Paulo José é um dos maiores atores da história do cinema brasileiro. Sua força interpretativa, aliada a uma voz marcante e a uma versatilidade impressionante, povoam o nosso cinema de grandes personagens e alguns filmes históricos. É só lembrar de “Macunaíma”, “O Padre e a Moça”, “Todas as Mulheres do Mundo”, “Edu, Coração de Ouro”, “O Homem Nu”, “Os Deus e os Mortos”, “O Rei da Noite”, “Ilha das Flores”. São incontáveis os trabalhos de Paulo José que marcaram o cinema nacional desde os anos 1960. São seis décadas de atuação desse nosso carismático ícone.
Não se pode deixar de lado, também, a contribuição de Paulo José para o teatro. Seu papel como integrante do renovador Teatro de Arena, nos anos 1960 e 1970. E a sua participação ativa na TV, especialmente depois que o Ato Institucional no. 5 aprofundou a opressão da ditadura militar sobre as artes, fechando as portas que tinham sido abertas pelo Cinema Novo e o teatro de resistência do período. Na TV, pôde fazer alguns trabalhos importantes, que serão sempre lembrados, por terem reunido naqueles tempos artistas de muito gabarito, que não conseguiam se expressar melhor por outros meios.
Pois bem, Paulo José chega aos 80 anos e é muito justo e oportuno que seja homenageado pelo cinema, para quem tanto contribuiu e ainda contribui, mesmo enfrentando há 25 anos o mal de Parkinson, que acabou por produzir uma perda de voz, ou melhor, uma voz mais fraca e tímida, que se pode ouvir no documentário “Todos os Paulos do Mundo”, de Gustavo Ribeiro e Rodrigo de Oliveira.
O filme costura um vasto material de arquivo de imagens do trabalho magnífico do ator no cinema e também na TV, com momentos atuais de Paulo José. E o faz de uma forma poética, estabelecendo um vínculo entre esse legado e o autorretrato verbal do próprio ator. Paulo José escreve sobre aspectos importantes de sua vida e de sua arte, além de suas reflexões sobre a cultura brasileira e esses textos são interpretados por ele e por seus amigos e parceiros artísticos, como Fernanda Montenegro, Milton Gonçalves, Selton Mello, Helena Ignez, Marieta Severo, Mariana Ximenes, Matheus Nachtergaele, entre outros. Também vemos em cena suas parcerias com Dina Sfat, Marília Pêra, Joana Fomm, Flávio Migliaccio, José Lewgoy e tanta gente mais. É uma profusão de talentos que preenche a tela.
Esse formato que acopla textos do próprio ator às suas performances, sem entrevistas de outros, nem avaliações críticas de quem quer que seja, mostra que a arte de Paulo José e seu pensamento falam por si. A importância do sua obra salta aos olhos, até para aqueles mais jovens que só conhecem seus trabalhos mais recentes, como o de “O Palhaço”, dirigido por Selton Mello, em 2011, ou suas participações na TV. Quem viveu e acompanhou a trajetória de Paulo José tem no filme um mergulho na história cultural do país, na realidade brasileira com suas mazelas, utopias, tragédias e alegrias.
Inevitavelmente, uma saudade e um sentido nostálgico aparecerão. Não porque ontem tenha sido necessariamente melhor do que hoje, mas porque o vivido foi bonito e envolveu muita luta. Paulo José é uma testemunha de tudo isso, numa trajetória que ele diz que foi mais marcada por fracassos do que por sucessos. É possível. Mas o que fica do seu trabalho é tão denso que o que se vê é o dinamismo e a beleza de sua arte. O resto já se perdeu, ganhou novo significado ou não importa.