De todos os cineastas da Nova Hollywood, Brian De Palma foi o que se manteve mais fiel às suas raízes, ainda produzindo um cinema com os mesmos interesses estéticos e temáticos sem que para isso precise se proibir de navegar por diferentes gêneros e estúdios. Ele não tem a estabilidade financeira de George Lucas ou está na posição confortável de Steven Spielberg, que tem seu próprio estúdio e dirige uma média de um filme a cada dois anos. Por outro lado, talvez seja muito mais influente do que seus colegas, algo que se reflete pelo interesse em refilmar a sua obra e os inúmeros cineastas inebriados por seu estilo.
Realizadores do documentário “De Palma”, Jake Paltrow e Noah Baumbach são oriundos do cinema indie e têm em alta conta o cineasta norte-americano. Os constantes encontros entre os três renderam uma amizade que agora se traduz nesta contribuição no cinema, na qual De Palma traça uma linha do tempo de sua própria carreira, rememorando desde o seu interesse juvenil por tecnologia até “Paixão” (2012), seu filme mais recente.
Quem é fã do cineasta sabe que a idade o tornou cada vez mais avesso a entrevistas, sendo por vezes monossilábico principalmente em questões sobre o seu passado. Não à toa, nos primeiros minutos do documentário, o vemos de braços cruzados, um tanto desinteressado ao tratar sobre si mesmo e a sua velha obsessão pelo cinema de Alfred Hitchcock. No entanto, o conforto em estar em um ambiente familiar e revendo a sua trajetória para amigos fazem toda a diferença, logo reavaliando os seus próprios altos e baixos com algum senso de humor.
Trata-se de uma filmografia tão incrível e cheia de experiências para compartilhar que um documentário com quase duas horas de duração soa insuficiente. Após a realização de filmes experimentais (“Dionysus in ’69”, “Woton’s Wake”) e outros que flertavam sobre o anseio da juventude diante da guerra no Vietnã (“Saudações” e a sua continuação “Olá, Mamãe!”), De Palma quase viu o seu ofício de diretor ganhar um fim abrupto com a sua demissão durante a pós-produção de “O Homem de Duas Vidas” (1972), o seu primeiro filme para um grande estúdio, a Warner Bros.
A sorte veio com “Carrie, a Estranha” (1976), o primeiro de quatro filmes que julga ter obtido uma harmonia entre o sucesso comercial, a liberdade artística e o êxito da crítica – os demais são “Vestida Para Matar” (1980), “Os Intocáveis” (1987) e “Missão: Impossível” (1996). Por outro lado, o fracasso esteve à espreita sempre que De Palma atingia o topo.
Das sessões vazias de “O Fantasma do Paraíso” (1974) em Los Angeles aos comentários severos por “A Fogueira das Vaidades” (1990), o cineasta ainda assim encontra alguma satisfação ao reconhecer o status de cult que algumas de suas produções receberam, especialmente “Um Tiro na Noite” (1981), cujo fiasco à época fez o seu casamento com a atriz Nancy Allen chegar ao fim, bem como levou à falência a companhia Filmways. Hoje, o longa é considerado brilhante, um clássico.
Mesmo dando conta de todos esses percalços, “De Palma” tem sido severamente criticado pela escolha de seu formato. Tendo somente Brian De Palma como testemunha e uma montagem bem astuta com a sua seleção de trechos de filmes e fotografias, houve quem taxasse Paltrow e Baumbach de preguiçosos, ao criarem basicamente um seleção de comentários para material extra de DVD. Não soa justo, pois De Palma não é um artista que precisa de comentários bajuladores de terceiros, sendo os seus depoimentos e as imagens antológicas que arquitetou as melhores defesas de seu próprio legado.