Earl Cameron (1917 – 2020)
O ator Earl Cameron, um dos primeiros e maiores astros negros do cinema britânico, morreu na sexta-feira (3/7) em sua casa em Kenilworth, na Inglaterra, de causas não reveladas. Ele tinha 102 anos. Cameron virou ator por acaso. Imigrante de Barbados, trabalhava como lavador de pratos quando foi visitar um amigo nos bastidores de um musical no West End londrino no final dos anos 1940. Naquele dia, um ator foi demitido e ele acabou aproveitado no ensaio para cantar um refrão. Não só entrou na peça como participou de diversas montagens teatrais, antes de fazer sua estreia bombástica nas telas em 1951, escalado pelo célebre diretor Basil Dearden como um marinheiro recém-chegado de navio em Londres, no clássico noir “Beco do Crime”. Naquele filme, o personagem de Cameron se envolvia com uma garota branca (Susan Shaw), num contexto de racismo e crime que entrou para a História. Foi o primeiro romance interracial produzido pelo cinema britânico. Apesar desse começo impactante, ele foi relegado a papéis menores nos longas seguintes, atuando geralmente em produções passadas na África, ainda no período colonial britânico, como “Simba” (1955), “Odongo” (1956), “A Morte Espreita na Floresta” (1956), “A Marca do Gavião” (1957) e até na série “O Caçador Branco” (1957). Só foi voltar à Londres urbana em novo filme de Dearden, o clássico “Safira, a Mulher Sem Alma” (1959), noir excepcional, vencedor do BAFTA de Melhor Filme Britânico, que se passava nos clubes noturnos de jazz da capital inglesa e novamente revisitava as relações interracionais e o racismo contra imigrantes caribenhos. Desde vez, ele interpretou um médico, irmão da personagem-título. Era o assassinato de sua irmã, confundida com uma mulher branca pela polícia, que dava início à trama, apresentada como uma investigação de crime racial. Após outras aventuras coloniais, inclusive um Tarzan – foi parceiro do herói em “Tarzan, o Magnífico” (1960) – , ele estrelou seu terceiro drama racial, “Lá Fora Ruge o Ódio” (1961), mais uma vez numa relação com uma mulher branca. Dirigido por Roy Ward Baker, o drama trazia o ator como o operário-modelo de uma fábrica, que era selecionado para receber uma promoção, despertando grande ressentimento entre seus colegas brancos. Cameron fez outro Tarzan – “Os Três Desafios de Tarzan” (1963) – e sua maior produção colonial, “Os Rifles de Batasi” (1964), de John Guillermin, antes de virar um agente secreto aliado de James Bond em “007 Contra a Chantagem Atômica” (1965). Ele também participou de “Dezembro Ardente” (1973), romance estrelado e dirigido por Sidney Poitier em Londres, integrou a produção libanesa “Maomé – O Mensageiro de Alá” (1976), ao lado de Anthony Quinn, e voltou a contracenar com o intérprete de 007, Sean Connery, em “Cuba” (1979). Mas aos poucos tomou o rumo da TV, onde apareceu em dezenas de produções, inclusive nas célebres séries “Doctor Who” e “O Prisioneiro”, antes de dar uma pausa de 15 anos nas telas. Retornou apenas na década de 1990 para dar continuidade à longa filmografia. Entre seus trabalhos mais recentes estão o thriller “A Intérprete” (2005), de Sydney Pollack, estrelado por Nicole Kidman, o premiado “A Rainha” (2006), de Stephen Frears, que consagrou Helen Mirren, e “A Origem” (2010), de Christopher Nolan, com Leonardo DiCaprio.
Cartas da Guerra contrasta o horror de batalhas sem sentido com a beleza da poesia
De um lado, o amor, de outro, a guerra. De um lado, a poesia, de outro, o sangue e a violência. O filme “Cartas da Guerra”, do cineasta português Ivo Ferreira, se nutre desses contrastes o tempo todo. O que o filme nos mostra é um acampamento de guerra, ações, confrontos. O personagem António (Miguel Nunes, astro de novelas portuguesas), convocado como médico pelo exército para atuar na guerra colonial de Angola, cuidando de feridos, triste e solitário, escreve cartas e um romance e tem com um superior hierárquico um ponto de contato intelectual, alimentado por conversas, ao jogo de xadrez. O que mais se vê, no entanto, são soldados vivendo o cotidiano embrutecedor da guerra. Se as imagens, maravilhosas em preto e branco, focam a guerra, o áudio é pleno de amor e poesia. Lindas cartas de amor apaixonado, poético, se sucedem ao longo do filme. Amo-te em tudo e sempre é uma das coisas mais repetidas nas cartas, que exploram literariamente a ausência da amada, da casa, dos pequenos prazeres da vida. É António escrevendo à sua esposa, a quem ele é fiel e de quem é sinceramente apaixonado. Mas ele está irremediavelmente longe da mulher amada, já grávida, e da filha que ele não poderá ver nascer, nem embalar, para seu desespero. De 1971 a 1973, ele escreve cartas de amor permanentemente, recebe as respostas que a gente não ouve, nem vê. E começa a escrever um romance. É o que o motiva a sobreviver. O contraste entre as belas mas terríveis imagens de batalha e a pureza de sentimentos do médico, aspirante a escritor, em suas cartas, produz uma espécie de curto-circuito entre a beleza do amor e a violência sem sentido de uma guerra colonial brutal. O impasse entre o desejo pelas coisas simples e cheias de humanidade e o horror do sangue jorrado em vão e da morte sem sentido, tese e antítese a clamar por uma síntese, que não virá. O que “Cartas da Guerra” nos mostra é a angustiante espera, a vida que se põe em suspensão e na incerteza. Só o amor para sustentar tal espera. Para além do sentimento, há a força das palavras, essencial para significar a vida e tudo o que acontece. A literatura como elemento de salvação. Baseado no romance homônimo de António Lobos Antunes, “Cartas da Guerra” é um filme de guerra belo, poético, amoroso. Não se dirige a uma racionalidade pacifista, mas às emoções que o conflito cria ou suprime. Mostra o contraste entre a vida de dentro e de fora da guerra, vivido por um ser humano sensível, capaz de colocar em palavras, bem escolhidas e encadeadas, a expressão de sentimentos de uma quadra decisiva da sua existência.
Joaquim é retrato sujo e realista do mártir que virou alegoria nacional
O cinema de Marcelo Gomes é um cinema de generosidade. Dos seus cinco longas-metragens, dois deles foram feitos em parceria com outros cineastas: “Viajo Porque Preciso, Volto Porque Te Amo” (2009), com Karim Aïnouz, e “O Homem das Multidões” (2013), com Cao Guimarães. Sua assinatura como autor acaba se tornando um pouco apagada, levando em consideração que os referidos trabalhos apresentavam algo muito em comum com a filmografia de seus colegas realizadores. Ele não havia dirigido sozinho um filme melhor do que sua brilhante estreia, “Cinemas, Aspirinas e Urubus” (2005) até agora, com “Joaquim”. Apesar de se passar no período colonial, o filme diz muito sobre o Brasil atual, seja na forma como mostra os índios como mendigos, os negros como um exemplo de alegria de espírito (que cena linda, a do escravo cantando com o índio à beira do rio), mas que devem se manter em posição subalterna, e os pobres explorados por interesse dos ricos. Sem importar quão raro tinha se tornado o ouro nas Minas Gerais, o reino europeu continuava cobrando pesados impostos. O quanto as coisas mudaram nos dias de hoje? No filme, Joaquim José da Silva Xavier lê os textos da independência das 13 colônias americanas e acredita que o Brasil também pode se livrar do fardo de Portugal. A trama se passa antes dos eventos mais famosos de sua vida, narrados em “Os Inconfidentes”, de Joaquim Pedro de Andrade, deixando claro que se trata de outra proposta, outro olhar cinematográfico, com um prólogo que parece didático na apresentação do personagem, mas cujo registro vai se provar o contrário já a partir da primeira cena com os personagens dialogando e agindo de maneira inquieta. O diálogo é ágil e natural, bem diferente do que se costuma ver em produções que retratam essa época, que em geral possuem uma linguagem mais empostada, o que acaba por distanciar o espectador. Aqui, até a câmera na mão nos aproxima de tudo. “Joaquim” quase nos faz sentir o cheiro daquele ambiente, em especial em uma das primeiras cenas: quando Preta (a atriz portuguesa Isabel Zuaa) leva comida para Joaquim (Júlio Machado) e Januário (Rômulo Braga). A câmera na mão segue inicialmente a escrava, para depois nos mostrar o relacionamento de proximidade entre aqueles personagens: Preta tirando piolho de Joaquim enquanto ele almoça. Esse aspecto mais sujo no retrato dos personagens e do ambiente também se distancia do que geralmente se vê em produções dessa época, mesmo as que trazem personagens pobres. Nessa mesma cena aparece um indiozinho pedindo comida. Januário diz para não dar, pra não acostumar. Joaquim é um pouco mais generoso. É um filme que faz questão de adotar um caminho contrário ou esperado o tempo todo. Em vez de vermos um herói, temos em Joaquim a figura de um perdedor. Marcelo Gomes o despe totalmente de sua glória, mesmo quando o reveste de uma obsessão pelo ouro para poder ficar rico e ter sua desejada mulher, que ainda por cima é uma escrava cujo corpo pertence a outro negro. O fato de Joaquim ter se tornado um mártir, e isso só é mostrado no prólogo, com uma apresentação dotada de ironia machadiana, é quase um acidente, fruto de sua revolta contra aquilo que ele acredita estar errado no Brasil colônia. No fim das contas, alguém precisou (precisou?) morrer por nossa causa e daí vem a imagem de Tiradentes até hoje parecida com a de um Jesus brasileiro, alguém que morreu por nós e que ganhou um feriado em 21 de abril que mais parece católico do que patriótico. No momento político opressivo e desesperançado em que vivemos, é natural que o público brasileiro se identifique não só com esse personagem, mas com todas as circunstâncias que o rodeiam, com figuras e eventos que podem muito bem ser vistos como alegorias do presente.
David Oyelowo e Rosamund Pike enfrentam o racismo para mudar o mundo em trailer de drama histórico
A Fox Searchlight divulgou o trailer americano de “A United Kingdom”, drama britânico de época que combina política, racismo e o nascimento de uma nação africana. Bem mais emocional que a prévia inglesa, o vídeo mostra como o casamento inter-racial entre os personagens de David Oyelowo (“Selma: Uma Luta Pela Igualdade”) e Rosamund Pike (“Garota Exemplar”) se torna mais que um choque social nos anos 1940, explodindo uma crise internacional. Escrito por Guy Hibbert (“Rastros de Justiça”), o roteiro foca a história real de Seretse Khama, membro da família real de Bechuanalândia, uma ex-colônia inglesa que viria a se tornar a nação africana de Botswana. Khama provocou indignação internacional quando se casou com uma mulher branca em 1948. Ele venceu uma tentativa de deposição, planejada por seu tio, apenas para enfrentar a oposição do governo racista da África do Sul, onde casamentos inter-raciais eram ilegais. A pressão do país aliado obrigou a Grã-Bretanha a bani-lo do seu próprio país de origem em 1951. Mas Seretse Khama voltou anos depois, justamente para liderar a independência do país, fundando um partido político em 1962 e se tornando o primeiro presidente de Botswana em 1966, que precipitou o fim da era do colonialismo britânico. Ele permaneceu no poder até sua morte, em 1980, e durante seu governo se tornou um dos maiores críticos do regime racista do apartheid na vizinha África do Sul. Botswana realiza eleições regulares desde sua morte e é considerado um dos maiores exemplos de estabilidade política no continente africano. “A United Kingdom” tem direção de Amma Asante, que anteriormente já tinha lidado com tema similar em “Belle”, sobre a filha mulata de um aristocrata na Inglaterra do século 18. O próprio Oyelowo assina a produção, que marca seu reencontro com Rosamund Pike, após os dois coadjuvarem em “Jack Reacher: O Último Tiro” (2012). A estreia aconteceu em novembro no Reino Unido, mas o filme só chegará a outros países em 2017. Ainda não há previsão para o lançamento no Brasil, mas “A United Kingdom” desembarca nos EUA em 10 de fevereiro.
Antes mesmo da estreia, Moana gera polêmica nas Ilhas do Pacífico
O povo não viu e já detestou. O novo filme da Disney, “Moana: Um Mar de Aventuras”, ainda não estreou, mas já gera polêmica nas Ilhas do Pacífico, que serviram de inspiração para sua história. Não adiantou a Disney fazer testes e contratar uma adolescente havaiana para dublar sua primeira Princesa Polinésia, nem o fato de Dwayne Johnson, que dubla um semideus do Pacífico, ser descendente de samoanos. O filme de animação dirigido por John Musker e Ron Clements (responsáveis por “A Pequena Sereia”, “Aladdin”, “Hércules” e “A Princesa e o Sapo”) não é politicamente correto, mas ofensivo, segundo diversas manifestações locais. O estúdio de animação americano é acusado de desprezo e saque cultural, primeiro pelo excesso de gordura usado para retratar o semdeus Maui, que seria fruto de um estereótipo preconceituoso – a Polinésia tem, estatisticamente, a população mais obesa do mundo – , mas também por vender produtos que exploram Maui, que seria sagrado. Em declaração à agência AFP, Marama Fox, dirigente do Partido Maoista da Nova Zelândia, acusou o estúdio americano de buscar “ganhar dinheiro graças à história e às crenças dos outros”. Para ele, vender bonecos e fantasias de Maui “é o mesmo que imprimir a imagem de um de nossos ancestrais em uma cortina de chuveiro ou em uma garrafa de cerveja”. Uma fantasia de Maui de corpo inteiro, inclusive sua pele bronzeada, foi acusada nas redes sociais de ser o equivalente à “black face”, as caricaturas teatrais racistas, que os brancos faziam até o começo do século 20 com o rosto pintado de negro, para mostrar como os negros eram burros nos Estados Unidos. A imagem ilustra este texto. A comissão de Direitos Humanos da Nova Zelândia se pronunciou após as críticas com o seguinte comentário: “Esperamos que a Disney compreenda as opiniões das comunidades e dos povos que caracteriza no filme”. Claro que nem todos viram colonialismo racista na iniciativa do clube do Mickey. A jornalista neozelandesa de origem samoana Madeleine Chapman é uma das defensoras da obra. “Depois de ver por anos nos aniversários pequenos ‘Homem-Aranha’ samoanos e ‘Batman’ bronzeados, seria verdadeiramente ofensivo ver crianças brancas fantasiadas de heróis polinésios?”, ela escreveu no site The Spin-off. A Disney, porém, prefere evitar que polêmicas interfiram nos negócios. E já voltou atrás. “A equipe de ‘Moama’ tomou muito cuidado na hora de respeitar as culturas das ilhas do Pacífico nas quais o filme se inspira e lamentamos que a fantasia de Maui tenha sido ofensiva”, disse o grupo em um comunicado. “Apresentamos nossas sinceras desculpas e retiramos a fantasia de nossas lojas”. Vale ressaltar que John Musker e Ron Clements estudaram bastante a cultura polinésia, antes de realizar o filme, fazendo longas viagens com sua equipe às ilhas do Pacífico, onde se reuniram com antropólogos. “Estas viagens modificaram completamente nossa percepção da história que desejávamos contar”, disse Musker, durante o Festival de Annecy.
A United Kingdom: Trailer mostra David Oyelowo e Rosamund Pike no romance inter-racial que abalou o mundo
A Pathé divulgou as primeiras fotos e o trailer de “A United Kingdom”, drama britânico de época que combina política colonial, racismo e o nascimento de uma nação africana. A prévia mostra como o romance e o casamento inter-racial entre os personagens de David Oyelowo (“Selma: Uma Luta Pela Igualdade”) e Rosamund Pike (“Garota Exemplar”) se torna mais que um choque social nos anos 1940, virando uma crise internacional. Escrito por Guy Hibbert (“Rastros de Justiça”), o roteiro foca a história real de Seretse Khama, membro da família real de Bechuanalândia, uma ex-colônia inglesa que viria a se tornar o nação africana de Botswana. Khama provocou indignação internacional quando se casou com uma mulher branca em 1948. Ele venceu uma tentativa de deposição, planejada por seu tio, apenas para enfrentar a oposição do governo racista da África do Sul, onde casamentos inter-raciais eram ilegais. A pressão do país aliado obrigou a Grã-Bretanha a bani-lo do seu próprio país de origem em 1951. Mas Seretse Khama voltou anos depois, justamente para liderar a independência do país, fundando um partido político em 1962 e se tornando o primeiro presidente de Botswana em 1966, precipitando o fim da era do colonialismo britânico. Ele permaneceu no poder até sua morte, em 1980, e durante seu governo se tornou um dos maiores críticos do regime racista do apartheid na vizinha África do Sul. Botswana realiza eleições regulares desde sua morte e é considerado um dos maiores exemplos de estabilidade política no continente africano. “A United Kingdom” tem direção de Amma Asante, que anteriormente já tinha lidado com tema similar em “Belle”, sobre a filha mulata de um aristocrata na Inglaterra do século 18. O próprio Oyelowo assina a produção, que marca seu reencontro com Rosamund Pike, após os dois coadjuvarem em “Jack Reacher: O Último Tiro” (2012). A estreia está marcada para 25 de novembro no Reino Unido.
A Lenda de Tarzan acerta mais que erra na renovação do personagem clássico
Criado em 1912 por Edgar Rice Burroughs, Tarzan é um personagem representante de uma mentalidade da virada do século 19 para o 20, que opunha selvageria e civilização a partir dos conceitos europeus em voga na época. Assim, o personagem atraía fascínio pela mistura destas oposições: o “selvagem” Tarzan e a “civilizada” Jane, seu grande amor e possibilidade de fazê-lo reencontrar a nobreza de sua família. Mais do que isso, Tarzan reinava sobre os animais e africanos enquanto nobre inglês branco. Mesmo criado por macacos e desconhecendo sua origem, o personagem parecia ter uma genética superior, algo que o faria naturalmente especial no ambiente da selva fabular que Burroughs imaginou sem nunca ter ido à África. Ao tentar atualizar o personagem, “A Lenda de Tarzan” toma certos cuidados para não cair nos estereótipos do início do século passado, mas não consegue fugir daquilo que é o cerne do personagem: é o homem branco que vai liderar e salvar os africanos de um destino cruel. Se por esse lado não há novidades, por outro o filme insere um personagem negro – e americano (Samuel L. Jackson, de “Os Vingadores”) – para ser o braço direito do protagonista e tenta fazer de Jane (Margot Robbie, de “Esquadrão Suicida”) uma mocinha que não esteja em perigo. São propostas importantes para deixar um personagem anacrônico em consonância com os novos tempos, mas o resultado é desequilibrado: o personagem de Jackson nunca está à altura dos feitos do protagonista e Jane, apesar de se mostrar forte e decidida, acaba sendo sempre o par romântico que precisa ser salvo pelo herói. Mas apesar das ressalvas o filme diverte e funciona bem em se propor como uma espécie de continuação para a história que todas já conhecem. Quando encontramos Tarzan pela primeira vez, ele não é o senhor das selvas, mas o lorde John Clayton, já “civilizado”, de volta ao castelo de sua família. Uma armadilha arquitetada pelo explorador de diamantes Leon Rom (Christoph Waltz, de “Django Livre”, fazendo o mesmo vilão divertido de sempre) leva o personagem-título de volta à África e ao seu reencontro com sua verdadeira natureza. David Yates usa paletas sombrias para contar a história, mas não se decide entre o realismo e o fantasioso. Parece haver dois filmes em “A Lenda de Tarzan”, um primeiro e mais interessante que se propõe a ser um épico sóbrio (dentro do possível, claro) sobre as dualidades de um homem criado em meio aos animais; e um segundo que mais lembra um filme de super-herói da Marvel. Algumas piadinhas e frases de efeito também não funcionam e parecem deslocadas neste filme, que pende para lados diferentes de acordo com o que roteiro precisa. Trazendo um clímax que abusa de efeitos digitais sem empolgar muito, “A Lenda de Tarzan” dá um novo sopro de vida ao personagem e consegue torná-lo interessante para as novas gerações, sem fazê-lo perder suas características essenciais. Mas enquanto fóssil perdido do tempo, representante de uma era passada e ultrapassada, Tarzan, o personagem, é mais interessante do que seu próprio filme. E a interpretação acima da média de Alexander Skarsgard (da série “True Blood”) ajuda muito neste sentido, trazendo imponência e complexidade para que acreditemos nesta figura deslocada no tempo e espaço. “A Lenda de Tarzan” está longe de ser perfeito, mas consegue em grande medida cumprir sua promessa de aventura como as matinês de antigamente.





