
Divulgação/ABC
Disney volta atrás e encerra suspensão de Jimmy Kimmel após pressão política nos EUA
ABC confirma retorno do apresentador depois de polêmica envolvendo comentários sobre Charlie Kirk e ameaças do governo dos EUA
Suspensão de “Jimmy Kimmel Live!” chega ao fim
A ABC decidiu recolocar Jimmy Kimmel no ar após uma suspensão que gerou forte repercussão nacional sobre os limites da liberdade de expressão e a pressão política exercida pelo governo de Donald Trump. O programa “Jimmy Kimmel Live!” retorna na noite de terça (23/9).
Em nota divulgada nesta segunda (22), a Walt Disney Co., controladora da emissora, declarou: “Na quarta-feira passada, tomamos a decisão de suspender a produção do programa para evitar inflamar ainda mais uma situação tensa em um momento emocional para o nosso país. Foi uma decisão que tomamos porque sentimos que alguns comentários foram inoportunos e, portanto, insensíveis. Passamos os últimos dias em conversas cuidadosas com Jimmy e, depois dessas conversas, chegamos à decisão de retornar o programa na terça-feira.”
O que provocou a suspensão?
A crise começou no programa de 15 de setembro, quando o apresentador fez uma observação considerada polêmica sobre o assassino de Charlie Kirk, o que foi interpretado por alguns como uma associação a apoiadores de Trump. A fala viralizou e desencadeou críticas nas redes sociais.
No dia seguinte, o presidente da FCC (órgão federal que controla as telecomunicações nos EUA), Brendan Carr, ameaçou rever licenças de afiliadas da ABC. Grupos como Nexstar e Sinclair chegaram a anunciar que poderiam suspender a transmissão do talk show. Embora a Nexstar tenha afirmado que a medida era independente da fala de Carr, a proximidade dos fatos levantou suspeitas.
Kimmel pretende pedir desculpas?
Segundo fontes ouvidas pela imprensa americana, Kimmel não pretendia se retratar e planejava defender que suas palavras haviam sido “tiradas de contexto e grosseiramente deturpadas”. A direção da Disney considerou que isso ampliaria a polêmica e anunciou a suspensão “indefinida”. Reuniões posteriores não alteraram a posição inicial do apresentador, que deve voltar ao ar sem dar o braço a torcer.
Consequências nas afiliadas e no público
Mesmo com o retorno, ainda há dúvidas sobre a exibição nacional. A Sinclair, que controla a afiliada da ABC em Washington, exige um pedido de desculpas, encontro com seus executivos e doação à Turning Point, organização fundada por Kirk. A Nexstar também pode manter a decisão de não transmitir o talk show.
Durante a suspensão, Trump celebrou a decisão, enquanto críticos do apresentador pediram sua demissão. Em contrapartida, a medida foi duramente atacada por políticos, artistas e sindicatos. O senador republicano Ted Cruz e o também republicano Rand Paul se juntaram às críticas, ao lado de nomes como do governador da Califórnia Gavin Newsom e do ex-presidente Barack Obama. O ex-presidente escreveu: “Depois de anos reclamando sobre a cultura do cancelamento, a atual administração levou isso a um novo e perigoso nível ao ameaçar rotineiramente ações regulatórias contra empresas de mídia, a menos que silenciem ou demitam repórteres e comentaristas que não agradam.”
Hollywood reage à decisão
Diversos artistas demonstraram apoio ao apresentador. Ben Stiller declarou: “Isso não está certo.” Jamie Lee Curtis também se solidarizou, enquanto Jean Smart afirmou estar “horrorizada”. Marc Maron escreveu: “Se você tem alguma preocupação ou crença na verdadeira liberdade, na constituição e na liberdade de expressão, este é o momento decisivo. É isso que o autoritarismo parece neste país, está acontecendo.”
Entidades como o WGA, DGA, PGA e o SAG-AFTRA, sindicatos que representam roteiristas, diretores, produtores e atores de Hollywood, também se manifestaram. “O direito de falar o que pensamos e de discordar uns dos outros — de incomodar, inclusive — está no cerne do que significa ser um povo livre. Isso não pode ser negado. Nem pela violência, nem pelo abuso de poder governamental, nem por atos de covardia corporativa”, disse o WGA. A ACLU (União Americana pelas Liberdades Civis) divulgou carta assinada por 400 nomes, incluindo Tom Hanks, Meryl Streep, Ramy Youssef e Kerry Washington, contra a suspensão.
Ex-CEO criticou Disney pela suspensão
Michael Eisner, que foi CEO da Disney entre 1984 e 2005, criticou duramente a suspensão de “Jimmy Kimmel Live!” por considerar que a decisão reflete uma forma de intimidação política fora de controle. Em postagem no X, Eisner questionou: “Onde foi parar toda essa liderança?”, sugerindo que executivos, diretores e líderes corporativos deveriam erguer-se contra “bullying”.
Eisner defendeu o talento de Kimmel, dizendo que ele é “muito talentoso e engraçado”, e insinuou que sua suspensão foi contra os princípios da liberdade de expressão. “A suspensão indefinida de Jimmy Kimmel imediatamente após a postura agressiva porém vazia do presidente da FCC é mais um exemplo de intimidação fora de controle.”
A divisão dentro da própria FCC
Houve críticas até mesmo dentro da própria FCC. Anna M. Gomez, comissária do órgão regulador, divulgou comunicado atacando Carr. “Não podemos permitir que um ato inaceitável de violência política seja distorcido em justificativa para censura e controle governamental. Esta FCC não tem a autoridade, a capacidade ou o direito constitucional de policiar conteúdo ou punir emissoras por discursos que o governo não gosta.”
Boicote e queda de ações pressionaram reviravolta
A suspensão de Jimmy Kimmel Live! também repercutiu no desempenho financeiro da Disney e gerou uma mobilização de boicote contra seus produtos. Relatórios de mercado indicaram queda nas ações da companhia, estimada em cerca de 1% logo após o anúncio, com avaliações apontando perdas bilionárias diárias de valor de mercado.
Paralelamente, usuários de serviços da empresa iniciaram campanhas de cancelamento de assinaturas do Disney+, Hulu e ESPN+. A pressão se estendeu para além do streaming, com protestos contra os parques da Disney World. Vários famosos confirmaram o cancelamento de suas contas de streaming.
O site de cancelamentos do Disney+ chegou a registrar instabilidade devido ao aumento súbito de acessos, reforçando a dimensão da mobilização. Apesar da incerteza sobre o impacto real a longo prazo, o episódio consolidou o boicote como um dos efeitos imediatos da polêmica, o que pode ter influenciado a Disney a reverter sua decisão em menos de uma semana.
A TV americana sob ameaça política
A volta de Kimmel acontece em um momento de instabilidade na televisão americana. A CBS anunciou o cancelamento do “Late Show with Stephen Colbert” para maio, coincidindo com a aprovação da venda da emissora para a Skydance e críticas de Trump ao apresentador. Colbert recebeu a notícia de sua demissão após chamar um pagamento de US$ 16 milhões a Trump, num processo movido pelo político contra a CBS, de “suborno” para a FCC aprovar a venda. Desde então, Trump tem ameaçado a mídia com novos processos e afirmado que canais que o criticam deviam perder suas concessões e sair do ar.