Morto a facadas durante um assalto, na madrugada desta quarta-feira (11/11), o diretor Cadu Barcellos, de 34 anos, era um exemplo de superação para a juventude das comunidades pobres do Rio
Aos 23, ele foi um dos cinco jovens cineastas aspirantes selecionados para dirigir episódios da antologia “5x Favela, Agora por Nós Mesmos” em 2009. O filme era uma atualização da antologia clássica do Cinema Novo “Cinco Vezes Favela”, originalmente dirigida por diretores iniciantes que se transformaram em grandes cineastas brasileiros.
Cacá Diegues, que estreou em longa no filme de 1962, foi o produtor do projeto, que inclui apenas equipes de comunidades pobres, registrando seus cotidianos.
Ele já trabalhava no setor audiovisual antes de ser “descoberto”, produzindo vídeos independentes desde a adolescência. Com 17 anos, já participava de cursos de internet e audiovisual em ONGs do Rio. Formado pela Escola Popular de Comunicação Critica (ESPOCC), projeto do Observatório de Favelas, virou oficialmente diretor aos 20 com o curta-metragem “Feira da Teixeira” (2006). No ano seguinte, assinou o programa “Crônicas da Cidade”, do Canal Futura.
Barcellos foi selecionado por Diegues pela experiência precoce e por se destacar em oficinas dedicadas ao cinema nas comunidades do Rio de Janeiro. O diretor afirmou ao jornal O Globo que Cadu foi um de seus melhores alunos.
“Quando nós resolvemos produzir ‘5x Favela, Agora por Nós Mesmos’ apenas com moradores de favela, um dos destaques que nós tivemos logo foi o Cadu Barcellos. Ele era tão inteligente, tão bem-humorado, tão talentoso, que nós demos a ele um dos episódios”, disse Diegues ao Globo. “Isso me deixa muito mal por ele, que foi uma pessoa que conheci muito, que foi muito meu amigo, como também pelo Rio de Janeiro que tá uma cidade impossível de se viver”, afirmou.
Após “5x Favela” ser exibido no Festival de Cannes e ganhar o prêmio do público no Festival de Paulínia, o jovem deu sequência à carreira de diretor e roteirista com a série “Mais X Favela”. Ele escreveu 13 episódios e dirigiu três capítulos das duas temporadas da atração, exibida entre 2011 e 2014 no Multishow.
Também escreveu e dirigiu o documentário “5x Pacificação” (2012) sobre a implementação das UPPs (Unidades de Polícia Pacificadora) nos morros do Rio, participou do roteiro de “Favela Gay” (2014) e foi diretor assistente de “Rio de Fé” (2013), documentário assinado por Cacá Diegues.
Paralelamente, ajudou a lançar o Maré Vive, um canal de mídia comunitária feito de forma colaborativa por moradores do Complexo da Maré, e coordenou o projeto Jpeg, na ONG Promundo, em que liderava um grupo de jovens que promovia ações ligadas à saúde e à igualdade de gênero.
Também foi dançarino e participou do Corpo de Dança da Maré, dirigido pelo coreógrafo Ivaldo Bertazzo, com espetáculos que rodaram o país, nos quais dançou por três anos.
Em 2020, o profissional multitalentoso entrou para a equipe do Porta dos Fundos. Ele foi contratado como assistente de direção do programa “Greg News”, apresentado por Gregorio Duvivier e exibido pela HBO.
Em seu perfil no Twitter, Duvivier afirmou que Barcellos era uma das melhores pessoas que já conheceu. “Um ser humano bom. Brilhante. Família. A morte do Cadu Barcellos deixa um buraco do tamanho do mundo.”
Em nota, a equipe do Porta dos Fundos também ressaltou o talento do cineasta e disse que espera por justiça.
“Hoje, nós do Porta dos Fundos acordamos profundamente tristes com a notícia do falecimento de Cadu Barcellos, um profissional amável, gentil, talentoso e dedicado, que trabalhou com a gente como assistente de direção na temporada de 2020 do programa “Greg News” (HBO). Aguardamos a apuração dessa tragédia e esperamos pela justiça, cientes de que nada pode reparar a perda da vida de uma pessoa tão jovem e querida.”
O cineasta deixa a esposa e um filho de dois anos.