Crítica internacional se divide sobre “Motel Destino” em Cannes: “esquecível” e “ousado”

Filme de Karim Aïnouz surpreende críticos estrangeiros com cenas quentes, em mais de um sentido

A crítica internacional presente no Festival de Cannes se dividiu radicalmente sobre o longa brasileiro “Motel Destino”, de Karim Aïnouz, que teve sua première na Croisette na noite de quarta-feira (22/5). O diretor cearense, que foi premiado no festival francês por “A Vida Invisível” (vencedor da mostra Um Certo Olhar em 2019), retornou ao festival com um thriller erótico muito aguardado.

“Esquecível”

Entretanto, a revista francesa Les Inrockuptibles mostrou-se decepcionada. “O cineasta brasileiro nos propulsa para dentro de um motel sujo e assina um exercício de estilo sem profundidade”, afirmou o texto.

Para o site americano The Wrap reclamou da falta de confiança do diretor e afirmou que “mesmo quando finalmente termina, há pouca chance de você lembrar muito do que viu.” A publicação ainda reforça a crítica, dizendo que o filme “é em grande parte derivado, tornando-se a pior coisa que um filme como este poderia ser: esquecível.”

Outro site importante, o Deadline, chegou a se entusiasmar com o começo – “uma explosão de energia e intriga, montando um promissor thriller neo-noir ambientado no cenário vibrante do Nordeste do Brasil” – , entretanto, logo reclamou: “Apesar do início emocionante e da cinematografia exuberante, o filme acaba perdendo o rumo, atolado por um ato intermediário lento e inconsistências narrativas”.

“Ousado”

Por outro lado, outras publicações viram muitas qualidades no filme, mesmo reconhecendo que ele pode não ser para todos.

A Variety concede que a projeção “pode ser frustrante para alguns”. Mas ressalta: “Uma vez que você se submete à energia sensual febril do filme, ele se torna uma espécie de explosão, pulsando com som, cor e movimento, e genuinamente hilário em sua lubricidade descarada”.

“‘Motel Destino’ é lento como mel e pesado de humor, a ponto de parecer um experimento de gênero ousado”, avaliou o Guardian, antes de rasgar elogios. “O filme é maravilhosamente interpretado pelo trio central: três performances intensamente físicas e despretensiosas, nas quais seus corpos estão frequentemente em exibição, sensuais mas frágeis.”

“Apesar de suas falhas, ‘Motel Destino’ tem humor, crueza e atmosfera de sobra”, ponderou o site The Hollywood Reporter, que se impressionou com “os visuais intoxicantes de Hélène Louvart, que conferem ao filme um calor palpável, fisicalidade e perigo, lembrando o trabalho da ascendente diretora de fotografia francesa em ‘Beach Rats’ de Eliza Hittman. As composições marcantes filmadas em 16mm têm texturas granuladas pulsando com vitalidade e eletrificadas por arrojados toques de cor saturada. A aparência é como neon mesmo à luz do dia, adicionando consideravelmente à carga erótica do filme.”

O site ScreenDaily foi nessa linha, citando a palheta de cores da produção, mas enaltecendo mais a atmosfera sensual: “Aïnouz brinca com o conceito de erotismo, que é de longe o elemento mais interessante deste drama: lençóis laranja flamejantes, lentes infravermelhas e flashes de azul pervinca à parte. Cada quarto do Motel Destino estremece e geme com a urgência das necessidades físicas sendo expressas lá dentro.”

Já o site Indiewire o considerou “sexy, perturbador, mas frio apesar do calor equatorial e da lava quente das atrações livres”. O texto argumenta que “o filme irradia uma energia niilista que pode não ter sido a intenção de Aïnouz, cujo objetivo era um retrato celebratório da luxúria através do prisma do noir.” E conclui que “‘Motel Destino’ parece quase iconoclasta em sua energia feroz e expansiva, com a aura destemida de um filme europeu dos anos 1960 cruzado com um pornô.”

Realmente ousado.

A trama e o elenco

Único latino-americano da competição, o filme foca na trajetória do jovem Heraldo, interpretado pelo estreante Iago Xavier, que transforma o cotidiano do Motel Destino ao chegar no local. Ele é um jovem de 21 anos que sonha em deixar sua pequena cidade litorânea para buscar uma vida melhor em São Paulo. Ele e seu irmão Jorge trabalham para uma agiota e traficante local chamada Bambina, que exige que eles façam um último trabalho antes de partirem. A trama se complica quando Heraldo decide passar uma noite com uma desconhecida no Motel Destino, perdendo seu dinheiro e ficando preso no quarto.

Ao retornar à cidade, Heraldo descobre uma tragédia durante o trabalho que deveria ter feito e, perseguido pelos capangas de Bambina, volta a buscar refúgio no Motel Destino, onde começa a trabalhar como faz-tudo em troca de abrigo. O motel é administrado por Dayana e seu marido abusivo, Elias. Heraldo e Dayana iniciam um caso clandestino, enquanto Elias, que também se sente atraído por Heraldo, desconfia do relacionamento dos dois.

O filme explora temas de erotismo, traição e violência, com uma atmosfera carregada de tensão sexual e um cenário sórdido, com referências ao neonoir dos anos 1980 – de filmes como “O Destino Bate à Sua Porta” e “Corpos Ardentes” (ambos de 1981). A narrativa é pontuada por cenas gráficas de sexo e momentos de perigo iminente, refletindo a luta de Heraldo para escapar de seu destino sombrio.

O elenco destaca o estreante Iago Xavier como Heraldo, Nataly Rocha (“Segunda Chamada”) como Dayana, Fabio Assunção (“Onde Está Meu Coração”) como Elias, Fabíola Líper (“Bacurau”) como Bambina e Renan Capivara (“Cabeça de Nêgo”) como Jorge.

Ainda não há previsão de estreia no Brasil.