Apenas 17% dos filmes brasileiros são dirigidos por mulheres – e 0% por mulheres negras

A Ancine (Agência Nacional do Cinema) divulgou um levantamento que registra a baixa participação das mulheres no cinema brasileiro. Das 2.583 obras audiovisuais registradas ano passado na agência, apenas 17% foram dirigidas […]

A Ancine (Agência Nacional do Cinema) divulgou um levantamento que registra a baixa participação das mulheres no cinema brasileiro. Das 2.583 obras audiovisuais registradas ano passado na agência, apenas 17% foram dirigidas e 21% roteirizadas por mulheres, embora mais da metade da população brasileira seja feminina.

“Os dados nos levam a entender que a construção das narrativas, que vêm dos roteiristas e dos diretores, por mais que os produtores participem, é dos homens. O olhar que vai construir o imaginário de nossa sociedade e novas gerações, é masculino”, acrescentou a diretora da Ancine, Debora Ivanov, durante a apresentação do estudo, no Seminário Internacional Mulheres no Audiovisual, que aconteceu no Rio de Janeiro na semana passada.

De acordo com o levantamento, as mulheres têm uma presença maior entre os produtores (41%) e diretores de arte (58%). Mas entre os diretores de fotografia, são apenas 8%.

A agência também constatou que, quanto mais cara a produção, menor o número de mulheres. “Observamos mais mulheres quando é um curta ou média-metragem, porque são mais baratos. Nossa presença é maior no documentário que na ficção, o que corrobora a visão de que em obras de custo menor temos mais oportunidades”, disse Ivanov.

Quando a etnia é acrescentada à sexualidade, o resultado é ainda mais estarrecedor. A Ancine não pesquisou esse dado, mas o Gemaa (Grupo de Estudos Multidisciplinar da Ação Afirmativa), vinculado ao Instituto de Estudos Sociais e Políticos da UERJ (Universidade do Estado do Rio de Janeiro), apurou que mulheres negras não dirigiram ou roteirizaram nem um longa-metragem sequer de ficção, com distribuição em mais de dez salas, no período de 1995 a 2016. O percentual de homens negros nas duas categorias não passou de 2% na direção e 3% no roteiro, enquanto homens brancos dirigiram 85% e roteirizaram 75% das principais produções nacionais.

Segundo a diretora do Fórum Itinerante do Cinema Negro e doutora em História, Janaína Oliveira, apesar disso, mulheres negras estão produzindo, especialmente curtas e webséries. Ela destacou a participação da realizadora negra Yasmin Thayná no festival de cinema de Rotterdam, um dos mais importantes do mundo, ao lado do ganhador do Oscar, Jerry Benkins, e que quase não repercutiu no Brasil.

Apresentada pela cientista política Marcia Rangel Candido, a pesquisa do Gemaa, com os filmes de maior bilheteria e que dominam o mercado, também avaliou a participação de mulheres nos elencos. O resultado é que a cada 37 homens brancos, uma mulher negra aparece, mas não em posição de prestígio. “A representação de mulheres negras quando estão protagonizando, é estereotipada, hiperssexualizada”, afirmou a cientista.

Para mudar o cenário, a diretora Debora Ivanov informou que a Ancine adotou a paridade de gênero nas comissões de avaliação dos filmes que concorrem ao Fundo Setorial do Audiovisual (FSA), com a presença de pelo menos uma pessoa negra.

O Ministério da Cultura, por meio da Secretaria do Audiovisual, também pretende lançar, em abril, a 2ª edição do edital Carmem Santos, que dará bônus a propostas de curtas-metragens apresentadas por mulheres. Devem ser distribuídos R$ 60 mil para 15 projetos.