dormael, que já havia nos dado, em 1990, uma outra comédia brilhante, “Um Homem com Duas Vidas”. Aqui estamos, claro, no terreno da fantasia, da farsa e da ironia. Os tipos humanos que compõem a narrativa são todos atraentes e bizarros. O diretor põe muitas coisas e situações em cena. As sequências se sucedem com beleza visual e humor inteligente. Mas a certa altura do filme, a gente fica se perguntando como ele vai amarrar esses elementos todos. Afinal, o tempo está passando, está tudo muito interessante. Mas como isso vai acabar? Vai dar em algo? Aí é que o final surpreende. Sim, o diretor foi capaz de amarrar tudo e construiu um fecho legal, que soa tão bem quanto soou todo o filme. Um roteiro muito bem trabalhado. E tudo anda sem pressa, há espaço para cenas curiosas, brincadeiras diversas, explorações visuais, ironias aparentemente dispensáveis, mas no fim tudo de algum modo se encaixa. Uma narrativa original, algo desconexa e absurda, produz um entretenimento de qualidade em cinema de primeira linha. O grande achado da narrativa é, sem dúvida, o que acontece aos mais diversos personagens, quando sabem quanto tempo têm exatamente de vida, em anos, meses, dias, horas, minutos e segundos. Todo o plano de existência humana muda, de modo distinto para cada um. Mas, quando todos sabem do seu destino, a coletividade toda também muda e as relações passam a ser outras, de todos com todos. Os desafios se sucedem. Os negócios se tornam caóticos, o trabalho, comprometido, o ócio, finalmente vivido, e coisas mais radicais podem acontecer. O menino pode virar menina. O garotão que sabe que vai viver mais 62 anos desafia a morte. Uma mulher insatisfeita pode flertar com um gorila. É uma brincadeira e tanto! Que também nos leva à reflexão. Benoît Poelvoorde (“3 Corações”), como o inusitado Deus, costura uma história que tem na menina Pili Groyne (“Dois Dias, Uma Noite”) o grande destaque, mas que inclui atores como François Damiens (“A Família Bélier”) e Cathérine Deneuve (“De Cabeça Erguida”) em papéis menores, e Yolande Moreau (“Uma Juíza Sem Juízo”), que faz muito bem a esposa de Deus, aquela que vai do mutismo ao embelezamento do mundo. Belo filme, escolhido pela Bélgica para representar o país na disputa pelo Oscar de Filme Estrangeiro. Só que foi preterido, não entrou entre os cinco escolhidos para a disputa final. Mas “O Novíssimo Testamento” tem frescor e leveza, num trabalho em que o talento e o humor dão as cartas, com criatividade transbordando. É isso o que importa, não os prêmios que tenha recebido ou venha a receber.

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    Tudo parece natural em Boi Neon, filme de sensibilidade extraordinária

    20 de janeiro de 2016 /

    Apesar de ser um aspecto da cultura popular, que coexiste com shows de bandas de forró, a vaquejada não é muito bem vista por quem vê crueldade na brincadeira de laçar o boi e fazê-lo ir ao chão. De fato é, mas também não se pode negar sua existência, nem perceber o quanto se trata de um tipo de negócio que movimenta uma quantidade significativa de pessoas, principalmente nas cidades do interior do Nordeste. “Boi Neon”, o novo longa-metragem de Gabriel Mascaro, não só trata do assunto, como tem a ousadia de mostrar a vida das pessoas que atuam em seus bastidores, personagens que não passariam de figurantes na lógica de qualquer outro filme convencional, uma vez que o cinema costuma privilegiar quem fica sob os holofotes ou tem uma história de vida mais ligada a uma trajetória de sucesso. Mascaro inverte também a lógica de gênero, evitando mostrar um vaqueiro com os estereótipos mais comuns. Iremar, interpretado por Juliano Cazarré (“Serra Pelada”), trabalha nos currais, sendo responsável por limpar o rabo do boi e prepará-lo para os peões do espetáculo. No entanto, ele sonha em trabalhar com confecção, especialmente feminina. Até tem uma máquina de costuma bem simples e monta seus manequins a partir do que encontra no lixão. E convive com uma mulher que também foge ao estereótipo feminino, Galega, a mãe solteira vivida por Maeve Jinkings (“O Som ao Redor”), que dirige o caminhão da trupe. Como já havia mostrado em seu trabalho anterior, “Ventos de Agosto” (2014), Mascaro demonstra uma obsessão pelos corpos, seja do homem ou da mulher (e, no caso de “Boi Neon” também dos animais), e muito da força do filme vem do modo como ele visualiza esses corpos. Algumas cenas, porém, podem até ser consideradas fortes, levando em consideração como o cinema brasileiro vem se domesticando desde a década de 1990, com a chamada retomada. De fato, o cineasta pernambucano inclui em seu filme imagens explícitas de sexo (com direito a membro em ereção) e não hesita em mostrar uma cena com um cavalo que certamente vai dar o que falar durante e depois das sessões, até por ser também engraçada. Mas apesar de se destacar dentro da estrutura narrativa, essas cenas não são feitas com um intuito sensacionalista, mas para mostrar os corpos como algo natural, ainda que momentos íntimos, como o sexo, o banho e a depilação, sejam considerados de natureza privada. Além da naturalidade com o trato do corpo, também pode causar estranheza ao grande público a estrutura pouco convencional da narrativa, que foge ao tradicional formato “introdução-desenvolvimento-conclusão”, embora esses elementos estejam presentes, mas de uma maneira mais moderna, por assim dizer. Mascaro privilegia o recorte de determinados momentos das vidas de seus personagens, e lhes dá profundidade. A força de cada cena e diálogo do filme, desde as simples conversas de Iremar com a garotinha que não tem contato com o pai, com os outros vaqueiros colegas ou com Galega, é captada com um senso de realismo impressionante, como já se podia notar em “Ventos de Agosto”, e próprio de um diretor que começou com documentários. Não por acaso, as cenas das vaquejadas se destacam como apropriações de eventos reais. Mas a experiência documental também pode ser traçada em sua opção por focar os bastidores e os personagens menos evidentes das vaquejadas. É fácil entender porque “Boi Neon” fez tanto sucesso no circuito dos festivais internacionais – foi premiado nos festivais de Veneza, Toronto, Rio, Nantes, Hamburgo e Adelaide, entre outros. Difícil é não ficar encantado com a sensibilidade do filme e a forma extraordinária com que capta a vida de pessoas tão simples.

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    Creed dá a Stallone sua revanche no Oscar, quatro décadas após Rocky

    16 de janeiro de 2016 /

    Diz a lenda que o desconhecido Sylvester Stallone escreveu o roteiro de “Rocky” em uma semana e, ao oferecer aos estúdios, abriu mão do que poderia receber apenas vendendo sua história (o ator teria pouquíssimos dólares em sua conta bancária na época) para poder protagonizar a obra. Lançado em 1976, a produção não apenas foi um sucesso fenomenal, como venceu o Oscar de Melhor Filme e apresentou um personagem que seria imortalizado na cultura pop. Stallone, porém, não levou sua estatueta e, conforme sua carreira evoluiu, parecia que jamais voltaria a ter outra chance. 40 anos e seis filmes depois, Rocky Balboa retorna ao cinema no que deveria ser a primeira vez em que não é o centro das atenções, mas como é comum aos grandes mitos da ficção, ele rouba a cena em “Creed – Nascido para Lutar”, e de quebra dá a Stallone sua chance de revanche, com a segunda indicação ao Oscar pelo personagem criado lá no final dos anos 1970. Dirigido por Ryan Coogler, o filme é o primeiro do universo de Balboa que não conta com roteiro ou produção de seu astro. Neste sentido, “Creed” é próximo de “Star Wars – O Despertar da Força”: uma franquia “tirada” de seu criador (naquele caso, George Lucas) para ser renovada com um novo elenco usando as estrelas do filmes anteriores como coadjuvantes de luxo em uma trama que emula o original. O centro narrativo é Adonis Creed (Jordan), filho de Apollo, ex-rival e depois amigo de Rocky ao longo quatro filmes. O garoto não passa por problemas financeiros como acontecia com Balboa no original, mas também se encontra prisioneiro de uma vida que não quer, e precisa se provar para além do sobrenome famoso. Michael B. Jordan, que já havia estrelado a estreia de Coogler, “Fruitvale Station – A Última Parada” (2013), entrega uma performance enérgica e também cativante, misturando a arrogância do pai nos filmes anteriores com a insegurança de um iniciante que quer sair da sombra de Apollo (mostrada de forma quase literal na cena da luta em frente ao projetor). A direção de Coogler é inspirada, especialmente no plano-sequência que acompanha Adonis no ringue, inovando na forma como o boxe é fotografado no cinema. E apesar do roteiro ser por demais devedor ao filme de 1976, o interesse nos personagens, o bom trabalho dos atores e o gosto forte de nostalgia são mais do que suficientes para fazer de “Creed” um dos melhores filmes da franquia ao lado do primeiro e do seu anterior direto, “Rocky Balboa” (2006). Mas o coração da obra está mesmo em Stallone. A longevidade do personagem provoca uma simpatia imediata assim que entra em cena, e o ator não decepciona ao encarnar Rocky com um misto de segurança e fragilidade em uma luta inesperada, mas que faz todo o sentido com a trajetória do personagem. Ao trazer Balboa pela primeira vez fora dos ringues, “Creed” deixa mais claro do que nunca a temática insistente da franquia: o vencedor não é aquele que ganha a luta, mas sim o que nunca desiste de lutar.

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    Steve Jobs é um filme complexo e criativo como seu personagem

    16 de janeiro de 2016 /

    Como dar conta de uma vida em duas horas de filme? Normalmente as cinebiografias enfrentam este desafio com histórias que acabam ou sendo cansativas ao detalhar demais algum ponto específico do biografado ou rasas e sem graça na tentativa de dar conta do todo. “Steve Jobs” parte de um artifício inteligente do roteirista Aaron Sorkin para não cair nesta armadilha e, ao mesmo tempo, entregar uma obra divertida, tensa e com personagens bem desenvolvidos. A vida de Steve Jobs é contada a partir de três momentos, em três grandes cenas que ocupam todo o filme: lançamento do Macintosh em 1984, lançamento do NextCube em 1990 e do iMac em 1998. Partindo de sua biografia escrita por Walter Isaacson, o roteirista imagina os bastidores destes grandes eventos para tentar entender quem é o homem que parece ter transformado todo o mundo. Os cenários mudam, mas os personagens permanecem os mesmos se reencontrando com a distância dos anos que separam um lançamento do outro. O diretor Danny Boyle faz sua parte conduzindo o ótimo elenco e utilizando três formatos diferentes de filmagem para acompanhar a evolução tecnológica, ao mesmo tempo em que acompanha as mudanças de Steve e do mundo: 16mm, 35mm e digital. E é então que, partindo desta mistura de estrutura teatral e estética cinematográfica, “Steve Jobs” coloca uma lupa sobre o criador da Apple e seus colegas de trabalho despejando informações a uma velocidade impressionante. Sorkin escreveu “A Rede Social” (2010) e aqui mais uma vez dá mostras de seus diálogos rápidos e cortantes ditos por personagens cerebrais. Combina que é uma beleza com o estilo frenético de Boyle, principalmente nos momentos de embate repletos de tiradas engraçadinhas e frases de efeito. Mas diretor e roteirista derrapam na emoção, e na maioria das vezes – como em alguns encontros de Jobs com a filha – a coisa toda soa um pouco piegas. Além disso, a própria estrutura narrativa da divisão em três episódios acaba se tornando uma prisão para a obra, de modo que os encontros, reencontros e desabafos antes de cada lançamento soam tão forçados que até o personagem principal faz um comentário metalinguístico sobre isso. Mas por outro lado, se Michael Fassbender não possui a semelhança física que Ashton Kutcher tem com o verdadeiro Jobs, seu talento como ator e o ótimo roteiro e direção fazem com que isto deixe logo de ser um problema (a aparência de Fassbender incomoda um pouco mais no início do filme, quando não parece tão jovem quanto Steve era na época do lançamento do Macintosh, o que tira um pouco a aura de “garoto prodígio” do biografado), e rapidamente nos vemos envolvidos em um drama repleto de intrigas palacianas e pessoais. A inspiração shakespeareana torna Jobs um rei, que por vezes é tirano e por vezes bondoso, mas nunca fraco e inseguro. A forma como manipula, estimula, confronta, trai e atropela seus “súditos” ganha força pelos excelentes coadjuvantes que encaram o talento de Fassbender de igual para igual. “Seus produtos são melhores do que você”, um deles diz em momento de desabafo. Pois o difícil homem que conhecemos através da lente de Boyle e do texto de Sorkin nos deu indiretamente mais um excelente produto com “Steve Jobs”. Um filme que, em sua fragmentação, nos entrega trechos para montarmos a sinfonia da vida deste personagem que se via como um maestro.

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    Spolight faz registro histórico dos últimos dias do jornalismo investigativo

    15 de janeiro de 2016 /

    Um roteiro sobre pedofilia cometida por padres da Igreja Católica provavelmente viraria um filme focado nas vítimas ou nos sobreviventes. Mas “Spotlight – Segredos Revelados” usa o polêmico tema para falar nas entrelinhas sobre o fim da era do jornalismo investigativo. Isso faz com que, não a polêmica, mas o dramalhão fique em segundo plano para dar lugar à urgência de um tom mais tenso, que geralmente era empregado nos filmes policiais dos anos 1970. Com bons tiras substituídos por outros profissionais em extinção, movidos por uma coceira que jamais para até que a verdade seja encontrada e divulgada. Baseado em fatos reais, o filme dirigido pelo ator Tom McCarthy (“Trocando os Pés”), que também divide o roteiro com Josh Singer, bebe na fonte das melhores produções sobre jornalismo, sendo a principal delas o clássico “Todos os Homens do Presidente” (1976), de Alan J. Pakula, o clássico em que Dustin Hoffman e Robert Redford revivem a investigação dos jornalistas Carl Bernstein e Bob Woodward, do Washington Post, sobre o escândalo Watergate. O tom de “Spotlight” é esse. É o herdeiro direto do filme de Pakula, mas a diferença é que “Todos os Homens do Presidente” foi feito no auge do jornalismo investigativo e apenas dois anos após a renúncia do presidente Richard Nixon em decorrência do escândalo relatado. Já “Spotlight” foi lançado numa época em que a profissão privilegia o factual e não as grandes reportagens, mais de uma década após a reportagem retratada no longa. Aqui, os olhos de Tom McCarthy estão direcionados para as ações do Boston Globe num mundo prestes a ser dominado pela internet. Mais precisamente em uma divisão (a Spotlight) coordenada por quatro jornalistas – Walter Robinson (Michael Keaton), Mike Rezendes (Mark Ruffalo), Sacha Pfeiffer (Rachel McAdams) e Matt Carroll (Brian d’Arcy James), observados de perto pelo editor Ben Bradlee Jr. (John Slattery), que curiosamente é filho de Ben Bradlee, o editor do Washington Post durante o caso Watergate. Eles agem como a S.W.A.T. do jornal, sempre responsáveis pelas investigações mais parrudas. Com a entrada de um novo editor-chefe, Marty Baron (Liev Schreiber), eles são “convidados a aceitar” um caso que o próprio jornal ignorou anos atrás: partir para cima da Arquidiocese de Boston, que teria jogado para debaixo do tapete crimes de abuso sexual cometidos por padres. O elenco está impecável. Difícil escolher um nome que se destaque mais. É um trabalho de conjunto, seguindo o que os personagens fizeram na vida real. De repente, podemos preferir Mark Ruffalo, o jornalista obstinado, de postura torta, talvez corcunda, sem tempo para a vida social. Mas, então, lembramos que McCarthy praticamente não mostra os repórteres da Spotlight se relacionando com parentes ou amigos – com exceção da personagem de Rachel McAdams, que mesmo assim fica ao redor deles reagindo ao trabalho. Agindo como se não houvesse amanhã, cientes ou não – pouco importa – de que essa vertente da profissão estivesse com os dias contados, o quarteto vai atrás de suas fontes e o ritmo de thriller predomina até o fim. Talvez a gente esteja acostumado com uma direção em que o cineasta “participa” mais da história, tentando em alguns momentos criar uma tensão mais forte. Acontece que nem todo mundo tem a energia de um Martin Scorsese ou mesmo Michael Mann, como em outro filme estupendo sobre jornalismo, “O Informante” (1999). Mas nem Alan J. Pakula era assim. O trabalho de McCarthy segue a escola Clint Eastwood, que apenas observa e conduz a história com segurança, ao se apoiar na excelência de três fatores – roteiro, elenco e edição. Deste modo, ele parece um cineasta com o espírito da Hollywood dos anos 1970, exercendo seu ofício no século 21. Mas é importante ressaltar que “Spotlight” não abraça a nostalgia. É um filme atual, urgente pela força de seu roteiro e pelo que coloca sob seu “holofote” – entre outras coisas, como o jornalismo deveria ser diferente da busca por likes a qualquer custo. Se dói lembrar que o jornalismo está moribundo, é reconfortante saber que não comprou um lugar no Céu, ao desmascarar, em seus últimos suspiros, a farsa religiosa da trama. O filme não quer revelar que existem padres pedófilos – isso pode ser redundante –, mas ajuda a entender que os casos que vieram à tona não foram isolados. A Igreja protegeu e praticamente financiou a safadeza toda. De forma interessante para este contexto, o jornalismo celebrado em “Spotlight” também se mostra uma profissão de fé, revelando que só se encontra a verdadeira paz na busca, o tempo todo, do caminho da verdade.

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