Helmut Berger, astro dos filmes de Visconti, morre aos 78 anos
O austríaco Helmut Berger, um dos mais famosos atores do cinema europeu na década de 1960 graças a colaborações marcantes com o diretor Luchino Visconti, morreu de maneira inesperada” na madrugada desta quinta-feira (18/5), aos 78 anos. Ele estava em casa, em Salzburg, e faleceu por volta das 4h (hora local). A notícia foi anunciada pelo agente do ator, que escreveu que ele faleceu “pacificamente, mas ainda assim inesperadamente” no site de sua empresa de gerenciamento. Nascido na Áustria em 1944, Berger mudou-se para Roma e começou a seguir uma carreira de ator depois de expressar desinteresse em seguir os passos de seus pais na indústria hoteleira. Inicialmente, ele conseguiu trabalho como figurante antes de conhecer Visconti em 1964. O diretor de “Rocco e Seus Irmãos” deu a Berger um pequeno papel em seu filme de 1967, “As Bruxas”, uma antologia também dirigida por mestres como Vittorio De Sica e Pier Paolo Pasolini. A partir dali, Berger e Visconti iniciaram uma relação profissional – e também romântica – que acabou impactando o cenário do cinema europeu na década seguinte. Os papéis mais significativos de Berger vieram em dois dos projetos seguintes de Visconti: “Os Deuses Malditos” (1969) e “Ludwig: A Paixão de um Rei” (1973). No filme de 1969, Berger interpretou um herdeiro fictício desequilibrado de um império siderúrgico na Alemanha nazista, disposto a dobrar seus princípios morais e fazer negócios com Hitler para satisfazer seus desejos por dinheiro e poder (entre outras coisas). Três anos depois, ele retratou o infame “rei cisne”, Ludwig II da Baviera, em um filme que explorava a obsessão do monarca tardio pela extravagância e pelo estilo de vida opulento que acabou levando-o a ser declarado insano. Ambos os filmes mostraram Berger interpretando homens poderosos com sexualidades ambíguas, o que o ajudou a estabelecer-se como um dos símbolos sexuais mais notáveis de sua época – época da explosão do glam rock e do visual andrógino. Ele voltou a colaborar com Visconti em “Violência e Paixão” (1974), como o homem mais jovem por quem Burt Lancaster, no papel de um professor envelhecido, desenvolve um relacionamento próximo. Muitos interpretaram o projeto como uma alegoria para o relacionamento próximo que Visconti e Berger desenvolveram ao longo de uma década de trabalho juntos. Foi o penúltimo filme de Visconti antes de sua morte em 1976 e o último projeto em que os dois trabalharam juntos. O ator também trabalhou com Vittorio De Sica no clássico “O Jardim dos Finzi Contini” (1970), sobre uma família judia que vê seu estilo de vida milionário transformado em pesadelo com a chegada do nazismo. Estrelou ainda a melhor adaptação do clássico de Oscar Wilde, “O Retrato de Dorian Gray” (1970), dirigida por Massimo Dallamano, e o giallo sangrento “Uma Borboleta com as Asas Ensanguentadas” (1971), de Duccio Tessari, antes de estrear em produções de língua inglesa. Berger contracenou com Elizabeth Taylor no suspense “Meu Corpo em Tuas Mãos” (1973) e com Glenda Jackson na comédia “A Inglesa Romântica” (1976), além de ter desempenhado um papel importante em “O Poderoso Chefão III” (1990), de Francis Ford Coppola, como um banqueiro do Vaticano que tenta dar um golpe na família Corleone. Também fez filmes em francês e alemão, e após uma série de problemas de saúde, anunciou sua aposentadoria em novembro de 2019. Considerado um dos homens mais bonitos de seu tempo, ele foi abertamente bissexual e manteve relacionamentos estáveis com Visconti e a atriz Marisa Berenson. Entre outros, relacionou-se também com Rudolf Nureyev, Britt Ekland, Ursula Andress, Nathalie Delon, Tab Hunter, Florinda Bolkan, Elizabeth Taylor, Marisa Mell, Anita Pallenberg, Marilu Tolo, Jerry Hall e o casal Bianca e Mick Jagger, até se casar com a escritora italiana Francesca Guidato em 19 de novembro de 1994. O agente de Berger disse que “ele desfrutou de seu lema ‘La Dolce Vita’ ao máximo durante toda a vida”. Ele citou o ator, ao lembrar o que ele lhe disse há muitos anos: “Vivi três vidas e em quatro idiomas! Je ne pesarte rien!”. Traduzindo: “Tô leve”.
Nathalie Delon (1941 – 2021)
A atriz francesa Nathalie Delon, que foi casada com o astro Alain Delon, morreu de câncer nesta quinta-feira (21/1) em Paris, aos 79 anos. Segundo o filho, ela faleceu pela manhã, cercada por seus familiares. De origem espanhola, a estrela nasceu no Marrocos, quando o país africano era uma colônia francesa, e seu nome verdadeiro era Francine Canovas. Chegou a Paris em 1962 após separar-se de seu primeiro marido, Guy Barthélémy, com quem teve uma filha. Mas ela não ficou muito tempo sozinha. Aos 21 anos, seus olhos verdes chamaram atenção de Alain Delon em uma discoteca parisiense. Na época, ele era noivo de Romy Schneider, uma das atrizes europeias mais famosas e lindas dos anos 1960. Em 1964, dois anos depois do primeiro encontro, ela se casou em segredo com Delon. Mas o relacionamento só foi assumido no cinema após mais três anos, quando contracenaram juntos no clássico thriller criminal “O Samurai” (1967). Em sua estreia, Nathalie chamou tanta atenção que passou a receber muitos convites para continuar a carreira. Ela assumiu os papéis principais de “Lição Particular… de Amor” (1968), “As Duas Irmãs” (1969), “A Mão” (1969) e só voltou a trabalhar com o marido após o divórcio, na comédia “Eu Te Amo, Nathalie” (1971). Nathalie também estrelou as superproduções internacionais “Quando 8 Sinos Tocam” (1971), ao lado de Anthony Hopkins, e “Barba Azul” (1972), estrelada por Richard Burton e por algumas das maiores beldades da época, como Rachel Welch, Virna Lisi e ela própria. Mas aos poucos entrou numa rotina de coadjuvante, em filmes como “A Inglesa Romântica” (1975), de Joseph Losey, e “A Mulher Fiel” (1976), de Roger Vadim, que abriram caminho para produções B e uma mudança radical de rumos. Nos anos 1980, após 30 filmes, ela se cansou de pequenos papéis e se reinventou como cineasta, escrevendo e dirigindo dois filmes, “Ils Appellent ça un Accident” (1982) e “Doces Mentiras” (1986). Este último foi uma coprodução americana estrelada por Treat Williams e Joanna Pacula. O primeiro filme que ela dirigiu também marcou um dos seus últimos trabalhos como atriz. Após a obra de 1982, ela só voltou a atuar nos anos 2000, encerrando a carreira em “Mensch” (2009) ao lado do filho, Anthony Delon. O filho em comum manteve os Delons próximos. “Nos víamos com frequência. Fazia parte da sua vida e ela da minha. Estivemos juntos no Natal. Tiramos fotos, as últimas”, disse Alain Delon nesta quinta-feira à agência AFP.
Michael Lonsdale (1931 – 2020)
O ator Michael Lonsdale, que ficou conhecido como o herói de “O Dia do Chacal” e o vilão de “007 Contra o Foguete da Morte”, morreu nesta segunda-feira (21/8) em sua casa em Paris aos 89 anos, após uma carreira de seis décadas. Filho de pai britânico e mãe francesa, Lonsdale cresceu em Londres e no Marrocos, onde descobriu o cinema de Hollywood em sessões com as tropas americanas durante a 2ª Guerra Mundial, mas só foi se dedicar às artes ao regressar a Paris em 1947, por influência de seu tio Marcel Arland, diretor da revista literária NRF. Ele estreou no teatro aos 24 anos e logo se mostrou interessado por experiências radicais, em adaptações de Eugène Ionesco e em parcerias com Marguerite Duras. A estreia no cinema aconteceu em 1956, sob o nome Michel Lonsdale. Ele participou de várias produções francesas até sofrer sua metamorfose, virando Michael ao ser escalado por Orson Welles em “O Processo” (1962), adaptação do célebre texto de Kafka rodada na França com Anthony Perkins e Jeanne Moreau. Dois anos depois, voltou a ser dirigido na França por outro mestre de Hollywood, Fred Zinnemann, no drama de guerra “A Voz do Sangue” (1964). Mas apesar da experiência com dois dos maiores cineastas hollywoodianos, decidiu retomar o nome Michel e mergulhar no cinema de arte francês, atuando em clássicos da nouvelle vague como “A Noiva Estava de Preto” (1968) e “Beijos Proibidos” (1968), ambos de François Truffaut, “Sopro no Coração” (1971), de Louis Malle, e “Não me Toque” (1971) e “Out 1: Spectre” (1972), os dois de Jacques Rivette. Entretanto, Fred Zinnemann não o esqueceu e se tornou responsável por introduzi-lo no cinema britânico, ao lhe dar um papel de destaque na adaptação do thriller “O Dia do Chacal” (1973), como o obstinado detetive Lebel, que enfrentou o vilão Carlos Chacal. Ele chegou a ser indicado ao BAFTA (o Oscar britânico), mas não foi desta vez que voltou a ser Michael, permanecendo no cinema francês com papéis em “Deslizamentos Progressivos do Prazer” (1974), de Alain Robbe-Grillet, e “O Fantasma da Liberdade” (1974), de Luis Buñuel, onde chegou a mostrar seu traseiro em cenas sadomasoquistas, pelo “amor à arte”. Paralelamente, aprofundou sua relação com a escritora Marguerite Duras, estrelando quatro filmes que ela dirigiu: “Destruir, Disse Ela” (1969), “Amarelo o Sol” (1971) e “India Song” (1975), onde se destacou como um vice-cônsul torturado, repetindo o papel em “Son Nom de Venise dans Calcutta Désert” (1976). No mesmo ano de “India Song”, que o projetou como protagonista, Lonsdale estrelou o clássico “Sessão Especial de Justiça” (1975), de Costa-Gravas, cuja denúncia do sistema penal à serviço de governos corruptos (no caso, da França ocupada por nazistas) rendeu discussões acaloradas – assim como censura – em vários países. A repercussão do filme de Costa-Gravas o projetou para além da França, levando-o a trabalhar com o inglês Joseph Losey (“Galileu”, “A Inglesa Romântica” e “Cidadão Klein”) e o austríaco Peter Handke (“A Mulher Canhota”), o que o colocou no radar dos produtores da franquia “007”. Em “007 Contra o Foguete da Morte” (1979), Lonsdale viveu o diabólico Drax, um industrial bilionário e pianista, que pretendia envenenar a população da Terra e, em seguida, repovoar o planeta com alguns escolhidos, que ele selecionou para viver em sua estação espacial. O ator comparou seu personagem a Hitler em uma entrevista de 2012. “Ele queria destruir todo mundo e fazer surgir uma nova ordem de jovens muito atléticos… ele estava completamente louco.” Para enfrentar o James Bond vivido por Roger Moore, Lonsdale decidiu voltar a ser Michael e assim foi “adotado” pelo cinema britânico, aparecendo em seguida num dos filmes ingleses mais bem-sucedidos de todos os tempos, “Carruagens de Fogo” (1981). Lonsdale também participou do blockbuster “O Nome da Rosa” (1986) e de vários filmes notáveis dos anos seguintes, firmando parceria com o mestre do drama de época britânico James Ivory nos clássicos “Vestígios do Dia” (1993) e “Jefferson em Paris” (1995), no qual interpretou o imperador Luis XVI. Apesar do sucesso em inglês, ele nunca filmou nos EUA, mas trabalhou em mais três thrillers de diretores americanos famosos. Dois desses filmes foram dirigidos na Inglaterra por John Frankenheimer: “O Documento Holcroft” (1985), estrelado por Michael Caine, e “Ronin” (1998), em que contracenou com Robert De Niro. O terceiro foi “Munique” (2005), de Steven Spielberg, em cenas rodadas na França. Mesmo com essas experiências, ele nunca se interessou por Hollywood, preferindo trabalhar com cineastas europeus como Milos Forman (“Sombras de Goya”), François Ozon (“O Amor em 5 Tempos”), Catherine Breillat (“A Última Amante”), Ermanno Olmi (“A Aldeia de Cartão”), Xavier Beauvois (“Homens e Deuses”) e até o centenário cineasta português Manoel de Oliveira (no último longa do diretor, “O Gebo e a Sombra”). Ativo até 2016, quando se aposentou, Lonsdale só foi receber seu primeiro grande prêmio na véspera de seus 80 anos, o César (equivalente francês do Oscar) por seu papel coadjuvante como sacerdote livre e heroico em “Homens e Deuses” (2010). A consagração como homem de fé foi importante não apenas para a carreira de Lonsdale. Ele professava fé cristã pela influência de uma madrinha cega e, em 1987, ingressou na Renovação Carismática Católica antes de fundar o “Magnificat”, um grupo de oração para artistas. Solteiro e sem filhos, Lonsdale também foi pintor e emprestou sua voz inconfundível a inúmeros documentários e audiolivros.


