Sentença expõe padrão de discriminação
A juíza Barbara de Lima Iseppi, responsável pela condenação de Leo Lins a oito anos e três meses de prisão, detalhou em sua sentença que o humorista cometeu uma ofensa a cada cinco minutos e 41 segundos durante o show “Perturbador”. Foram listados 13 discursos discriminatórios em 74 minutos de apresentação, atingindo diferentes minorias, como negros, mulheres, nordestinos, idosos, pessoas LGBTQIA+, pessoas com HIV, gordos, judeus, evangélicos, indígenas, pessoas com deficiência e portadores de lábio leporino.
A magistrada destacou trechos do show e indicou que o próprio Leo Lins reconhecia o caráter das falas. Em uma das piadas, ele afirmou: “Essa piada pode parecer um pouco preconceituosa, porque é”. Para Iseppi, a confissão demonstra consciência e dolo na prática do crime: “Ora, não tivesse plena consciência de que está promovendo discursos discriminatórios, o réu nada diria a respeito de ser preso, processado, ‘cancelado’, sendo nítida sua ação livre e voluntária, com dolo direto”.
Enquadramento
Iseppi enquadrou o humorista pela prática reiterada dos delitos previstos no artigo 20 da Lei 7.716/89, que define os crimes resultantes de preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional, e no artigo 88 da Lei 13.146/2015, que é o Estatuto da Pessoa com Deficiência.
O que disse a defesa?
O humorista teria chamado a acusação de “absurda”, alegando que as piadas faziam parte de um personagem em ambiente fictício, típico do contexto teatral. Leo Lins disse que desmontava o personagem ao fim da apresentação e que o objetivo era fazer rir, não ofender. Segundo ele, as piadas não tinham o intuito de ofender, discriminar ou incitar preconceito contra minorias. Ao contrário, a intenção seria fazer as pessoas se sentirem “incluídas”.
Porém, a juíza rejeitou essa tese, frisando que o show foi divulgado fora do contexto teatral, ao ser disponibilizado no YouTube e visto por cerca de 3 milhões de pessoas antes de ser retirado do ar em agosto de 2023, o que amplificou o alcance discriminatório das falas.
Em nota emitida após a condenação, a defesa de Lins afirmou que causava preocupação “ver um humorista condenado a sanções equivalentes às aplicadas a crimes como tráfico de drogas, corrupção ou homicídio, por supostas piadas contadas em palco”. Os advogados ainda informaram que vão recorrer da decisão, acreditando que “essa injustiça seja reparada em segunda instância”.
Condenação e multa
Além da pena de prisão em regime inicial fechado, o humorista foi condenado a pagar indenização de R$ 303,6 mil por danos morais coletivos e multa de 1.170 salários mínimos (cerca de R$ 1,4 milhão). Como a defesa vai recorrer, esses números podem aumentar, diminuir ou zerar após o processo seguir para segunda instância.