Peter Bogdanovich (1939-2021)
O diretor Peter Bogdanovich, de clássicos como “A Última Sessão de Cinema”, “Lua de Papel” e “Marcas do Destino”, morreu nesta quinta (6/1) de causas naturais em sua casa em Los Angeles, aos 82 anos. Filho de um pintor sérvio, ele decidiu estudar para virar ator aos 16 anos, mas já aos 20 fez a transição para a direção, numa montagem teatral off-Broadway de “The Big Knife”, que ganhou muitos elogios em 1959. Seu primeiro contato com o cinema foi por meio de críticas e artigos publicados na revista Esquire. Acabou encorajado a se mudar para Hollywood, onde conheceu Roger Corman, que o colocou a trabalhar como seu assistente no clássico de motoqueiros “Os Anjos Selvagens”, estrelado por Peter Fonda em 1966. A estreia como diretor aconteceu dois anos depois com “Na Mira da Morte”. Escrito pelo próprio Bogdanovich, o filme destacava em seu elenco o astro de terror Boris Karloff (“Frankenstein”), que devia dois dias de filmagem a Corman. Mesmo com esta restrição, virou um clássico de suspense, contando a história de um atirador que começava a disparar num cine drive-in, durante a aparição de um antigo astro de Hollywood (Karloff). Em troca deste filme, ele topou dirigir um trash para Corman, “Viagem ao Planeta das Mulheres Selvagens” (1968), sobre mulheres belíssimas que habitavam o planeta Vênus. Mas usou um pseudônimo para não se queimar. Decidido a virar um diretor sério, conseguiu assegurar produção de um grande estúdio, a Columbia Pictures, para seu longa seguinte. E fez questão de filmar em preto e branco. Lançado em 1971, “A Última Sessão de Cinema” o consagrou com duas indicações ao Oscar, como Melhor Diretor e Roteirista. O drama baseado no romance homônimo de Larry McMurtry acompanhava estudantes do ensino médio que viravam adultos em uma cidade isolada e decadente no norte do Texas em 1951, momento em que o local começava a definhar, tanto cultural como economicamente. O elenco da produção projetou os jovens astros Timothy Bottoms, Jeff Bridges e Cybill Shepherd, e rendeu Oscars de Melhores Atores Coadjuvantes aos veteranos Cloris Leachman e Ben Johnson. Com apenas 31 anos, Bogdanovich viveu o auge e chegou a ser comparado a Orson Welles. “Ele realizou o mais difícil de todos os feitos cinematográficos: tornou o tédio fascinante”, definiu a revista Time ao elogiar sua obra-prima. Bogdanovich ainda conseguiu um novo amor com “A Última Sessão de Cinema”: Cybill Shepherd, que ele transformou em atriz após vê-la como modelo na capa da revista Glamour. O caso levou ao rompimento de seu casamento com a designer de produção Polly Platt, com quem o cineasta teve duas filhas. A fase de ouro de sua carreira continuou com a comédia “Essa Pequena é uma Parada” (1972) e o drama “Lua de Papel” (1973), ambos estrelados por Ryan O’Neal. Também filmado em preto e branco, “Lua de Papel” foi a última unanimidade crítica de Bogdanovich, acompanhando um golpista e uma menina durante a Grande Depressão. Nos papel principal, O’Neal contracenou com sua própria filha, Tatum O’Neal, que pelo desempenho se tornou a atriz mais jovem a vencer um Oscar, aos 10 anos de idade. Depois destes lançamentos, Bogdanovich decidiu rodar mais dois filmes com sua musa. Shepherd estrelou a comédia de costumes “Daisy Miller” (1974) e o musical “Amor, Eterno Amor” (1975), que também trouxe Burt Reynolds cantando e dançando corajosamente músicas de Cole Porter. Mas ambos fracassaram, já que a crítica – que anos antes o elogiava por revigorar a indústria – se voltara contra o cineasta. “Eles ficaram revoltados porque eu estava tendo um caso com Shepherd”, disse Bogdanovich em uma entrevista de 2019 ao site Vulture . “Eu vi fotos nossas em que parecia um cara arrogante e ela uma garota sexy. E éramos ricos e famosos e fazíamos filmes juntos. Nesta época, Cary Grant me ligou. Ele diz: ‘Peter, pelo amor de Deus, você pode parar de dizer às pessoas que está feliz? E pare de dizer que você está apaixonado. Eu disse: ‘Por quê, Cary?’ ‘Porque eles não estão felizes e não estão apaixonados.’ Ele estava certo.” O status de menino dourado durou pouco e os filmes seguintes não foram incensados. Apesar disso, “No Mundo do Cinema” (1976), novamente estrelado por Ryan e Tatum O’Neal, foi exibido no Festival de Berlim. Sua carreira sofreu outro baque quando um novo affair o devolveu aos tabloides. Ele se envolveu com a ex-playmate Dorothy Stratten, ao dirigi-la na comédia romântica “Muito Riso e Muita Alegria” em 1980, e a jovem acabou assassinada por seu marido, Paul Snider, que depois se matou. Diante do crime, o estúdio desistiu de lançar o filme. Abalado, Bogdanovich comprou os direitos da 20th Century Fox e tentou distribuir a comédia sozinho. Mas ninguém encarou as sessões com risos e alegria, e o diretor acabou falindo. Em 1984, ele escreveu o livro “The Killing of the Unicorn: Dorothy Stratten 1960-1980”, no qual atribuiu grande parte da culpa pela morte de Stratten a Hugh Hefner, argumentando que o fundador da Playboy desencadeou a ira de Paul Snider quando o baniu de sua mansão. O cineasta recuperou seu prestígio com o lançamento de “Marcas do Destino” (1985), um drama romântico sobre um adolescente deformado. O filme estrelado pelos jovens Eric Stoltz e Laura Dern também incluiu em seu elenco a cantora Cher e foi um grande sucesso de público e crítica. Revigorado, ele decidiu retomar os personagens de seu principal clássico em 1990, voltando a se juntar com Timothy Bottoms, Jeff Bridges e Cybill Shepherd em “Texasville”, continuação colorida de “A Última Sessão de Cinema”. Mas o revival não teve a repercussão esperada. Sua vida privada voltou a render notícias quando ele se casou com Louise Stratten, irmã mais nova de Dorothy Stratten, em 1988. Ela tinha apenas 20 anos e ele estava com quase 50. Mesmo assim, o casamento durou até 2001 e eles permaneceram amigos depois do divórcio, chegando a morar juntos novamente no final de 2018, quando Bogdanovich precisou de ajuda após quebrar o fêmur. Stratten também escreveu o roteiro de “Um Amor a Cada Esquina”, último filme dirigido pelo cineasta em 2014. Antes disso, ele ainda filmou as comédias “Impróprio para Menores” (1992), com Michael Caine, “Um Sonho, Dois Amores” (1993), com River Phoenix, e “O Miado do Gato” (2001), com Kirsten Dunst, além de vários telefilmes e um documentário sobre a banda Tom Petty and the Heartbreakers. Mas os trabalhos de direção foram ficando cada vez mais escassos e espaçados, o que o fez reconsiderar sua incipiente carreira de ator. Bogdanovich costumava aparecer em seus filmes e tinha participado como ele mesmo de um episódio da série “A Gata e o Rato”, estrelada por Cybill Shepherd e Bruce Willis nos anos 1980. Mas foi só após ser estimulado por Noah Baumbach a coadjuvar em “Louco de Ciúmes” (1997), que passou a levar a sério a ideia de virar ator. Ele virou figura frequente no elenco de diversos filmes e séries dos anos 2000, incluindo o grande sucesso da HBO “Família Soprano” (The Sopranos), no qual viveu o terapeuta Dr. Elliot Kupferberg. A variedade de títulos que contaram com sua presença abrangem do terror blockbuster “It – Capítulo 2” (no papel de um diretor) ao drama indie “Enquanto Somos Jovens” (novamente dirigido por Baumbach), até se despedir da atuação na série “Get Shorty” em 2019. Ele também deu aulas de cinema, publicou diversos livros com entrevistas com os grandes mestres da sétima arte e desenvolveu um show solo chamado “Monstros Sagrados”, no qual contava anedotas sobre sua carreira. Mais recentemente, apresentava um podcast chamado “Plot Thickens”. A notícia de sua morte foi repercutida por dezenas de cineastas, como Guillermo del Toro e Francis Ford Coppola, e os mais variados astros de Hollywood nas redes sociais. “Ele foi meu Céu e meu Chão”, escreveu Tatum O’Neal, emocionada. Veja abaixo o trailer original da obra-prima do diretor.
Tommy Kirk (1941-2021)
O ex-astro mirim Tommy Kirk, um dos maiores ídolos das produções da Disney nas décadas de 1950 e 1960, morreu na noite de terça (28/9) aos 89 anos. A causa da morte não foi revelada. Ele era gay e vivia sozinho, após romper os laços com a família por sua orientação sexual, mas mantinha amizade próxima com a ex-colega Beverly Washburn, com quem contracenou em seu primeiro sucesso de cinema, “O Meu Melhor Companheiro”, de 1957. Os dois se conheceram crianças e nunca se afastaram. Eram, de fato, vizinhos e foi ela quem comunicou sua morte. Em uma entrevista de 1993 à revista Filmfax, Kirk contou que percebeu que era gay aos 17 anos e que isso quase destruiu sua carreira. “Disney era um estúdio de cinema familiar e eu deveria ser o protagonista jovem de seus principais filmes. Depois que descobriram que eu estava envolvido com outro homem, foi o fim da minha trajetória com a Disney. ” “Eu considero minha adolescência como sendo desesperadamente infeliz”, disse Kirk na entrevista. “Eu sabia que era gay, mas não tinha como expressar meus sentimentos. Era muito difícil conhecer pessoas e, naquela época, não havia lugar para ir para se socializar. Foi só no início dos anos 1960 que comecei a ouvir falar de lugares onde os gays se reuniam. Aquele estilo de vida não era reconhecido e eu me sentia muito, muito sozinho. Oh, eu tive alguns encontros breves e muito apaixonados quando adolescente, eu tive alguns casos, mas eles sempre foram clandestinos, coisas do tipo beco sem saída. Éramos desesperados e miseráveis”, desabafou. “Quando eu tinha cerca de 17 ou 18 anos, finalmente admiti para mim mesmo que era isso mesmo, eu não iria mudar. Não sabia quais seriam as consequências, mas tinha a sensação definitiva de que isso destruiria minha carreira na Disney e talvez toda minha carreira de ator. Tudo iria acabar.” A carreira de Tommy Kirk começou de forma impactante em 1956, quando foi escalado, aos 15 anos de idade, como Joe Hardy na adaptação da Disney para os personagens dos livros de mistérios juvenis “Os Hardy Boys”. A trama seriada de “The Hardy Boys: The Mystery of the Applegate Treasure” era exibida como um segmento da versão clássica do “Clube do Mickey”, e seus episódios com tesouros enterrados, pistas misteriosas e esqueletos fizeram tanto sucesso que foram seguidos por uma 2ª temporada, “The Hardy Boys: The Mystery of the Ghost Farm”. A repercussão positiva animou o estúdio a escalar o jovem em seu primeiro longa-metragem. Com direção de Robert Stevenson, que ainda faria os blockbusters “Mary Poppins” e “Se Meu Fusca Falasse” nos anos 1960, “O Meu Melhor Companheiro” marcou a transformação do então adolescente de 16 anos em ícone da Disney. A história do menino que resgatava um vira-latas que parecia não prestar para nada, mas se torna inestimável para uma família no campo, foi uma das maiores bilheterias de cinema de 1957. A Disney tratou de juntar o menino com mais um cachorro em seu filme seguinte, “Felpudo, o Cão Feiticeiro” (1959), mas teve (ainda) mais sucesso com o terceiro lançamento, “A Cidadela dos Robinson”, aventura clássica dirigida por outro mestre, Ken Annakin. A história da família de náufragos que enfrentava piratas numa ilha deserta também marcou época por ser o primeiro filme com personagem queer da Disney, a menina Roberta (Janet Munro), que disfarçava sua identidade para passar por um menino. Kirk também apareceu em “O Fantástico Super-Homem” (1961) e “O Fabuloso Criador de Encrencas” (1963), em que Fred MacMurray deu vida ao professor aloprado Ned Brainard, um inventor atrapalhado que sempre criava problemas. Os dois filmes marcaram novas parcerias com o diretor Robert Stevenson, que em seguida escalou Kirk em seu primeiro papel de protagonista adolescente, “As Desventuras de Merlin Jones” (1964). Foi outro sucesso, que teve continuação em “O Maravilhoso Homem que Voou” (1965), último filme do ator na Disney. Os filmes de Merlin Jones fizeram esforço para estabelecer Annette Funicello como par romântico de Kirk. Os dois começaram a atuar juntos no musical infantil “Uma Aventura na Terra dos Brinquedos”, em 1961, e ao chegarem à puberdade chegaram a encenar cenas mais picantes em “Ele, Ela e o Pijama” (1964), o primeiro lançamento “adulto” do ator fora da Disney. Ao contrário do que Kirk imaginava, o rompimento com a Disney não foi o fim de sua carreira. Funicello o trouxe para a franquia da Turma da Praia. Depois de “Ele, Ela e o Pijama”, que tinha conexão distante com o universo dos surfistas pela participação da gangue dos motoqueiros liderada por Eric Von Zipper (o impagável Harvey Lembeck), Kirk permaneceu naquele universo para estrelar “Fantasma de Biquini” (1966), novamente com Lembeck, “O Mundos dos Biquínis” (1967), terror da Turma da Praia com Boris Karloff (o primeiro “Frankenstein”), e a aventura caiçara “Catalina Caper” (1967). O ator ainda estrelou filmes trash de sci-fi que acabaram se tornando cultuados, como “A Cidade dos Gigantes” (1965), ao lado dos então jovens Ron Howard e Beau Bridges, e “Mars Needs Women” (1968), com a eterna Batgirl Yvonne Craig. Ainda enfrentou o supervilão Dr. Goldfoot no terceiro filme do personagem vivido por Vincent Price, “The Wild Weird World of Dr. Goldfoot”, substituindo o astro da Turma da Praia Frankie Avalon no pastiche de 007, sem esquecer sua tentativa de ser veloz e furioso no filme de corridas “Rivais no Volante” (1967). De fato, boa parte da filmografia de Kirk nos anos 1960 poderia ser descrita, de uma forma ou outra, como cult movies. Mas nem todas as produções trash em que ele se meteu deram certo. Depois de um par de terrores muito, mas muito ruins, “Blood of Ghastly Horror” (1967) e “It’s Alive” (1969), ele finalmente empacou. Ele fez só dois longas na década de 1970 e, depois disso, só voltou aos cinemas em 1995 na comédia sci-fi “Altas Confusões”, remake satírico do clássico “A Mulher de 15 Metros” (1958). Após mais um punhado de terrores lançados direto em vídeo, o ator encerrou a carreira em 2001 com um filme de vampiro, “The Education of a Vampire” (2001). Em 2006, a Disney finalmente demostrou ter superado o preconceito para reconhecer a importância de Kirk para a História do estúdio. Ele e Tim Considine, os dois intérpretes dos irmãos Hardy na série dos anos 1950, foram saudados como Disney Legends, uma honra concedida a poucos artistas por suas contribuições extraordinárias para a The Walt Disney Company. Na cerimônia, Kirk desejou, para sua posteridade, “ser lembrado por meu trabalho na Disney, como ‘O Meu Melhor Companheiro’ e ‘A Cidadela dos Robinson'”. E contou como se sentiu orgulhoso no dia em que Walt Disney o apresentou para a famosa colunista de fofocas Hedda Hopper como seu amuleto da sorte. Tommy Kirk foi um dos maiores campeões de bilheteria da Disney, antes de ser descartado pelo estúdio por homofobia. “O Meu Melhor Companheiro” foi selecionado para preservação por inestimável importância histórica e cultural no Registro Nacional de Filmes dos Estados Unidos pela Biblioteca do Congresso em 2019.
Monte Hellman (1929–2021)
O diretor Monte Hellman, que dirigiu os clássicos cultuados “O Tiro Certo” (The Shooting) e “Corrida Sem Fim” (Two-Lane Blacktop), morreu na terça-feira, uma semana após sofrer uma queda em casa, aos 91 anos. Chamado de o cineasta americano mais talentoso de sua geração pela influente revista francesa Cahiers du Cinema, Monte Himmelbaum (seu nome verdadeiro) começou sua carreira nos anos 1950, abrindo uma companhia de teatro em Los Angeles. Ninguém menos que Roger Corman, o rei dos filmes B, foi um de seus investidores e eles se juntaram na primeira montagem de “Esperando Godot”, de Samuel Beckett, na cidade. Quando foi expulso de seu espaço depois de um ano, Hellman foi encorajado pelo produtor a entrar no cinema e assim fez sua estreia em 1959, dirigindo o terror barato “A Besta da Caverna Assombrada” com produção de Corman. Ele também foi um dos envolvidos nas filmagens de “Sombras do Terror”, que aconteceu apenas para aproveitar dois dias de estúdio agendado com cenários góticos, numa sobra do cronograma da produção de “O Corvo”, em 1963. Após Corman filmar dois dias de cenas de Boris Karloff subindo e descendo escadas, andando por corredores e abrindo portas num castelo, vários diretores foram convocados para completar a produção com cenas ao ar livre, entre eles Hellman e Francis Ford Coppola. Foi nessa produção inusitada que Hellman conheceu Jack Nicholson, astro do filme – trajado no uniforme napoleônico de Marlon Brando, contrabandeado de “Désirée, o Amor de Napoleão” (1954). Os dois se tornaram parceiros em várias produções. Hellman e Nicholson rodaram dois filmes consecutivos nas Filipinas para Corman em 1964, “Flight to Fury” e “Guerrilheiros do Pacífico”. O diretor filmou o segundo enquanto editava o primeiro, e antes de terminar o ano ainda completou “Cordilheira”, o que dá ideia do ritmo insano das produções de Corman. Depois de mostrar serviço, Hellman procurou o produtor para financiar um faroeste escrito por uma amiga de Jack Nicholson, a estreante Carole Eastman (que depois escreveria outro clássico, “Cada um Vive como Quer”). O produtor topou, desde que o mesmo orçamento rendesse dois westerns. O resultado foi “O Tiro Certo”, escrito por Eastman, e “A Vingança de um Pistoleiro”, com história concebida rapidamente por Nicholson. Os dois filmes marcaram época pelo uso das paisagens desertas e empoeiradas em Kanab, Utah, e levaram apenas três semanas para serem concluídos em 1966. “O Tiro Certo” também inaugurou a parceria do diretor com outro astro, Warren Oates (1928–1982), que Hellman passou a considerar seu alter ego no cinema. Na trama, o personagem de Oates era contratado para guiar uma mulher misteriosa (Millie Perkins) pelo deserto opressivamente quente, cuja agenda de vingança acaba incluindo um terceiro viajante, um pistoleiro habilidoso retratado por Nicholson. Já “A Vingança de um Pistoleiro” trazia Nicholson e mais dois cowboys em fuga, sendo caçados por vigilantes. “Achávamos que estávamos fazendo ‘Duelo ao Sol’”, Hellman disse uma vez ao LA Weekly sobre as filmagens, citando um western clássico dos anos 1940. Mas embora os dois longas tenham sido exibidos no Festival Cannes em 1966, nenhum recebeu distribuição nos cinemas dos Estados Unidos, porque a companhia europeia que os adquiriu no festival faliu. Eles só chegaram aos EUA na TV, onde estrearam dois anos depois. Por isso, a crítica cinematográfica demorou a descobri-los, o que só aconteceu na era do VHS, quando se tornaram cultuadíssimos e considerados pioneiros do western subversivo que revolucionou o gênero nos anos 1960. A decepção com o destino dos longas fez Hellman levar cinco anos para voltar a dirigir. Nesse meio tempo, trabalhou como editor em cult movies como “Os Anjos Selvagens” (1966) para Corman e “Os Monkees Estão de Volta” (Head, 1968) para Bob Rafelson. Mas quando decidiu que era hora de voltar ao cinema, trouxe ao mundo sua obra mais cultuada, “Corrida Sem Fim”, em 1971. O filme trazia o cantor James Taylor e o baterista dos Beach Boys, Dennis Wilson, como dois hot-rodders, que ganhavam a vida vencendo corridas de arrancada com seu Chevy One-Fifty de 1955 incrementado. Eles acabam desafiados pelo personagem de Warren Oates, proprietário de um novo Pontiac GTO, numa corrida pelas estradas do Arizona a Washington. As sessões de imprensa do longa chamaram atenção pelos aplausos, as primeiras críticas rasgaram elogios e o então chefe da Universal Pictures, Ned Tanen, chegou a dizer que “Corrida Sem Fim” era o melhor filme ao qual ele já tinha se associado. Infelizmente, seu chefe, Lew Wasserman, não compartilhou do mesmo entusiasmo. Ao contrário, achou que o filme era “subversivo”, segundo contava Hellman, e proibiu que o estúdio gastasse publicidade para promovê-lo, resultando num fracasso comercial. Hellman fez mais dois longas com Warren Oates, “Galo de Briga” (1974) e “A Volta do Pistoleiro” (1978), este último um spaghetti western rodado na Espanha. E passou muitos anos envolvido em projetos – mais de 50, segundo uma contagem – que acabaram nunca sendo realizados. Ele ainda trabalhou como editor de “Elite de Assassinos” (1975) para Sam Peckinpah e diretor de segunda unidade nas cenas de ação de “Agonia e Glória” (1980), de Samuel Fuller, e “RoboCop” (1987), de Paul Verhoeven. Além disso, como produtor executivo, ajudou a financiar “Cães de Aluguel” (1992), primeiro filme dirigido por Quentin Tarantino, enquanto pensava que poderia dirigir o roteiro do colega, que vislumbrava como um potencial clássico. Após seus últimos longas fracassarem – a aventura “Iguana: A Fera do Mar” (1988) e o terror “Noite do Silêncio” (1989), lançado direto em vídeo – o diretor só foi ressurgir mais de duas décadas depois, com “Caminho para o Nada” (2010), produzido por sua filha. Exibido no Festival de Veneza, o filme foi recebido com curiosidade, mas sua maior repercussão foi trazer de volta a lembrança de Monte Hellman para os cinéfilos de todo o mundo.
Quinn O’Hara (1941 – 2017)
Morreu Quinn O’Hara, ex-Miss Escócia que participou da franquia da Turma da Praia nos anos 1960. Ela tinha 76 anos e faleceu na sexta-feira (5/5) em Los Angeles, de causas naturais. Curiosamente, ela nasceu como Alice Jones, em 3 de janeiro de 1941 na cidade de Edimburgo, e se tornou a primeira Miss Escócia de todos os tempos, já que até então o concurso de beleza juntava candidatas dos quatro países da Grã-Bretanha na disputa de uma única vaga ao Miss Universo, do qual ela também participou. Sua família acabou se mudando para a Califórnia no começo dos anos 1960, onde ela tentou a carreira de atriz, aparecendo em três filmes de Jerry Lewis em pequenos papéis – “O Mocinho Encrenqueiro” (1961), “Errado pra Cachorro” (1963) e “O Otário” (1964). Ruiva estonteante, O’Hara também retratou a secretária sexy de Jack Lemmon em “Um Amor de Vizinho” (1964) e coadjuvou em diversos episódios de séries cultuadas, de “Agente da UNCLE” à britânica “UFO”. Seus papéis mais famosos a retrataram de biquíni. Ela foi para a praia com Raquel Welch em “A Swingin’ Summer” (1965), filme com participação de vários artistas famosos (Gary Lewis & The Playboys, The Rip Chords e The Righteous Brothers). E ainda enfrentou o “Fantasma de Biquíni” (1966), último longa da Turma da Praia, que trazia apenas um remanescente do filme original “A Praia dos Amores” (1963), o motoqueiro Eric Von Zipper (Harvey Lembeck). Nesta produção da American International Pictures, O’Hara interpretou Sinistra, a filha míope, mas sexy, do vilão interpretado pelo veterano Basil Rathbone (o Sherlock Holmes dos anos 1940). Ambos tentam aterrorizar os adolescentes em uma festa na piscina, realizada na mansão assustadora de ninguém menos que Boris Karloff. Ela até chega a cantar uma música no filme, que também contava com Nancy Sinatra no elenco. “Eu me diverti mais interpretando esse papel do que qualquer outro. Ele é o meu favorito, sem dúvida”, ela contou no livro “Drive-In Dream Girls: A Galaxy of B-Movie Starlets of the Sixties”. “E ainda inventei meu caminhar errático, porque eu não podia ver coisa nenhuma com os óculos da personagem, cujas lentes eram tão grossas quanto o fundo de garrafas de Coca-Cola.” Sua carreira cinematográfica ainda incluiu o curta “Prelude” (1968), indicado ao Oscar, o terror “O Uivo da Bruxa” (1970), em que foi a personagem-título, desta vez contracenando com Vincent Price, e um trio de filmes supostamente eróticos, com baixo orçamento e qualidade – “Rubia’s Jungle” (1970), “Foursome” (1971) e “The Teacher” (1974). Nos últimos anos, a atriz se manteve ativa na TV. Seu último papel foi na série “Las Vegas”, em 2005, mas também participou de atrações clássicas como “CHiPs”, “A Ilha da Fantasia”, “SOS Malibu” e “Duro na Queda”, na época em que namorava o protagonista desta série, Lee Majors. O destaque final foi um papel recorrente em “Dallas”, estendido entre sete episódios exibidos entre 1986 e 1991.



