Spotlight denuncia um dos maiores escândalos do século em homenagem ao bom e velho jornalismo

Um dos filmes mais incensados pela crítica americana em 2015, favorito a diversos prêmios da temporada, “Spotlight – Segredos Revelados” chega aos cinemas em sintonia com estes tempos de denúncias de esquemas […]

Um dos filmes mais incensados pela crítica americana em 2015, favorito a diversos prêmios da temporada, “Spotlight – Segredos Revelados” chega aos cinemas em sintonia com estes tempos de denúncias de esquemas de corrupção em grandes corporações e no governo, mas também das revelações pessoais em redes sociais, de gente disposta a compartilhar a sua própria experiência como vítima de abuso sexual na infância ou na adolescência.

O longa de Tom McCarthy trata de um escândalo específico, trazido à luz pela imprensa americana em 2002: o número alarmante de ocorrências de padres católicos que abusaram sexualmente de crianças em suas paróquias. A trama acompanha o trabalho investigativo de um grupo de repórteres do jornal The Boston Globe, que tem início com a chegada de um novo editor, interessado no caso de abuso de um padre local, abafado pela Igreja.

Puxando o fio da meada, a investigação chega a novos casos e passa a ganhar proporções assustadoras, envolvendo dezenas de sacerdotes e vítimas. Mas nenhum caso tivera repercussão até então, graças ao trabalho de advogados, acordos financeiros e pressão social. Impressionados com a descoberta, os repórteres decidem enfrentar a poderosa Igreja Católica, revelando uma sordidez que repercute até os dias de hoje, levando até o Papa Francisco a se manifestar.

Além da trama relevante, “Spotlight” materializa uma realização técnica admirável. A fotografia, de Masanobu Takayanagi, dá profundidade de campo a ambientes de trabalho reduzidos, como a redação do jornal, e a cenografia, figurino etc. também não ficam atrás. A reconstituição é fidedigna e feita de forma discreta e sóbria, evocando a estética elegante de clássicos do jornalismo político, como “Todos os Homens do Presidente”, de Alan J. Pakula, e “Rede de Intrigas”, de Sidney Lumet, ambos de 1976, com direito a toda a carga de urgência e suspense que obras como essas requerem.

Para completar, o elenco é formado por artistas de peso como Michael Keaton (“Birdman”), Mark Ruffalo (“Os Vingadores”), Rachel McAdams (“Questão de Tempo”), Brian d’Arcy James (série “Smasht”), Liev Schreiber (série “Ray Donovan”) e John Slattery (série “Mad Men”), intérpretes da equipe que sacrifica a vida pessoal pela dedicação ao trabalho. De fato, é curioso como os cônjuges dos jornalistas praticamente não aparecem em cena, sinalizando a obsessão pela notícia que marca a vida desses profissionais.

O filme também apresenta seu caso como um símbolo de resistência, diante do fechamento ou demissões em massa que vêm acontecendo nos jornais, devido à popularização dos sites da internet. O fato é que a nova mídia não demonstrou, até agora, interesse em bancar investigações ao longo de meses de pesquisa e aprofundamento como a realizada pela equipe de “Spotlight”. A perda dos jornais, representaria a perda da informação.

Portanto, “Spotlight” supre duas funções: o de filme-denúncia e de filme-homenagem ao estilo de jornalismo old school e às pessoas que o fazem/faziam. Mas é mesmo como filme-denúncia que a obra de Tom McCarthy se mostra mais contundente, ao revelar uma instituição religiosa insuspeita como uma espécie de máfia, capaz de esconder todas as fontes, comprar advogados ou oferecer altas somas em dinheiro em troca do silêncio. Troque a religião por partido político, e a história também pode servir de paradigma para iluminar outras lamas profundas.