Vangelis (1943–2022)
O compositor grego Vangelis, vencedor do Oscar pelo clássico “Carruagens de Fogo” (1981), morreu na terça-feira (17/5) num hospital da França, aos 79 anos, de causa não divulgada. Vangelis era nome artístico de Evángelos Odysséas Papathanassíu, que ele assumiu ao iniciar a carreira como tecladista de bandas de rock progressivo, como Forminx e Aphrodite’s Child (cujo vocalista era Demis Roussos). Ele começou a compor trilhas nos anos 1960, quando ainda era roqueiro, mas logo se viu cheio de trabalho neste segmento, tanto no cinema quanto na TV grega. Em 1976, fez sua primeira trilha internacional, para a produção britânica “O Jogo da Trapaça”, o que o levou a trocar de vez os palcos pelos estúdios de cinema. Apesar da longa carreira, ele só foi estourar em Hollywood após o drama esportivo “Carruagens de Fogo” (1981), de Hugh Hudson, impressionar o público mundial. A história da equipe de atletismo britânica nas Olimpíadas de Paris, de 1924, venceu o Oscar de Melhor Filme, mas foi o Oscar de Trilha Sonora que ficou marcado até hoje, tamanha a popularidade atingida pelo trabalho do compositor grego. A música-tema de “Carruagens de Fogo” acabou se tornando hino esportivo, sendo usada em transmissões de eventos de atletismo em todo o mundo, inclusive na cobertura televisiva das Olimpíadas de Los Angeles e Londres, e a corrida de São Silvestre no Brasil. O sucesso fez Vangelis ser contratado para seu primeiro projeto americano. E foi outro fenômeno: a trilha de “Blade Runner” (1982). As músicas do filme de Ridley Scott passaram a embalar todo o tipo de comercial televisivo e serviram de base para outros trabalhos baseados na franquia, lançados nos últimos anos. O músico voltou a trabalhar com Ridley Scott dez anos depois, em “1492: A Conquista do Paraíso” (1992), e se juntou a vários outros mestres do cinema mundial. Os destaques de sua filmografia incluem “Desaparecido” (1982), que rendeu um Oscar para seu conterrâneo Costra Gavras, “Antártica” (1983), do japonês Koreyoshi Kurahara, “Rebelião em Alto Mar” (1984), do australiano Roger Donaldson, “Francesco: A História de São Francisco de Assis” (1989), da italiana Liliana Cavani, “Lua de Fel” (1994), do franco-polonês Roman Polanski, e “Alexandre” (2004), do americano Oliver Stone. Nos últimos tempos, Vangelis vinha se especializando em músicas para documentários. Chegou a fazer até a trilha do registro da Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e o Desenvolvimento, conhecida como Rio 92, acompanhando o lendário oceanógrafo-cineasta Jacques-Yves Cousteau. Ele também compôs músicas para missões espaciais da NASA em 2001 e em 2013, trabalho que lhe rendeu uma Medalha de Serviço Público Excepcional. Lembra abaixo os hits mais famosos do compositor.
Alan Ladd Jr. (1937–2022)
O produtor vencedor do Oscar Alan Ladd Jr. morreu nesta quarta-feira (2/3) aos 84 anos. Filho do lendário Alan Ladd, ator de clássicos dos anos 1940 e 1950 como “Alma Torturada” e “Os Brutos Também Amam”, o produtor foi um dos executivos mais influentes de Hollywood, responsável por lançar “Star Wars” e vários blockbusters que ganham continuações até hoje. Ladd Jr. raramente falava de seu pai, que morreu de aparente suicídio aos 50 anos, e foi criado por sua mãe longe de Hollywood. Seu primeiro emprego foi na imobiliária de seu padrasto. Mas sempre foi cinéfilo e, numa viagem a Londres, encontrou abertura para investir em produções independentes, lançado filmes britânicos no começo dos anos 1970: “O Preço de Amar”, “O Vilão”, “Amantes Infieis” e “Os que Chegam com a Noite”, estrelado por Marlon Brando, que fez sucesso nos EUA e o levou a Los Angeles. Em 1973, ele ingressou na 20th Century Fox como vice-presidente de produção, chegando a chefe de produção em 1974 e a presidente do estúdio em 1976. Embora a ascensão tenha sido rápida, ela se deu por meio de escolhas decisivas para a empresa, como o investimento em projetos controversos como “A Profecia”, “O Jovem Frankenstein”, “A Última Loucura de Mel Brooks” e “Guerra nas Estrelas”. Só este último filme rendeu US$ 500 milhões em seu lançamento, uma quantia nunca antes vista, fazendo com que, em cinco anos, Ladd quadruplicasse a receita e os lucros líquidos da Fox – de 1974 até sua saída em 1979. O detalhe é que ele foi considerado louco por bancar a visão do cineasta George Lucas. Ladd precisou colocar subalternos em seus lugares e contrariar o mercado cinematográfico inteiro para aprovar a produção de “Guerra nas Estrelas”, que, com orçamento de US$ 10 milhões, tinha sido recusado por todos os outros estúdios por ser considerado caro demais para valer o risco. A História mostrou quem tinha razão. O lançamento do filme em 1977 criou a era dos blockbusters modernos e dividiu o cinema em antes e depois de “Star Wars”. O Instagram oficial da Lucasfilm reconheceu a importância do produtor para a franquia numa homenagem póstuma, destacando que o “amigo querido” “ficou do lado de George [Lucas] naqueles dias iniciais, e seu impacto em ‘Star Wars’ não pode ser subestimado”. Carinhosamente conhecido na indústria como Laddie, Alan Ladd Jr. era respeitado por muitos e desdenhado por outros ao utilizar seu gosto como fator para fechar contratos, investir em projetos visionários e manter um perfil discreto e cordial em meio às suas conquistas, o que o distinguia do estilo extravagante, falastrão e processado por assédio que se tornou padrão em Hollywood nos últimos anos. Ele chegou a surpreender a indústria ao abandonar seu emprego de US$ 2 milhões por ano como chefe da 20th Century Fox porque sua equipe não estava sendo compensada o suficiente pelo sucesso de blockbusters como “Star Wars” e “Alien”. Poucos lembram, mas “Alien” também foi uma batalha pessoal de Ladd, que entendeu a importância de transformar Ripley (personagem masculino no roteiro original) em mulher, atendendo uma mudança solicitada pelo diretor Ridley Scott. Interpretada por Sigourney Weaver, a personagem foi a primeira heroína de ação moderna, inovando os blockbusters americanos. Após sair da Fox, o estúdio afundou com vários fracassos consecutivos, só voltando a se recuperar no final dos anos 1980. Já Ladd fundou sua própria produtora, a Ladd Co., que se tornou pioneira das produtoras “boutique”, empresas de cinema que atuam de forma independente, mas em aliança contratual com grandes estúdios – em seu caso, em parceria com a Warner Bros. Entre os diversos lançamentos históricos da Ladd Co., encontram-se filmes como “Corpos Ardentes”, “Era uma vez na América”, “Os Eleitos”, “Blade Runner”, “Loucademia de Polícia” e “Carruagens de Fogo”, que surpreendeu expectativas ao vencer o Oscar de Melhor Filme em 1981. Mas muitos de seus filmes de prestígio acabaram dando prejuízo. Hoje cultuadíssimo, “Blade Runner” de Ridley Scott foi um fracasso caríssimo em 1982. Isso fez com que ele voltasse aos grandes estúdios em meados dos anos 1980, virando presidente da MGM, por onde lançou “Feitiço da Lua”, que rendeu o Oscar para Cher, “Um Peixe Chamado Wanda” e “Rain Man”, vencedor do Oscar em 1989. Mas Ladd não ficou muito tempo à frente da MGM, saindo antes de conquistar o Oscar por “Rain Man”, quando o estúdio foi vendido. Em nova incursão independente, o produtor mostrou que continuava atento às novas tendências, lançando o hit “Thelma e Louise”, nova parceria com Ridley Scott, que revigorou o cinema de ação feminista em 1991 e o ajudou a reformar a Ladd Co, por onde produziu “Coração Valente”, épico estrelado e dirigido por Mel Gibson, que venceu o Oscar em 1996. Ladd se aposentou com o lançamento de “Medo da Verdade” em 2007, suspense que inaugurou a carreira de Ben Affleck como diretor. Ver essa foto no Instagram Uma publicação compartilhada por Industrial Light & Magic (@ilmvfx)
Michael Lonsdale (1931 – 2020)
O ator Michael Lonsdale, que ficou conhecido como o herói de “O Dia do Chacal” e o vilão de “007 Contra o Foguete da Morte”, morreu nesta segunda-feira (21/8) em sua casa em Paris aos 89 anos, após uma carreira de seis décadas. Filho de pai britânico e mãe francesa, Lonsdale cresceu em Londres e no Marrocos, onde descobriu o cinema de Hollywood em sessões com as tropas americanas durante a 2ª Guerra Mundial, mas só foi se dedicar às artes ao regressar a Paris em 1947, por influência de seu tio Marcel Arland, diretor da revista literária NRF. Ele estreou no teatro aos 24 anos e logo se mostrou interessado por experiências radicais, em adaptações de Eugène Ionesco e em parcerias com Marguerite Duras. A estreia no cinema aconteceu em 1956, sob o nome Michel Lonsdale. Ele participou de várias produções francesas até sofrer sua metamorfose, virando Michael ao ser escalado por Orson Welles em “O Processo” (1962), adaptação do célebre texto de Kafka rodada na França com Anthony Perkins e Jeanne Moreau. Dois anos depois, voltou a ser dirigido na França por outro mestre de Hollywood, Fred Zinnemann, no drama de guerra “A Voz do Sangue” (1964). Mas apesar da experiência com dois dos maiores cineastas hollywoodianos, decidiu retomar o nome Michel e mergulhar no cinema de arte francês, atuando em clássicos da nouvelle vague como “A Noiva Estava de Preto” (1968) e “Beijos Proibidos” (1968), ambos de François Truffaut, “Sopro no Coração” (1971), de Louis Malle, e “Não me Toque” (1971) e “Out 1: Spectre” (1972), os dois de Jacques Rivette. Entretanto, Fred Zinnemann não o esqueceu e se tornou responsável por introduzi-lo no cinema britânico, ao lhe dar um papel de destaque na adaptação do thriller “O Dia do Chacal” (1973), como o obstinado detetive Lebel, que enfrentou o vilão Carlos Chacal. Ele chegou a ser indicado ao BAFTA (o Oscar britânico), mas não foi desta vez que voltou a ser Michael, permanecendo no cinema francês com papéis em “Deslizamentos Progressivos do Prazer” (1974), de Alain Robbe-Grillet, e “O Fantasma da Liberdade” (1974), de Luis Buñuel, onde chegou a mostrar seu traseiro em cenas sadomasoquistas, pelo “amor à arte”. Paralelamente, aprofundou sua relação com a escritora Marguerite Duras, estrelando quatro filmes que ela dirigiu: “Destruir, Disse Ela” (1969), “Amarelo o Sol” (1971) e “India Song” (1975), onde se destacou como um vice-cônsul torturado, repetindo o papel em “Son Nom de Venise dans Calcutta Désert” (1976). No mesmo ano de “India Song”, que o projetou como protagonista, Lonsdale estrelou o clássico “Sessão Especial de Justiça” (1975), de Costa-Gravas, cuja denúncia do sistema penal à serviço de governos corruptos (no caso, da França ocupada por nazistas) rendeu discussões acaloradas – assim como censura – em vários países. A repercussão do filme de Costa-Gravas o projetou para além da França, levando-o a trabalhar com o inglês Joseph Losey (“Galileu”, “A Inglesa Romântica” e “Cidadão Klein”) e o austríaco Peter Handke (“A Mulher Canhota”), o que o colocou no radar dos produtores da franquia “007”. Em “007 Contra o Foguete da Morte” (1979), Lonsdale viveu o diabólico Drax, um industrial bilionário e pianista, que pretendia envenenar a população da Terra e, em seguida, repovoar o planeta com alguns escolhidos, que ele selecionou para viver em sua estação espacial. O ator comparou seu personagem a Hitler em uma entrevista de 2012. “Ele queria destruir todo mundo e fazer surgir uma nova ordem de jovens muito atléticos… ele estava completamente louco.” Para enfrentar o James Bond vivido por Roger Moore, Lonsdale decidiu voltar a ser Michael e assim foi “adotado” pelo cinema britânico, aparecendo em seguida num dos filmes ingleses mais bem-sucedidos de todos os tempos, “Carruagens de Fogo” (1981). Lonsdale também participou do blockbuster “O Nome da Rosa” (1986) e de vários filmes notáveis dos anos seguintes, firmando parceria com o mestre do drama de época britânico James Ivory nos clássicos “Vestígios do Dia” (1993) e “Jefferson em Paris” (1995), no qual interpretou o imperador Luis XVI. Apesar do sucesso em inglês, ele nunca filmou nos EUA, mas trabalhou em mais três thrillers de diretores americanos famosos. Dois desses filmes foram dirigidos na Inglaterra por John Frankenheimer: “O Documento Holcroft” (1985), estrelado por Michael Caine, e “Ronin” (1998), em que contracenou com Robert De Niro. O terceiro foi “Munique” (2005), de Steven Spielberg, em cenas rodadas na França. Mesmo com essas experiências, ele nunca se interessou por Hollywood, preferindo trabalhar com cineastas europeus como Milos Forman (“Sombras de Goya”), François Ozon (“O Amor em 5 Tempos”), Catherine Breillat (“A Última Amante”), Ermanno Olmi (“A Aldeia de Cartão”), Xavier Beauvois (“Homens e Deuses”) e até o centenário cineasta português Manoel de Oliveira (no último longa do diretor, “O Gebo e a Sombra”). Ativo até 2016, quando se aposentou, Lonsdale só foi receber seu primeiro grande prêmio na véspera de seus 80 anos, o César (equivalente francês do Oscar) por seu papel coadjuvante como sacerdote livre e heroico em “Homens e Deuses” (2010). A consagração como homem de fé foi importante não apenas para a carreira de Lonsdale. Ele professava fé cristã pela influência de uma madrinha cega e, em 1987, ingressou na Renovação Carismática Católica antes de fundar o “Magnificat”, um grupo de oração para artistas. Solteiro e sem filhos, Lonsdale também foi pintor e emprestou sua voz inconfundível a inúmeros documentários e audiolivros.
Ben Cross (1947 – 2020)
O ator Ben Cross, que ficou conhecido pelo papel do atleta olímpico Harold Abrahams no clássico “Carruagens de Fogo” (1981), morreu na manhã desta terça (18/8) em Vienna, onde residia, de uma doença não especificada aos 72 anos. Cross teve grandes sucessos no palco e nas telas. Sua estreia nos cinemas foi ao lado de Sean Connery e Michael Caine no filme “Uma Ponte Longe Demais”, de 1977, mesmo ano em que se tornou membro da Royal Shakespeare Company. Ele ficou famoso ao estrelar a primeira montagem do musical “Chicago” em Londres, em 1979, onde interpretou o protagonista Billy Flynn (vivido por Richard Gere nos cinemas). Por isso, também tentou carreira como cantor, lançando várias músicas. O sucesso de “Chicago” o levou ao papel de Harold Abrahams em “Carruagens de Fogo”, filme que contou a história de atletas britânicos nas Olimpíadas de 1924. Embora Cross acreditasse que a história não teria apelo além do Reino Unido, tornou-se um sucesso mundial e acabou vencendo o Oscar de Melhor Filme. “Um filme como esse muda a vida profissionalmente”, ele disse numa entrevista de 2012 . “De repente, você passa a receber convites para muitos trabalhos, o que é adorável. Mas, desde então, fiz 80 ou 90 projetos, nenhum dos quais teve tanto sucesso.” De fato, muitos de seus filmes seguintes foram abaixo da crítica, empregando-o geralmente como vilão. Num dos mais razoáveis, “Lancelot, o Primeiro Cavaleiro” (1995), enfrentou Richard Gere e Sean Connery, mas ele lutou até com Jean-Claude Van Damme em “A Irmandade” (2001). Também assumiu novas versões de papéis famosos, como no resgate da novela “Dark Shadows”, transformada em série de curta duração em 1991, na qual viveu o vampiro Barbanas Collins. Ele ainda foi Sarek, o pai de Spock, no reboot de “Star Trek”, de 2009. Entre seus últimos trabalhos estão papéis nas séries “Banshee” (2013–2016), “12 Macacos” (2015–2018) e “Pandora” (2019), além de ter interpretado o Príncipe Charles no telefilme “William & Kate: The Movie” (2011). Cross deixou algumas produções inéditas, incluindo o romance da Netflix “Last Letter to Your Lover”, com Shailene Woodley e Felicity Jones, e o terror sobrenatural “The Devil’s Light”, com Virginia Madsen.
Ian Holm (1931 – 2020)
O ator britânico Ian Holm, conhecido por viver Bilbo em “O Senhor dos Anéis” e Ash em “Alien: O Oitavo Passageiro”, morreu nesta sexta (19/6) aos 88 anos. O agente do ator confirmou a notícia citando complicações do Mal de Parkinson como causa da morte. “Ele morreu pacificamente no hospital, com sua família e seu cuidador. Ian era charmoso, gentil e talentoso, e vamos sentir falta dele enormemente”, escreveu o agente, em comunicado. Um dos atores britânicos mais famosos de sua geração, Ian Holm nasceu em 12 de setembro de 1931, filho de médicos escoceses, na cidade inglesa de Goodmayes, e acumulou diversos prêmios em sua carreira. Ele também deu, literalmente, sangue pela arte. Em 1959, quando fazia parte da Royal Shakespeare Company, a mais prestigiosa trupe do teatro britânico, Holm teve o dedo cortado por Laurence Olivier durante uma luta de espadas na montagem de “Coriolanus”. Acabou com uma cicatriz, que para ele tinha conotação de dedicação e orgulho por seu trabalho. Sua trajetória rumo à fama incluiu várias aparições na televisão britânica no início dos anos 1960, até conquistar destaque como o rei Ricardo III na minissérie da BBC “The Wars of the Roses” (1965). Em seguida, conquistou o papel que lhe deu projeção internacional, ao vencer o Tony (o Oscar do teatro) em sua estreia na Broadway em 1967, como Lenny em “Volta ao Lar”, de Harold Pinter, atuando sob direção de Peter Hall. Holm também estrelou a versão de cinema da peça em 1973, novamente dirigida por Hall, que ainda foi o diretor que o lançou no cinema, apropriadamente numa adaptação de Shakespeare, “Sonho de uma Noite de Verão”, em 1968. Na obra shakespeariana, ele viveu o icônico elfo Puck, que foi o primeiro personagem fantástico de sua filmografia. A consagração no cinema e no teatro seguiram paralelas por quase toda a sua carreira. Ele trabalhou em clássicos como “O Homem de Kiev” (1968), de John Frankenheimer, “Oh! Que Bela Guerra!” (1969), de Richard Attenborough, “Nicholas e Alexandra” (1971), de Franklin J. Schaffner, “Mary Stuart, Rainha da Escócia” (1971), de Charles Jarrot, “As Garras do Leão” (1972), novamente de Attenborough… obras premiadíssimas. Seus personagens marcaram época. Viveu, por exemplo, o vilanesco Príncipe João no cultuadíssimo “Robin e Marian” (1976), sobre a morte de Robin Hood (vivido por Sean Connery), sem esquecer as minisséries que impressionaram gerações, estabelecendo-o no imaginário televisivo como Napoleão em “Os Amores de Napoleão” (1974), o escritor JM Barrie, criador de “Peter Pan”, em “Os Garotos Perdidos” (que lhe rendeu indicação ao BAFTA Awards) e o monstruoso nazista Heinrich Himmler na icônica “Holocausto” (1978). A consagração no cinema veio com a indicação ao Oscar e a vitória no BAFTA por “Carruagens de Fogo”, o filme esportivo mais célebre de todos os tempos, em que viveu um treinador olímpico. Sua versatilidade também lhe garantiu muitos admiradores geeks. Holm impactou a ficção científica por suas atuações como Ash, o androide traidor, que acabava decapitado em “Alien: O Oitavo Passageiro” (1979), de Ridley Scott, o burocrata Sr. Kurtzmann em outro clássico, o fantástico “Brazil, o Filme” (1985), de Terry Gilliam, o padre Cornelius em “O Quinto Elemento” (1997), melhor filme de Luc Besson, e o cientista que prevê o apocalipse de “O Dia Depois de Amanhã” (2004), de Roland Emmerich. Ele ainda trabalhou com Gilliam em “Os Bandidos do Tempo” (1981), numa das três vezes em que viveu Napoleão. Foi nesta época, inclusive, que começou sua conexão com “O Senhor dos Anéis”. Em 1981, quando a BBC produziu uma adaptação para o rádio da obra de J.R.R. Tolkien, ele foi o escolhido para dar voz a Frodo. Vinte anos depois, virou o tio de Frodo, Bilbo Bolseiro, na trilogia cinematográfica de Peter Jackson, lançada entre 2001 e 2003 — o final da saga, “O Retorno do Rei”, rendeu-lhe o SAG Awards (prêmio do Sindicato dos Atores dos EUA) como parte do Melhor Elenco do ano. Sua carreira foi repleta de aventuras fantásticas, incluindo “Juggernaut: Inferno em Alto-Mar” (1974), de Richard Lester, e “Greystoke: A Lenda de Tarzan” (1984), uma das mais fiéis adaptações da obra de Edgar Rice Burroughs, na qual interpretou o francês Phillippe D’Arnot, o melhor amigo de Tarzan. Mas também dramas sutis, como “Dançando com um Estranho” (1985), de Mike Newell, e “A Outra” (1988), de Woody Allen. Holm perpetuou-se nas telas em várias adaptações shakespeareanas, numa lista que conta ainda com “Henrique V” (1989), de Kenneth Branagh, e “Hamlet” (1990), de Franco Zeffirelli. E multiplicou-se em obras cults, como “Kafka” (1991), de Steven Sodebergh, “Mistérios e Paixões” (1991), de David Cronenberg, “As Loucuras do Rei George (1994), de Nicholas Hytner, “Por uma Vida Menos Ordinária” (1997), de Danny Boyle, “O Doce Amanhã” (1997), de Atom Egoyan, etc, etc. Ele até voltou a viver Napoleão uma terceira vez, em “As Novas Roupas do Imperador” (2001), de Alan Taylor, tornando-se o ator mais identificado com o papel. Entre os cerca de 130 desempenhos que legou ao público também destacam-se os primeiros filmes dirigidos pelos atores Stanley Tucci (“A Grande Noite”, em 1996) e Zach Braff (“Hora de Voltar”, em 2004), os dramas premiados “O Aviador” (2004), de Martin Scorsese, e “O Senhor das Armas” (2005), de Andrew Niccol, e a animação “Ratatouille” (2007), da Disney-Pixar. Seus últimos trabalhos foram resgates de seus papéis mais populares. Ele voltou a viver Ash no videogame “Alien: Isolation”, lançado em 2014, e a versão envelhecida de Bilbo na trilogia “O Hobbit”, encerrando sua filmografia em 2014, com “O Hobbit: A Batalha dos Cinco Exércitos”. Tudo isso, apesar de sofrer de ataques de pânico a cada vez que as luzes acendiam, o diretor dizia “ação” e as cortinas se abriam. Tudo isso, que também lhe rendeu a nomeação de Comandante do Império Britânico em 1989, a distinção de cavaleiro, conferida pela Rainha Elizabeth II em 1998, a admiração de seus pares e o encantamento de fãs, ao redor do mundo.
Colin Welland (1934 – 2015)
Morreu o ator e roteirista britânico Colin Welland, vencedor do Oscar de Melhor Roteiro Original por “Carruagens de Fogo” (1981). Welland , que sofria do mal de Alzheimer há vários anos, faleceu na segunda-feira (2/11), aos 81 anos, durante o sono, anunciou sua família. Ele nasceu Colin Williams em Lancashire, na Inglaterra, em 4 de julho de 1934, filho de um estivador, e estudou para se tornar professor de Artes Dramáticas em Manchester. Após as aulas, costumava ir a um bar frequentado por funcionários da Granada TV, o canal 3 do Norte da Inglaterra, na esperança de conseguir um emprego na produção de séries. Ironicamente, acabou conhecendo e integrando uma trupe de teatro, que lhe rendeu, após aparecer em algumas peças, convite para atuar numa nova e revolucionária série policial exibida no canal. Sua estreia na TV foi como um dos detetives coadjuvantes de “Z Cars”, drama policial passado no Norte da Inglaterra, com sotaques até então pouco ouvidos na televisão britânica. A trama girava em torno de patrulhas de carros da polícia e marcou época por seu realismo social, explorando a criminalidade derivada do desemprego, ao mesmo tempo em que apresentava um retrato pouco simpático das autoridades. Colin participou das cinco temporadas originais da produção, em 87 episódios exibidos entre 1962 e 1965. Logo depois, foi convidado a estrear no cinema por ninguém menos que Ken Loach, encantando a crítica com seu papel em “Kes” (1969), um dos filmes mais célebres do cineasta inglês. Welland venceu o BAFTA (o Oscar britânico) de Melhor Ator Coadjuvante por interpretar o único professor simpático da trama, que incentivava o jovem protagonista, um estudante pobre e vítima de bulling, cujo único amigo era um falcão. Após aparecer como um pastor em outro clássico de outro mestre do cinema, o ultraviolento “Sob o Domínio do Medo” (1971), de Sam Peckinpah, ele passou a escrever roteiros de TV. Assinou muitos teleteatros para a BBC, deixando a carreira de ator um pouco de lado. Ainda assim, pôde ser visto em “O Vilão” (1971), no filme derivado da série “Sweeney!” (1977) e como um dos protagonistas da série de comédia “Cowboys” (1980-1981), entre outras aparições, cada vez mais raras. Logo escreveu seu primeiro roteiro de cinema, “Os Yankees Estão Voltando” (1979), dirigido por John Schlesinger. O drama, sobre relacionamentos entre soldados americanos e a comunidade britânica durante a 2ª Guerra Mundial, rendeu-lhe uma indicação ao BAFTA de Melhor Roteiro. A repercussão positiva o inspirou a escrever outro drama histórico, sobre dois atletas britânicos, que superaram diferenças de classe e religião para formar um time imbatível nos Jogos Olímpicos de Paris em 1924. Dirigido por Hugh Hudson, “Carruagens de Fogo” (1981) foi indicado a sete Oscars. Venceu quatro, incluindo Melhor Filme e Roteiro Original, escrito por Welland. Além disso, consagrou imagens e uma trilha sonora, assinada por Vangelis, que passaram a representar o espírito olímpico dali em diante. Tanto que, 30 anos depois, a abertura dos Jogos Olímpicos de Londres rendeu-lhe homenagem em 2012. Curiosamente, o filme era tido como azarão no Oscar de 1982. Dramas britânicos não venciam o prêmio de Melhor Filme desde “Oliver”, em 1968. Além disso, a crítica estava dividida desde sua première no Festival de Cannes. Na ocasião, Roger Ebert, fã da produção, juntou os críticos americanos para dar ao filme um prêmio especial, separado dos críticos internacionais, que estavam sendo influenciados pelo repúdio dos franceses à forma como o roteiro tratava seu país. Parte das resenhas americanas também preferiu desdenhar a trama, considerada britânica demais. “A reação a ‘Carruagens de fogo’ na América foi a seguinte: quem quer ouvir a história de dois atletas de 1924?”, lembrou Welland, em um artigo de 2001. “Quando exibimos em Twickenham, um produtor de Hollywood deixou a sala depois de dez minutos. No fim, ele voltou e disse que não tinha interesse. Quando nós ganhamos quatro Oscars, não sei onde ele se escondeu”. Welland também fez história ao receber seu prêmio, rendendo, com seu discurso, um dos grandes momentos do Oscar. Com a estatueta nas mãos, ele bradou “Os britânicos estão chegando!”, alusão a uma conhecida frase da revolução americana, mas também um prenúncio certeiro do que viria. Depois da vitória de “Carruagens de Fogo”, os longas britânicos deixaram de ser azarões, tornando-se favoritos a acumular troféus da Academia de Artes e Ciências de Hollywood. O sucesso também cercou seu próximo trabalho de expectativas. Mas Welland experimentou bloqueio criativo e levou anos para materializar seu roteiro seguinte, “Duas Vezes na Vida”, que só chegou aos cinemas em 1985. A história de infidelidade conjugal, estrelada por Gene Hackman, Ellen Burstyn e Ann-Margret, chegou a ser especulada para o Oscar, mas o próprio escritor implodiu suas chances de indicação, ao admitir que tinha adaptado a ideia de um antigo roteiro televisivo feito para a BBC em 1973. Ele nunca mais conseguiu repetir o sucesso de “Carruagens de Fogo”. Pior que isso, dos dez novos roteiros que escreveu, só dois viraram filmes. Para aumentar a injúria, o script de um deles, “Assassinato Sob Custódia” (1989), sobre as crueldades do apartheid em África do Sul, foi totalmente modificado pela diretora, a francesa Euzhan Palcy. Seu último roteiro de cinema foi a versão britânica de “A Guerra dos Botões” (1995) , refilmagem do clássico francês homônimo de 1962, por sua vez baseado no romance de Louis Pergaud, sobre a rivalidade brutal das crianças de duas vilas vizinhas. Sua maior frustração foi nunca ter conseguido tirar do papel o roteiro sobre a história das locomotivas a vapor, uma invenção do engenheiro Robert Stephenson. “Os produtores americanos disseram que era mais ‘Carruagens de Fogo’ e não se interessaram. Mas era um drama histórico fantástico. Robert Stephenson não sabia ler e escrever, mas foi o maior engenheiro de sua geração. Ele tinha o mundo contra ele e precisou lutar contra os esnobes para realizar uma revolução industrial. E quanto mais eu tentava explicar, mais ouvia: ‘É mais ‘Carruagens de Fogo’”. Sem conseguir emplacar seus roteiros, ele voltou a aparecer como ator em algumas produções televisivas dos anos 1990. Sua última interpretação foi ao ar na série “Bramwell”, em 1998. Logo depois, viria o Alzheimer. “Alzheimer é uma doença cruel, e passamos por momentos difíceis. Mas, no fim, Colin morreu em paz durante o sono. Temos orgulho das conquistas dele ao longo da vida, mas — acima de tudo — vamos sentir falta do amigo, marido, pai e avô amoroso”, disse sua esposa Patricia. Os dois eram casados desde 1962.





