O Regresso materializa um espetáculo de sobrevivência visceral

Certa vez, Alfred Hitchcock comentou que no cinema se morre facilmente, mas que matar um homem é muito mais complicado e difícil de executar. Exemplificou isso na famosa cena do assassinato no […]

Certa vez, Alfred Hitchcock comentou que no cinema se morre facilmente, mas que matar um homem é muito mais complicado e difícil de executar. Exemplificou isso na famosa cena do assassinato no fogão, do filme “Cortina Rasgada”, de 1966.

O filme “O Regresso”, um dos mais fortes concorrentes ao Oscar 2016, mostra o personagem Hugh Glass (Leonardo DiCaprio) com sete vidas, ou seja, sobrevivendo a tudo, ao impossível, ao inimaginável. O regresso do título se refere ao retorno à vida após a morte iminente, decretada, com direito até à cova e à terra por cima do corpo. Sobreviver significa uma luta sem tréguas, uma tenacidade, uma disposição de espírito invejável, nas condições mais adversas.

Trata-se, na narrativa, de um explorador/caçador nas florestas selvagens norte-americanas, convivendo com exploradores rivais e suas armas de fogo, grupos indígenas e suas flechas, com um inverno cruel, de tão rigoroso, e com os animais na selva, ursos, entre eles. E, claro, com a cobiça e a competitividade humanas, em seus aspectos mais agressivos.

É uma aventura épica de sobrevivência das mais incríveis e viscerais. Mostrada com muita técnica e efeitos especiais, mas de forma realista, informando que se baseia em fatos reais – inclusive já filmada anteriormente, no longa “Fúria Selvagem” (1971). Não se assemelha às habituais batalhas ao estilo videogame, em que a morte nunca parece uma questão real e possível de alcançar o herói.

Aqui, não, o protagonista está em risco de vida o tempo inteiro. Destruído, semimorto ou renascendo das cinzas. É uma trama intensa, sofrida, violenta e, também, sangrenta. Trata-se, porém, de um filme magnificamente bem realizado, espetaculares movimentos de câmera exploram uma locação de grande beleza, que nos possibilitam uma forte imersão nessa selva inóspita, que cheira a morte, com muita ação.

A caracterização dos personagens, os figurinos, a maquiagem e um esplêndido trabalho de som, além da música também espetacular, do conhecido talento de Ryuchi Sakamoto (“Furyo, Em Nome da Honra”), fazem de “O Regresso” um forte espetáculo cinematográfico. Capaz de aproveitar os recursos tecnológicos do cinema atual e de suas salas de exibição contemporâneas.

Não por acaso, esse espetáculo foi o que recebeu mais indicações para o Oscar. São 12, vejam só: filme, direção, figurino, fotografia, ator e ator coadjuvante, efeitos especiais, mixagem de som, edição de som, direção de arte, maquiagem e edição. Já recebeu diversos prêmios dos sindicatos de Hollywood, inclusive o de Melhor Ator para Leonardo DiCaprio. Está com tudo, no momento.

Será que desta vez o ator leva o Oscar? Bem provável, e será merecido, sem dúvida. Aliás, até já amadureceu demais a sua vez. E o diretor diretor mexicano Alejandro González Iñárritu? Bisará seu Oscar? Ele tem uma carreira de prestígio no cinema norte-americano, pelos grandes filmes que realizou e pelos prêmios já conquistados, a partir de “Amores Brutos”, em 2000, premiado com o BAFTA, indicado ao Oscar de filme estrangeiro, e “21 gramas”, em 2003, “Babel”, em 2006, e especialmente com “Birdman”, que levou no ano passado os principais Oscar, de melhor filme e diretor.

Méritos como realização, “O Regresso” tem, especialmente se o olharmos pelo prisma do grande espetáculo. Além disso, não é um filme vazio, é uma celebração da luta pela vida, uma obsessão permanente pela autopreservação. Nossos tempos parecem ser especialmente difíceis e desafiadores para essa luta, com tantas guerras, terrorismo, intolerância religiosa e radicalizações de todos os tipos. É, portanto, bem-vinda essa celebração.